22/06/2015 - 20ª - Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação e Informática

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Boa tarde para cada uma e para cada um.
Declaro aberta a 20ª Reunião da Comissão de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura, que se realiza nesta data, 22 de junho de 2015.
Iniciando os trabalhos da reunião, informo que hoje realizaremos uma audiência pública em atendimento ao Requerimento nº 17, de 2015, de minha autoria e de outros Senadores, que se destina a tratar do tema "Marco Legal para o desenvolvimento de um Sistema Nacional do Conhecimento e Inovação no Brasil: Projetos em Andamento e Lacunas a Preencher." O propósito é tentar ajuda naquilo a que esta Comissão se propõe nesses dois anos.
Secretária, como podemos abrir a porta ao Brasil para o mundo da inovação? Há um mundo dinâmico de inovação lá fora, e estamos acanhados do lado de cá. É preciso abrir essa porta. É preciso abrir essa porta por meio do envolvimento do setor privado, do setor universitário, dos institutos tecnológicos e científicos e da própria educação de base, sem o que aqueles de que falei antes não funcionarão bem.
Então, nós sabemos, do ponto de vista genérico, abstrato, o que é preciso fazer, mas estamos procurando luzes para transformar essas ideias em projetos legislativos, projetos de leis do Senado, talvez até incentivando para que surjam projetos também na Câmara dos Deputados.
Para isso, convidamos personalidades como a Srª Emília Maria Silva Ribeiro Curi, Secretária Executiva do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, o Sr. Naomar Monteiro de Almeida Filho, Reitor da Universidade Federal do Sul da Bahia, o Sr. Rafael Lucchesi Ramacciotti, Diretor de Educação e Tecnologia da Confederação Nacional da Indústria, e o Sr. José Eduardo Krieger, Pró-Reitor de Pesquisa da Universidade de São Paulo.
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Esta reunião será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação da população. As pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania, ou do Alô Senado, pelo número 0800612211.
Vamos passar às exposições dos convidados e, ao final, as Srªs e os Srs. Senadores presentes poderão fazer uso da palavra.
Durante o curso da audiência, esta Presidência também poderá fazer intervenções, assim como apresentar os comentários e questionamentos enviados pelos cidadãos que assistem a esta reunião.
Cada expositor terá quantos minutos? Dez minutos? Quinze minutos?
A SRª EMÍLIA MARIA SILVA RIBEIRO CURI - Quantos forem determinados. Se deixar, eu falo aqui até...
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Vocês que dizem. Quinze minutos? Não se preocupem, que eu não vou cortar a palavra.
Nesse sentido, então, passo a palavra primeiro à Emília Maria Silva Ribeiro Curi, a quem agradeço muito pela presença, pois sei que ela tem muito trabalho no Ministério, e, ao mesmo tempo, peço que transmita ao Ministro Aldo os meus agradecimentos por haver liberado sua presença nesta audiência.
A SRª EMÍLIA MARIA SILVA RIBEIRO CURI - Obrigada, Presidente Cristovam, é com prazer que eu estou aqui.
Boa tarde a todos os meus colegas de Mesa.
Presidente Cristovam, quero deixar registrado que o Ministro Aldo gostaria de estar aqui, nesta audiência, mas, infelizmente, pela coincidência com a agenda da Presidência da República, ele não teve a oportunidade de estar presente.
É importante frisar que esta pauta é a pauta do ministério para o ano de 2015. O senhor acertou. A Comissão vai bem dentro do que nós estamos programando no nosso dia a dia.
A parte de inovação, desenvolvimento e conhecimento já foi contemplada na emenda constitucional que foi promulgada em fevereiro, aqui, no Congresso Nacional, com uma grande festa no plenário, onde nós tivemos a oportunidade de colocar alguns pontos importantes.
A comunidade científica e todo o setor produtivo do País receberam, com muito prazer, muita honra e muita alegria, a emenda constitucional, porque ela incluiu a palavra "inovação", porque o que mais buscamos hoje no País é inovar, tanto transversalmente, como verticalmente. A transversal é o grande objetivo. Queremos atingir a maior população possível com a criatividade que temos hoje, represada já há muitos anos, e a emenda constitucional veio nos favorecer.
Depois da aprovação dessa emenda constitucional, Presidente Cristovam e demais membros, nós já estamos revendo uma série de legislações, algumas dentro do próprio Ministério e outras em andamento aqui, no próprio Congresso Nacional. Essa revisão do marco legal no Ministério será constante de agora em diante, dada a iniciativa da emenda constitucional.
É importante frisar que uma parcela dessa revisão trata da questão da inovação para atingirmos um objetivo que nós ainda não conseguimos.
Presidente, esses dados são muito importantes porque são recentes.
Aqui está o valor de investimento do Governo e da empresa no nosso País com base em 2012, porque nós temos uma defasagem em campi que dá na questão do PIB, mas, se o senhor observar, o Estado e o empresariado vêm fazendo o seu papel com muita dificuldade. O nosso País ainda não tem a cultura de investimento do nosso empresariado em pesquisa, inovação. Investir em pesquisa e inovação ainda é muito difícil.
Então, esses dados do Ministério da Ciência e Tecnologia são de agora. Nós os compilamos e os colocamos hoje à disposição. É um dos dados da nossa página, que mostra que tanto o Governo Federal quanto os governos estaduais vêm investindo e que os recursos públicos são muito superiores em gastos para se atingirem objetivos de pesquisa, de P&D, e a empresa ainda não está engajada nesse porte.
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Dentre esses entraves, não só a emenda constitucional, Presidente Cristovam e demais membros, nós fizemos, a pedido do Ministro Aldo... Aliás, isso virou histórico: todos os Ministros da Ciência e Tecnologia que ingressam no Ministério ficam preocupados com os entraves legais, os marcos que estão impedindo de avançarmos.
Dado o assunto, o Ministro foi além e pediu a contribuição não só de instituições como a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência e a Academia Brasileira de Letras, mas também da CNI, da Fiocruz... Depois, nós pegamos os nossos órgãos internos do Ministério e fomos a outros Ministérios e fizemos um apurado enorme com relação aos entraves burocráticos e vimos que o regime jurídico de compra e contratação é um entrave grande.
Importação de insumo para a pesquisa é outro grande entrave grande. Hoje, uma empresa de grande porte, uma multinacional que quer trazer um equipamento para o País paga todos os impostos como se fosse uma empresa do setor produtivo. Isso não deveria acontecer. Mas também há uma série de discussões que o Ministro está promovendo agora com o Ministério da Fazenda.
Recursos humanos para ciência. A parte do conhecimento e recursos humanos também é um grande estrangulamento, é um fator de suma necessidade.
Vemos aí o setor de energia nuclear. Nós não temos mão de obra para o setor de energia nuclear e também não temos mão de obra para segurança cibernética. Estamos buscando essas mãos de obra fora do País.
E o acesso à biodiversidade. Recentemente, foi aprovada, pelo Congresso Nacional, a Lei da Biodiversidade - festejamos sua aprovação com muita alegria -, que trouxe várias formas de destravar processos de pesquisa que já vinham sendo reivindicados há muito tempo, Presidente.
Como falei, a Emenda à Constituição nº 85 promoveu um avanço gigantesco na área de ciência e tecnologia. A meu ver, este ano de 2015 é um renascer na área de ciência e tecnologia no País, porque o Congresso Nacional tem participado ativamente das reivindicações do setor e o setor tem participado ativamente dentro do Congresso Nacional. A Emenda foi aprovada de uma forma muito rápida e com um nível de discussão muito elevado.
A Lei de Inovação que temos hoje, a Lei nº 10.973, que é de 2004, está sendo atualizada pelo PL 2.177 que virá aqui ao Senado Federal, provavelmente a esta Comissão, e estamos trabalhando nessa legislação, Presidente, há muitos anos. É uma legislação que já vem sendo debatida na Câmara há bastante tempo. O Deputado Sibá apresentou o texto final na semana passada e ela contempla um pedido... O senhor, que foi acadêmico, que foi das universidades, e o nosso acadêmico e pesquisador que está aqui ao lado sabem da grande dificuldade para se fazer pesquisa e comprar insumos, comprar equipamentos e, ao mesmo tempo, fazer uma obra. A dificuldade está que na Lei de Licitação só é permitido comprar, sem a exigência de licitação, até R$8 mil. Isto há anos. E com R$8 mil não se faz pesquisa com facilidade. E há dificuldade do setor de fazer licitação... Isso é dispendioso. Às vezes, é preciso fazer licitação para comprar um equipamento que custa R$10 mil. Isso não está nos nossos planos de desenvolvimento, porque não é possível expandir com esses entraves.
O projeto de lei esta contemplando esse tema colocando um budget de R$300 mil para comprar insumos, produtos, reagentes, equipamentos, obras, o que facilita muito, muito, muito as universidades federais e as instituições de ensino, as Ifes. O projeto também tem outro destrave que o Ministério da Ciência e Tecnologia apoia que é a dedicação dos professores, a DE, a dedicação exclusiva dos professores universitários nas empresas privadas, para contarem mais horas. Isso também precisa ser revisto. O que nós temos hoje de professores universitários e pesquisadores... O nosso núcleo pensante está nas universidades. Não há que se procurar em outro lugar. É natural que qualquer empresa que tenha algum entrave, que necessite que se estude algum ponto procure a universidade. E, hoje, os professores, nas universidades, têm uma grande dificuldade na parte da legislação para atuar nas iniciativas privadas. Isso é comum no mundo inteiro. Aliás, faz parte do processo da inovação a participação do professor.
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Em São Paulo - não vou muito longe -, o professor se afasta por um período de tempo, ganha x de salário, volta e traz o conhecimento para a universidade. No Brasil, nós temos dificuldade com relação a esse aceite, mas o PL 2.177 está contemplando isso, e o Ministério apoia plenamente.
Já falei da lei de acesso ao patrimônio genético, que é a Lei de Biodiversidade, que foi aprovada e está destravando uma série de pesquisas que, antes, levavam muito tempo para serem aprovadas no Ministério. E nós também temos outras leis que são conhecidas de todos, como o FNDCT, a Lei do Bem, a Lei de Informática.
Nós também estamos mais dedicados à propriedade intelectual. Nós temos, no Congresso Nacional, alguns PLs em tramitação, que coloquei ali e que o Ministério vem acompanhando de perto. São projetos fragmentados, mas muito importantes também para o destrave no setor. Porém, é preciso melhor avaliá-los, melhor acompanhá-los no processo como um todo. Se pudéssemos debatê-los mais à frente neste plenário, nesta Comissão, isso seria muito importante para o País.
O que está sendo feito no Ministério é a atualização da parte de inovação, do termo de inovação que está na Constituição. Nós temos uma legislação para rever, a fim de fazer o nosso Sistema Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação para os próximos 20 anos. Há uma preocupação do Ministro Aldo em mandar esse projeto de lei para o Congresso Nacional o mais rápido possível, para que possamos ter uma perspectiva futura de inovação, e não um entrave, sem distorcer as situações que ficam estanques, porque a inovação, a pesquisa, a ciência é muito dinâmica. Ela não é fruto de uma situação estanque. Muito pelo contrário, ela é mutante. Por conta disso, nós temos o desafio de fazer essa norma geral dentro do Ministério, com um debate com a sociedade, é claro. Pretendemos abrir acesso a uma consulta pública dessa proposta de legislação para que todos participem. Ela é muito importante. Em breve, nós vamos debatê-la no Ministério.
