03/06/2015 - 19ª - Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

R
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Bom dia a todos e a todas, Srs. Senadores, Srªs Senadoras!
Declaro aberta a 19ª Reunião da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião destina-se a discutir a crise hídrica no Brasil, em atendimento ao Requerimento nº 15 de minha autoria - sou a Senadora Regina Sousa, para quem não me conhece.
Esta reunião é de caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Os cidadãos podem participar fazendo perguntas por meio do portal e-Cidadania, pelo endereço www.senado.leg.br.
R
E temos os nossos convidados: Sr. Marcelo Medeiros, Secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano, do Ministério do Meio Ambiente; Sr. Luis Alberto de Mendonça Sabanay, Assessor Especial para Assuntos Estratégicos, do Ministério da Pesca e Aquicultura.
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Esqueci de colocar. O Senador Donizeti também é autor do requerimento. Juntamos os dois requerimentos. Os assuntos eram idênticos e fizemos um só. Depois, vou passar a Presidência para ele.
Sr. Antônio Gomes Barbosa, Coordenador Nacional do Programa Uma Terra e Duas Águas; Srª Luz Adriana Cuartas Pineda, Pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais.
Inicialmente, dez minutos para cada um, com a tolerância necessária que pode chegar a 15 minutos, porque são quatro.
É uma audiência oportuna. Véspera do Dia Mundial do Meio Ambiente, dia 5. Talvez por isso o esvaziamento. Nós não atentamos que amanhã é um feriado nacional, e aí a dificuldade para o pessoal ficar. Todo mundo já começou a viajar. Mas é uma oportunidade.
O debate é para refletirmos sobre a escassez da água. É um debate que precisa estar presente em todos os lugares. Não é mais só São Paulo que está sofrendo a crise da água de beber. Inicialmente, deu-se muita ênfase a São Paulo, mas hoje está presente em todos os lugares.
Eu fiquei estarrecida. No meu Estado, há uma lagoa, a Lagoa de Parnaguá, com 72 mil metros quadrados de superfície, uma das maiores lagoas do Brasil, 74 milhões de litros de água. Ela está totalmente seca. Abastecia quatro Municípios. Onde há vestígio de água é só lodo e lama. É uma coisa estarrecedora, para quem viu o mar que era a lagoa de Parnaguá e para quem vê agora. Então, há alguma coisa errada acontecendo. A intervenção é responsável. Somos nós que temos que discutir. O Governo, os poderes e a sociedade, principalmente.
A ONU lançou o seu relatório no começo do ano e é um grito de alerta sobre a questão da água. Diz que, em 2030, 40% vão estar sofrendo escassez. Vai haver déficit de 40% da água. Fala também que, nos últimos dez anos, o consumo cresceu duas vezes mais que a população. Então, são muitos dados. É aconselhável que todo mundo leia o Relatório da ONU, que divulguemos nas escolas.
Esta audiência é para isto: para ver que rumos, que dicas temos, tanto para o Governo quanto para o Congresso, para a sociedade; o que fazer para enfrentar a questão da crise hídrica no Brasil.
Passo a palavra ao Sr. Marcelo Medeiros, que tem dez minutos, com a tolerância. Depois revemos a questão do tempo durante o debate.
O SR. MARCELO MEDEIROS - Bom dia a todos, Senadora.
Eu fiz uma apresentação muito maior do que dez minutos, porque sei que ficam as apresentações, depois, para as pessoas copiarem. Então, há muito mais informação nela. Alguns eslaides eu vou passar rapidamente.
Eu vou falar rapidamente sobre os fatores - porque não foi somente a falta de chuva - que levaram a esse problema de escassez, e vou falar de algumas ações, tanto do Ministério do Meio Ambiente quando do Governo Federal como um todo.
R
Temos que levar em consideração não só o sistema de gerenciamento de recursos hídricos, mas os fatores da ocupação humana que levam também à seca.
É sabido que temos o problema de falta de chuva na Região Nordeste. Há um problema geológico também na região, que não favorece a ocorrência de água subterrânea. Isso atinge quase 60% do Nordeste, ou seja, há falta de chuva e falta de reservação natural.
Temos um problema na Região Sudeste, que é intensamente ocupada. Há uma intensa atividade industrial, de comércios, e um adensamento popular, que levam não só ao esgotamento da fonte de água, mas também a problemas de qualidade.
Há o problema no Sul, onde a água é extremamente demandada para a irrigação. Não há um regime regular de chuva. Em qualquer dia, no Sul, pode haver uma seca ou uma cheia em partes diferentes do mesmo Estado.
A Amazônia, que é pouco ocupada, tem a maior concentração de água, mas tem o problema de qualidade. Depois eu vou falando sobre isso.
Um dos problemas que levaram a essa escassez é a nossa ocupação, tradicionalmente no litoral. Esses pontos mais escuros indicam maior densidade demográfica,enquanto que o interior do País foi pouco ocupado. Esse adensamento está piorando. Se levarmos em consideração que, em 1950, 55% das pessoas moravam em cidades, no Censo de 2010, com 190 milhões de pessoas, 85% já moram em cidades. Então, há um adensamento de pessoas e a concentração da pressão sobre a água em um ponto. Não só concentração da pressão, mas também, no caso de desastres naturais - eu trabalho com isso há muitos anos, sou do setor de águas há quase 20 anos, nos últimos sete anos coordenei, na Agência Nacional de Águas, a área de eventos críticos -, você expõe mais pessoas ao risco, por causa do adensamento. Você as expõe aos deslizamentos, às enxurradas, porque as pessoas estão mais juntas, ocupam uma menor área no espaço.
