29/06/2015 - 9ª - CPI do Assassinato de Jovens - 2015

Horário

Texto com revisão

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A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Havendo número regimental, declaro aberta a 9ª Reunião da Comissão Parlamentar de Inquérito criada pelo Requerimento do Senado Federal nº 115, de 2015, com a finalidade de, no prazo de 180 dias, investigar o assassinato de jovens no Brasil.
Conforme convocação, a presente reunião destinar-se-á à realização de audiência pública com os pesquisadores indicados no Requerimento nº 1, de 2015, aprovado por esta Comissão.
Estão presentes o seguintes convidados:
Sr. Julio Jacobo Waiselfisz, autor do Mapa da Violência dos Jovens no Brasil, e Sr. Luiz Eduardo Soares, especialista em segurança pública.
Peço à Secretaria que imediatamente conduza e acomode à mesa nossos convidados.
Agradeço a presença do nosso Relator, Senador Lindbergh Farias. Esta audiência pública será realizada em caráter interativo com a possibilidade de participação popular, como foram todas as outras. Por isso, as pessoas que tenham interesse em participar, com comentários ou perguntas, podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, no endereço, www.senado.leg.br/ecidadania e do Alô Senado, através do número 0800 61 22 11. Eu pedia até ao pessoal da TV Senado, se pudesse, colocar esse endereço agora aí.
Para organizar nossos trabalhos, informo que, após a exposição dos convidados, a palavra será concedida aos Senadores na ordem de suas inscrições. Terão preferência, para o uso da palavra, o Relator e o autor do requerimento.
Convido para sentar-se à mesa o Prof. Julio Jacobo, que já participou comigo de uma entrevista hoje sobre o assunto, aqui mesmo no Senado Federal, na TV Senado. Vamos, portanto, ter as duas intervenções. Proponho que tenhamos 20 minutos. É suficiente para sua exposição? Se houver necessidade extraordinária de tempo, negociaremos. Mas acho que, dentro do passível, dá para organizar nos 20 minutos. Também o Dr. Luiz Eduardo deverá preparar-se para o mesmo tempo.
Saúdo o Senador Lindbergh que, na última semana, se notabilizou pela viagem internacional à Venezuela. Já conseguiu acalmar as coisas por lá. Aqui no Brasil a situação está bem mais fácil, e ele certamente conseguirá.
Vamos iniciar a nossa audiência, concedendo a palavra ao Prof. Julio Jacobo, autor do Mapa da Violência, para que faça a apresentação da pesquisa realizada, que foi focada nos adolescentes de 16 a 17 anos no Brasil.
O SR. JULIO JACOBO WAISELFISZ - Perfeito. Muito obrigado, Senadora; muito obrigado, Lindbergh; muito obrigado, colegas; muito obrigado, minha diretora aqui presente; na pessoa deles, saúdo todos os colegas aqui.
Vou tentar trazer alguns dados objetivos segundo a discussão que, aparentemente, desperta muita paixão, desperta muito ressentimento, desperta muita emoção acerca da discussão, da atual discussão da redução da maioridade penal.
Primeiro, quero falar do Mapa bem rapidamente para explicar alguma coisa rápida.
Pode passar.
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O Mapa foi publicado, divulgado pela Unesco em 1998, ou seja, já temos 17 anos de Mapa. Este atual, que estamos divulgando agora, é o Mapa nº 27. Estou contando um a um, à medida que vão saindo.
O foco global dos mapas sempre foi a violência letal e a juventude. São esses dois focos, tentando relacionar algo que, em um momento, quando começamos a escrever, passava totalmente despercebido, que é a violência letal no Brasil e a juventude; a juventude e a violência letal no Brasil. Agora, já há consciência, já há, digamos, uma visão desse problema, apesar de que ainda não está superado, sequer, eu diria, estagnado até o dia de hoje.
Já tive diversas parcerias. Quero esclarecer que o Mapa da Violência não aceita nenhum tipo de financiamento institucional. Só se aceita parcerias para publicação e divulgação do mapa, a parte editorial etc. Já tive, para essas parcerias, o Ministério da Justiça, Unesco, Ritla, Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação, Ciência e Cultura, Instituto Ayrton Senna, Instituto Sangari, Flacso, Secretaria-Geral da Presidência, Secretaria Nacional da Juventude, etc. Isto é, a gente oferece a publicação para aquelas instituições que possam precisar.
Pode passar.
Quais são as nossas fontes de dados? São fontes oficiais. Não trabalhamos com dados de fontes secundárias duvidosas que possam torcer para um ou outro lado. Nossa fonte básica é uma declaração de óbito ou o sistema de informação de mortalidade do Ministério da Saúde.
Vocês sabem que, diante de qualquer óbito no Brasil, torna-se necessária uma declaração de óbito pedida por médicos competentes. Com essa declaração de óbito, tem que se lavrar uma certidão de óbito em cartório de registro civil para enterrar e fazer qualquer tipo de trâmite. É o documento oficial de mortalidade do Brasil. São normas e leis estabelecidas pela Organização Mundial da Saúde há 40, 50 anos.
Trabalhando com esse esquema, temos uma dupla vantagem. Primeiro, neste momento já faz 35 anos de vida o sistema, é de 1980. E segundo temos um sistema internacional totalmente homogêneo, que siga as mínimas classificações, em princípio. Podemos, então, fazer comparações internacionais.
Para a população de cor temos um sério problema para calcular as taxas. Vocês sabem que a única vez em que se levanta a população por raça, cor é nos censos demográficos. A partir desse censo demográfico, não temos. Temos que fazer a estimativa por raça, cor para calcular as taxas. Então, desenvolvemos alguns métodos de interpolação intercensitária para poder trabalhar idade, sexo, etc, com respeito à cor.
E, por último, as estatísticas internacionais, como já estou me referindo à Organização Mundial da Saúde, que tem credibilidade histórica.
Pode passar.
Então, vamos começar com os dados, entrar diretamente nos dados.
Primeiro fenômeno que se pode observar significativo. Divide-se a causa de mortalidade em dois grandes tipos: causas naturais, quando há deterioração da saúde por enfermidade ou pelo passar do tempo, idade, velhice, etc.; e causas externas, por um agente externo, um acidente.
Então, nós temos o contrassenso de que no Brasil as causas naturais foram caindo drasticamente. Deem uma olhada. Em 1980, na faixa de zero a dezenove anos de idade, morreram 228.485 pessoas. Olhem em 2013, quando caiu para 53 mil. Caiu 78% praticamente. Isso nos fez melhorar muito, por exemplo, no Índice de Desenvolvimento Humano, que tem um indicador que se chama Esperança de Vida ao Nascer. Precisamente, a diminuição das taxas de mortalidade está fazendo com que os nossos índices de esperança de vida se elevem drasticamente.
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Por exemplo, os últimos dados apontam que nós temos uma esperança de vida acima de 70 anos, tanto para homens como para mulheres.
Na contramão dessa diminuição drástica, as causas externas.
Entre os jovens aumentaram... Deem uma olhada: as causas externas aumentaram 22%. E por que aumentam as causas externas? Quais são as causas externas? Por exemplo, acidentes de trânsito. E, nesse lapso, só aumentaram 0,6% nessa faixa de zero a 19. Os acidentes como afogamentos, queimaduras etc. caíram 38,7%. Os suicídios juvenis aumentaram, lamentavelmente, 50% neste lapso; mas o que aumentou barbaramente no Brasil foram os homicídios, que passaram de 1.825, em 1980, para 10.520, em 2013. Isso quer dizer que, de uma taxa de 3,1% em 100 mil jovens passamos para 16,3% em 100 mil jovens de zero a 19 anos de idade.
Também outras causas externas caíram. Então, a única explicação que temos para o aumento da mortalidade juvenil, neste momento, por causas externas, são os homicídios.
Pode passar, por favor.
Aqui está no gráfico. Deem uma olhada em como caíram as causas naturais, de 1980 a 2013, de 387 em 100 mil para 83 em 100 mil; as causas externas passaram de 27 para 34. E aqui, nessas causas externas, estão os homicídios.
Pode passar, por favor.
Dos 16 aos 17 anos é a faixa da vida dos jovens que nos preocupa.
De novo, a mesma história: acidentes de trânsito aumentaram 71%; suicídios aumentaram 80% no mesmo lapso; homicídios aumentaram 640%. Quer dizer, aumentaram sete vezes nesse lapso de tempo. As taxas aumentaram também na mesma proporção, com significativa participação no total da mortalidades dos jovens.
Nos anos 80, só 9,7% dos nossos jovens morriam por homicídio - 9,7% do total das mortes de jovens, em 1980, foi por homicídio! Em 1985, aumentou para 16% e, em 1990, aumentou para 25%, 27%, 37%, 40%. 42%, até que, em 2013, está em 46%. Isto é: 46% do total das mortes de jovens, de todas as mortes de jovens por quaisquer causas, é por homicídio. Ou seja, quase a metade dos nossos jovens de 16 a 17 anos morre por homicídio. Isso não tem paralelo em nenhum outro país do mundo. O México, inclusive, que tem taxas maiores, El Salvador, inclusive, que tem taxas maiores, não têm esse nível de mortalidade por homicídios nessas faixas etárias.
Pode passar, por favor.
Vocês observam, agora, por idade simples, como isso acontece.