Eu já havia falado do Marco Legal da Lei de Biodiversidade. A atualização da Lei de Inovação, que está no 2.177, para as indústrias, é muito importante.
Nós temos uma interação enorme com uma empresa, uma organização social criada pelo Ministério, que se chama Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial). Essa empresa tem 66 projetos pilotos já em andamento e faz contato com duas empresas, das quais participa injetando recursos.
Nós temos investimentos de 100 milhões, ainda neste ano, para gastar em inovação, e esses recursos contam com a participação da Finep. Os recursos da empresa também já estão dentro do nosso contrato de gestão e estão vinculados a um termo aditivo para este ano, somente este ano. Para o ano que vem, nós estamos discutindo, porque, no ano que vem, vai ocorrer a assinatura do contrato de gestão da empresa para os próximos cinco anos. Essa é uma empresa muito importante que só tem obtido sucesso na área de inovação com as empresas. Nós acreditamos que essa organização social vai nos auxiliar muito no encaminhamento da inovação dentro das empresas, além de nos ajudar a sair daquele foco baixo de investimento e inovação, pesquisa e desenvolvimento nas empresas. Ela está nos auxiliando. É uma consultora, um braço para que possa ser feita uma interação mais próxima.
Aqui estão algumas instituições que fazem parte, que estão em conjunto com ela, e que nós também vamos acompanhando no dia a dia.
A expansão das universidades federais também está prevista no Pró-Infra, um programa muito importante de infraestrutura para os processos de pesquisa. A evolução de 2002 para 2014 é considerável, e pretendemos fazer com que elas avancem. Mesmo com a crise que temos no País hoje, com a nossa situação econômica em fase de revisão e avaliação, acreditamos - este é o nosso pensamento, não é, Prof. Milioni? - que é com as crises que crescemos. É na crise que se cresce.
Se alguém vai aos Estados Unidos e visita a Califórnia, percebe que aquelas empresas, para chegarem aos monstros que são hoje, tiveram inúmeras falências e passaram por inúmeras dificuldades para se inovarem. E a inovação também vem da dificuldade. E dessas dificuldades que vamos ter agora para frente, de recursos, nós teremos a criatividade para crescermos mais na área de inovação. A ideia é de 63 - estamos com essa previsão -, mas vamos passar, para 2016 ou 2017, para muito mais do que isso. É uma prioridade do Ministério.
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Agora, dados que interessam ao nosso Cristovam, nosso educador.
A evolução dos programas de pós-graduação no País é considerável, a dedicação em recursos humanos, o programa Ciência sem Fronteiras e o interesse em fazer uma evolução de mestres e doutores na pós-graduação é enorme. Sabemos que ainda temos déficit de mão de obra nessa área de pós-graduação, que ainda há o que crescer, mas nossos números são consideráveis.
(Soa a campainha.)
A SRª EMÍLIA MARIA SILVA RIBEIRO CURI - A regulamentação... Como falei, vamos fazer uma audiência pública para que a sociedade participe.
Quero agradecer a oportunidade. Falei rapidamente. Daria para falar muito mais, dos polos tecnológicos, dos parques tecnológicos, mas ficamos voltados aqui para a questão legal, legislativa, porque o Congresso Nacional tem dado um suporte imenso, tem sido um local de debate muito importante para o Ministério, e pretendemos estar mais aqui.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu que agradeço. O tempo foi curto, mas, no final, vamos ter tempo para continuar esse debate.
Passo a palavra agora ao Sr. Naomar Monteiro de Almeida Filho, Reitor da Universidade Federal do Sul da Bahia.
O SR. NAOMAR MONTEIRO DE ALMEIDA FILHO - Boa tarde a todos e todas.
Eu queria agradecer ao Prof. Cristovam, parceiro, desde o começo, em uma experiência que está em andamento. Minha contribuição será justamente... Ao revisar o conceito do Sistema Nacional de Conhecimento e Inovação, apresentado neste pequeno documento, descobrimos, com satisfação, que, há bastante tempo, a gente já vem trilhando caminhos convergentes.
Tenho a satisfação de mostrar um experimento em progresso muito dentro da linha aqui incorporada: a Universidade Federal do Sul da Bahia, que tem como proposta enfrentar os quatro grandes desafios da universidade brasileira, que são desconstruir a educação como fator de exclusão social, superar conceitos elitistas de excelência e autonomia, que tanto têm prejudicado o avanço da inteligência nacional, integrar sistemicamente a universidade ao campo social da educação e recriar a universidade pública no protagonismo de novos modelos de desenvolvimento.
Evidentemente, os inspiradores são Paulo Freire, Milton Santos e Anísio Teixeira, que, há muitos anos, já desenhou essa universidade com esses temas ousadamente antecipados, mas, em especial, com a integração plena ao sistema de educação, que talvez seja a principal lacuna, que também é objeto desta nossa discussão hoje, em relação a conhecimento e inovação na sociedade brasileira.
Em se tratando de instituições interiorizadas, acrescem-se ainda alguns elementos de dificuldades. Um deles é o fracasso no sucesso: a exclusão de jovens do território onde uma instituição se instala pelo fato de ser excelente. Abundam exemplos de grandes iniciativas que trazem pouca contribuição para o território no entorno. Os grandes cursos em áreas tecnológicas que estão no interior do Brasil, pode-se procurar, não tem jovens do entorno. Nesse caso, o Plano Nacional de Educação tem metas muito claras que chamam a universidade para contribuir.
E toda a discussão em curso sobre a Pátria Educadora já define uma linha de ação: mudanças curriculares, educação em tempo integral e formação de professores tendo como foco, principalmente, o ensino médio, que é o grande gargalo na formação no Brasil. E, dentro desse gargalo, a questão da formação do docente. Aqui é o dado baiano, Estado brasileiro campeão na função docente sem licenciatura. Quer dizer, há uma proporção insuportável de docentes sem formação.
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Nossa universidade situa-se exatamente na parte média da costa brasileira.
Aqui é o mapa do Brasil numa perspectiva sul-sul, onde a costa brasileira tem uma enorme lacuna e onde havia uma lacuna bastante intensa na oferta de educação superior, zero vagas em educação superior até o ano passado.
A nossa base principal, a Reitoria, fica em Itabuna, temos campus em Porto Seguro e em Teixeira de Freitas, mas cobrimos todo um território de 48 Municípios, com 1,5 milhão de habitantes e meio milhão de jovens na população escolar.
Iniciamos a instituição discutindo valores, que são estes quatro, com especial destaque para compromisso com a educação básica. Isso faz parte de uma carta de fundação, um documento que as universidades brasileiras deveriam se esforçar para formular.
Nosso modelo é simples, de regime letivo quadrimestral, em vez do semestre ficção, que a maioria das universidades adota e que faz com que a instituição fique ociosa cinco meses e meio.
O modelo é de ciclos de formação, currículos modulares e flexíveis. Vou mostrar o exemplo de cobertura territorial num modelo já consagrado em muitas partes do mundo, em especial naqueles locais que tem alta concentração de produção científica e tecnológica, uma estrutura organizacional superleve e a distribuição geográfica no território das unidades.
O modelo de ciclos de formação é por bacharelados e licenciaturas interdisciplinares já adotados por 18 universidades brasileiras, com pioneirismo na Federal do ABC. A nossa universidade oferece esse modelo em uma expansão para as licenciaturas e os bacharelados.
O modelo é simples: um primeiro ciclo, de três anos, onde os jovens podem escolher bacharelados já definidos por grandes áreas ou uma área básica de ingresso, e a escolha pode ser feita em seguida, promovendo-se uma permeabilidade entre os cursos de primeiro ciclo.
Esses cursos são oferecidos em colégios universitários, numa rede municipalizada, ou, então, nos três campi, sendo que o segundo ciclo, a formação profissional, e o terceiro ciclo completam esta formação, só que se dá ao jovem o poder da escolha. Essas unidades centralizadas estão sendo implantadas em Municípios com mais de 20 mil habitantes, mais de 300 egressos do ensino médio público, em periferia urbana, quilombos, assentamentos, aldeias indígenas, usando tecnologia: uma rede digital com programas metapresenciais de formação geral.
A estrutura geral é uma rede de colégios universitários, coordenada por um instituto de humanidades, artes e ciências - implantamos três -, como passagem para centros de formação específica.
Essa é a nossa estrutura. São seis centros de formação, em três campi, e 36 colégios universitários como projeto. O acesso é pelo Enem, todos. Com relação a cotas, conseguimos ler a legislação que diz que é um mínimo de 50% para alunos de escola pública, praticamos acima deste mínimo nas sedes, e 85% nos Municípios, sendo que a entrada para o segundo ciclo também se dá sob a forma de convênios com universidades com estrutura similar à daquelas 18 instituições que trabalhamos.
Assim, os alunos têm certificação intermediária de formação geral universitária, diploma de bacharelado e licenciatura e passam a cursos de segundo ciclo com uma incentivada mobilidade entre esses cursos, de modo que é possível termos uma formação de professores no primeiro ciclo, aplicando as quatro áreas do Enem e acrescentando-se artes e suas tecnologias e algumas inovações na pós-graduação, em especial a residência pedagógica, que faz parte de todo um leque de residências em todas as áreas: residência empresarial, ambiental, rural, até de residência médica.
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Modelo pedagógico baseado em equipes docentes, aprendizagem ativa, baseada em problemas e em projetos, e um sistema de tutorias.
E aqui está o perfil do egresso das licenciaturas interdisciplinares.
Não é possível o Brasil avançar formando de modo disciplinar e fragmentado os docentes que vão compor os quadros científicos, técnicos e artísticos do futuro.
Essa é a estrutura simples e direta da formação geral, com muita escolha, de modo que o aluno pode entrar com a intenção e descobre sua vocação, inclusive a vocação na educação.
O sistema de aprendizagem compartilhada em equipes de aprendizagem com residentes supervisionados por tutores, e a universidade destina, dos seus quadros, a orientação e a coordenação de práticas pedagógicas, levando a sério aquela ideia de que educar é uma gestão dos processos de ensino e aprendizagem.
A carga horária é a mais leve possível, com modelos modulares, grandes blocos, formas mais integradas e mais holísticas de definição.
No momento, estamos com 1.610 alunos, começamos em setembro do ano passado. A previsão para este ano, se os cortes e contingenciamentos não nos abaterem, é de 2.160 alunos, com 163 professores já trabalhando. E notem a proporção: se completamos as 90 vagas do concurso, teremos duzentos e poucos professores para 2.160 alunos ingressantes. É a razão aluno/professor mais elevada de todas as instituições públicas ou privadas nesse formato. E um detalhe: 100% de doutores neste momento. Nós e a Federal do ABC somos as únicas universidades do plano federal que têm essa proporção de doutores. As estaduais paulistas não contam, porque já fizeram esse dever de casa há 15 anos.
A estrutura organizacional é supersimples. São quatro pró-reitorias, contrastando com as até 12 ou 13 de outras instituições, uma pró-reitoria de TI e uma de sustentabilidade, um conselho estratégico social, que participa inclusive da eleição de reitor.