Esse adensamento também exerce uma pressão sobre a qualidade da água, e a má qualidade - nós, que trabalhamos com engenharia de recursos hídricos - é um fator de perda de disponibilidade de água. Quando piora a qualidade, é menor a chance de eu usar um certo estoque de água, seja um rio, um aquífero ou um reservatório.
E é justamente nos grandes adensamentos urbanos que há uma perda maior: maior lançamento de esgoto que não é tratado; maior lançamento de efluente industrial que não é tratado, ou mesmo que sejam tratados, não são suficientemente tratados a ponto de remover toda a carga de poluição.
Isso é comum também no Nordeste: não só o adensamento populacional, mas o problema de não haver vazão nos rios. Há muito rio intermitente, muita região que diminui bruscamente a vazão, quando cessa o período chuvoso. Onde diminui a vazão, há o aumento da concentração de carga poluente. O rio não faz mais a diluição. Perde-se mais água por conta disso. É um efeito perverso que, agora, São Paulo também passa. Como não chove, a vazão diminui muito e a carga de esgoto é a mesma, praticamente passa-se a perder mais estoque de água.
Nós temos muitas legislações que versam sobre águas, desde a Política Nacional, que é de 97, e está quase fazendo 20 anos. Há uma lei que cria depois a ANA, porque a política criou uma gestão descentralizada participativa; mas, em 2000,vimos que isso não ia andar muito para frente e criamos a Agência Nacional de Águas.
Concentramos, no plano federal, algumas coisas. Há a Lei de Saneamento Básico, o Estatuto das Cidades. Todas elas dizem alguma coisa sobre isso. Além da Lei de Saneamento Básico e da Política Nacional de Recursos Hídricos, temos o Plano Nacional de Recursos Hídricos e também o Plano Nacional de Saneamento Básico, que conversam entre si.
Nos Estados e Municípios, há reflexos dessas legislações. Hoje, todos os Estados possuem uma Política Estadual de Recursos Hídricos. Nem todos os Estados têm todos os instrumentos. Mais da metade já tem Plano Estadual de Recursos Hídricos, quase todos outorgam o direito de uso da água e quase todos cobram pelo uso da água de alguma forma, ou vão começar a cobrar.
A outorga, para nós, é muito importante. A nossa legislação é moderna. A Constituição diz que a água é um bem público. Se a água é bem público e é bem de todos, então tem que se regular não o preço mas o acesso; o acesso isonômico. A outorga é um meio de se ter o acesso isonômico.
Vou começar a falar sobre a escassez. Essa foto é de 24 de fevereiro deste ano. Foi um período de fevereiro em que houve várias enxurradas em São Paulo e inundações, ao mesmo tempo que você passa por um problema por falta de água para o abastecimento público. São as incoerências do tempo.
R
São Paulo também tem um problema que acontece em todas as cidades brasileiras. Eu sou de Belo Horizonte, moro em Brasília desde 2001, mas em Belo Horizonte também é o mesmo problema: você tem grandes rios que cortam as cidades, mas eles não são utilizados para abastecimento público por conta da poluição. É muito complicado e caro tratar um rio muito poluído e voltar atrás. Então, tradicionalmente, as companhias de abastecimento, ao invés de tratar o esgoto, começam a buscar água em locais mais distantes.
Essa é uma contagem de eventos de seca, pela Defesa Civil Nacional, de 2003 até 2012. Houve vários eventos de seca e vários de estiagem no Brasil inteiro. Só por conta de seca, que é a estiagem prolongada, nesse período nós tivemos 956 Municípios que declararam situação de emergência ou de calamidade pública, isso no Brasil todo. Mas se formos para São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, que são os mais afetados hoje, veremos que essa conta de 2013 não teve registro para São Paulo e Rio de Janeiro. O que eu estou tentando dizer é que essa situação que a gente vive hoje foi um pouco abrupta.
No final de 2013, começamos a ver que os reservatórios baixavam; e o período chuvoso de 2013 para 2014, que é o do final do ano nessa região, quando começam as grandes chuvas, não foi suficiente para encher os reservatórios. No início de 2014, nós conversamos com o Estado de São Paulo sobre isso. Começou a declinar rapidamente e as chuvas não vieram. Então é uma situação muito atípica para nós.
Na Agência Nacional de Águas nós temos a Rede Hidrometeorológica Nacional, coletamos dados há muitos anos e não temos registro de uma seca tão forte nos últimos 84 anos em que observamos a chuva. Nunca tivemos períodos chuvosos tão baixos.
Temos várias secas históricas em grandes aglomerados urbanos e sabemos como esses aglomerados lidaram com isso.
Vou deixar isso para depois. Fica na apresentação.
Em vários deles, houve não só planos de contingência. Uma coisa em que estamos batendo muito firme agora com os Estados e Municípios é que eles precisam ter formas, gatilhos que indicam que a partir de uma certa diminuição do estoque de água, seja um rio, seja um reservatório, deve haver ações restritivas a serem tomadas.
Londres é um bom exemplo, assim como Sacramento, na Califórnia, em que a partir de um certo limite de água, não se pode irrigar jardim, não se pode lavar prédio público, não se pode irrigar gramados. São várias medidas restritivas, tudo isso aliado a campanhas de conscientização pública, o que São Paulo está fazendo também.