Aqui temos, em meninos de zero anos de idade, como são os homicídios.
A coluna vermelha são os homicídios.
A faixa de zero anos de idade participa com 0,3% do total de mortes. Em seguida, aumenta para 1,7%, para 1,9% etc... E assim vai, mais ou menos oscilando em níveis muito baixos, de 2,9%; até chegar aos 13 anos de idade. A partir dos 13 anos de idade, olhem como sobe. E, quando chega aos 17 anos de idade, 48,2% dos meninos de 17 anos de idade morrem por homicídio. Depois, começa a cair de novo: 47%, 48,2%, na idade de 17 anos morre por homicídio.
O resto é o resto O que quero dizer? Que 14% vão morrer por acidentes de trânsito, aqui; o resto morre por qualquer outra causa, por acidentes, por infecções etc., etc.
Esse dado é impressionante. Impressiona que a metade dos nossos jovens morra por causa de homicídio.
Pode passar, por favor.
Fazendo comparações internacionais.
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Antes, esclareço que a Organização Mundial de Saúde trabalha com faixas quinquenais, de cinco em cinco anos. Então, comparamos a que mais se assemelha, 15 a 19 e de zero a 19 anos.
México, por exemplo, tem uma taxa muito maior que a nossa: 95,6 homicídios a cada cem mil jovens de 15 a 19. Em Salvador, 55... E nós trouxemos Salvador, que se considera paradigma internacional de mortes juvenis. Nós citamos. Eles têm 55 e está caindo, e nós temos 54 e estamos aumentando. Colômbia. Alguns anos atrás, falar de Colômbia era falar de violência. Era a guerrilha, era o narcotráfico, era tudo. Colômbia, agora, está mais baixo do que nós. Está com 49,3. Panamá, 39; Porto Rico, 31; Guatemala... Deem uma olhada: os sete primeiros países, em violência internacional, são da América Latina. Aí vem, no oitavo, África do Sul. Com toda a história do apartheid, etc., ainda é uma cidade relativamente violenta. Se nós comparamos países com taxas civilizadas, por exemplo, Áustria: 0,2. Isto é, nós temos 250 vezes a taxa da Áustria. Para cada menino que morre na Áustria, morrem, no Brasil, 250. Japão: 0,2. De novo, 250. Reino Unido: 0,2. De novo, 250 a mais. Bélgica: 0,... De novo. Ora, Dinamarca, no ano de 2012, não registrou nenhuma morte na faixa de 15 a 19 anos de idade. Escócia, idem; Luxemburgo, idem; Suíça, idem. Nós só temos infinitas vezes - quando se divide algo por zero, infinito - mais mortes de jovens que esses quatro países.
De novo, quando se trata de zero a 19, a mesma história. Deem uma olhada: México, 26,17... O Brasil, bordeando praticamente Salvador, que está caindo enquanto... Colômbia, Panamá e Ilha caem, enquanto França tem 0,3; Alemanha, 0,3; Portugal, 0,3; Espanha, 0,3; Japão, 0,2... 0,2... 0,1... Escócia, zero. Quer dizer, essas são taxas que poderíamos chamar civilizadas. Aqui temos algo que poderíamos chamar taxas bárbaras.
Pode passar.
Perfil das vítimas. Em 2013, 93% das vítimas de homicídio, e nessa faixa etária, de 16 e 20 anos, foram homens. Entre os Estados, a variabilidade é moderada. No caso, cem por cento de vítimas do sexo masculino em uma pá, em um extremo, e 71,4 num raio, mas 28,6% de mulheres.
Nível educacional da vítima deve ser 17 anos. Esse é um dado que eu tive da seguinte forma: pegamos, na idade de 16 e 17 anos, e vimos na PNAD, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, do IBGE, qual é o nível de escolaridade da população brasileira de 16 e 17 anos. Então, por exemplo, na faixa de um a três anos de estudo, as vítimas têm 20%, com só um a três praticamente analfabetos, enquanto que a população tem 2,6%. Então, temos dez vezes mais analfabetos que na população. Depois, quando vamos a quatro... Não esqueçam que estamos falando de meninos de 16, 17 anos.
Em teoria, pela progressão normal, pela idade ideal, que fala o Ministério da Educação, seja oito ou nove anos, já deveria ter terminado os seus nove anos de escolarização, a começar aos seis, ou seus oito anos, se começou aos sete anos de idade. Agora está na fase de transição essa idade. Então, de uma outra forma, deveriam ter, pelo menos, oito anos de escolarização. Deem uma olhada. De quatro a sete anos, não finalizou o seu Ensino Fundamental, 62% das vítimas e 24% da população.
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Quando vemos, terminou o Ensino Fundamental e pode estar cursando ou já cursou o Ensino Médio, temos só 16% das vítimas e 71% da população. Isso vai marcar um perfil de menos da metade do nível de escolarização que tem o resto da população. Isso os afeta, fundamentalmente, desescolarizados que são. Geralmente pelas comparações que temos, também pela Pnad, os mais pobres são os de menor nível de renda familiar, que moram nas periferias suburbanas. Pelo georreferenciamento que temos da morte, trata-se precisamente de periferias suburbanas, favelas etc.
Pode passar.
A cor dos homicídios. Estas são as taxas de homicídios e índice de vitimização negra. O índice de vitimização negra é a relação entre as taxas brancas e as taxas negras. Quanto por cento morrem mais negros do que brancos, em outras palavras? Nós tínhamos, em 2003, uma taxa de 29,1% mortes de brancos. Em 2013, caiu para 24,2%. Foi uma queda de vinte e pouso por cento, perto de vinte por cento, por aí. Caem as taxas brancas, conclusão, e caem significativamente. Em contraposição, as taxas negras, as taxas de negros, de jovens negros de 16 e 17 anos de idade aumentem de 50 a cada 100 mil negros para 66,3 a cada 100 mil negros. Que quer dizer? Em 2003, morriam 71,8% mais negros que brancos. Por cada negro, morria 0,7 branco, algo assim. Enquanto que, em 2013, são 173. Para cada branco, morrem praticamente três negros.
O trágico do caso, o preocupante do caso é que, apesar de todas essas medidas e políticas que estamos tendo, as taxas seguem crescendo drasticamente, não mostram sinais de retroceder.
De novo, isso quer dizer, para mim, que ou nossas políticas são insuficientes - estamos tentando apagar um incêndio com um conta-gotas -, ou são ineficientes.
Eu não sei; não tenho parâmetros para analisar a eficiência das políticas. O que eu sei é que, nesse caso, se aplica um princípio de epidemiologia muito básico...
(Soa a campainha.)
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Pode continuar.
O SR. JULIO JACOBO WAISELFISZ - Desculpe... Ah, sim.
Se um enfermo tem uma febre que sobe, que aumenta drasticamente e que não abaixa com os remédios, não vamos colocar a culpa no enfermo. Ninguém coloca a culpa da febre no enfermo! E, aqui, estamos colocando a culpa no enfermo, nos dias de hoje.
Botamos a culpa no remédio: ou o remédio é insuficiente, ou é ineficiente. Ou trocamos o remédio, ou aumentamos a dose. Contudo, não colocamos a culpa no paciente. Colocamos a culpa no remédio que estamos usando ou na nossa incapacidade de dar um remédio eficiente.
Podemos continuar.
Esses são os números por cor em alguns Estados, na faixa etária de 16 a 17 anos.
E, sim, quando a gente fala de taxas, não se dá muito conta do que está sucedendo. As taxas ocultam uma realidade. Uma realidade, por exemplo...
Vamos ver: em Sergipe, em 2013, morreu um branco de 16 a 17 anos - um branco morreu! -, enquanto morreram 63 negros. No Pará, morreram 11 brancos, enquanto morreram 184 negros. Em Alagoas, sete brancos contra 176 negros Na Bahia, 17 brancos contra 364 negros. No Maranhão, três brancos contra 105 negros. Em Mato Grosso, quatro contra...
Vejam; em todos os Estados, em maior ou menor medida, salvo Paraná e Santa Catarina, as taxas são desfavoráveis para os negros.
Os únicos Estados que têm maior mortalidade de brancos que de negros são Paraná e Santa Catarina. E isso é histórico; não é de hoje. Primeiro, porque há muito poucos negros, pouco visíveis etc., mas, como são proporções, estão se preservando.
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Todavia, no Brasil, temos o que estamos vendo: uma taxa de falecimentos de 703 brancos contra 2.737 negros, isto é, 173% de vítimização.
Pode passar, por favor.
Convidaram-me, dias atrás, para participar de uma comissão parlamentar de segurança que iria tratar da questão das facas, porque estava grande a polêmica em torno das ocorrências com facas nos Rio de Janeiro, onde mataram um médico etc. Então, quando me convidaram, eu fiz uma tabulação para ir à comissão, mas, ao final, como tive de fazer uma viagem ao exterior, acabei não podendo participar, mas, mesmo assim, fiz a tabulação e me surpreenderam algumas coisas, a saber: essas são idades simples das vítimas, de zero a 17 anos de idade.
Este é o meio empregado: enforcamento, sufocamento, arma de fogo, instrumentos cortantes, como facas etc., e depois outros meios, como objetos contundentes etc., etc. Deem um olhada: as armas de fogo, como aumentam drasticamente com o aumento da idade do indivíduo. Quando se chega aos 16, 17 anos de idade, praticamente 80% ou mais dos homicídios são praticados por armas de fogo.
