Do quadrilátero Cruls ao patrimônio histórico e cultural da humanidade
Equipe da Missão Cruls, que no final do século XIX demarcou a área da futura capital
Sonhada por dois séculos, a criação de Brasília – inaugurada no dia 21 de abril de 1960 – começou com projetos esboçados desde o período colonial. No século 18 o governo português já cogitava a possibilidade de transferir a capital do Brasil para o interior – medida que foi defendida em outros momentos históricos. Em 1892, a proposta começou a se consolidar, quando o então presidente Floriano Peixoto determinou que uma comissão de cientistas explorasse o Planalto Central e demarcasse a área que seria destinada ao Distrito Federal.
A Comissão Exploradora do Planalto Central, composta por 21 pessoas e chefiada pelo astrônomo e geógrafo belga Louis Ferdinand Cruls – conhecida como Missão Cruls –, demarcou uma área de 14.400 Km², considerada adequada para a futura capital, que ficou conhecida como “Quadrilátero Cruls”. A partir daí, a construção de Brasília foi ganhando corpo em diversos momentos históricos, culminando com sua inauguração, pelo presidente Juscelino Kubitschek, até ser tombada pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco) como patrimônio histórico e cultural da humanidade, em 1987.
A equipe de Cruls era composta por pesquisadores, geólogos, geógrafos, botânicos, naturalistas, engenheiros e médicos, entre outros, e realizou estudos científicos até então inéditos na região, mapeando aspectos climáticos e topográficos, além de estudar a fauna, a flora, os cursos de rios e modo de vida dos habitantes.
Posteriormente, em 1955, outra comissão, chefiada pelo marechal José Pessoa, realizou estudos e fez nova demarcação para o local, cuja área foi fixada em 52 mil Km², aprovada pelo presidente Café Filho. Em 1955, no famoso comício realizado na cidade de Jataí (GO), como candidato à presidência da República, Juscelino prometeu transferir a capital do país para o Planalto Central, caso fosse eleito.
Promessa cumprida, apesar de resistências de setores políticos que queriam manter a capital no Rio de Janeiro, Juscelino construiu a cidade e a inaugurou em 1960, concretizando um sonho de dois séculos. O nome Brasília, adotado por Juscelino, havia sido sugerido em 1823, durante a Constituinte do Império, por José Bonifácio.
Abaixo, a cronologia sobre acontecimentos que precederam a construção da capital federal e os ocorridos após sua inauguração:
1750 – O cartógrafo genovês Francisco Tossi Colombina elaborou a chamada Carta de Goiás, sugerindo a mudança da capital do Brasil para essa região. Há ainda registros históricos atribuídos ao Marquês de Pombal, segundo os quais o estadista português defendia a mudança da sede do governo para o vale do Amazonas.
1763 – O Brasil passou a ter nova capital: o Rio de Janeiro (RJ), que sucedeu Salvador (BA).
1810 – Já existia a proposta de fixar a sede do governo no interior do país, longe dos portos, por questões estratégicas de segurança, o que dificultaria ataques de conquistadores.
1823 – Ano da Constituinte do Império, quando José Bonifácio – conhecido pelo epíteto de “Patriarca da Independência” – apresentou projeto para mudar a capital do país, sugerindo o nome “Brasília” para a nova cidade.
1852 - O parlamentar pernambucano Holanda Cavalcanti apresentou projeto ao Senado, dando continuidade à proposta de José Bonifácio.
1853 – O senador piauiense João Lustosa da Cunha Paranaguá – segundo Marquês de Paranaguá – também apresentou projeto sobre o tema. Na ocasião, discursou defendendo a mudança da capital.
1877 – Francisco Adolfo de Varnhagen, o visconde de Porto Seguro, militar, diplomata e historiador brasileiro, fez a primeira viagem ao Planalto Central para localizar a futura capital. Oficializada pelo Ministério da Agricultura, a aventura, feita em lombo de burro, era para indicar regiões propícias à colonização europeia no Brasil. Varnhagen sugeria o nome de Imperatória para a nova capital, que seria a sede do Império.
1883 – Ano do famoso sonho de São João Bosco – Dom Bosco –, italiano fundador da Congregação dos Salesianos. Em seu sonho, ele viu o surgimento de uma nova civilização, entre os paralelos 15° e 20° do hemisfério sul, numa região onde se formava um lago. Brasília está localizada no mesmo espaço geográfico delimitado pelo sonho, erguida às margens do Lago Paranoá – por esse motivo, Dom Bosco é o padroeiro da cidade, ao lado de Nossa Senhora Aparecida.