Barcelona, a mesma coisa. Barcelona foi mais urgente ainda, porque foi abrupta como a nossa. Foi de um ano chuvoso para um ano muito seco. Além de fazer medidas restritivas, eles tiveram que apelar para a importação de água da França. Tiveram que instalar plantas de dessalinização de água do mar, o que, para nós que somos da engenharia, é a coisa mais complicada e mais cara a se fazer; mas eventualmente tem que ser feita.
O que tradicionalmente se faz na gestão da seca, principalmente do ponto de vista de abastecimento público?
A primeira tentativa que sempre se faz é buscar água nova: ou se busca um novo manancial ou se trata o esgoto melhor para poder oferecer água de volta. Isso é o que se chama de aumento de suprimento. A outra medida conjunta é diminuir a demanda, forçar a demanda.
As grandes secas são uma boa oportunidade para isso, principalmente para se mudarem os padrões de comportamento da população. Só que os padrões não são somente diminuir o tempo no chuveiro. Houve um aumento de renda das populações hoje em dia e isso aumenta a pressão sobre consumo de bens e serviços. E, com isso, aumenta-se o consumo de água. As pessoas começam a comprar mais coisas e tudo depende de água para a produção, não só o alimento. Qualquer coisa industrial também depende de água, e isso aumenta a demanda.
Então, temos que forçar a redução sobre a pressão não só do ponto de vista de uso direto da água pela pessoa, mas também por novos padrões de consumo. E tentamos minimizar impactos, o que, em parte, tem a ver com o aumento de suprimento.
Esses são os mananciais de São Paulo. Há oito grandes mananciais. De um a sete são os principais. O Cantareira é o mais famoso justamente devido ao volume de água que é retirado dele. Isso é para mostrar que a cidade de São Paulo não é abastecida só pelo Cantareira.
Esse é o gráfico exemplo de que eu falei antes. Essa é a produção de água tratada na metrópole de São Paulo de 2012 até 2015. Vejam que em 2012 e em 2013 há patamares de 70 metros cúbicos por segundo. Era a água entregue para as pessoas. Por conta da seca, a Sabesp e as companhias municipais foram diminuindo a vazão tratada. Hoje em dia, atende-se a cidade com 50 metros cúbicos. Reduzimos mais de 40% da vazão tratada. E as pessoas estão vivendo. Hoje a estimativa média de consumo está em torno de 200 litros por dia por pessoa.
R
É um dado meio falso, porque nessa conta entram a indústria que está dentro da cidade e as companhias de serviço também: restaurantes, lavanderias. Então, talvez o consumo da pessoa seja menor do que isso.
Essa é a distribuição dos sistemas. O Cantareira é o maior deles, atende a 5,4 milhões de pessoas. Aliás, ele era o maior, mas está perdendo espaço para o Guarapiranga, porque a própria Sabesp está fazendo modulações para retirar a pressão sobre o Cantareira, que é o nosso pior manancial em São Paulo hoje. Ele está com menos 10%. Menos é porque, em engenharia, consideramos negativo quando se começa a usar o volume morto. Ainda tem água. Estamos no volume morto dois, mas ainda tem água. Isso é para mostrar o quão abrupta foi a perda de vazão para o reservatório. De 82 até agora, em junho, sempre oscilávamos muito acima do volume morto. De repente, em 2014, houve essa queda de uma vez.
Esse gráfico é das vazões que chegam ao Sistema Cantareira. Temos um gráfico de médias. Até 2013, dizíamos que o pior ano do Sudeste foi 53. Quem lida com barragem faz o último teste num projeto de barragem, quando está construindo, que é o de simulação: se a barragem aguenta as demandas sobre ela. E há uma recomendação da Eletrobras e de outros órgãos de que se simule isso usando a década de 50, que sempre foi a pior década. Se o reservatório aguentar demandas com as chuvas da década de 50, ele é um bom reservatório.
O patamar mudou. Hoje em dia não é mais 53, é 2014. Todo o ano de 2014 é o pior ano do histórico que já registramos em oitenta e poucos anos de observação. E 2015 começou pior do que 2014. Tivemos uma afluência muito menor. Em fevereiro e março choveu, houve um aumento de vazão. Isso gerou aquela recuperação do volume dois para o volume um; só que nós estamos em maio e as vazões continuam menores do que em 53. Não temos uma perspectiva de recuperação de reservatório para este ano, nem mesmo no período chuvoso, porque grandes reservatórios como Cantareira, Três Marias, Sobradinho são o que chamamos de plurianuais. Eles têm que aguentar períodos severos de mais de um ano de seca, e já deplecionamos essa reserva que nós tínhamos. Então, vamos demorar alguns anos para recuperar esses reservatórios, mesmo que chova muito no final do ano.
O Paraíba do Sul é outro problema no Sudeste, é a bacia mais industrializada que nós temos, com maior desenvolvimento econômico.
O Paraíba do Sul é um pouco diferente do Cantareira, porque o Cantareira só tem o Cantareira. No Paraíba do Sul nós temos uma série de represas que foram construídas para o setor elétrico. Isso está garantindo a reserva. É a mesma coisa do São Francisco. Temos Três Marias, Sobradinho, Itaparica. Reservatórios do setor elétrico hoje suprem a demanda de abastecimento público.
É bom lembrar que o Paraíba do Sul sofreu uma das primeiras grandes transposições. Retira-se água do Paraíba do Sul para alimentar a metrópole do Rio de Janeiro através do Sistema Guandu.