Sufocamento vai caindo... É grande nas idades mais novas e vai caindo ao longo do tempo.
Objeto cortante e punçante se mantêm mais ou menos constante ao longo do tempo.
O engraçado do caso, o paradoxal, melhor dizendo, é que o Rio de Janeiro, por exemplo, apresentou uma taxa de 5,2% de participação do uso de facas nos homicídios, enquanto o uso de armas de fogo foi de mais de 80%!
O Estado do Rio de Janeiro já editou uma lei, aprovada pela Assembleia, de controle do uso das facas.. Não sei se já foi promulgada... Não sei se já foi promulgada.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. JULIO JACOBO WAISELFISZ - Sim, quase.
Enquanto que o paradoxal do caso é que, em nível nacional, 10% dos homicídios aproximadamente se perpetuam com armas de fogo. Estamos controlando, decididamente, o porte e a tenência de facas, enquanto que outros meios, que matam 78% da população, estamos ampliando as possibilidades de circulação, agora, na discussão da limitação do Estatuto do Desarmamento. É meio paradoxal que aquilo que mata pouco possa circular e aquilo que mata muito tenha ampliada a sua circulação.
Pode passar, por favor.
Taxas de homicídios de adolescentes de 16 e 17 anos, Vocês podem ver...
Só um minuto. É que, de tanta distância, eu não estou vendo, mas tenho aqui.
Temos Alagoas, Espírito Santo e Ceará nos três primeiro lugares de morte de jovens de 16 e 17 anos de idade. Aqui está a sequência que termina com Santa Catarina e Tocantins.
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - E a Bahia?
O SR. JULIO JACOBO WAISELFISZ - A Bahia está em nono lugar.
Agora, quando se trata de evolução, nós temos uma enorme cadeia de evolução, que começa com o Rio Grande do Norte, que cresceu, em 10 anos, 560% a taxa de homicídios de jovens de 16 e 17 anos de idade.
O Ceará cresceu 436%; a Paraíba, 300%; a Bahia, 299%, ou seja, quadruplicou a incidência em poucos anos, em dez anos.
Pode passar, por favor.
Aqui temos os Municípios com mais de quatro mil adolescentes e os dados de homicídios de jovens de 16 e 17 anos.
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Os três primeiros - sinto muito, Senador Lídice - são da Bahia: Simões Filho, Lauro de Freitas e Porto Seguro, com uma população jovem de 16 e 17 anos, de cerca de quatro a cinco mil - aqui está a média da população entre 2011 e 2013.
Esclareço: para evitar oscilações que Municípios de pequeno porte podem ter, eu calculei a média dos três últimos anos disponíveis, isto é, a média de 2011, 2012 e 2013.
Simões Filho teve, em 2011, 2012 e 2013, respectivamente, 17, 17 e 11 homicídios, com uma média de 332,6; Lauro de Freitas, 308, 5; e Porto Seguro, 301,1.
Depois, seguem Serra, no Espírito Santo; Ananindeua, no Pará etc.
Temos, mais ou menos, 100 Municípios mais violentos quanto a esse tipo de jovens.
Pode passar, por favor.
Bom, por último, todos esses materiais e o Mapa da Violência vocês podem baixar - o mapa inclusive - em www.mapadaviolencia,org.br.
O meu e-mail é juliowa@gmail.com.
Qualquer dúvida ou problema podem me contatar por e-mail.
Por último, gostaria de colocar é a minha enorme preocupação em dois sentidos: quando começamos a trabalhar no Mapa da Violência em 1998, estávamos amplamente preocupados com a situação da juventude. Começamos vários projetos de pesquisa, vários programas, como, por exemplo, a Escola Aberta do Ministério da Educação, para preservar a juventude etc., porque, de fato, estávamos muito preocupados. Vemos que, hoje, 17 anos depois, estamos pior do que estávamos antigamente. Nossas taxas quase triplicaram. Nada parece apontar para que estejamos detendo ou em condições de parar essa febre homicida que temos no Brasil.
De novo, repito: não se coloca a culpa no paciente. É o paciente que está sofrendo essa crua e nua realidade do Brasil, e nós estamos colocando a culpa no paciente. Nós criamos uma sociedade violenta - e digo nós pelos meus cabelos brancos, pela minha idade -, uma sociedade violenta e corrupta, que é o que o jovem tem hoje. Nós demos esse legado à juventude e nós queremos que o jovem pague a conta de algo que nós lhes legamos.
Muito obrigado. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Antes de passar a palavra ao próximo orador, eu quero registrar e agradecer a presença da Drª Angélica Goulart, Secretária Nacional de Direitos da Criança e do Adolescente, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
Muito obrigada.
Quero pedir desculpas ao Professor Jacobo, mas é que, na verdade, há um controle de tempo automático. Não sou eu que... Quando se chega aos 20 minutos, automaticamente vai haver uma campainha. Na verdade, já aos 19, ela toca, mas não há corte de som nem nada; é apenas para orientar o orador, de acordo com o formato adotado nas Comissões.
Portanto, eu vou passar a palavra agora ao Professor Luiz Eduardo Soares para fazer também a sua exposição.
O SR. LUIZ EDUARDO SOARES - Muito obrigado, Senadora. É um prazer, apesar do tema, que nos angustia a todos. Eu vou atrás do microfone, já que ele é incontrolável, como os homicídios no Brasil. É um prazer e uma honra compartilhar esta mesa com a senhora, com o Professor Jacobo, que se tornou...
O senhor se tornou uma instituição para nós, além de um amigo, um mestre inspirador, uma instituição, fonte de credibilidade, de confiança, e nós devemos muitíssimo ao senhor e aos seus esforços para que, pelo conhecimento, nós sejamos capazes ou nos tornemos capazes em algum momento de reverter esse quadro.
Até agora isso não se deu, mas nós não desistimos e persistimos. Nesse sentido, eu sou um discípulo do senhor. Apesar de a nossa idade ser próxima, eu já sou um discípulo porque também repito esse mantra: é preciso intervir de alguma maneira, interceptar essa dinâmica genocida no Brasil.
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Há 18, 20 anos, aproximadamente, eu tenho ousado recorrer a essa categoria, a essa expressão mais forte, com o propósito de sensibilizar a audiência.
Aliás, eu devo também agradecimentos ao Senador Lindbergh Farias, relator desta Comissão, pelo convite, além da Senadora Lídice da Mata e devo cumprimentá-las e cumprimentá-los a todos aqui na abertura.
Eu estou convencido de que nós não seremos capazes, de fato, de implantar uma democracia que mereça esse nome, que esteja à altura da dignidade histórica desse nome, se nós não revertermos esse quadro.
Não se trata, propriamente, de um processo de vitimização aleatório, que se distribua de forma equitativa, como disse e demonstrou o Professor Jacobo - e o tem feito seguidamente -, trata-se de um processo com endereço específico, com foco, que de modo concentrado se reproduz, distribuindo desigualmente riscos, sofrimento humano e vitimização. Nós estamos falando de genocídio da juventude negra e pobre que habita as periferias, as favelas, os territórios mais vulneráveis, hoje, de todos os Estados brasileiros, não mais apenas das metrópoles, como ocorria ou tendia a ocorrer antes.
E parece que nós nos acomodamos, como Nação, e naturalizamos esse processo e passamos a conviver com ele, como se fosse tolerável, como se fizesse parte da paisagem.
Todos os esforços, portanto, que forem viáveis, entre eles e com destaque esta CPI, são meritórios e devem merecer todo o nosso apoio, todo o nosso investimento.
Eu espero, Senadora Lídice, que ao fim desse processo, desta CPI, seja possível encaminhar ao País um conjunto de propostas objetivas que mereçam, então, o debate por parte da sociedade e das autoridades do Executivo para além das diferenças partidárias, ideológicas; para além das disputas políticas e eleitorais, unindo-nos a todos em torno da vida e da vida dos jovens.
Não é possível que nós não sejamos capazes de promover um pacto pela paz, de celebrar um acordo, um entendimento em torno de um consenso mínimo, reformando as nossas polícias, atualizando a arquitetura institucional da Segurança Pública que nós herdamos da ditadura, acriticamente, que se reproduz por inércia, ao longo de todos esses anos.
O Brasil se adaptou ao novo contexto democrático, com altos e baixos, aos trancos e barrancos e com as suas contradições, mas a área de segurança pública, as instituições de segurança pública, particularmente as polícias, essas permanecem ainda imersas na cultura corporativa herdada daqueles tempos sombrios, com variações, com esforços claros de transformação, que são honrosos, mas são ainda excepcionais, ainda tópicos, ainda insuficientes.
Nós não atualizamos, não promovemos a transição democrática nessa área. E eu diria mais: inclusive, na área da Justiça Criminal. Há muito o que fazer.
Eu lhes trago uma reflexão, que, de alguma maneira, talvez ajude a complementar o aporte do Professor Jacobo, a descrição, o mapa, essa cartografia diabólica, - não é? -, tão triste, tão trágica, que ele compartilhou conosco. Uma reflexão que focaliza a outra dimensão, o outro lado; o lado dos agentes sociais, dos atores sociais, dos indivíduos, dessas pessoas que transitam pelas cidades e que se envolvem nessas tramas de vida e morte.