Aqui é o Conselho atuando.
Nós usamos a telepresença o máximo possível. Os conselhos trabalham em todos os campi. Temos uma redefinição, em estatuto, de um quadro complementar, de modo que nós credenciamos professores para o ensino de graduação, inclusive mestres de artes, saberes e ofícios, que não são somente os tradicionais, mas também os tecnológicos.
Esse senhor sabe fazer barcos. Engenheiros navais não conseguem fazer barcos.
Uma mestra oleira.
Os alunos participam intensamente dos trabalhos.
Nossa Reitoria, em Itabuna.
Reciclamos um centro de treinamento.
Este é o nosso campus em Porto Seguro.
Aqui, em Teixeira de Freitas.
O investimento em tecnologia chega a ponto de aplicarmos um computador por aluno. Todos os alunos são fieis depositários de notebook.
Este é o Colégio Universitário de Ibicaraí.
Este é o de Coaraci.
De Itamaraju.
De Teixeira de Freitas.
De Cabrália.
De Porto Seguro.
E temos, em Teixeira de Freitas e em Itabuna, mais especialmente em Porto Seguro, um fenômeno. Este é o contingente de alunos que querem ser professores. Uma manchete da região. Os estudantes aprovam muito esse modelo.
E, finalmente, nós estamos avançando para um programa interdisciplinar de formação de professores, transformando todas as escolas de ensino médio onde os nossos colégios universitários estão instalados em centros de ensino médio integral, com centros noturnos de educação e programas de formação docente continuada, simplesmente habilitando as escolas como campos de prática para a pesquisa educacional e à formação docente. Aí, a universidade assume a gestão pedagógica e a Secretaria Estadual de Educação mantém a gestão administrativa.
Esses são os seis colégios universitários em processo de adesão. E neste momento estamos implantando o Pibid.
Aqui, só para dar uma ideia aos senhores, seis docentes no quadro central de formação, seis coordenadores de práticas pedagógicas seis e doze no quadro de componentes curriculares. Isso implica que, com apenas 24 professores, nós vamos atingir 4.714 alunos da rede média de educação.
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O projeto para o ano 2020 é de conclusão da etapa de implantação, cobrindo todos os 36 colégios universitários em 29 localidades, com 28 mil alunos.
Este é o mapa da região, com os institutos de humanidades, artes e ciências localizados nos três campi. Os colégios universitários estão aqui em amarelo, previstos, mas já foram implantados em 2015 esses em vermelho, sendo que seis deles já aderiram ao processo de se tornarem centros de educação integral, nesse caso, sob a gestão da universidade.
(Soa a campainha.)
O SR. NAOMAR MONTEIRO DE ALMEIDA FILHO - Eu agradeço a oportunidade de apresentar o modelo aos senhores e às senhoras presentes.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Eu agradeço a pontualidade do professor, que fez o sino tocar.
Eu passo a palavra agora ao Rafael Lucchesi Ramacciotti.
O SR. RAFAEL LUCCHESI RAMACCIOTTI - Obrigado, Senador. Obrigado pelo convite e pelo trabalho que o senhor, um entusiasta dessa agenda, tão bem lidera nessa área.
Eu também quero fazer referência aos colegas de Mesa que me precederam, por suas excelentes apresentações, aos colegas de Mesa, aos senhores e às senhoras.
Indo direto ao ponto, até por haver muito a falar em pouco tempo, na agenda de inovação, o locus principal da inovação é sempre as empresas - isso é um consenso na literatura -, mas a inovação é um processo complexo e envolve um ambiente externo à empresa, todo um ecossistema de conhecimento que envolve as universidades, os laboratórios, os centros de P&D, e tudo isso é decisivo.
No Brasil, há um grande problema. O nosso cenário econômico hoje é desafiador. Nos anos 80, a indústria brasileira era responsável por metade do PIB, e hoje o é por um quarto do nosso PIB, e a indústria de transformação é responsável por 13%. A indústria tem declinado. Tem havido uma tendência de retração.
E há uma diferença. Os Estados Unidos têm se desindustrializado, mas ele mantém marcas, mantém uma enorme liderança nas fronteiras técnicas. Quando ele deixa de industrializar a Barbie nos Estados Unidos, com uma Barbie a US$20, US$19,50 continuam nos Estados Unidos, saindo apenas US$0,50. No nosso caso, nós fomos inteiramente removidos das cadeias em que deixamos de atuar.
O Brasil está perdendo competitividade. Nós ocupamos, hoje, a 57ª posição. Quando se decompõe isso, vemos uma série de elementos, mas estamos perdendo competitividade relativa. Os países ricos têm investido mais em inovação, têm investido mais em ativos intangíveis, como conhecimento, e nós estamos ficando para trás, investindo menos em capital humano, o que, na sociedade do conhecimento, é decisivo.
Nós estamos tendo uma série de problemas na nossa balança comercial. Até 2005, mais ou menos, a nossa balança comercial era superavitária - tinha um superávit na faixa de US$5 bilhões/ano - e deve fechar este ano com mais de US$120 bilhões em déficit na balança comercial de produtos industriais e, mais intensamente, na área de média e alta tecnologias, exatamente função e expressão do custo Brasil e das dificuldades competitivas.
Temos embalado sol e água na forma de soja, minérios e outras commodities. E sabemos que isso não vai sustentar um país, não vai sustentar uma moderna economia de serviços, até porque esse processo de retração de nossa matriz industrial vai expor muito mais o Brasil aos ciclos econômicos internacionais.
Precisamos avançar na agenda de inovação.
Essa lâmina aqui e a seguinte, Emília, meio que desmontam essa construção, indo mais a fundo e qualificando melhor o debate. Durante muito tempo, eu ouvia o Ministro Sérgio Rezende usar uma expressão que eu acho que não expressa adequadamente. O setor público faz a sua parte, e as empresas brasileiras têm de fazer mais, porque, para fazer face ao dispêndio do setor público, quando examinamos mais profundamente, sofisticando mais o processo, nós vamos ver que nossa agenda está nesse quadrante aqui, que é liderado pelo dispêndio na universidade e também pelo sistema de inovação orientado para a pesquisa pública. Os países desenvolvidos têm uma liderança maior nas instituições de ciência e tecnologia e com foco na lógica empresarial.
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Em outras palavras, o que acontece é o seguinte: quando você encaixa bem a estrutura de dispêndio público, ela alavanca muito mais o dispêndio privado. E nós ainda temos uma distância, temos um dever de casa para fazer nessa direção.
Há avanços inegáveis - eu vou falar disso -, há uma construção em processo - a MEI é um processo importante -, e temos um enorme dever de casa também para o setor empresarial.
Então, poderíamos dizer que fica mais razoável descrever o nosso Sistema Nacional de Inovação com um duplo problema: temos um problema de oferta e um problema de demanda. Temos um problema de oferta por causa da natureza dos instrumentos de política pública, que são muito burocratizados, muito distantes do mundo empresarial, muito focados na lógica acadêmica. E temos, ainda, um problema de intensidade das estratégias empresariais, que ainda são insuficientes do ponto de vista de maior densidade de dispêndio na área de inovação. E os dados refletem isso de maneira inequívoca.
Vemos aí o Japão, a Coreia, a China, a Alemanha e os Estados Unidos, que estão exatamente naquele quadrante mais moderno que consegue alavancar de maneira mais clara o dispêndio público com um dispêndio privado muito maior. Isso vai assegurar a participação de empresas nas cadeias globais de valor e construção de marca, liderando o comércio internacional e conseguindo, inclusive, maior alavancagem no Sistema Nacional de Inovação, estabelecendo uma rede cooperativa sistêmica entre esses atores, o que vai gerar um círculo virtuoso de desenvolvimento econômico e social para este País.
Inovar é, certamente, uma agenda central no Brasil. Se nós olharmos todas as principais agendas, nós não vamos conseguir avançar rapidamente na agenda macroeconômica. O tripé vai continuar existindo, as relações de trabalho não vão ter tanta velocidade... A agenda educacional está avançando, mas está avançando lentamente - isso é geracional.
Quanto à infraestrutura, temos modernizado o marco legal, há uma nova postura do Governo, mas esse processo ainda será muito lento. Onde podemos fazer a diferença rapidamente é na inovação. Por isso, nós defendemos inclusive que se dê maior carga ao orçamento de ministérios, como o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, que haja uma relação mais seletiva no equilíbrio fiscal, algo importante para toda a sociedade, mas entendendo a importância dessa agenda.
Há avanços claros, como a criação dos fundos setoriais, os esforços de conexão de uma política industrial, que é algo importante, afirmativo, dessa agenda, a Lei de Inovação, que agora está sendo revista e modernizada, a Lei do Bem, instrumentos fiscais automáticos, as várias etapas do processo da nossa política industrial, o Plano Inova Empresa, com volume de recursos significativo, o advento da Embrapii, que tem um elemento extremamente importante, porque sai da lógica "ofertista" e vai para a lógica de demanda, tem uma via rápida, o modelo fast track, com elevada alavancagem de dispêndio privado... E a experiência da Embrapii - a Secretária Executiva falou muito bem sobre isso - tem sido muito exitosa, muito bem liderada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Nós avançamos no nosso Sistema de Inovação. Há um número maior de empresas. Ou seja, as estratégias estão convergindo, há um esforço de modernização da agenda de políticas públicas e de resposta empresarial. Só que ele ainda é absolutamente insuficiente para as necessidades de conexão disso com um sistema de desenvolvimento econômico, um círculo virtuoso que poderíamos implementar, estabelecendo, claro, o diálogo de que temos um duplo problema de oferta e demanda dentro desse sistema.
Mas temos que registrar que hoje nós temos 64% ou mais no número de empresas, na sua grande maioria empresas industriais, e que nós temos um número que hoje é 200% maior em empresas que têm, efetivamente, o apoio de instrumentos de política pública, e isso é relevante. Estamos crescendo. As pessoas de P&D, a comunidade de P&D que está nas empresas e no sistema público mais que dobrou. Isto é algo importante a se registrar. Nós temos de avançar no Brasil, que tem de saltar na agenda de inovação, como eu falei há pouco.
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Vou falar um pouco do que nós temos feito.
A CNI tem um mapa estratégico que tem como elemento fundamental a educação. Em uma pesquisa que nós fizemos, as principais lideranças empresariais brasileiras apontaram a educação como pilar fundamental. A agenda para a competitividade é centrada em inovação e produtividade. Então, achamos aqui... Neste score board nós temos essa estrutura de causalidade baseada na educação, buscando a competitividade por meio da inovação tecnológica.
A mobilização empresarial pela inovação pode ser descrita como a mais bem sucedida plataforma de cooperação público e privada. Nós temos aí mais de 100 lideranças empresariais. As principais lideranças empresariais sentam-se à mesa com o Ministro da Ciência e Tecnologia, o Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, o Ministro da Educação e com outras áreas públicas necessárias em suas agendas para avançar no marco legal, aumentar a competitividade empresarial por meio da inovação, desenvolver a proposta de expandir o financiamento privado e público à inovação e aperfeiçoar o quadro legal e desenvolver uma cultura de inovação no País, à semelhança das iniciativas nacionais de inovação que acontecem nos Estados Unidos, Inglaterra e nos países desenvolvidos.