1891 – A primeira Constituição da República estabelece, em seu artigo 3º, a área de 14 mil Km² no planalto central, a ser demarcada para a transferência da futura capital.
Integrantes da Missão Cruls às margens do Rio das Almas, em Goiás, 1892
1892 – Nomeada pelo presidente Floriano Peixoto, a Comissão Exploradora do Planalto Central, composta por 21 pessoas e chefiada pelo astrônomo e geógrafo belga Louis Ferdinand Cruls. A chamada Missão Cruls demarcou uma área de 14.400 Km², considerada adequada para a futura capital, que ficou conhecida como “Quadrilátero Cruls” (formado pelas áreas que incluíam as lagoas de Formosa, Feia e Mestre D’Armas). Esse local foi o mesmo indicado por Varnhagen.
1894 – Cruls apresentou ao governo republicano o relatório da comissão exploradora, que ficou conhecido como Relatório Cruls.
1896 – Cruls apresentou um segundo relatório sobre o local demarcado, com informações sobre ligação ferroviária.
1922 – Foi lançada a pedra fundamental da futura capital do país, perto da cidade de Planaltina, que integra atualmente o Distrito Federal.
1952 – O Congresso Nacional aprovou lei determinando a realização de estudos conclusivos para a edificação da nova capital.
1955 – Foram concluídos os estudos realizados por uma comissão chefiada pelo marechal José Pessoa, que contratou a empresa americana Donald Belcher & Associates, de Donald Belcher, para demarcar o local de construção da capital, cuja área foi fixada em 52 mil Km². Nesse mesmo ano, o presidente Café Filho aprovou a área.
1955 – Em comício na cidade de Jataí (GO), o candidato à presidência da República, Juscelino Kubitschek prometeu transferir a capital do país para o Planalto Central, caso fosse eleito.
1956 – O presidente Juscelino Kubitschek encaminhou ao Congresso a chamada Mensagem de Anápolis, propondo, entre outras medidas, a criação da Companhia Urbanizadora da Nova Capital, a futura Novacap. Propôs também o nome de Brasília para sede do governo. Aprovado pelo Congresso, o projeto se converteu na Lei 2.874/56. Nesse mesmo ano foi lançado o edital do concurso do plano piloto, publicado no Diário Oficial de 30 de setembro de 1956. Em outubro, o governo de Juscelino começou, efetivamente, a construção da cidade. Iniciou as obras da residência presidencial provisória, o futuro Catetinho, que foi concluído em nove dias. Começaram a ser construídos o primeiro aeroporto da cidade e o Palácio da Alvorada.
1957 – O projeto de Lúcio Costa foi escolhido vencedor e começam as obras de construção do plano piloto.
1958 – Foi feito o primeiro asfaltamento e também fundada a cidade de Taguatinga.
1960 – Brasília é inaugurada. As festividades para a inauguração começaram às 16h do dia 20 de abril. Na madrugada, uma missa celebrada pelo patriarca de Lisboa marca a inauguração da capital. Às 9h30 do dia 21 de abril foram instalados os três poderes da República: Palácio do Planalto, Congresso Nacional e Supremo Tribunal Federal (STF).
1961 – Inaugurada oficialmente a Universidade de Brasília (UnB), tendo como primeiro reitor Darcy Ribeiro.
1961-1964 – Nesse período – que abrange os governos de Jânio Quadros e João Goulart – a construção da cidade e a transferência dos órgãos do governo do Rio de Janeiro para Brasília ficam praticamente estagnadas. A partir de 1964, o presidente Castelo Branco, assim como os militares que o sucederam no governo, consolidam Brasília como a capital federal do país.
1967 – Inaugurada a Torre de TV. O mirante da Torre já funcionava desde 21 de abril de 1965.
1970 – Após mais de dez anos de construção, é inaugurada a Catedral de Brasília.
1971 – Inaugurada a primeira etapa do hoje Conjunto Nacional, o primeiro shopping center da cidade.
1978 – Inaugurado o Parque da Cidade.
1986 – foram eleitos os primeiros senadores e deputados federais por Brasília.
1987 – Brasília é tombada pela Unesco e registrada como patrimônio histórico e cultural da humanidade.
1990 – Brasília elege o primeiro governador e os primeiros deputados distritais.
2000 – A população total do Distrito Federal supera dois milhões de habitantes.
2002 – Inaugurada a Ponte Juscelino Kubitschek.
2006 – Inaugurado o Conjunto Cultural da República, a mais recente obra de Oscar Niemeyer em Brasília.
Helena Daltro Pontual/Agência Senado