Ao longo dessas décadas - tenho 61 anos e tenho trabalhado reiteradamente nessa matéria por ângulos distintos -, persuadi-me, depois de muitas experiências de pesquisa e de testemunho pessoal, que, às vezes, são mais ricos do que as pesquisas propriamente, de que há uma razão prioritária, uma motivação fundamental, que explica ou que ajuda a compreender o ingresso das crianças, desses adolescentes, ainda tão jovens, nas dinâmicas criminais, porque essa pergunta me parece importante. Se nós soubéssemos responder a essa pergunta, provavelmente, os remédios serão melhores, as terapias, as políticas públicas que adotarmos para interceptar a dinâmica e impedir que esse recrutamento se efetive serão mais eficientes.
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Se nós compreendermos as razões pelas quais esses jovens aceitam ingressar nesse universo que lhes dá - o quê? - uma sobrevida de poucos anos, a morte violenta em mãos alheias antes dos 25 anos... Usando a expressão do velho Thomas Hobbes: uma vida funesta, uma vida acanhada, limitada, circunscrita ao seu próprio território, com alguns ganhos eventuais, efêmeros, fugazes.
Por que, entretanto, é possível trocar sua vida, já que o destino, o horizonte é assim tão estreito, tão curto, por uma aventura desse tipo, dessa natureza? Conversando com esses meninos, Brasil afora, e aprendendo também com outros colegas e pesquisadores e outros companheiros de travessia, militantes dos direitos humanos, engajados nessas causas, eu identifiquei um fator. Eu não chamo causa, porque eu não utilizo essa expressão para pensar a sociedade humana. Se nós somos seres humanos, há uma dose de liberdade e os condicionamentos são sempre restritos e limitados, não são absolutos. E essa dose de liberdade torna os processos imprevisíveis, indeterminados, até certo ponto. É claro que há condições, há condicionamentos, há pressões, mas não há determinações mecânicas. Por isso, os mesmos indivíduos submetidos às mesmas condições responderão de modos distintos. Há criatividade, possibilidade de reinvenção, renegociação com a realidade e com suas relações mais próximas, de modo que causa, causalidade me parece um conceito não aplicável à sociedade humana.
De toda maneira, por isso mesmo, sem falar em causa ou causalidade, respeitando a multiplicidade extraordinária de circunstâncias, a variação espantosa de trajetórias humanas, eu lhes diria que há um fator decisivo que joga um papel fundamental e que nos conduzirá, então, a uma reflexão que eu acho básica para definição de políticas públicas e para, inclusive, a discussão a respeito da redução de idade de imputabilidade penal.
Eu vou lhes descrever esse caso como se ele fosse o único. Repito: isso será, claro, apenas um artifício de comunicação, porque as realidades são diversas. Mas vamos lá a esse caso exemplar.
Um menino, um jovem adolescente, na sua faixa de 13, 14, 15, 16 anos, transitando pelas grandes cidades brasileiras, hoje até pelas médias e algumas pequenas, sendo negro e pobre, é um ser socialmente invisível. Invisível porque se confunde com o cenário, com a paisagem; e é desdenhado, negligenciado pelos que cruzam com ele, com esse personagem, nas esquinas da cidade.
Se ele dirige a palavra, essa palavra não ecoa, não tem resposta, não merece atenção. Se ele intervém de forma tímida, os passos não se interrompem, nós continuamos, prosseguimos andando. Se ele se aproxima de uma janela de automóvel, a janela rapidamente é fechada.
Essa invisibilidade pode se dar de duas maneiras: alguém pode ser invisível por não ser visto, notado, percebido, ou porque se projeta sobre esse ser, esse indivíduo um estigma, um preconceito, uma imagem pré-fabricada, uma caricatura. E, quando nós projetamos sobre o outro uma imagem ossificada, reificada, cristalizada, negativa, um estigma, nós não vemos o outro; nós vemos o retrato, o reflexo, o espelho da nossa intolerância. Esse é o retrato da nossa incapacidade de vivenciar a relação humana na sua plenitude, de reconhecer a alteridade, a presença singular, insubstituível daquela pessoa, daquele ser humano que está na outra ponta dessa interlocução, dessa interação. Portanto, essa invisibilidade se constitui por negligência, indiferença ou por medo, preconceito, estigmatização.
E a histórias, as histórias e histórias, que se reproduzem todos os dias, daqueles que são confundidos, porque não são vistos ou ouvidos, mas são tomados, projetando-se sobre as suas faces como se fossem telas vazias, os preconceitos e toda a sua carga de ódio e de medo, são uma extensão da mesma superfície.
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Muito bem; esse jovem recebe de outro jovem uma arma - digamos, uma arma de fogo -, num roteiro qualquer de uma novela, de um drama que nós aqui imaginemos. Quem é esse outro jovem que passa ao primeiro uma arma? É ele mesmo num capítulo mais avançado dessa mesma narrativa. Mas não importa. No momento vamos nos ater a esse personagem, a esse indivíduo, a esse pequeno ser que hesita, testa, sente essa arma e ousa apontá-la para alguém numa esquina qualquer, num momento subsequente a essa cena que eu descrevi.
Quando esse menino aponta para alguém essa arma, essa outra pessoa interrompe tudo o que estiver fazendo e lhe dá, claro, toda a atenção. E há, com isso, uma inversão súbita da hierarquia anterior: ele que era nada, cinza, parte da paisagem, desconhecido, torna-se um personagem assombroso, que cresce e se impõe pela força, afirmando ali a sua presença. A arma, nesse caso, é uma espécie de passaporte ontológico; um passaporte do ser para a existência, de trânsito para a sua autoconstituição como sujeito.
Horrível, triste, lamentável, desastroso, porque esse recurso, esse instrumento de autoafirmação, de autoconstituição, que afirma a presença, atua justamente contra o seu próprio interesse, para reforçar todos os estigmas, para reiterar aquele circuito de violência, do qual ele fora vítima previamente, e vai conduzi-lo a um destino trágico, como nós já dissemos. Antes dos 25 anos ele vai, provavelmente, pagar esse preço, o preço por essa ousadia, com a própria vida.
Portanto, não se trata de uma solução saudável, construtiva. Mas nós precisamos compreender a lógica que subjaz esse processo e as razões, as motivações dessa dinâmica. O que permite, o que induz, o que suscita esse tipo de ação?
Ah! Ele quer subtrair propriedade para obter benefícios. Eu lhes digo que, em boa parte dos casos, isso é secundário em relação ao que está em curso aqui nesta cena. Nesta cena, o fundamental é a afirmação desse sujeito, é a afirmação de sua presença, que requer, então, do outro o quê? Reconhecimento, valorização, acolhimento como um ser humano pleno.
Vejam que paradoxo! Por isso é tão difícil levar isso ao grande público e discutir abertamente um quadro tão paradoxal - para usar a expressão do Professor Jacobo -, tão contraditório.
O que eu estou lhes dizendo muito claramente é que a arma apontada por um menino, por um adolescente, pela primeira vez - ele ainda não se tornou um profissional desta prática... No ensaio geral da violência, pela primeira vez, quando emerge essa possibilidade, essa arma apontada para alguém é um pedido de socorro; é uma tentativa de conexão; é um esforço na direção do contato e da abertura de comunicação. É um pedido de socorro lá do fundo do poço mais escuro e não a afirmação da violência por parte de um personagem monstruoso, perfeitamente autoconstituído e seguro de si.
O que está em jogo é exatamente esse processo; é o metabolismo psíquico, social, cultural, valorativo de um ser que engendra, em si, um ser humano contra a noite da ignorância, da negligência, da indiferença ou da estigmatização.
Deixando metáforas de lado, o que eu lhes digo é: o ato é violento. Quando isso ocorre, a vítima - eu, qualquer um de nós - não vai pensar antropologicamente, psicanaliticamente, não vai pensar sociologicamente. Vai reagir como ser humano - porque nós somos seres humanos -, com ódio e com medo, é evidente! Mas aqui o nosso esforço é o da reflexão. E esse jogo é um jogo brutal, porque, sendo seres humanos, nós reagimos, naturalmente, como seres humanos.
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Diante da ameaça, não somos capazes de ir além - nem recomendo que se vá, peço, isso é sobre-humano. Mas é preciso que, na reflexão, nós sejamos capazes de depreender dessa cena, desse momento, digamos, dramatúrgico o que está em jogo. O que está em jogo é o pedido de socorro, é o pedido de relação, é o restabelecimento de contato, é um pedido de valorização e reconhecimento de alguém que se sente não humano, subumano, não existente.
O que nós fazemos como sociedade? Lançamos esse menino para uma entidade socioeducativa e querem levá-lo para o sistema penitenciário ou para sucursais do sistema penitenciário. Mas, enfim, lançamos esse menino para o sistema socioeducativo, para uma entidade - nós sabemos que o ECA nunca foi implementado com rigor, agora estamos discutindo a mudança da lei antes de testá-la! É extraordinário o nosso País! Nós temos uma lei que nunca foi aplicada com rigor, mas agora ela está sendo discutida, em vez de haver uma espécie de celebração de um grande acordo pela aplicação finalmente dessa lei, para que nós a testemos e voltemos a discuti-la no futuro quando ela tiver sido aplicada, nós discutimos a sua mudança, a sua alteração, como se ela tivesse sido aplicada com rigor há séculos. Nunca foi!