Há um planejamento estratégico com toda relação de causa e efeito. Há prioridade da agenda da MEI, que vai desde a modernização do marco legal, aperfeiçoamento do sistema financeiro, projetos estruturantes, entre outros. Isso é todo um quadrante e muito mais do que o que ora apresento no PowerPoint. Essas propostas se materializam no Word, sem fazer aqui uma propaganda, mas em um editor de texto, vamos dizer assim, colocando, claramente, a que tipo de legislação seja ela legal ou com base em portaria, ou seja, infralegal, para fazer avançar nossa agenda, bem como a constituição de uma plataforma privada de mobilização empresarial, como nós fizemos, nos anos 90, na Agenda de Qualidade e Produtividade para o País. Há um conjunto de conteúdo, hoje, disponível às empresas e a quem esteja participando.
No Senai, estamos avançando muito. O Senai é um dos maiores sistemas de educação profissional do mundo e o maior do Brasil e da América Latina. Nós temos esse nível de capilaridade. Hoje, há, no Brasil, estudantes matriculados em 2.600 Municípios do Brasil fazendo cursos de educação profissional no Senai. Atuamos em todos os setores. Fechamos 2014 com quase quatro milhões de matrículas. Somos o principal parceiro do maior programa de educação profissional da história deste País, o Pronatec, algo decisivo para mudar a matriz educacional brasileira, e estamos avançando na criação de 62 Institutos Senai de Inovação do Senai. Se o Senai foi uma organização decisiva para o Brasil fazer a revolução industrial que fez na segunda metade do século XX, com a intensidade com que a fez, nós estamos nos colocando - já somos - como a maior instituição de apoio a serviço tecnológico da indústria, com a constituição desses 61 Institutos Senai de Inovação do Senai, com abordagem setorial distribuída regionalmente com aderência à distribuição do tecido industrial, inclusive pelas especialidades a que eles atendem. Os institutos de tecnologia são setoriais e os institutos de inovação...
O Senai é uma instituição com DNA alemão, pois ele se constituiu, em 1942, fundado nas séries metódicas. Se a USP nasceu com a atração de uma plêiade de intelectuais franceses para montá-lo, o Senai nasceu com a atração de her professors alemães e suíços, trazendo as sedes metódicas para o Brasil. Mas, novamente, nossos modelos inspiradores, que são os parceiros na montagem dessa estrutura, são o Instituto Frau Wolf e o MIT. O MIT nasceu em Boston como o Senai. Era um instituto voltado para a educação profissional em mecanização agrícola e hoje é o que é. E nós, nos Institutos Senai de Inovação, temos 26 principais tecnologias transversais, que vão desde a automação e a manufatura até a tecnologia a laser ou micromanufatura, distribuídas também nas principais tecnologias demandadas pelo tecido industrial brasileiro.
Temos, para finalizar, um conjunto de propostas voltadas para a construção do Sistema Nacional de Inovação que vão desde a participação maior do setor industrial nas propostas desta Comissão de avaliar o nosso sistema educacional, bem com a participação do Senai na agenda de conhecimento, na criação dos institutos dessa área, melhorar a qualidade e aumentar as vagas dos cursos de Engenharia. Temos todo um conjunto de agendas voltado para o aprofundamento e o aperfeiçoamento dos cursos de Engenharia.
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A CNI e a MEI têm defendido equalizar o tratamento das ICTs e das empresas na agenda brasileira, dar preferência para os produtos das empresas que investem em PD&I, maior flexibilidade, mais segurança jurídica para o incentivo, permitir que os professores das universidades - a Emília falou muito bem - tenham uma atuação mais forte na agenda de inovação... O locus da inovação é a empresa, mas, certamente, a forma como nós restringimos isso é prejudicial.
(Soa a campainha.)
O SR. RAFAEL LUCCHESI RAMACCIOTTI - Política Nacional de Nanotecnologia. Temos que aperfeiçoar o marco em discussão no Congresso.
Com isso, termino a minha apresentação, respeitando o tempo, como os anteriores.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Estou impressionado com a pontualidade de todos até aqui!
Eu passo a palavra agora ao Sr. José Eduardo Krieger, Pró-Reitor de Pesquisa da Universidade de São Paulo, dizendo que não se preocupe em cumprir o tempo. Aproveite que os outros cumpriram para falar um pouco mais, se quiser. (Risos.)
O SR. JOSÉ EDUARDO KRIEGER - Boa tarde a todos.
Primeiro, eu gostaria de agradecer ao Prof. Cristovam Buarque e cumprimentá-lo pela iniciativa.
É um prazer estar aqui com todos vocês da Mesa.
O ingrediente - eu vou procurar trazer alguns elementos para a nossa discussão - diz respeito a um dos papéis da universidade na formação de recursos nesse sistema.
Então, tradicionalmente, as nossas universidades foram bastante influenciadas pelo modelo humboldtiano, em que a integração das artes e ciência com a pesquisa é o principal vetor para se atingir um conhecimento amplo e profundo.
Agora, o que caracteriza o quadro brasileiro de ensino superior? Eu acho que é um sistema complexo e heterogêneo. É complexo porque nós somos 200 milhões de habitantes, temos cerca de 7,3 milhões de alunos na educação superior, formam-se cerca de um milhão de alunos por ano - queremos atingir, a curto prazo, 1,5 milhão por ano -, existem mais de duas mil instituições de ensino superior, sendo que 195 são universidades, de tal sorte que nós assistimos ao significante crescimento de, mais ou menos, 25 vezes esse sistema nos últimos 50 anos.
Por um lado, isso é um crescimento espetacular; por outro, é insuficiente. Um dos elementos para dizer que ele é insuficiente, conforme já foi mencionado aqui, é que há um déficit, não só de formação de profissionais... Nós temos só cerca de 15% dos nossos jovens de 18 a 25 anos na universidade, no ensino superior, versus cerca de 80% nos países da OCDE.
Essa expansão significativa do sistema não é particular do Brasil, mas aconteceu também com os nossos parceiros da América Latina, com expansão no acesso a universidades na Argentina, no Chile e no México, que aumentaram entre 220% e 470% o número de matriculados entre os anos 70 e 90, ainda que existam diferentes regras de entrada nesses diversos países. Por exemplo, nós temos, aqui, o vestibular, mas na Argentina e no México todos eles entram e, depois, quando você vai afunilando , vão saindo do sistema.
A expansão do Brasil, entretanto, a mais recente, é, predominantemente, feita pelo crescimento do segmento privado, que visa lucro - seria o private for-profit -, que representa, hoje, cerca de 75% dos alunos, uma frontal diferença em relação ao sistema americano, onde cerca de 75% do ensino superior é público. Os indicadores, entretanto, mostram que os alunos formados nesse sistema privado têm desempenho inferior àqueles formados no sistema público, isto com base em resultados dos exames da OAB e, mais recentemente, da área médica.
Esse sistema, além de complexo, é bastante heterogêneo, e esse é um ponto a se levar em consideração nas proposições futuras. Se nós considerarmos que, entre as quase 200 universidades, a USP, sozinha, é responsável por quase 23% de toda a produção científica em revistas especializadas e forma cerca de 22% de todos os doutores, é um número anacrônico. Isso não pode acontecer num país de dimensões quase continentais, com 200 milhões de habitantes. Essa é uma fonte de preocupação.
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Por um lado, gestores da Universidade de São Paulo poderiam se sentir honrados, mas esse é um quadro que não faz sentido nenhum. Ele está mudando, mas precisa mudar numa velocidade mais rápida para que tenhamos sucesso no País.
Frente a essas características, os desafios da educação superior no Brasil representam um enorme dilema. Como vamos garantir a expansão e o acesso, que ainda são necessários, com a necessidade de começarmos a focar no aumento, na qualidade e na relevância das nossas instituições? Esse é o grande dilema. De maneira geral, para atacarmos qualquer um desses problemas, precisamos ser focados, precisamos dirigir recursos e temos que fazer as duas coisas. Então, o sistema ainda requer expansão tanto em números como em entrada de pessoas, mas, por outro lado, o nosso grande desafio hoje é com a qualidade, com, mais ainda, a relevância do que é produzido nas universidades e a relação das universidades com a sociedade em geral, o setor público e o setor privado.
Isso requer um sistema integrado e hierarquizado de educação superior, amplo e diversificado. Esse é o grande desafio que temos. Espero que o Congresso, especialmente esta Comissão, possa trazer esses elementos e, principalmente, oportunidades de soluções para esse problema.
Tivemos, recentemente, o lançamento da Carta Universitária do Rio, que aconteceu no ano passado, em 2014. Mais de mil reitores e presidentes de universidades se reuniram. Evidentemente, alguns pontos são convergentes, não são problemas exclusivos do Brasil, mas especialmente dos países ibero-americanos. Quer dizer, ênfase em aumentar a responsabilidade social e o contato com a sociedade das universidades, engajamento na melhora da qualidade de vida da população, no desenvolvimento sustentável, igualdade de sexo e o acesso de crianças oriundas de famílias de baixa renda ao ensino superior.
Esses são alguns dos elementos comuns fundamentais, especialmente na nossa realidade. Isso exige a transformação, Portanto, devemos cumprimentar a ação do Senador Professor Cristovam, nosso colega, desta Comissão e, consequentemente, do Senado.
Quer dizer, há necessidade de uma reforma da governança: padrões de qualidade de ensino, diversificação nas fontes de financiamento das nossas universidades, massiva incorporação de tecnologia da informação nas atividades-meio e fim da universidade - não é só na gestão que hoje temos, mas, fundamentalmente, na atividade-fim -, na pesquisa, que é facilmente reconhecida, e, principalmente, na revolução da maneira de ensinar, de proporcionar o ensino continuado aos seus egressos, elemento fundamental para qualquer sociedade que almeja entrar e se manter na chamada era do conhecimento, na sociedade do conhecimento, para ser competitiva nesse setor. Isso é uma exigência. Temos que procurar a forma de transformar as nossas universidades.
Quais os elementos fundamentais a serem incorporados às nossas instituições? Essa questão das novas tecnologias da informação e a internet, especialmente no quesito de novas formas de ensino, tantos os presenciais como à distância, é fundamental, e não só para o aluno que está hoje ligado á universidade, mas também para o egresso. A educação continuada é um elemento fundamental. Quer dizer, o trabalho da universidade não para quando se dá um diploma a alguém. Muito pelo contrário, precisamos de uma regulamentação que exija daquele egresso portador de um diploma que, para que continue sendo portador desse diploma, ele tenha que passar pela chamada educação continuada. E é um grande desafio para as nossas universidades, para as nossas instituições garantir meios para que isso possa acontecer e ter, consequentemente, uma regulação que exija que isso aconteça.
O segundo aspecto é a construção de um sistema integrado e hierarquizado de educação superior, amplo e diversificado.
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Este, talvez, seja o ponto fundamental que eu gostaria de trazer para discussão com vocês: um sistema que seja flexível e que inclua diversidade de modelos complementares e necessários para satisfazer as necessidades da sociedade no ensino, na pesquisa e, fundamentalmente, na chamada terceira missão. Intensificar as relações com a sociedade. Isso está na ordem do dia, ou seja, a ideia da torre de marfim acabou. Nós, hoje, conforme a apresentação do Prof. Naomar, estamos derrubando, inclusive, muros de departamentos, muros de unidades, para que possamos executar essas ações que a universidade requer, de maneira nova, aproveitando novas tecnologias, para nos integrar a esse novo mundo.