No Paraíba do Sul, adotamos medidas restritivas de retirada de vazão através da Agência Nacional de Águas, que é um órgão vinculado ao Ministério do Meio Ambiente. Então, hoje em dia ele está com 17%, que é a soma de todos os reservatórios. É um valor muito baixo. Estamos começando o ano com menos do que começamos 2014, como esse gráfico mostra. É a evolução desde 93 desse sistema equivalente do Paraíba do Sul.
Vejam que hoje temos 17%, mas no mesmo período, em 2014, tínhamos 33%. E, se olharmos um ano antes, nós tínhamos 50%. Como isso diminuiu muito!
De Belo Horizonte, no início do ano, recebemos pedido de ajuda também, do governo do Estado. É a mesma coisa. Há vazões diminuindo os mananciais principais da cidade. Esse é o único sistema de reservatório, que são três. Hoje ele tem 37%, mas esteve pior. Logo no início do ano ele tinha 30%. E essa queda foi de 2014, em um ano, até chegar em janeiro. Como ele desceu abruptamente por falta de chuvas.
Na Bacia do São Francisco, temos o mesmo problema. Ordenamos a redução de vazão em Sobradinho, mas isso foi feito em conjunto com o Comitê de Bacia. A mesma coisa fizemos em São Paulo, com os Comitês de Bacia e os usuários. Se não tivéssemos reduzido a vazão em Sobradinho, estaríamos usando o volume morto agora também.
O Nordeste é muito crítico. Eu já falei daquela condição de não ter reservação natural em aquífero. Hoje em dia, para nós, um dos piores é o Ceará. Temos um valor muito baixo no reservatório do Ceará e em Pernambuco. Eles estão bem baixinhos. Isso pode levar a um colapso se não houver aumento de chuvas e se não houver racionamento.
Esse gráfico acompanha a evolução dos sistemas de reservação dos Estados. Vejam que há uma queda desde 2012. Houve uma subida só na Bahia.
A Bahia era o Estado que mais nos preocupava até 2013. A seca dele começou em 2011. A seca severa foi mais ou menos em 2012. Mas houve chuvas no interior da Bahia que aumentaram o nível de um grande reservatório, Pedra do Cavalo, que abastece a porção sul da Bahia. Então a gente teve como se fosse um certo alívio; mas as demais caíram muito.
R
O Epitácio Pessoa é um reservatório emblemático. Quase todos os grandes reservatórios do Nordeste tiveram esse comportamento. A gente teve armazenamento e, de 2012 para cá, com a seca, queda abrupta. É uma queda tão descendente que é como se não tivesse chovido nos últimos três anos, de tanto que desce. Ele não sentiu as chuvas que houve, de tão poucas que foram.
Bom, dentro do Governo Federal, a gente tem um comitê de doze Ministros, a gente se reúne periodicamente, os Ministros numa frequência menor e nós técnicos toda semana, para discutir o que é feito para cada Estado. Nós estamos auxiliando Estado a Estado, até por conta do pacto federativo. Todo mundo tem uma legislação estadual de recursos hídricos e elas têm que ser obedecidas. E essas são as linhas principais de apoio do Governo.
No plano do Ministério do Meio Ambiente, tem a Agência Nacional de Águas e a gente exerce isso através da regulação. Em todos os Estados, principalmente no Nordeste, em São Paulo e no Paraíba do Sul, nós fizemos atividades de articulação com os comitês, com os Estados e Municípios, para diminuir as retiradas de vazão; e também com os setores dos grandes usuários, da indústria, da irrigação. A gente está diminuindo a outorga de todo mundo. E isso é feito negociado, não é imposto. E a gente está fazendo regras de operação mais restritas para os reservatórios do setor elétrico também. Lá existem linhas de apoio financeiro, através do PAC, do BNDES.
Esses foram os pedidos de obras do Rio de Janeiro feitos ao Governo Federal. Deles o mais relevante é o Sistema Guandu, que abastece mais da metade da região metropolitana do Rio de Janeiro. É um manancial. Há uma transposição do rio Paraíba do Sul para ele, são 60 m³ por segundo, só que uma grande parte dessa vazão é para diluir o esgoto que chega através de três rios nessa área aqui onde fica a captação que vai para a região metropolitana. Vem Poços, Queimados e mais um terceiro do qual esqueci o nome. Eles vêm do Distrito Industrial, da Baixada Fluminense. Então, para diluir o esgoto você tem essa grande adução de água. Essa adução não foi feita por causa disso. Na década de 50, isso tudo foi construído pelo setor elétrico, só que como existia disponibilidade de água, o Rio de Janeiro começou a tomar água para abastecimento público. Essa transposição era do setor elétrico.
Então nós estamos financiando uma obra que vai aumentar uma barragem aqui, que segura esses três rios, vai ter um canal subterrâneo aqui, para jogar essa água poluída mais à frente e vai diminuir a necessidade de diluir essa água. Então, eu posso diminuir essa pressão sobre o Paraíba do Sul.
Ao mesmo tempo, isto aqui é a foz do Guandu, no São Francisco, no Paraíba do Sul, no Guandu, em diversos rios que diminuíram a vazão no ponto de contato com o mar, porque o mar entra. É o que a gente chama de avanço da corrente salina. Quem capta a água, quem pega a água salina não estava... Nenhum sistema de tratamento foi feito para tratar a água salina. Então, os sistemas ficam inviáveis, não se consegue mais captar a água. São várias cidades.