Mas, enfim, nesse não aplicar, nós temos, então, entidades muitas delas que nós sabemos que são símiles do cárcere e são símiles de latas do lixo. Quando nós depositamos alguém - mais ainda um adolescente - na lata do lixo, que mensagem nós passamos às pessoas? Você é o conteúdo desse continente, e esse continente sendo uma lata de lixo, predefine você como conteúdo: você é um lixo! É um lixo que não nos importa, é um dejeto. É aquilo que de fato você supunha ser, temia ser, contra o que você lutou equivocadamente na contramão, contraditoriamente, erguendo aquela arma.
Pois saiba que não tem saída, é esse o seu destino.
Então, de fora para dentro, com a mensagem dessa estrutura institucional, com a sua cenografia, com a sua coreografia, com esse elenco daqueles funcionários, muitos esforçados, buscando os caminhos opostos, mas muitos deles parte dessa cena de horrores, ele ou ela, esse menino reconhece, de fora para dentro, que é lixo. Absorve essa informação e passa a se comportar em conformidade com essa informação.
Essa é uma entidade constituída por uma instituição... Vejam, supostamente, isso tudo estaria encaminhado na direção da socioeducação.
(Soa a campainha.)
O SR. LUIZ EDUARDO SOARES - Não é nem da justiça, é a socioeducação. Para que houvesse a possibilidade de que florescesse esse ser humano aí, que estava obstado por tantos entraves interno e externos. Mas não, nós confirmamos as piores suspeitas que a sua dor mais profunda anunciava. E dizemos: o caminho é esse, você não é nada mesmo, você está destinado à invisibilidade, a menos que você a esses expedientes brutais, e não lhe resta alternativa.
Quando a solicitação havia sido justamente a de contato, valorização e reconhecimento. Só há uma saída nesse caso: se nós apostamos no ser humano. Se nós apostamos na paz social, na segurança pública, se queremos menos violência, menos crimes, porque nós estamos contratando não apenas a destruição desses indivíduos, mas violência para a sociedade. Porque esses indivíduos vão retornar à sociedade. É isso que nós estamos contratando com essas propostas mirabolantes, demagógicas, do populismo penal, maximalistas, que estão correndo propondo a redução da idade de imputabilidade penal.
Bom, a solução seria justamente o contrário disso tudo. É dizer para o perpetrador do mais bárbaro dos crimes: eu não estou adjetivando o sujeito, estou adjetivando o seu ato, o mais bárbaro dos crimes perpetrados por um ser humano não condena esse ser humano a identificar-se com a natureza desse crime.
É possível para qualquer um começar de novo. É possível sempre esse tipo de oportunidade, que alguém se dar a si mesmo. Portanto, quando definimos, transferimos o adjetivo do ato para o sujeito, nós atribuímos à essência desse sujeito uma determinada natureza que é aquela do fato. E congelamos esse sujeito na imobilidade. Ele passa a ser petrificado, ele é apenas aquilo que ele fez.
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Não há alternativa para esse sujeito, para a sua reinvenção. Nós estamos destruindo a possibilidade de mudança.
Esta instituição, quando se define como lixo, depósito de seres humanos, que não são mais do lixo, e quando nós definimos esses seres humanos como monstruosos, estamos passando uma mensagem que está na contramão daquela que seria razoável: em vez de acolhermos, valorizarmos, reconhecermos esse ser humano que foi capaz de chegar a atos extremos, buscando reconhecimento e valorização, por mais paradoxal que seja, em vez de encontrarmos nesse ser humano, por baixo da brutalidade, a sua humanidade no sentido virtuoso e positivo, para estimulá-la, a partir daí - seria possível, quem sabe, uma reconstituição - não, nós condenamos esse ser humano a não ser mais do que ele foi naquele momento, a não ser mais do que aquele ato que ele perpetrou.
Eu não estou dizendo, então, que, diante de atos brutais, a sociedade tenha de ser acolhedora, afetuosa, generosa, carinhosa, abraçando aqueles que sejam capazes de atos dessa natureza. Não se trata disso. É preciso impor limites, mas sabemos como - nessa tensão entre a necessidade do reconhecimento e da valorização e a necessidade de impor limites e de responsabilizar - isso não pode excluir a dimensão, a valorização e o reconhecimento. A imposição de limites unilateral associada à brutalização nega a possibilidade de restabelecimento da comunicação, que estava presente naquele ato da violência. É claro que, quando esse indivíduo se converte num criminoso profissional, vai dilapidando toda essa disponibilidade interior e vai-se convertendo, mais e mais, num padrão, num estigma no qual ele começa a se reconhecer.
Vejam que a busca não é só reconhecimento e valorização; é de pertencimento, porque, ali, do outro lado, acolhendo esse jovem, está um grupo criminoso, um grupo criminoso que lhe oferece a possibilidade de se sentir importante, respeitável, mesmo que para práticas não respeitáveis.
Isso é mais valioso do que o bem material eventualmente subtraído, ainda que reconheça que isso joga um papel também. Vejam que a experiência de pertencimento é tão mais intensa e gratificante quanto mais coeso for grupo, e mais coeso será o grupo quanto mais esse grupo enfrentar rivalidades, disputas, competições, de forma mais agonística, mais violenta. Por isso, a guerra é a própria saída das ditaduras para promover coesões intranacionais.
Em casos extremos, quando há uma fragmentação interna, o último recurso de um ditador é declarar guerra a algum inimigo qualquer para promover a coesão interna. Nós sabemos que os grupos se fazem, se fortalecem na disputa, na concorrência, que pode ser fraternal, lúdica, como num jogo de futebol - nem sempre fraternal e lúdica, infelizmente -, ou pode ser violenta.
Os grupos do tráfico e os grupos criminosos vivem sempre em disputas, às vezes, armadas com grupos policiais e com grupos de criminosos. Isso torna esse grupo mais coeso. E essa coesão propicia, proporciona ao seu membro essa sensação de pertença mais gratificante, mais integradora. E mais: o tênis de marca e a camisa de marca são o fetiche, são o símbolo de pertencimento e, mais, de valor. O que está em jogo é a sedução das meninas, é sentir-se alvo do desejo das meninas ou do desejo alheio, não propriamente de conquistar, mas sentir-se com méritos suficientes para merecer mais que essa atenção, o desejo, esse encantamento. Isso é extraordinariamente gratificante. Se eu tivesse tempo, eu lhes relataria situações, e casos, e pesquisas de experiência. Não, não há tempo.
Então, concluindo, eu lhes diria: o que está em jogo é menos a economia, é menos a disputa material, menos essa carência, menos o jogo bruto da posse, e mais a disputa, esse itinerário, esse percurso de autoconstituição do ser humano, dessa pessoa, na sua singularidade.
Esses gritos de socorro se multiplicam, e essas mortes que vimos são gritos de socorro não ouvidos.
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São resultados da nossa incapacidade de entender a mensagem que recebemos dos jovens abandonados, excluídos e condenados à invisibilidade: os gritos de socorro, os pedidos de reconhecimento e de valorização. O que está em jogo, portanto, seria um pedido para que a sociedade, em vez de discutir formas de conduzir os seus espíritos às moendas das penitenciárias, os valorizasse e estendesse, com mais e mais ambição, com mais radicalidade, os princípios mais generosos do ECA.
Muito obrigado pela atenção. (Palmas.)
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Nós agradecemos imensamente as duas falas.
E eu queria aproveitar para ler algumas contribuições que chegaram até nós através do canal e-Cidadania, da audiência interativa.
Lahiri T. de A. Silva - lahiritrajano@hotmail.com -, da Bahia, diz: "Gostaria de saber qual seria o motivo da resistência de grupos da segurança pública em reconhecer a importância dos peritos papiloscopistas. Eles poderiam colaborar na identificação de muitos jovens desaparecidos em situações de crimes de Estado ou crimes organizados".
Ainda Lahiri T. diz: "Gostaria de contribuir com esta matéria que fala sobre a importância dos peritos técnicos (papiloscopista) em crimes desse tipo. http://www.correio24horas.com.br/detalhe/noticia/secretario-de-justica-alerta-jurandy-para-que-nao-ande-sozinho/?cHash=81e5f8335ae63f7aed610cebb5cc8557". Ela manda uma matéria.
Também ainda Lahiri: "Colaboração para a audiência com uma matéria sobre a importância da identificação, para evitar casos de desaparecimento de jovens: http://www.campograndenews.com.br/cidades/capital/delegado-diz-que-tudo-indica-que-corpo-em-canavial-e-de-marielly".
Ainda Lahiri: "Estruturar as polícias e desburocratizá-las, melhorando a qualificação, tirando os policiais de trabalhos cartoriais e administrativos, assim como investir em transparência das ações e na inteligência policial. Por que não se faz isso no Brasil?"
Lahiri é da Bahia e, acompanhando a nossa audiência, colocou quatro questões.
De cidadão via Alô Senado. Faisal Metne Junior, Rio de Janeiro. O cidadão afirma que os jovens de comunidades carentes, tanto o agressor quanto o agredido, são vítimas das circunstâncias do tráfico de drogas.
Jose Jeova dos Santos Jr, Rio Grande do Norte. "Sou oficial da PMRN. A minha pergunta é dirigida ao Dr. Soares: as polícias militares com seus valores (disciplina e hierarquia) não poderiam ser integradas em uma política preventiva de resgate de valores junto à juventude (exemplo: colégios militares, acampamento de instrução para jovens etc)?"