Isso pressupõe, primeiro, um pequeno número de universidades do tipo humboldtiano, como a USP, por exemplo, e várias outras, em cada região do País, para garantir a competitividade do País nas áreas de conhecimento especializado e produção de conhecimento.
Isso não basta. Nós precisamos também de um grande número de instituições cuja principal missão seja ensinar, acompanhada de alguma atividade de pesquisa e extensão dirigida a pequenos nichos de excelência. Essas outras unidades, sim, também precisam encontrar seus nichos de extensão e de pesquisa, mas, fundamentalmente, a sua missão é ensinar, ao lado daquelas outras universidades, em pequeno número, cujo papel fundamental é gerar conhecimento, fazer pesquisa e ter essa interlocução muito maior com o sistema público e, fundamentalmente, com o sistema privado na geração do conhecimento e da inovação.
Para atingir esses objetivos, serão necessárias alterações profundas na governança. É claro que é tentador perguntar para o Prof. Naomar - e eu tenho certeza de que isso vai acontecer no debate - se esse novo modelo que ele propõe - e eu acho que ele já está na versão 3.0 ou 4.0, não sei - tem de ser feito do zero ou se nós podemos fazer o retrofit de algumas das nossas instituições. Essa é uma questão fundamental. Isso é um modelo de sucesso, eu acho que ele está sendo copiado, mas, até aqui, eu acho que ele vem sendo aplicado fundamentalmente em novas entidades. No entanto, nós vamos precisar ter o retrofit de algumas das nossas instituições. A reengenharia de algumas das unidades que estão aí nesse sistema que precisa ser organizado vai ser fundamental. Eu acho que essas alterações na governança, nas organizações das instituições, vão refletir-se no desafio de haver currículos arrojados, novas formas de ensinar, de acesso e de recrutamento e de promoção de professores que vão fugir da mesmice que há hoje. É necessário que haja essa inovação e que haja a regulamentação.
Eu acho que a Emília foi muito feliz em mostrar o número de marcos regulatórios que se vêm acompanhando. E nós ansiamos por uma atividade ainda maior deste Congresso nesse sentido; senão, não é viável. Aqui, é aquela situação onde há dúvida se é o cachorro que balança o rabo ou se é o rabo que balança o cachorro. Frequentemente, essas mudanças requerem que o rabo balance o cachorro. Os marcos regulatórios são essenciais para mostrar a direção, para onde temos de ir. Senão, não adianta ter muito recurso para investir, não adianta mobilização. Nós precisamos ter o marco regulatório que dá um norte para as nossas instituições, para a nossa sociedade, para a nossa atividade em sociedade.
Finalmente, imagina-se algum tipo de associação formal ou informal de instituições, com diferentes características, em um sistema que seja integrado de educação superior regional. Evidentemente, isso impactará, em alguma medida, na liberdade acadêmica e até financeira desses participantes, que serão partes de um sistema hierarquizado.
Eu acho que esses são os desafios que nós temos pela frente, Prof. Buarque. E eu acho fundamental a contribuição desta Comissão, especialmente em trazer alguns novos marcos regulatórios, para que possamos ter essa convergência de interesses do setor privado e do setor público, especialmente representado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado.
Eu fico feliz que tenhamos ganhado bem do tempo, até porque quero explorar mais vocês. As falas de vocês vão nos agregar bastante na transcrição para divulgar entre outros Senadores e na sociedade em geral, sobretudo quando esta reunião passar na televisão.
Para elaborar o que nós queremos, projetos de lei que possam ajudar a mudar a realidade, eu anotei quatro perguntas. Se não houver tempo de respondê-las aqui, eu gostaria de ter outra ocasião, outra oportunidade, para dialogar. Eu vou ler as quatro, e podem escolher uma ou outra para responder.
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A primeira é: como vocês imaginam o Brasil daqui a 20, 30 anos se não dermos um salto na ciência e na tecnologia como país criador e inovador de ciência e tecnologia? Estou partindo do pressuposto de que, hoje, não estamos entre os principais países geradores de ciência e tecnologia.
Dois: o que tem impedido o Brasil de ser um país de ponta na inovação científica e tecnológica?
Três: o que fazer para criar uma sólida infraestrutura científica e tecnológica? Onde agir?
Quatro: onde investir prioritariamente para criar essa infraestrutura?
Eu vou colocar na ordem em que falaram, mas fique à vontade, Emília, para escolher qual pergunta, para falar das quatro ou para colocar outras, como eu coloquei também.
A SRª EMÍLIA MARIA SILVA RIBEIRO CURI - Na verdade, são um conjunto as quatro, Presidente. As perguntas são muito importantes, porque, realmente, são essas perguntas que nós nos fazemos no Ministério todos os dias. Estas perguntas são feitas todas as terças-feiras nas reuniões com o Ministro, sobre projeto. Para onde nós vamos? De que projeto precisamos? Do que o País precisa?
Então, isso é um conjunto de realizações.
Eu falei da emenda constitucional que foi aprovada para a inovação neste País, que, na realidade, é um conjunto de ciência, políticas e tudo o mais que virá daqui para a frente. Ela é muito importante, porque ela desenha as respostas que o Senador Cristovam está colocando, o que é nossa obrigação compor, neste ano, com a sociedade, com o Congresso Nacional, com todos participando. Trata-se de elaborar, Presidente Cristovam, um projeto consistente, que é o que a emenda constitucional pede, de regulamentação para os próximos 20 anos.
E não só isso, pois o Ministério ainda tem por obrigação se rever. O Ministério da Ciência e Tecnologia não foi protagonista de uma série de questões na área de inovação e pesquisa neste País. É muito recente o destaque ao Ministério da Ciência e Tecnologia.
Aliás, o Ministério está fazendo 30 anos neste ano. Ele foi criado em 1985. Neste ano, nós estamos fazendo 30 anos de Ministério de Ciência e Tecnologia e estamos nos perguntando o que nós fizemos nesses 30 anos e o que vamos fazer daqui para frente.
Então, a necessidade de revisão do marco legal é urgente! Quando o Ministro pediu e eu avisei a todos que nós estávamos fazendo um apurado dos estrangulamentos, isso é para acontecer. Dentro do Ministério, na nossa jurídica, nós estamos revendo portarias do próprio Ministério, portarias de editais que nós publicamos - editais que, às vezes, pensamos que estão atendendo à sociedade e não estão, pois atendem uma mesma sociedade sempre, não abrangendo o que precisa ser atendido. Há muitas legislações pequenas, de instruções normativas desnecessárias, e há legislações que precisam ser revistas, pois são arcaicas, velhas e já não nos atendem mais. Há uma série de entraves desnecessários hoje, porque não se trata só de dinheiro, não se trata só de conjuntura financeira; não é financeiro.
Eu citei aqui a nossa regra de descompasso com as empresas e o órgão público investindo em inovação, e esse descompasso se dá também por falta de espaço de investimento e de conhecimento - muito mais de conhecimento do que financeiro.
As empresas, na sua maior parte, têm dificuldade em implantar um laboratório de desenvolvimento de pesquisa; elas têm dificuldade de saber onde procurar, e, quando batem à porta, o setor das universidades não pode ajudar, porque a nossa legislação não permite essa confusão. Para a cabeça de universidade e empresa, é difícil entender: de um lado, quer; do outro, quer; mas não pode haver, porque a legislação não permite. Isso é um entrave gravíssimo para nós.
E recursos humanos também não há do que se falar. A área de recursos humanos no País vem crescendo gradativamente, como eu mostrei na nossa apresentação, mas não é suficiente. O Nordeste, que era tão excluído no nosso País, hoje produz 17% dos pós-graduandos. É uma informação importante? É, mas não é o suficiente, dada a nossa população.
Hoje, nós conseguimos equiparar, com investimentos que houve na área de ciência e tecnologia, o País quase como um todo. Não há tanta diferença mais do Nordeste para o Sul e o Sudeste; para o Norte e o Centro-Oeste, sim. No Norte e no Centro-Oeste, hoje identificamos que há uma carência em que precisamos investir.
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Então, acerca desses dados, também, no Ministério é preciso avançar. Nós precisamos ter, no Ministério, credenciamento, cadastro, avaliação, avaliação daquilo em que investimentos, para sabermos se temos um resultado satisfatório. Para isso, o Ministério está se organizando, Presidente Cristovam.
E acredito, não, mas tenho certeza de que, no próximo ano, já vai haver diferença e, nos anos seguintes, também, porque, no Governo atual da Presidenta Dilma e do Ministro Aldo, existe a prioridade em inovação. O Ministro Aldo conversa com a Presidenta Dilma, todas as semanas, sobre para onde nós vamos com relação à inovação. E isso ele traz para o Ministério, o que estamos elaborando.
Sobre os entraves com relação à ciência, pesquisa e inovação, mais ou menos em setembro, os projetos de lei estarão aqui no Congresso. E o que não for possível ser enviado ainda em setembro discutiremos com esta Comissão. E isso nós vamos ainda debater sobre alguns pontos que precisamos renovar.
Temos um monte de entraves da legislação para vencer, principalmente no que diz respeito às indústrias. O Dr. Lucchesi tem razão: há um descompasso entre o público e o privado, mas também o público tem que dar mais apoio ao privado, para ele se desenvolver. Nós estamos distantes, e temos de estar mais próximos das iniciativas privadas. Para isso, o Ministério tem a Embrapii (Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial), tem a MEI (Mobilização Empresarial pela Inovação) e outros meios e recursos para conversar; estamos falando diariamente com a CNI e com outras instituições privadas; temos polos e parques tecnológicos sendo criados; temos laboratórios sendo fomentados.
Então, os recursos que nós temos disponíveis estão sendo investidos nos laboratórios existentes para alavancar. Temos que ver as questões vocacionais de cada região para podermos desenvolvê-las, para que o nosso País se torne competitivo no mundo. Temos de abraçar algumas questões sobre as quais estamos fazendo acordos internacionais, para avançarmos também, como no caso de terras-raras; temos várias parcerias que podemos fazer pelo mundo.
Então, o Brasil é muito amplo, muito rico, muito próspero. Temos dificuldades? Muitas, mas elas já estão identificadas, e vamos investir contra elas - a área de recursos humanos, em que o Ciência sem Fronteiras tem ajudado muito, mas não é o suficiente.
Precisamos trazer as empresas também para essa área de investimento, e n outras parcelas de atividades que foram deixadas e que agora precisam avançar. O Ministério está-se reestruturando, inclusive, para isso. Estamos nos atualizando: as nossas secretarias estão sendo atualizadas; o nosso sistema interno está sendo atualizado, com uma comissão de governança; e, na área externa, o Ministro nomeou uma comissão para rever todos os nossos institutos - nós temos institutos históricos que são mais velhos que o Ministério da Ciência e Tecnologia e que precisam hoje definir claramente para o nosso País qual é a contribuição deles para o nosso futuro.
Todas essas instituições estão passando por avaliação. Há uma comissão de avaliação externa que o Ministro nomeou, para, em prazo determinado, dar-nos dados consistentes sobre o que e para que nós estamos investindo. E contamos com o trabalho do Congresso Nacional bem próximo para isso, viu, Presidente Cristovam?