No caso do Guandu, a gente autorizou um excesso de água para empurrar de novo a corrente salina, mas o São Francisco também, Sobradinho e Xingó, todo mundo está soltando água para deter o avanço, justamente para favorecer essas cidades que estão na beira do mar.
Nesse caso aqui não tem mais como fazer isso. Então as indústrias, sob uma articulação do Governo do Estado, fizeram uma barragem subterrânea aqui... subterrânea não, uma barragem submersa que diminuiu o avanço. É uma obra simples, barata, e por conta disso a gente vai economizar uns 10 m³ por segundo nessa região. É muita água para ser economizada.
Aqui são as obras de São Paulo. A mais emblemática, que ficou na mídia o tempo todo, foi uma transposição do Paraíba do Sul para um rio estadual que justamente leva para o Cantareira. A gente fez uma articulação entre os três Estados que acompanham a Bacia, os Comitês de Bacias, alguns usuários e vários órgãos federais para que isso fosse feito, mas isso só vai estar pronto em 2017.
Na ANA, a gente tem outras ações que não são só de regulação, mas são de informação. Então, tem o Atlas (Abastecimento Urbano de Água), que está sendo refeito agora e diz justamente sobre esse problema: Município a Município do País, qual o problema com o manancial, se ele tem que ser ampliado ou não ou se tem que buscar um novo manancial. E a gente está fazendo a mesma coisa agora para o esgotamento sanitário, porque lembra que eu falei que o problema de seca não é só chuva, é um problema também muito sério de qualidade da água.
Na ANA também, junto com a Integração Nacional,estamos fazendo um Plano Nacional de Segurança Hídrica. É um projeto que já começou no ano passado para garantir a oferta de água; e outra vertente é aumentar a resiliência das comunidades quanto aos desastres de origem hídrica que são seca e inundação.
A gente tem também um programa de revitalização de bacia, no Ministério; mas ele está sendo reformulado agora, pelo Governo Federal, a partir de uma decisão da Presidente, porque há muitas ações que têm de ser articuladas em conjunto, principalmente saneamento e controle de erosão, que não são exercidas pelo Ministério do Meio Ambiente.
R
Também temos um programa para comunidades no Semiárido, que é muito interessante, que a gente chama de Água Doce, que é tratar a água salobra salgada do poço, para a comunidade ter água potável através de um pequeno dessalinizador. Ele é mantido pela própria comunidade e o rejeito dele vai para uma estação não de tratamento, mas de criação de peixes. Então você passa a ter proteína animal e essa água que sai do peixe vai irrigar uma planta australiana que se chama Atriplex, que vive muito bem com o sal e retira cloreto de sódio do solo, porque o cloreto de sódio estraga o solo, não é?
Bom, passei um pouquinho, mas ficam a apresentação e as perguntas.
Obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Passo a palavra ao Sr. Luis Alberto de Mendonça, do Ministério da Pesca.
Você também tem apresentação?
O SR. LUIS ALBERTO DE MENDONÇA SABANAY - Não. Aqui é a minha discussão.
Bom dia a todos e a todas.
Senadora Regina Sousa, parabéns pela Comissão de Meio Ambiente e a iniciativa do debate sobre a questão da crise hídrica. Para nós, como o Marcelo terminou com peixe, eu vou começar com peixe. Certo?
Quero cumprimentar os meus companheiros de Mesa: o próprio Marcelo, o Antônio, a Luz; o Senador Donizeti, com quem eu tive o privilégio de estar na semana passada, num debate da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária no Estado dele: Tocantins.
Discutindo o peixe, Senadora, temos que dizer que a água é intrínseca ao nosso sistema de produção. E toda crise vai impactar sobre um novo sistema produtivo brasileiro que tem tempo de experiência, mas de fato, como política pública no País,foi consolidada a partir de 2003; e em 2009 tivemos a criação do Ministério da Pesca e Aquicultura, pelo então Presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
E para iniciarmos esse debate, eu não vou entrar nas considerações mais técnicas e gerais porque a obviedade está colocada inclusive pelos gráficos que o Dr. Marcelo apresenta na sua exposição. Mas olhando para São Paulo, nós já tivemos um impacto significativo na produção da nossa aquicultura continental, com a diminuição das águas dos reservatórios aos quais nós temos acesso para a utilização na produção.
Então, a perdurar essa mesma lógica, principalmente com a questão das mudanças climáticas, que é o maior impacto, na verdade, no recurso hídrico para o setor produtivo que atinge oceanos e águas continentais, nós temos essas questões do modelo de desenvolvimento que temos vivido nesses últimos 50 anos, que precisa ser colocado em pauta, principalmente o adensamento demográfico das cidades, a exemplo da minha cidade que é Florianópolis, em Santa Catarina, Senadora, que tem a maior produção de moluscos bivalves do País, responsável por 78% da produção nacional.
É uma ilha. A cidade aumentou, a população aumentou, e uma das questões centrais para o desenvolvimento da produção em águas brasileiras é ter qualidade de água. Eu não posso ter água ruim. Se tiver água ruim não tem peixe ou não tem comida.
Então, o principal debate que se faz em Florianópolis é o saneamento básico, porque impacta diretamente nas bacias nossas, principalmente nos lugares de produção que estão ao sul da ilha de Florianópolis, que é a produção de moluscos.