Ficam aqui as contribuições e as perguntas para que sejam respondidas pelos nossos debatedores.
Eu também queria fazer algumas perguntas para servir também ao relatório do nosso companheiro, Senador Lindbergh, que, tendo um compromisso neste momento, teve que se retirar e deixou algumas das contribuições daquilo que ele ver respondido.
Eu quero dirigir as questões aos dois. Como os senhores veem um futuro cenário brasileiro com encarceramento de jovens menores de 18 anos? Os senhores acreditam que a medida trará impactos nos índices da criminalidade? Quais seriam as consequências do encarceramento precoce desses indivíduos em processo de desenvolvimento biopsicológico?
Mais uma: que medidas efetivas devem e podem ser adotadas - esta para Luiz Eduardo - para afastar crianças e adolescentes da violência precoce?
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Também para o Dr. Luiz Eduardo: não raro os órgãos de segurança pública fazem uso de força letal contra os jovens em suas ações de policiamento. Contudo, justificam os homicídios praticados com base nos chamados autos de resistência.
Quais providências podem dar maior transparência às apurações e evitar esse tipo de conduta? O Projeto de Lei nº 4.471, de 2012, que tramita na Câmara dos Deputado, está pronto para votação em Plenário, cria regras vigorosas para apuração de mortes e lesões corporais decorrentes das ações de agentes do Estado. A medida é um caminho satisfatório no sentido de minorar esse tipo de ocorrência?
Para o Prof. Julio: o Mapa da Violência 2015 destaca que o Brasil possui vasto arsenal de armas de fogo, circunstância que estaria relacionada ao aumento da mortalidade de jovens. Como deveria ser uma política efetiva de desarmamento no País?
Acrescento mais uma pergunta. Considerando serem os jovens, para os dois expositores, as principais vítimas da violência no País, qual sua opinião a respeito da política de enfrentamento ao tráfico de drogas? Esta é uma estratégia fracassada? Qual seria a principal causa do assassinato de jovens no País? Há uma distinção entre estra causa, entre os Estados Federados?
Paro por aqui. Proponho no máximo de dez minutos para cada resposta. Por acaso, se for necessário, nós ampliamos tempo.
Quem quer começar? Sugestão, Jacobo, do Dr. Luiz Eduardo.
O SR. LUIZ EDUARDO SOARES - O professor depois fecha, não é? Está certo.
São muitas questões e muito difíceis. Eu vou começar pelo Sr. Jose Jeova dos Santos, que é oficial da Polícia Militar do Rio Grande do Norte. Eu fico muito feliz em saber que o senhor concorda com a ideia de que a prevenção é o melhor caminho e que as Polícias todas devem se orientar, sobretudo, na medida do possível, para a prevenção. As políticas públicas mais inteligentes são as que previnem, e eu fico muito feliz que o senhor tenha essa percepção.
Entretanto, eu não sei se as sugestões às quais o senhor alude seriam exatamente as mais adequadas, porque, muitas vezes, ainda que na experiência do senhor - e eu a respeito, evidentemente -, disciplina esteja associada ao culto aos valores, não necessariamente essa é a equação que se aplica de modo universal. Há outras formas de consolidação de valor, dos valores de respeito, de convívio, de compaixão, de solidariedade, de cooperação, respeito à liberdade e à diversidade. E nós podemos explorar essa pluralidade. Eu acho que as formas de educação podem se renovar, devem se renovar, e elas, eu creio que serão tão mais eficientes quanto mais ouvirmos os próprios jovens, levarmos em conta o seu imaginário, a sua sensibilidade e as suas experiências.
O Senador Lindbergh deixou várias questões, que são muito importantes e que são talvez maiores do que a possibilidade de resposta nesse nosso encontro. De toda maneira, eu faria algumas observações, reunindo as questões, o conjunto das perguntas e buscando alguns fios de articulação.
No Estado do Rio de Janeiro, de 2003 a 2014, houve 10.699 mortes provocadas por ações policiais - 10.699. Quando nós dizíamos que, no Brasil, há seis mortes provocadas por ação policial por dia, todos nos surpreendemos.
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Mas esse número, de alguma maneira, simbolicamente, parece pequeno. Na comunicação, o símbolo pesa. É melhor tomar um caso específico e projetar essa realidade, retrospectivamente, até o ano de 2003, por exemplo, para lhes dar a dimensão da magnitude do que estamos falando. Nós não estamos falando em desvios de conduta individuais, eventuais, casuais; nós estamos falando em um padrão institucionalizado. Por que institucionalizado? Porque se reitera, se reproduz de forma, inclusive, previsível. Podemos calcular os movimentos dos números, porque eles variam, se elevam, se reduzem, mas em uma magnitude espantosa: 10.699, Senador, entre 2013 e 2014.
Hoje, antes de vir para cá, recebi vários comunicados pelo celular, mas não tive possibilidade de obter esclarecimentos. Eu saí do Rio muito cedo. Amigos meus pedindo que eu já falasse sobre o caso do Rafael, supostamente assassinado pela polícia hoje, no Rio de Janeiro. Amigo de amigos meus, etc.; um rapaz morador de favela, trabalhador, entregador de pizza. Não tenho mais informações, mais elementos, não tive tempo para qualquer levantamento, mas é só uma nota. É uma nota pessoal, de um pequeno caso - pequeno, porém, incomensurável, porque é uma vida humana -, que nos assombra, que nos acompanha no dia a dia no Rio de Janeiro. Isso é uma tragédia, e é absolutamente inaceitável.
Morrem policiais também, em uma quantidade muito superior à da média dos países. Estamos, portanto, diante de um problema muito grave. São jovens também. Quem são esses policiais que matam e que morrem? Eles são irmãos, eles provém das mesmas áreas, dos mesmos territórios vulneráveis; frequentemente, têm a mesma cor. E aquilo que eu chamei de genocídio do jovem negro, nas favelas, nas periferias, chega a atingir, frequentemente, policiais também; trabalhadores, cidadãos policiais.
Uma procuradora do Estado do Rio de Janeiro, corajosa, audaciosa, propôs um TAC (Termo de Ajuste de Conduta) ao Governo do Estado do Rio, verificando que as condições de atuação dos policiais nas UPPs era inaceitável, era subumana. E o que estava sendo perpetrado era inaceitável, também, com a sociedade local. Isso não teve grande visibilidade. Nós precisamos discutir esse caso em detalhes, porque é exemplar e pode abrir caminhos para formas inovadoras de controle externo. Mas o fato é que essa procuradora narra a situação que encontrou nas UPPs depois de várias denúncias de policiais. Ela foi visitá-los e narra a situação usando os seguintes termos: "os policiais trabalhavam em situação análoga à da escravidão". Não é nenhum militante de movimentos radicais; é uma procuradora que examinou uma situação concreta. Essas situações absurdas envolviam desrespeito a tempo de trabalho, inclusive, considerando-se o tempo extra; condições sanitárias abjetas; de alimentação, precariíssimas; de treinamento de defesa; temperaturas desumanas; equipamentos que não funcionam. Isso tudo, submetidos à pressão do risco e à pressão psicológica que advém com a proximidade, a vizinhança do risco. Como solicitar desses policiais respeito aos direitos humanos se os seus próprios estão sendo violados sistematicamente?
E por que é que se aceita esse nível de exploração da força de trabalho? Por que é que um trabalhador convive, ainda que indignado, com essa situação? Porque é militar. Porque, se levantar a voz, denunciar essa situação e se recusar a cumprir mais uma jornada de trabalho, ele será preso sem direito a defesa, porque o regimento disciplinar assim determina. Portanto, a natureza militar da nossa instituição de policiamento ostensivo se converteu em um instrumento de superexploração da força de trabalho, que é um dos fatores conducentes à própria violência policial.
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Enfim, temos que refundar as nossas instituições, levando em conta múltiplos aspectos: as condições de trabalho, as condições organizacionais dos trabalhadores, cidadãos, policiais, e, por outro lado, a situação em que vivem as populações nos territórios mais vulneráveis, particularmente os jovens frequentemente estigmatizados e vítimas desse processo que é criminoso.
Uma coisa é falarmos do crime perpetrado por indivíduos. Isso é repulsivo e inaceitável; mas outra coisa ainda mais grave é falar do crime perpetrado pelo Estado sistematicamente como política. Não é uma política consciente, uma política explícita: "Vamos exterminar esse grupo social", mas é o que se depreende da análise histórica, da análise dos dados, é o que se depreende da leitura dos mapas aos quais se tem devotado a competência do Prof. Jacobo. Portanto, se o Senador me pergunta o que fazer, eu diria: temos de atuar, me parece, de forma muito, muito, profunda e intensa em duas áreas simultaneamente: refundando as instituições de segurança pública e arquitetura institucional da segurança pública da Justiça criminal. Aí uma adaptação à situação democrática, que exige muito investimento. Essa é uma política de longo prazo, que implicará a alteração do art. 144 da Constituição. Em algum momento temos que dar o primeiro passo...
(Soa a campainha.)
O SR. LUIZ EDUARDO SOARES - ... em termos de prosseguir, porque um passo, ainda que seja diminuto, é indispensável para que o caminho se realize e se cumpra.