Esta comissão vai ter uma agenda bem apurada com relação à ciência e tecnologia neste ano, porque é o ano da inovação: a inovação do Ministério, a inovação das propostas, a inovação com as empresas, a inovação do dinheiro público - para onde vai, para que vai e por que vai. É a forma de agora desenharmos a política de para onde vai o País para daqui a 20 anos. Então, o momento é este.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Passo à palavra ao Prof. Naomar.
O SR. NAOMAR MONTEIRO DE ALMEIDA FILHO - Realmente, eu concordo que as quatro questões estão articuladas. Eu vou fazer um comentário muito rápido sobre a primeira.
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Se, em 20, 30 anos, e talvez até em 10 anos, o Brasil não superar sua dívida histórica com a educação e, com o modelo de desenvolvimento que faz com que tenhamos uma dependência tecnológica - não que não esteja sendo resolvida, mas que se está acentuando, porque o avanço tecnológico no mundo ocorre numa velocidade maior do que os avanços tecnológicos que estamos experimentando -, eu diria que, se isso não for resolvido muito rapidamente, em 30 anos teremos, realmente, sérias dificuldades em nos constituir como Nação e como País. Acho que é um tema de urgente debate nacional.
Com esse comentário, vou ater-me a alguns entraves que eu identificaria, é claro, como proposta, como hipótese, de certa forma até como interpretação. Nós temos uma desigualdade estrutural na educação brasileira que é inacreditável como se mantém; um sistema em que a desigualdade social herdada do colonialismo escravocrata - o que o Prof. Cristovam Buarque tem assinalado em vários momentos - manifesta-se de uma forma extremamente perversa: uma minoria social consegue que o Estado financie a preparação das suas futuras gerações, pagando, mas tendo uma renúncia fiscal de tal porte que é claro que quase que garante o acesso dessas gerações à educação superior pública gratuita, cara e de melhor qualidade, reservando para aqueles que não puderam efetuar esse investimento - porque isso é um investimento - vagas em um setor público socialmente desvalorizado e que não é capaz de preparar suficientemente essas gerações para entrarem nessas instituições. Mas aqueles que superam essas barreiras e concluem, por exemplo, a etapa média de formação entram em instituições que são pagas. Então, os pobres pagam, e os ricos têm... Estou dizendo "ricos" só para esse contraste, mas todos aqueles que conseguem ter acesso a uma educação de qualidade no nível básico entram na educação superior em uma vantagem enorme. E as políticas públicas atualmente vigentes não contestam a estrutura perversa do sistema, como, por exemplo, cotas, Reuni, ProUni. O ProUni, por exemplo, faz com que o acesso dos pobres ou dos que têm menor acesso a recursos econômicos e financeiros tenham o Estado subsidiando a sua educação, mas não nas instituições de melhor qualidade.
Por outro lado, essa desigualdade estrutural encontra um sistema educacional que não é apenas fragmentado, mas é muito isolado em termo de setores. Um exemplo simples: antes, era o vestibular; agora, é o Enem. São formas de a universidade continuar apartada da educação básica em geral e da educação profissional também. É como se as universidades não tivessem organicidade a cumprir em um sistema mais amplo. É claro que, na retórica, no discurso, é fácil dizer que precisamos de uma concepção sistêmica de educação, mas, na prática, o que acontece são setores com dinâmicas e desenvolvimentos distintos.
Isso leva, acredito, a um entrave no papel das universidades no momento contemporâneo brasileiro, porque são instituições com um modelo muito antigo. São modelos e propostas antigas, superadas e que não são mais usadas nem onde foram geradas. E, como a universidade, não só simbolicamente, desempenha um papel de farol, o que a universidade define, por exemplo, como forma de entrada termina chapando todo o ensino médio, por exemplo. E, é claro, as camadas socialmente mais favorecidas no Brasil rapidamente se ajustam a essas formas. Agora é o Enem, e os preparatórios já estão todos prontos para fazer Enem.
Um quarto entrave é o tema de nós termos - acho que a Secretária Emília menciona isso - um sistema estatal que não é público. Ele pertence ao Estado, mas não é público, porque não atende, não acolhe, não incorpora o que podemos dizer que seja representativo da sociedade brasileira.
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Nesse sentido, acho que tivemos um processo constitucional historicamente importante, só que isso resultou, na legislação brasileira, em como se o mundo fosse somente Estado ou mercado, como se não houvesse sociedade envolvendo tudo isso. As universidades, sendo do Estado, submetem-se às mesmas regras. Todo o aparelho de Estado é destinado a outras missões, a outras finalidades, que, muitas vezes, são incompatíveis com as da própria universidade.
E dou como exemplo, só para ilustrar esse tema importantíssimo, a questão da licitação. Do ponto de vista descritivo, inclusive instrumental, um dispositivo como um robô, por exemplo, para ser descrito em um processo licitatório, vai praticamente impedir que se compre pelo menor preço o que existe de tecnologia mais avançada, porque aquele robozinho que é a vanguarda, o Asimov, vanguarda da pesquisa em robótica, faz a mesma coisa que um desses brinquedos chineses que se compram por aí e que se movimentam.
As tecnologias avançadas são mais caras e, muitas vezes, são mais caras no momento inicial do seu desenvolvimento. São mais caras por causa disso. Para algum pesquisador, na vanguarda do seu campo de pesquisa, é impossível comprar alguma coisa pelo menor preço. E mesmo a definição do que seja técnica, nesse caso não se aplica, porque vanguarda não é o que é conhecido; vanguarda, inclusive, é o que seja definido.
Finalizo esta análise dos entraves com a questão do conceito que predomina, de qualidade ou de mérito, na universidade, que é um conceito que praticamente impede massificação. Os exemplos de sucesso no mundo implicam massificação. Os Estados Unidos investem, realmente, bilhões de dólares para terem a formação de uma base enorme. Dessa base, vai resultar um conjunto de sujeitos que poderão produzir a inovação.
O sistema brasileiro praticamente impede que as instituições mais engajadas na produção do conhecimento e inovação sejam de massa. E até eu tenho um bom debate com o Eduardo. Essa hierarquização pode resultar em uma manutenção das pautas restritas. Talvez seja muito interessante termos uma discussão sobre como fazer com que tenhamos muito mais universidades humboldtianas no Brasil do que sempre tivemos e que sempre foram muito restritas, muito pequenas.
A expansão que o Brasil tem experimentado na educação superior recente não é nessa direção. Se fizermos qualquer verificação, nós vamos encontrar que uma certa periferia do sistema universitário se está ampliando. E está-se ampliando porque é barato ampliar-se nesse espaço, mas é socialmente caro isso. É como se estivéssemos desinvestindo nos 30 anos do futuro em que o Senador Cristovam nos desafia a pensar.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado.
Eu peço, agora, ao Rafael que responda.
O SR. RAFAEL LUCCHESI RAMACCIOTTI - Bom, Senador, seguindo o roteiro que o senhor propôs, se nós não conseguirmos nos conectar à agenda do conhecimento, vamos ter um retrocesso econômico, um retrocesso industrial. A bem da verdade, isso já vem acontecendo. Essa especialização regressiva vai significar um enorme esvaziamento do tecido econômico.
Se nós nos inserirmos nas cadeias de valor internacional, na divisão internacional de trabalho, como exportadores de commodities agrícolas ou minerais, a economia de serviço vai ter muito baixa complexidade, a natureza dos empregos para as futuras gerações vai ser de um enorme esvaziamento econômico. Estaremos muito mais sujeitos às oscilações das crises internacionais.
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A indústria é uma base industrial. Além de ela assegurar maior sofisticação de todo o tecido econômico, da economia de serviços, ela assegura muito maior estabilidade dos ciclos econômicos, porque elas têm uma lógica contracíclica voltada para o mercado doméstico e para o mercado internacional, e não tão sujeita às variações internacionais das commodities.
Por não estarmos na fronteira, somos um País de capitalismo tardio, conectamos o nosso desenvolvimento como substituição de importação, temos um atraso institucional e um atraso educacional. A estatística mais antiga: a população adulta brasileira tinha seis meses de escolaridade, em 1870, contra 5,4 anos de escolaridade da população dos Estados Unidos; no início do século XX, os Estados Unidos tinham sete anos e meio, e nós tínhamos um ano e meio; no início do século XXI, nós estamos com sete anos e meio de escolaridade média da população adulta contra 13 anos dos Estados Unidos ou da Europa Ocidental. Estamos muito mais perto hoje do que no passado, mas, como eu falei antes, os Estados Unidos atingiram o que temos hoje há 100 anos.
Temos 100 anos de atraso na dimensão educacional, e daí tudo deriva para a maturidade que temos na nossa democracia, nas nossas instituições, na nossa cidadania e, evidentemente, nós temos um problema adicional: a ordem constitucional e institucional do Brasil nascida na Constituição de 1988 é de elevada rigidez, o que prejudica muito um país emergente. Nós temos uma lógica de enorme rigidez institucional para um país que tem que fazer o catching up. Nós não conseguimos, e o fosso tem-se ampliado.
O que precisamos fazer, especificamente, nessa agenda de ciência, tecnologia e inovação?
Precisamos de uma agenda superior. Precisamos deixar de ser uma agenda incremental para partir para uma agenda superior tanto do ponto de vista do volume de recurso quanto do crédito, do marco legal, da capacidade de conexão com a inovação. Precisamos ser seletivos na alocação de projetos estratégicos, ter menos uma lógica de pulverização de recursos. Precisamos ter maior capacidade de construir uma agenda voltada para o País e menos uma agenda voltada para os grupos de interesse que estão em torno da agenda do Ministério da Ciência e Tecnologia, do ambiente pulverizado de pesquisa no País.
Então, é preciso haver uma subordinação, e o Brasil tem que se livrar da hierarquia da hegemonia de políticas públicas baseadas única e exclusivamente na estabilidade macroeconômica. Isso é uma condição dada, importante, mas haver uma hierarquia entre política macroeconômica de estabilização com política industrial, em que o principal componente seja de inovação tecnológica. Do contrário, não vamos estar no futuro. E são decisivas algumas iniciativas que o Ministério está pensando. Estamos discutindo em fóruns como a MEI, de modernização institucional, de darmos um salto, fazer coisas como a Secretária acabou de fazer. Fazer uma avaliação do nosso sistema é mandatório, para saber onde estamos alocando recursos, e não alocar cegamente pelo efeito da inércia.
Quais as prioridades?
Avançar no sentido de um sistema pontuado na demanda, com modernização do marco legal, com projetos estruturantes de PDI (Plano de Desenvolvimento Institucional), com fortalecimento das engenharias, com modernização da estrutura de propriedade intelectual - é inimaginável que você demore 14 anos na fila para ter uma patente reconhecida no Brasil. Você diz: "A gente não vai sair do lugar". Imagine nós pensarmos em um telefone: o Brasil é um telefone, na área de ciência, tecnologia e inovação, para as empresas, 14 anos atrás.