Se a qualidade de água que vai ser despejada nesses lugares não estiver adequada, obviamente eu vou ter uma consequência objetiva no impacto da produção daquela região. Então isso é fundamental no conceito geral do debate do Ministério da Pesca e Aquicultura.
Eu considero o impacto das mudanças climáticas, tanto nos oceanos quanto nas águas interiores... O comportamento do recurso, a escassez, e nos oceanos também o aumento de acidez, a mudança no comportamento dos biomas, do ecossistema, a mudança do comportamento dos estoques pesqueiros... Óbvio, não é só a crise da diminuição da água, mas aquilo que de fato, de um modo geral, impacta sobre o recurso.
Então, o que nós ponderamos nessa discussão? Essa questão do modelo de desenvolvimento não pode ser a qualquer custo.
R
O Brasil tem um grande potencial de desenvolvimento do setor pesqueiro brasileiro, tanto a aquicultura como a pesca. Ainda que a pesca tenha o seu estoque controlado e o recurso não seja abundante pelos nossos oceanos, ainda há, dentro da política, pelo que estamos constituindo, principalmente num plano de ordenamento e de manejo, de extração do recurso natural que seja de forma sustentável, ainda há um grande espaço para a produção do alimento, do pescado brasileiro, na pesca extrativa. Digo isso tanto na costa quanto no continente brasileiro. E a aquicultura como sendo de fato a ferramenta para o aumento da produção da proteína animal.
Diferente dos outros sistemas pecuários, a aquicultura basicamente deve ter esse controle. E nós temos hoje, no critério de desenvolvimento da aquicultura, a prática do licenciamento ambiental, que já é uma regra segura do ponto de vista da sua consequência, do seu objetivo, do que está no objetivo do nosso desenvolvimento, uma produção altamente sustentável para o setor da aquicultura. Tanto é que nós regulamentamos, desde o início, a utilização dos copos de água para a produção de aquicultura em 1% do total do recurso. Sabe-se no mundo que pode-se utilizar até 4%. E nenhum dos nosso projetos de desenvolvimento de aquicultura chega a 1% de ocupação do espaço.
Então há impactos? Obviamente há, porque é um recurso externo que você implanta dentro da natureza, agora é de baixo impacto, com toda a certeza, para essa questão. E a exigência que nós fazemos, no monitoramento do controle da água para a produção de aquicultura, de fósforo, daquelas coisas todas que são colocadas como elementos de identificação da qualidade da água, é fundamental para o que nós vamos subtrair depois, que é o produto da aquicultura.
A segunda grande questão que nós queremos colocar do cultivo da aquicultura. Nós criamos... Nós apoiamos, na verdade, uma iniciativa da Unesp, uma rede de sustentabilidade que inclui quase 38 pesquisadores e 15 instituições nacionais que estão responsáveis por levantar as condições de qualidade de água, a questão da boa utilização do recurso hídrico e também de uma forma coordenada fazer a pesquisa da eficiência da utilização do recurso hídrico para a produção do setor de aquicultura.
Nós temos um terceiro exemplo que colocamos, que é o planejamento do desenvolvimento da aquicultura no Estado do Maranhão, que envolve os apicuns e os salgados. É um bioma essencial que no Código Florestal foi muito debatido; e temos uma responsabilidade muito grande sobre esses recursos. Mas também existem populações que sobrevivem... e não são poucas pessoas que sobrevivem da extração desse alimento, principalmente do caranguejo e de outros produtos, da carcinicultura e do seu desenvolvimento nessa região.
Nós temos que regular a boa utilização do recurso. E o plano de desenvolvimento desse setor no Maranhão, da carcinicultura, tem sido um exemplo para nós, porque os cientistas analisam os impactos do contorno da produção e propõem elementos reguladores que deem conta de fazer com que essa produção seja sustentável. É um exercício analítico muito importante que nós temos; são dois exemplos entre tantos outros que o Ministério da Pesca e Aquicultura tem apoiado ao longo desses anos.
Agora, o que de fato o MPA observa em termos de futuro, com o que eu gostaria de contribuir em relação à proposição em debate nesta Comissão?
Nós temos que investir, ampliar o investimento em pesquisa, desenvolvimento, inovações e tecnologias que otimizem a utilização dos recursos, como mostrou o Dr. Marcelo ali. Aproveitar a água para o consumo humano, aproveitar a água para a adubagem de lavouras, o que é possível acontecer; principalmente quando tem peixe há uma presença muito forte de adubo natural, que pode ser potencializada; há a utilização para a produção do pescado e outros tantos... E nós temos uma pesquisa desenvolvida na Furg, no Rio Grande do Sul, que aproveita a água em até seis meses, no mesmo sistema para a produção, que é um exemplo importante a ser considerado aqui.
R
A segunda questão é ampliar a pesquisa da rede de sustentabilidade para o monitoramento do recurso hídrico, a diminuição e a sua reutilização, que eu acho fundamental.
À similaridade do Ministério da Agricultura, que teve uma iniciativa muito interessante, que é a agricultura de baixo carbono, nós precisamos também implementar sistemas de controle e monitoramento e também políticas e tecnologia para uma pesca extrativa que tenha essas considerações do baixo carbono como critério e como um plano de desenvolvimento nacional, associado ao ordenamento, ao monitoramento, ao plano de manejos no recurso natural.