Por outro lado, em iniciativas sociais que têm de partir de um espírito consensual que está muito distante de nós e cada vez mais distante para além de partidos, disputas ideológicas e eleitorais e de disputas políticas menores; um reconhecimento do conjunto dos atores políticos e sociais de que essa é uma tragédia que merece uma ação consensual convergente. Isso envolve a primeira infância, o fim da evasão, o controle severo da evasão escolar, um investimento profundo e sério nesse processo e, sobretudo, a percepção de que não é com a repressão que vamos vencer essa situação, mas é com uma disputa positiva, propositiva e construtiva.
Se os jovens, eu dizia, atendem ao chamado do recrutamento desses grupos criminosos, porque obtém, de lá, algum benefício, ainda que ela seja destrutivo e autodestrutivo, devemos entender essa dinâmica, compreender quais são esses benefícios subjetivos e objetivos e responder, oferecendo a esses jovens os mesmos benefícios e outros, com sentido invertido, positivo, construtivo.
Essa disputa é a disputa que nos conduzirá a um resultado positivo, como todas as boas experiências no Brasil e fora do Brasil têm demonstrado. E não é a invasão bélica, a destruição física, o aprisionamento que vai reproduzir a violência por meio da institucionalidade.
O Ministério Público tem, por papel constitucional, exercer o controle externo da atividade policial, e tenho certeza de que meus amigos do MP reconhecerão que isso tem sido feito de forma muito insuficiente, muito precária.
De modo que, se o MP assumir, abraçar essa causa, de fato, levando a sério e compreendendo que não basta buscar os desvios de conduta individuais, mas que é preciso reconhecer que há uma estrutura que se reproduz e que é preciso questioná-la; se o MP entender ainda que está na obrigação da sua instituição, obrigação constitucional, operar esse questionamento; se formos capazes de reinventar, como sociedade, com a participação dos policiais, todo esse setor de modo a atualizá-lo, modernizá-lo, torná-lo transparente, com controle externo e orientado para a garantia de direitos, para a vida, para o respeito aos direitos humanos; e também se interviermos socialmente nessas várias dimensões, num trabalho multissetorial, articulado, a partir de um grande pacto, para além dessas disputas ideológicas e políticas; se operarmos dessa forma, investirmos nesse mutirão pela civilidade, pela democracia, pela justiça, pela vida, tenho certeza de que avançaremos e que o próximo Mapa, um dia, algum mapa do Prof. Jacobo nos trará boas notícias.
Muito obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Obrigada.
Antes de o Dr. Jacobo fazer sua fala, vou destacar uma das inúmeras falas que vieram aqui, para que possa servir de referência também.
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José Maria Pereira da Nóbrega Júnior, da Paraíba. "Estudo o assunto e digo: Não é a exclusão social da jovens carentes negros que faz deles elementos vulneráveis da violência. Os dados fornecidos não correspondem ao lado de quem mata. Provavelmente, quem mata ou morre estão do mesmo lado social." Cidadão via Alô Senado.
A Secretária quer falar agora antes de... Estou abrindo um espaço para a Secretária da Secretaria Nacional de Direitos Humanos fazer uma rápida fala em função do horário.
A SRª ANGÉLICA MOURA GOULART (Fora do microfone.) - Deixe-o responder.
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Pois não.
O SR. JULIO JACOBO WAISELFISZ - Não vou dizer muito, os temas já foram mais ou menos abordados.
sobre a pergunta do Senador Lindbergh, se o encarceramento é uma solução. Penso que esse elemento não é solução de coisa alguma, é um problema que temos que enfrentar para solucionar alguns outros problemas.
Concretamente, ao discutir a maioridade penal, tenho certeza quase absoluta, baseada em números, em pesquisas, de que nosso índice de criminalidade e violência vai aumentar, longe de diminuir. Por que digo isso? Primeiro, pelo diferencial de reincidência que se sabe que existe entre os dois sistemas. Enquanto um sistema tem uma reincidência de 30%, outro sistema se calcula que tenha 70% de reincidência. Há um diferencial de 40%. Esses 40% vão resultar em que, no retorno à sociedade, a criminalidade e a violência aumentem. Isso, em primeiro lugar.
Em segundo lugar, o que está em discussão é, mais ou menos, o problema de não terminar nunca. Ou seja, baixa-se a 16 anos; proximamente, vai se baixar aos 14; vai se baixar aos 12, por quê? Porque vai continuar existindo violência nas diversas faixas etárias. Até que uma criança tenha que mostrar certidão de boa conduta ou que pertence a uma família de bem, terá que vir junto a uma certidão. A diminuição ou aumento de idade penal não vai solucionar os problemas de fundo, não vai solucionar os conflitos que existem, não vai solucionar o problema de nossa sociedade.
Com respeito à circulação das armas de fogo, sabemos que há a diminuição da circulação. A campanha do desarmamento foi eficiente, digamos, no primeiro período de sua promulgação e regulamentação por meados de 2004 até fins de 2005, quando houve o plebiscito nacional. Foram entregues, com contraprestação, financeira aproximadamente 480 mil armas em lapso de um ano e pouca coisa. Realmente, os dados comprovam eficientemente, sem nenhum tipo de questionamento, que há uma queda significativa no primeiro ano e no segundo ano do Estatuto do Desarmamento.
Depois do plebiscito, parece que terminou o desarmamento, terminaram as notícias, terminou todo o processo do Estatuto do Desarmamento. Só ficou a parte do estatuto e não ficou a parte do desarmamento. O registro, sim, implementou-se, mas o desarmamento acabou. Houve campanhas esporádicas posteriores de que em sete, oito anos de existência conseguiram retirar de circulação cento e poucas mil armas de fogo, praticamente meia arma de fogo por cada homicídio com arma de fogo. Nesse lapso de seis ou sete anos, houve mais ou menos 300 a 350 mil homicídios. Retiraram-se metade dos homicídios cometidos por arma de fogo. Sim, a eficiência foi extremamente baixa. Praticamente não houve campanha do desarmamento.
Então, temos neste momento, pelos estudos que se realizam por aí - são estimativas, ninguém sabe exatamente quantas armas existem em circulação -, aproximadamente de 15 a 16 milhões de armas em circulação, mais ou menos metade em mãos legais, metade em mãos ilegais.
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Nós fizemos uma pesquisa em escolas, e 37% dos alunos de 15 a 16 anos de idade sabiam onde conseguir uma arma de fogo. Eu não sei onde conseguir uma arma de fogo apesar de militar nessa área. Então, realmente arma de fogo é um instrumento de primeira necessidade neste campo.
Concordo com Eduardo quando diz o significado para um jovem da arma de fogo. Fizemos uma pesquisa no Distrito Federal - gangue, galera, rapa - e estávamos conversando com meninos sobre o que significava isso há 10, 12 anos. Eles chegaram à conclusão que revólver é instrumento de respeito. Chamaram isso de instrumento de respeito. Claro, esse jovem não pode ter respeito por educação, não pode respeito por grana, não pode ter respeito por posição social, então, vai ter respeito pela arma. O fundamental é o que você disse: "ser alguém". A arma converte o nada em alguém, o invisível em algo visível. Olha-se a arma e não o indivíduo que empunha a arma.
Então, poderíamos dizer, primeiro, que ninguém afirmou que retirar essa arma de fogo iria solucionar o problema do conflito, iria tornar o conflito menos letal. Arma de fogo não foi feito para limpar as unhas, não foi feita para coçar as costas; foi feita para matar. Quem usa a arma tem que estar disposto a matar ou estar disposto a morrer. Um dos dois vai morrer. Se empunha uma arma, ou mata ou morre. Um dos dois! Arma de fogo incentiva a letalidade.
A primeira coisa que fazem os capacetes azuis, quando chegam em uma situação como a fizeram os brasileiros quando chegaram no Haiti, foi desarmar a população. Podem se enfrentar, vão brigar, mas não vão matar. A intenção não era eliminar os homicídios, como se está colocando agora em alguma comissão; era tornar o homicídio menos letal. Isso se conseguiu. Temos uma situação de equilíbrio mais estável. Estamos numa taxa de 28, 29 homicídios em cem mil há mais ou menos 10 ou 12 anos; aumenta um pouco, desce um pouco. Conseguiu-se o objetivo de desarmamento que era tirar a letalidade.
A última. Enfrentamento do tráfico. Há uma visão muito, digamos, interesseira, de que o tráfico é responsável por praticamente tudo que existe de violência em nossa sociedade. Eu não digo que tráfico é pacífico, mas não explica toda a violência da nossa sociedade, nem sequer a maior parte da violência da nossa sociedade.
Em uma pesquisa do Conselho do Ministério Público, que fundamentou a campanha Conte até Dez, fizeram uma contagem de homicídios em 16 unidades federativas, homicídios por motivos fúteis e banais e homicídios profissionais. Chegaram à conclusão que em nove unidades federativas são homicídios culturais, em cinco prevalecem os homicídios que são profissionais da droga, tráfico, a minoria dos Estados. Não digo que não sejam violentos, porque temos que enfrentar outra realidade, que também é a cultura da violência que é o conflito do Brasil, conflitos no trânsito, conflitos entre vizinhos, conflitos entre parênteses, conflito entre casais se resolve via extermínio do elemento conflitivo. Essa é a nossa dura e crua realidade.