Então, as próprias empresas brasileiras depositam patentes no resto do mundo, porque o nosso sistema é arqueológico nisso. E o INPI é superavitário, mas é regido a partir do sistema de orçamento único e é preso na lógica do sistema geral. Precisamos ter uma lógica voltada para a conexão das nossas universidades, com startups; temos que resolver agenda de crédito e financiamento. Não é possível não haver uma capitalização da Finep. A Finep está com um volume de recursos absolutamente insuficiente para fazer frente à necessidade de investimento. Depositamos na fronteira pública financiamentos da ordem de centenas de bilhões e, para o financiamento para a agenda de inovação, dois, três, quatro bilhões. É absolutamente insuficiente. Não vamos ter uma agenda superior se continuarmos com essa administração inercial da escassez, mantendo como tudo antes. Vamos ficar enxugando gelo e vamos perder o bonde da história.
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Precisamos avançar em iniciativas ousadas, como eu vi aqui apresentadas pelo Naomar e pelo Eduardo Krieger, de repensar a universidade, desconectando-a da lógica inercial da nossa torre de marfim e conectando-a numa agenda superior de desenvolvimento brasileiro. Temos que deixar uma lógica paroquial de ocupar o Estado, numa constelação de interesses menores, e ter um interesse superior presidindo a nossa agenda.
O Brasil perdeu uma enorme oportunidade no período recente de expansão, mas a nossa tradição social, como já havia previsto Celso Furtado, em Formação Econômica do Brasil, é a de se mover em cima dos choques adversos. Então, mais uma vez diante de um desafio, perdemos oportunidades. Quiçá possamos fazer dessa agenda dos choques adversos uma reflexão sobre a necessidade de modernização institucional com uma agenda superior conectada com a necessidade de fazermos isso, senão a grande resposta à primeira questão levantada pelo Senador será que, daqui a 30 anos, nós não vamos manter as conquistas sociais do ciclo democrático. Se nós não conseguirmos resolver o problema de geração de riqueza, a agenda de distribuição, de cidadania, de desenvolvimento econômico e social vai regredir persistentemente, porque nós não conseguimos conectar a capacidade de geração de riqueza e o desenvolvimento econômico e social, decorrendo daí uma série de problemas sociais.
As manifestações de junho de 2013 dão claro sentido de que a exclusão não é um caminho. Precisamos pensar uma sociedade que seja capaz de avançar na agenda de equidade, mas que isso seja sustentável do ponto de vista econômico. Uma democracia de demandas vai parar na estação Grécia, não vai reproduzir-se, ou seremos capturados, como vários documentos do Banco Mundial e de outros autores dizem, na captura da renda média. Vamos ficar parados, estagnados, enquanto as outras sociedades que são capazes de construir uma agenda conectada com o futuro vão avançar.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Muito obrigado.
Agora, o José Eduardo Krieger.
O SR. JOSÉ EDUARDO KRIEGER - A questão sobre se o gigante vai continuar adormecido ou se vai, em algum momento, resolver levantar-se é desafiadora.
Chegou a hora. O tempo per se não é um problema para nós. Vimos que, enquanto sociedades como a norte-americana ou a europeia tiveram quatro, cinco décadas para acomodar o crescimento e o envelhecimento da população, no Brasil, um catching up feio, nós fizemos em três décadas o que aconteceu lá, e estamos com as dificuldades que nós temos. Então, há várias maneiras de ver como o tempo nos vai afetar.
O que eu considero fundamental experimentar para saber quando vamos quebrar esse ciclo são questões mais profundas da nossa sociedade.
Como vocês todos sabem, é que eu venho da área médica. Eu sou Pró-Reitor de Pesquisa da Universidade de São Paulo, mas sou da Faculdade de Medicina. E há uma questão que está no nosso DNA, e faz tempo: é o problema da nossa incapacidade de ver coisas diferentes como diferentes. Sem avançar nesse quesito, nós não vamos fazer muita coisa, porque, por inércia, somos meio arrastados. O mundo se levanta, e às vezes discutimos se foi o mar que se levantou ou se fomos nós que subimos, mas a coisa acaba acontecendo. A minha preocupação é saber como nós vamos quebrar esse ciclo.
De novo, acredito que um dos vetores é esta Casa, talvez por marcos regulatórios mais ousados, em que a sociedade brasileira vai perceber que não precisa se chamar de sociedade igualitária se as regras são todas iguais. Elas não têm que ser iguais. Nós temos que ver o que é diferente ser diferente. Se eu vou alocar mais recurso e concentrá-lo, isso é uma dificuldade. Se eu colocar os meus colegas pesquisadores, nós não vamos chegar a essa conclusão. Nós já vamos sair contentes se houver isonomia no salário e no que cada um vai ganhar. Isso é contrário a qualquer medida, especialmente quando o cobertor é curto, de alocação de recursos, de definição de prioridades. Então esse vírus tem que ser eliminado, e eu não sei como.
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Eu acho que um pouco talvez pela ousadia do regramento. De novo, retomo a esta Casa e faço um apelo: é necessário que nós tenhamos condições... São vários os exemplos.
Como é que hoje, em 2015, vou pensar... Um dos nossos maiores projetos de sucesso, a Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior), nos últimos 30 anos, formação de doutores... Quer dizer, saímos de 0,4% da produção mundial para 2,5%. Espetacular, não vamos entrar na questão da relevância, mas esse avanço em número foi muito grande, e mais ou menos foi da formação de doutores.
Hoje, o mesmo regramento da Universidade de São Paulo é igual para a Universidade Federal do Acre, e não há a questão se ela é igual, melhor ou pior do que a Universidade de São Paulo. Elas são diferentes, elas vivem realidades diferentes, elas estão em situações diferentes, e nós temos um regramento igual! O que acontece dentro da Universidade de São Paulo hoje tem que acontecer dentro da Universidade do Acre, e eu acho que coisas assim estão atrasando as duas.
Eu acho que nenhuma está podendo atingir o seu papel vocacional, porque estão presas a regramentos que nós julgamos democráticos, porque são iguais para todo mundo, mas que são a maior âncora que nós temos neste País.
Quer dizer, não é possível. Nós não vamos falar em prioridade, em definir prioridades. Nós podemos ter, às vezes, alguém mais ou menos político que consegue fazer as coisas, mas é muito difícil. Quer dizer, como é que nós conseguimos entender que, na América do Norte, eles têm instituições democráticas, instituições em que você constrói consensos, mas há as alternativas?
Eu vou contar uma historinha para vocês sobre Projeto Genoma Humano, do qual todo mundo já ouviu falar, sequenciamento. Começou no final da década de 80. Fizeram uma reunião em uma das universidades da Califórnia, em Santa Cruz, na costa oeste dos Estados Unidos. Sentaram-se lá várias pessoas e começaram a discutir: "Vamos fazer? Não vamos? US$3 bilhões de dólares; não temos nem equipamento ainda para fazer isso..." Os dois pesquisadores do NIAID ficaram discutindo se o bom era fazer big science, small science, ou seja, investir muito num grande projeto, pouco num projeto pequeno.
Dali a pouco, o pessoal do departamento de energia e o pessoal de defesa disseram: "Opa, isso aí nós sabemos fazer, grande investimento...". Dali a pouco, o maior beneficiário, que é o NIAID (National Institute of Allergy and Infectious Diseases), o Ministério da Saúde americano, foi puxado, porque há esses outros instrumentos na sociedade.
Todos podem pegar e amaciar o seu instrumento que está aqui no bolso, e você pensa só a partir do Steve Jobs, que fez um negócio espetacular, de empacotar uma série de tecnologias. Ninguém pergunta de onde saíram as principais patentes que estão atrás desse instrumento. Quer dizer, quem foram os aceleradores dessa tecnologia? Foram agências que estão ligadas ao sistema de defesa americano e ao departamento de energia. Não foi da NSF (National Science Foundation) ou do NIAID, que são os nossos agentes de financiamento, onde há as regras mais democráticas; foi onde se podem fazer coisas com agilidade, onde se pode ter um programa, porque nós frequentemente queremos aplicar a regra dos investimentos, por exemplo, do Ministério, etc. à regra geral. Nós temos que fazer essa aplicação, nós temos que ter esses meios, mas nós temos que também ter as alternativas, com regramento. Quer dizer, ninguém fugiu da lei, essas agências americanas que estão no departamento de energia e no departamento de defesa, mas há outra lógica. Quer dizer, o sistema tem que ter esse conjunto de atores em que um pode ir mais rápido, e outro pode ir mais lentamente; do contrário, vamos continuar definindo se vamos ter aquele gigante adormecido ou se ele vai acordar.
E já se passam 54 anos, no meu caso. Desde que eu nasci, desde bem pequeno, eu ouço que o gigante adormecido está acordando, o País do futuro, assim por diante.
Evidentemente, a inércia acabou nos levando, e temos vários exemplos em que pudemos dar contribuições importantes, mas é difícil imaginar um país de dimensões continentais, a oitava economia mundial, e, mesmo que eu pegue só números de publicações, que é o indicador, nós somos o décimo terceiro. Foi um avanço tremendo nos últimos 30 anos, mas não é compatível com a nossa economia.
Se eu for falar agora em relevância, vamos para o vigésimo quarto. Quer dizer, há necessidade de mudança, e essa mudança, especialmente num país com as nossas características, requer regramentos que desde o dia 1 comecem a mostrar que coisas diferentes têm que ser vistas de maneira diferente. Isso é uma incapacidade nossa, de brasileiros, de observar. Nós temos dificuldade com isso. Nós temos aquele problema da isonomia: tudo tem que ser igual. Nós temos de falar que precisamos ter igualdade de oportunidades, mas não continuidade em qualquer das nossas atividades.
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Então, acho que esse é o desafio: quando cada uma das leis sair desta Casa, termos esse pensamento. Quer dizer, como é que isso começa a entrar não na matriz do País, mas na matriz de cada um de nós? Como é que o brasileiro vai começar a entender que coisas diferentes podem ser diferentes? E outra: temos esse exemplo dentro de casa. Quando uma pessoa tem dois filhos, eles são expostos às mesmas coisas e são diferentes.
Já temos os exemplos, mas, por alguma razão inexplicável, temos essa dificuldade, como sociedade, para atuar. Aí, vai ser complicado definir prioridades, alocação de recursos de uma maneira diferente, permitir um regramento para novos experimentos, como esse em que o Prof. Naomar Monteiro está envolvido, desde que o fez, na Bahia, depois lá em São Paulo e, agora, no sul da Bahia. Isso é fundamental.
Por regras uniformes, nunca se faria isso. Quer dizer, não dá. Aquela minha pergunta: é possível fazer o retrofit, algumas reengenharias de algumas de nossas instituições? Ou vamos ter de criar do novo, from the scratch, do zero?
Muito bem, essas eram algumas das minhas considerações. São mais provocações, para que possamos continuar nesta discussão.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Vou encerrar, tentando responder as perguntas, como eu responderia.
Aliás, antes, há uma pergunta de fora. Na verdade, trata-se apenas de uma afirmação de Anna Flavia Schmitt: "Infelizmente, percebe-se que a inovação dos países é pura platitude de quem faz a Educação como palanque, porque sabe-se que só 'os filhos de' terão acesso a esses incentivos".
Esse é um dos problemas. Vemos a ciência para beneficiar os alunos que vão fazer ciência e não para que os formados na ciência sirvam ao povo inteiro. O mesmo acontece com a universidade, Naomar. Costumamos vê-la como algo a beneficiar quem entra na universidade, quando, na verdade, quem entra na universidade é para beneficiar o País, como quem entra no Exército, como quem entra no serviço diplomático.