Há outra questão que é a água da chuva. É um recurso em que nós temos que nos aprofundar. No caso nosso da produção, temos esse mapa de uma seca sistêmica que há no noroeste do Rio Grande do Sul, oeste de Santa Catarina, sudoeste do Paraná, que perdura há alguns anos e é um dos lugares de maior produção de aquicultura daquela região do Sul do Brasil. Nós temos já aqueles chiqueiros de suínos, de aves, utilizados como uma ferramenta de reaproveitamento do recurso, que tem sido aplicado para o desenvolvimento da aquicultura.
Obviamente, nós temos essa questão da preservação dos mananciais, das florestas, do controle desse processo da expansão de um programa de desenvolvimento da agricultura e da pecuária brasileira que precisa ter esse horizonte em vista. Não dá para fazer uma expansão de qualquer forma.
Para nós, as matas ciliares dos rios, dos mananciais são fundamentais. A caracterização da conservação desses sistemas garante para nós um recurso adequado, com qualidade, em que a produção pode ser desenvolvida de alguma outra forma.
Do ponto de vista de curto, médio e longo prazo, o que eu colocaria em perspectiva para o desenvolvimento do setor pesqueiro brasileiro, envolvendo tanto a produção quanto a extração? A primeira grande questão é que nós temos que, no nosso caso do desenvolvimento, partir para além dos estudos dos recursos naturais que ainda não são totalmente conhecidos. E nós temos que aprofundar como podemos utilizar isso de forma inteligente, esse processo do recurso natural pesqueiro no Brasil, porque não é só a utilização da água.
O peixe, por exemplo, Senadora, pode servir para o alimento, pode servir para combustível, os seus restos. Há as algas, que podem ser vetores de meio ambiente. Principalmente em águas que estão muito sujas, elas também podem ser aproveitadas para uma série de questões e para desenvolver um sistema de controle de vetor ambiental.
Nós temos que trabalhar o zoneamento da pesca e da aquicultura em que incluamos no processo uma análise de risco rigorosíssima, para garantir a viabilidade da produção, considerando as mudanças, considerando a escassez do recurso hídrico, que é fundamental nesse processo. Um planejamento para o desenvolvimento que evite a concentração. Nós precisamos ter essa lógica em perspectiva, para garantir a sustentabilidade do futuro do sistema produtivo brasileiro.
Eu vou fazer uma comparação que fiz lá no Tocantins. Em um hectare de terra e pasto e boi, proteína animal, na melhor performance, eu consigo produzir 700kg em três anos. No mesmo hectare de lâmina d'água em tanque escavado, eu consigo produzir, em seis meses, 16 toneladas de proteína animal, olhando a tilapinha que você apontou ali, Marcelo. Está certo? Um hectare de pasto, proteína bovina, 700kg em três anos. Em seis meses, no mesmo hectare, com água, eu consigo 16 toneladas de produção de pescado.
Então, é pouco espaço. E se não adensar, a reutilização do recurso pode ser feita, e nós temos um alto impacto no sistema produtivo brasileiro.
R
Dentro da pesca, precisamos ter uma pesca seletiva, não concentrada, diminuir o esforço, qualificar a intervenção dos sistemas de pescarias, que têm baixo impacto nos recursos naturais, no meio ambiente e na sua totalidade, mas que são elementos em perspectivas para o desenvolvimento brasileiro.
O zoneamento pesqueiro, o zoneamento aquícola, um plano de zoneamento para o desenvolvimento são fundamentais, por quê? Porque mantém as populações produtivas nos seus espaços e evita, por exemplo, a migração e a concentração nos grandes centros urbanos, que é um dos grandes problemas para a questão da escassez do recurso hídrico, mantendo uma atividade rural sustentável.
Aliás, quero considerar isso neste debate, já finalizando a minha intervenção. Tenho que considerar duas faces do mundo rural: o que tem a terra como seu insumo fundamental para a produção, para a vida, para a produção de alimentos etc., e outro que está na água, e com uma diferença fundamental. Qual é a diferença fundamental? A terra tem o seu estatuto privado.
Senadora, sabemos que o problema da pobreza... Tocando num problema que não é só do Brasil, mas a América Latina vive e tem superado ao longo destes últimos anos, falamos do grande problema da má distribuição de espaços. Está certo, Senadora? Se a terra tivesse sido bem dividida, Senador Donizeti, no começo da nossa história, não teríamos as concentrações e os bolsões de pobreza que vemos, porque há espaço para todo mundo. Então, essa atividade de regularização ou de redimensionamento da atividade do sistema fundiário é fundamental.
Mas a água, no Brasil, no nosso País, é um bem público, é um recurso público. Por isso, defendo, em absoluto, que a política de desenvolvimento de pesca e aquicultura e de produção e águas no nosso País necessita fundamentalmente de uma presença forte do Estado brasileiro, na conduta dessa política, e do Estado como um todo, na sua Casa de legislação, na sua ação executiva, na questão do Judiciário, porque a água em nosso País tem que ser tratada com essa natureza pública, com um alto controle social, porque é um bem de consumo humano e com múltiplo uso que precisa de uma responsabilidade na sua preservação, de forma bastante rígida e sistemática. Por que? Por causa das futuras gerações, do futuro do nosso País e do nosso continente.