Então, temos, para fazer valer uma questão básica, que é o respeito à vida do próximo, um longo caminho para percorrer.
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Muito obrigada pela participação dos senhores, que certamente nos anima a continuar nossa tarefa, nossa investigação.
Vou passar a palavra, antes de terminar, para nossa Secretária Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente, da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.
A SRª ANGÉLICA MOURA GOULART - É um nome grande, não é?
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Muito maior que o orçamento.
A SRª ANGÉLICA MOURA GOULART - Isso a senhora conhece bem.
Boa noite, Senadora. Primeiramente, um agradecimento por essa iniciativa à senhora e ao Senador Lindbergh, porque nesse momento estratégico precisamos trazer, cada vez mais, luz para esse tema.
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A reflexão dos nossos dois grandes mestres, tanto o Professor Jacobo como o Prof. Luiz Eduardo, é fundamental para aprofundar, ampliar essa discussão.
Na verdade, nos últimos 90 dias, nós fomos praticamente sequestrados por esse tema. Nós não tivemos mais sossego desde que a PEC foi apresentada na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, para aprovar a sua admissibilidade. De lá para cá, nosso tempo é todo na ampliação do diálogo, tanto com os Parlamentares como com a sociedade de modo geral. Nós acreditamos que, nesses três meses, houve um aspecto positivo de essa pauta estar presente, que foi o aprofundamento dessa discussão em cada canto deste País. Todo movimento, especialmente movimento social ligado à criança e ao adolescente, à militância dessa área, está levando essa discussão, com a parceria de muitos outros movimentos sociais. Tanto é que, amanhã, acredito que chegarão caravanas do Brasil todo para acompanhar a votação da PEC 171. Há uma grande mobilização. Agora mesmo,em frente ao Congresso Nacional,os jovens estão acampados lá fazendo um sarau, fazendo uma vigília, com a perspectiva de, mais uma vez, numa última tentativa, alertar os Parlamentares, que amanhã tomarão essa importante decisão, da importância da responsabilidade de eles colocarem o voto deles favorável às PEC 171.
De fato, precisamos tratar dessa forma. Participamos de inúmeras audiências, de inúmeros debates, e nenhuma das razões favoráveis são razões pautadas em dados, numa linha conceitual de que essa decisão vai resolver o problema, ou da violência ou de da impunidade de que tanto se fala, que são dois grandes mitos que precisamos continuar discutindo para derrubar.
Neste último momento, esperamos que a PEC seja derrotada, com muita esperança de que todo esse esforço concentrado, nos últimos meses, tenha conseguido angariar os votos necessários para que ela seja rejeitada. Caso contrário, nós vamos precisar ainda mais desta Casa para ampliar essa discussão, essa reflexão. Mesmo que a PEC seja derrotada, nós ainda acreditamos que se abriu uma discussão em torno desse tema que precisa ser aprofundada, desde as razões que levam meninos e meninas a serem cooptados com tanta facilidade pelo crime - que eu não vou nem dizer que nem é organizado ou não - quanto é a possibilidade de qualificação do sistema socioeducativo e de um grande pacto nacional de enfrentamento aos homicídios todos, especialmente aos de adolescentes, que chegam a esses níveis que o Prof. Jacobo traz o tempo todo para a nossa discussão.
Nós temos muita esperança de que amanhã vençamos uma etapa. Mas, caso contrário, de qualquer forma, contamos com esta Casa aqui, para que possamos, de fato, avançar no amadurecimento do que é o sistema socioeducativo neste País, dos investimentos que a senhora sabe muito bem que ele precisa receber para a sua real qualificação. Os esforços todos só serão mesmo contemplados quando todos - Executivo, Legislativo, a sociedade de modo geral - entenderam o quanto precisamos investir no acolhimento e na possibilidade de reconstrução de um projeto de vida para esses jovens.
Desculpem que o tempo todo levantamos e saímos, mas estamos ainda nessa mobilização daqueles últimos minutos da votação. A senhora sabe muito bem, eu acho que os professores, pelas causas em que estão envolvidos nos últimos anos, também sabem que estamos no respiro final de conseguir que a PEC seja rejeitada.
Então, fica o agradecimento. De qualquer forma, nossa Secretaria, como responsável pela política - o professor já sabe -, está trabalhando em dois níveis. Um deles é a qualificação do Sinase e o outro é a construção de um pacto de enfrentamento ao homicídio de adolescentes, dentro do pacto nacional de enfrentamento de homicídios.
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E a gente gostaria de continuar contando com a participação e com a qualidade da discussão que vocês trazem nessa construção que está sob a nossa responsabilidade.
A SRª PRESIDENTE (Lídice da Mata. Bloco Socialismo e Democracia/PSB - BA) - Muito obrigada.
Quero, no entanto, antes de encerrar ler novas contribuições que chegaram via Alô Senado.
Carlos Arcene dos Santos, São Paulo: "Para aplicar a maioridade penal no País, o Governo deverá criar políticas públicas para auxiliar os jovens brasileiros, dando-lhes mais oportunidade de trabalho e educação, independente de sua cor ou raça".
João Batista Alves, Paraíba: "O genocídio de jovens de 16 a 19 anos não está ligado à ganância dos políticos por se manter no poder e também pelo aumento na corrupção?"
Vitor Vellozo dos Santos, Tocantins: "Que Brasil é este onde há uma desconstrução dos meios de coerção de práticas ilícitas, onde as vítimas são postas em segundo plano e há uma supervalorização do criminoso?"
Deusmar Vicente Vieira, Goiás. "Afirmo que o Governo deve criar vagas de emprego para os jovens, pois ele precisam ser ensinados a ter responsabilidade".
Finalmente, Átila Roque. "Assustador ouvir análises tão lúcidas e bem informadas sobre a tragédia que se abate sobre nossa juventude, e pensar que o risco que corremos é ver a demagogia populista prevalecer na Câmara dos Deputados na votação da PEC 171. Torço para o Senado não deixar isso ir adiante".
Eu também torço e acho uma coincidência, acima de tudo, infeliz a PEC ter a numeração 171. (Risos.)
Nada mais havendo a tratar, quero agradecer a presença de todos, convidando-os para a próxima reunião da Comissão a realizar-se na sexta-feira, pós 2 de julho. Dois de julho refere-se exata à data em que se consolida a independência do Brasil, na Bahia, após a guerra que se iniciou um ano antes, em 25 de junho de 1822, na cidade de Cachoeira, que vem a ser a minha cidade natal, quando as tropas portuguesas atiraram sobre a Câmara de Vereadores da cidade de Cachoeira, que reconhecia D. Pedro I como Príncipe Regente do Brasil.
Naquela oportunidade, os portugueses, que já conviviam com a independência decreta às margens do Ipiranga, tinham um segundo plano, que era conviver com as tropas e com a independência do Brasil no Sul e no Sudeste e fazer permanecer sob o domínio português todo o Norte e Nordeste brasileiro.
A luta pela independência do Brasil na Bahia foi uma luta armada, de enfrentamento e de formação de um exército nacional, o chamado de Exército dos Periquitos, que contou com a participação de índios, de negros libertos e também da elite branca brasileira. Ele contou com a participação de brasileiros de Minas Gerais, de Sergipe, de Alagoas, de Pernambuco, que formavam esse exército, que resistiu e veio finalmente a alcançar a vitória, invadindo e conquistando a cidade de Salvador, que, à época, estava dominada pelas tropas portuguesas, em 02 de julho de 1823.
Anualmente, acontece na Bahia um cortejo popular que revive toda essa história e que sai pelas ruas da cidade de Salvador, a partir justamente do local onde a batalha final aconteceu.
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É uma data magna para a Bahia e deveria ser um data magna para o Brasil, com o reconhecimento do 2 de julho como uma data de importância fundamental para a construção da unidade nacional e para a consolidação da independência no Brasil.
Os baianos e a nossa Bancada da Bahia, anualmente, marcam essa data no Senado Federal e temos a luta pelo reconhecimento dessa data nacionalmente. Infelizmente, ainda não conseguimos viabilizar nossa batalha legislativa, que, através de projeto de lei, retira o nome do aeroporto de Salvador, que, atualmente, se chama Luís Eduardo Magalhães, e, em substituição, a data de 2 de julho. Independentemente de reconhecer os méritos do Deputado Luís Eduardo Magalhães como Presidente da Câmara dos Deputados, como Deputado pela Bahia, uma data como essa tem uma importância muito maior do que a participação de qualquer que seja o cidadão, porque um cidadão não pode substituir a participação de tantos cidadãos que tornaram possível a soberania do Brasil.
Portanto, na sexta-feira, dia 3 de julho, a partir das 8h30, a CPI estará em audiência pública na Assembleia Legislativa de Roraima, na capital, Boa Vista, ouvindo os convidados que já foram mencionados nos Requerimentos nºs 16, 18 e 20, aprovados por esta Comissão. São autoridades locais e organizações não governamentais, que estaremos ouvindo acerca do tema que estamos investigando lá, que são mortes de jovens naquele Estado. A questão denunciada pelos Senadores que solicitaram esta audiência se dá justamente pelo crescimento da violência sobre a população de jovens, especialmente nas fronteiras daquele Estado.
Portanto, agradeço a participação de todos vocês e declaro encerrada a presente reunião.
(Iniciada às 19 horas e 46 minutos, a reunião é encerrada às 21 horas e 28 minutos.)