Mas vou tentar analisar rapidamente como é que eu veria as perguntas.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Vou falar em você aqui.
A primeira pergunta: como vocês imaginam o Brasil, daqui a 20 ou 30 anos, se não dermos um salto na ciência e na tecnologia?
Um desastre completo de dependência. Hoje, só vivemos se, lá de fora, mandarem remédios e equipamentos médicos. Os remédios que tomamos foram inventados fora, salvo exceções. Os equipamentos que os médicos usam vêm de fora. Só falamos ao telefone, porque alguém o inventou lá fora. As coisas vão continuar a ser assim, no ritmo em que as coisas estão indo.
Aliás, gostaria, Emília, de ver se há alguém trabalhando na análise do que foi feito, nesses 30 anos, na ciência e na tecnologia, graças ao Ministério da Ciência e Tecnologia. Qual o salto que demos em pesquisas espaciais, em pesquisas nucleares, em energias alternativas?
Aqui, falo do Senador Hélio José, um defensor das energias alternativas, sobretudo a solar.
Então, a situação é trágica.
Segunda questão. O que tem impedido o Brasil ser um país de ponta na inovação científica e tecnológica?
Creio que alguns fatores: primeiro, um empresariado que não gosta de inovação, a não ser nas máquinas que compra lá fora, mas que ele não inventa aqui dentro, salvo raras exceções; um empresariado que não gosta de inventar produtos novos, mas produzir produtos inventados lá fora.
Quais são os produtos inventados aqui dentro? Produtos novos, que a gente compre? Automóvel não é! Computador não é! E por aí vai.
Um outro fator é que a universidade tem horror a empresário, portanto não vai inovar. Pode até descobrir coisas, mas não inova. Uma coisa é descobrir a vacina contra a poliomielite; outra é fazer a campanha de vacinação. O cientista é capaz de inventar a fórmula da vacina, mas ele, sozinho, não resolve o problema; só quando convive com o setor empresarial e governamental, e as nossas universidades têm horror ao setor empresarial.
Outro fator, que considero o mais grave, é o sistema de educação de base que exclui, porque não dá educação para todos, e mesmo aqueles que têm educação não se formam para ciência e tecnologia, salvo raras exceções.
Aí, vou para o que fazer. A primeira coisa, para mim, é não jogar fora nenhum cérebro.
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Se quisermos ter ciência e tecnologia, a primeira coisa é não queimar os cérebros, como o fazemos, negando a educação. São 13 milhões de analfabetos! Ou seja, se colocarmos somente 1% de pessoas capazes, são 130 mil cérebros. Jogamos fora 130 mil cérebros.
Só 40% terminam o ensino médio. Desses, eu dizia que a metade era de boa qualidade, mas, nesta semana, eu ouvi uma figura muito séria, como Claudio Haddad, dizendo que não há mais de 5% dos nossos alunos que terminem o ensino médio com qualidade - eu diria 20%, metade de 40. Ele diz 5% dos 100, ou seja, pouco mais de 10% dos que terminam.
Penso que a primeira questão é esta: não desperdiçarmos nenhum cérebro. Aí, para mim, a solução é federalizar a educação de base. Não vou querer discutir isso aqui, mas não vejo como fazer isso com a educação de base, ou nas mãos do setor apenas privado de quem pode pagar a escola, que são poucos os que podem pagar uma boa escola - tem que ser pública -, ou nas mãos dos Municípios, que são todos pobres e desiguais.
O outro aspecto de não desperdiçar nenhum cérebro é dar ênfase ao lado científico do cérebro, o que não costumamos fazer. Além de desperdiçar a educação, ela é bacharelesca. Não ensinamos matemática; não ensinamos as bases científicas às nossas crianças.
Outro fator é colocar as universidades em associação com o setor empresarial e governamental, para que as invenções e os pensamentos virem inovação; inovação passa pela realidade e não pode ser apenas uma questão do intelectual trancado em casa. Ele pode até inventar, mas só inova quando aquilo chega lá fora e se transforma em algo concreto.
Onde investir prioritariamente? Por exemplo, para fazer o empresário brasileiro envolver-se mais na inovação, o BNDES deveria financiar os setores empresariais inovadores, o que ele não faz. Já disse até que, por mim, o BNDES ficaria dentro do Ministério de Ciência e Tecnologia e não dentro do Ministério de Indústria e Comércio, porque se trata todas as indústrias como merecedoras de financiamento. Isso não vai gerar inovação se todas forem tratadas igualmente.
Aí vem o que foi dito sobre diferença. É preciso diferenciar. O que a gente financia? Caso se queira um País inovador, deve-se financiar o setor inovador. Deixe o setor que não é inovador se virar e buscar recursos em outros lugares. A Coreia fez isso. Na Finlândia, a Nokia era uma fábrica de papel higiênico, e eles canalizaram recursos para que ela se tornasse uma indústria geradora de alta tecnologia.
Creio que universidade e setor empresarial, este é um setor que eu colocaria como prioritário na infraestrutura, obviamente depois de não desperdiçar nenhum cérebro pela educação de base. Investiria nas universidades, mas orientando-as, se quisermos inovação.
Bem, dito isso, fica o meu agradecimento a todos. Antes de terminar, passo a palavra ao Senador Hélio José para concluir, porque foi por mim citado.
Nos próximos 30 anos, se não investirmos em ecologia, vamos ser um País absolutamente dependente em energia. Já o fomos de petróleo; conseguimos ter petróleo hoje, mas petróleo acaba.
O grande poço de energia é este aqui. Não é o petróleo. É aqui que vamos inventar novas formas. E, com o sol que temos, precisamos, hoje em dia, importar as placas. É um absurdo.
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Então, eu passo a palavra a você, que é o nosso Senador da energia eólica... Desculpe, da energia solar.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PSD - DF) - As alternativas, eólica e solar, eu acho que a gente tem que defender, para variar nossa matriz energética.
Eu queria primeiro, Cristovam, cumprimentá-lo pela oportunidade de trazer aqui esses pensadores para discutir assunto tão importante. A gente discute tanta coisa aqui, e de repente alguns assuntos que alguns não acham importante passam. E você está sempre enxergando lá na frente. Eu acho que aqui, na nossa Comissão de Ciência e Tecnologia, na qual tenho a honra de ser seu Vice-Presidente, você traz essa discussão do Sistema Nacional de Conhecimento e Inovação, que é muito importante.
Eu queria parabenizar cada um dos que estiveram aqui: a minha querida Emília, por conhecer tão bem esta Casa, por ter trabalhado tanto tempo aqui, sabe como se dá o dia a dia desta Casa. E você lá, na Secretaria Executiva do MCTI, acho que é um acerto, Emília.
Nessa linha, a gente pode colaborar muito, porque boa vontade do Senador Cristovam, minha, do Senador Omar, vocês vão encontrar aqui; e de outros também, nessa linha.
A SRª EMÍLIA MARIA SILVA RIBEIRO CURI - Senador, reforçando o que o senhor falou, realmente nós vamos precisar muito, porque a revisão do marco neste ano é fundamental para a continuidade dos trabalhos e para destravar o que já vem sendo feito há tantos anos. O Congresso Nacional é de suma importância.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PSD - DF) - Com certeza, o Senador Cristovam deve colocar, e a gente vai apoiar, porque essa renovação é fundamental mesmo.
O Naomar Monteiro de Almeida Filho traz essa experiência baiana. O Brasil é continental. A gente tem tantas pessoas, com tanta capacidade, espalhadas, e de repente não são aproveitadas por causa dessa falta de investimento, dessa falta de priorização. O Brasil foi âncora em tempos passados, com Carlos Chagas, com Santos Dumont. Em tantas coisas o Brasil esteve na frente, e depois a gente deu uma freada por causa dessa dificuldade de investimento. Então, quando vejo uma universidade como essa do sul da Bahia, que é uma universidade nova, preocupada com esse processo, é muito bom.
Eu estive com o Robson esses dias na CNI. Eu sou Presidente da Frente Parlamentar da Infraestrutura aqui no Congresso Nacional, e discuto muito essa questão da indústria, porque inclusive vou fazer o relatório da CMO (Comissão Mista de Orçamento) sobre a indústria, o comércio e a micro e pequena empresa. Coube a mim essa responsabilidade.
Então, até quero voltar para discutir mais amiúde essas questões com os industriários, com os comerciantes e com os micro e pequenos empresários, para, juntos, termos uma posição um pouco melhor, mais avançada. Quero parabenizá-lo sobre a colocação a respeito da necessidade de priorização, porque se não há tantos recursos, temos de priorizar aquilo que nos vai trazer algum resultado, sem nos esquecer dos demais, mas dar algumas priorizações.
O Krieger, da USP... A USP é ponta no Brasil, a USP sempre está na frente. Eu acho, Krieger, que você trouxe coisas importantes para esta discussão, e, juntos, aqui, podemos construir muito. A USP, com todas aquelas cabeças pensantes... A minha filha até passou para Direito na USP, mas a fiz fazer na UnB; não foi fazer lá no Largo do São Francisco. Foi um erro meu. Mas a UnB é nossa universidade, não é, Cristovam? Eu e você estivemos lá tanto tempo. Então, nós tínhamos de prestigiar a UnB. Mas a USP é a USP. A gente fica muito feliz com as suas colocações.
Então, Cristovam, só queria registrar que lamento ter chegado um pouco a posteriori, mas vou pegar as notas taquigráficas, vou compreender o colocado aqui por vocês. Esse livro que o Cristovam elabora é de altíssima qualidade. Essa questão da revolução da educação, essa questão que o Cristovam está discutindo agora, da federalização, que ainda não está bem compreendida por todos... Tenho até a preocupação de algumas pessoas votarem apressadamente, sem compreender a proposta, e até prejudicar o encaminhamento dessa proposta de alcance tão grande.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - É amanhã. Conto com você lá na hora do voto.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PSD - DF) - Com certeza, Senador! Não sei se vamos ganhar, mas estamos juntos! Quero que o senhor convença alguns que eu vi que estavam meio resistentes.
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Então, quero dar um abraço em todos, pedir desculpas por ter chegado atrasado, e parabenizá-los.
Estamos aqui nesta Comissão, de que sou o Vice-Presidente, com todo o carinho, para trabalhar juntos - viu, Emília? Eu falei aqui com o seu ministro que ele precisava nos ajudar, Brasília, a tornar realidade uma coisa que o Cristovam começou quando foi governador, que era a cidade digital, essa vocação de Brasília de ter uma indústria não poluente.
Já faz 12 anos que estamos tentando... (Falha na gravação.)
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PSD - DF) - ... tornar isso realidade, e ele foi muito solícito aqui conosco. Acho que poderíamos discutir também alguns avanços nessa linha.
Muito obrigado, pessoal.
O SR. PRESIDENTE (Cristovam Buarque. Bloco Apoio Governo/PDT - DF) - Obrigado, Senador.
E agradecendo a todos os presentes, a quem assistiu a esta reunião,a quem participou, encerro esta audiência.
Está encerrada a reunião.
(Iniciada às 16 horas e 09 minutos, a reunião é encerrada às 18 horas e 02 minutos.)