E não dá para pensar em recurso hídrico sem pensar numa política integrada do ponto de vista continental. A mesma água que sai dos Andes vai para a Bacia Amazônica, que é o nosso grande potencial de desenvolvimento do pescado brasileiro. E temos um Ministro hoje, é o primeiro Ministro da Amazônia, que é o Ministro Helder Barbalho, que tem tentado projetar e ampliar como foco do desenvolvimento amazônico a questão do desenvolvimento do pescado, como também o de gelo na Antártica, no sistema, que tem impacto nos recursos hídricos do nosso País e do nosso continente de forma bastante intensa. Então, temos que pensar uma política continental para isso.
E encerro, aqui, agradecendo a oportunidade da participação do nosso Ministério da Pesca e Aquicultura neste debate, propondo que água e peixe devam estar sempre presentes na mesa de todo brasileiro.
Muito obrigado.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Convivam harmoniosamente.
Vou convidar o Senador Donizeti para dividir a Presidência, o requerimento foi nosso, e vou para o lugar dele ali assistir.
O SR. DONIZETI NOGUEIRA (Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Não, não precisa não.
A SRª PRESIDENTE (Regina Sousa. Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Vem, Donizeti, presida aqui um pedacinho.
Eu queria só cumprimentar, de novo, uma pessoa, o Barbosa, porque só depois da segunda olhada o reconheci, fomos companheiros de militância no Partido dos Trabalhadores. Bem-vindo. Prazer em vê-lo.
R
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Bom, estou vendo que a Senadora Regina está ficando numa posição em que qualquer hora escapa.
Então, agradeço a oportunidade, Senadora, fizemos este requerimento juntos.
Eu estava ouvindo aqui e penso que vamos chegar a um tempo em que vamos ficar no dilema: a cama ou a mesa. Ou lava a roupa de cama, ou toma banho, ou faz comida e planta. Mas não vamos chegar nisso não porque há uma solução.
Vamos passar a palavra para a Drª Luz Adriana Cuartas, que é Pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais.
Então, Drª Luz, estou fazendo uma equidade aqui. Já ouvimos dois homens, agora vamos ouvir uma mulher, para mudar a fonética no nosso ouvido.
A senhora tem a palavra, como os outros, por dez minutos; depois que tocar a campainha, quanto tempo precisar.
Antes, eu só queria dizer uma coisa que eu deveria ter dito, desculpem. No dia em que tomei posse aqui, no Senado, que foi dia 3 de fevereiro, sou Senador Suplente, no meu discurso, pautei esta questão da água como um tema que precisava estar na agenda: a defesa da água, a questão da crise hídrica.
Eu, que venho da agricultura de alta tecnologia, do agronegócio, por um bom período da minha vida, venho convivendo com esta questão da chuva, água, terra, agricultura, de longa data. E, na ação direta do homem na natureza, há o desequilíbrio, de certa forma, porque, na agricultura de cerrado, por exemplo - e vivemos no início dos anos 70, meados dos anos 70, 80, a expansão da agricultura no Cerrado, que foi um negócio que cresceu muito, porque a Embrapa desenvolveu tecnologia, variedades -, rapidamente, começamos a sofrer com o problema dos veranicos, que não eram comuns antes da agricultura naquela região, no Cerrado, agora tão frequentes; e com outro fator, que é um fenômeno chamado pé de grade, isto é, à medida que se vai praticando a agricultura naquela área, forma-se uma camada impermeável, a água bate e não consegue percolar. E o que ela faz? Duas coisas: leva a fertilidade da terra e assoreia os rios, os córregos, os mananciais. Então, uma das alternativas que havia para rebater isso era plantio em nível.
Estou dizendo isso, porque, agora, mais recentemente, fui a uma região do Rio Grande do Sul e vi que essa questão do plantio em nível foi abandonada. E, naquele dia, estávamos vendo lá, naquela feira, em Não-me-Toque, uma experiência de um cientista da Embrapa aqui, de Brasília, se não me engano, Dr. Jorge, em que ele mostrava a diferença de plantar em nível e não plantar em nível, em relação à melhor utilização da água.
Quero dizer, com isso, resumidamente, que, na verdade, o problema da água é de gestão, porque não vamos conseguir eliminar os períodos de estiagem assim, não há uma tecnologia para isso; aquele negócio de bombear as nuvens não deu certo. Então, não vamos conseguir resolver isso, mas amenizar, na medida em que tivermos uma utilização melhor dos recursos naturais.
R
Sendo assim, precisamos melhorar a gestão dos recursos hídricos que temos, pois só melhorando a gestão nós vamos conseguir dar longevidade à utilização desse bem tão precioso para a vida humana no Planeta.
Então, Drª Luz, é com você agora, para trazer as suas colaborações aqui para nós, nesta manhã, com poucos Senadores, mas com dois Senadores aguerridos aqui, de muitos anos de luta em defesa dos interesses do Brasil e do povo brasileiro, Senadora Regina e Donizeti Nogueira.
A SRª LUZ ADRIANA CUARTAS PINEDA - Obrigada, bom dia a todos, bom dia aos Senadores, agradeço o convite da Senadora Regina para participar desta audiência pública.
Aqui vou mostrar rapidamente... Como eu falei, venho do Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais, é um centro relativamente novo, nós fomos criados em 2011, infelizmente depois de uma tragédia, do desastre da região serrana do Rio. Então, a partir dali foi criado este centro. Os nossos objetivos são, principalmente, o alerta de desastres naturais, com relevância para a proteção civil e para dispor de capacidade científica e tecnológica para melhorar cada vez mais esses alertas para todo o território.
Então, o Cemaden opera 24 horas por dia, 7 dias por semana. Elaboramos e emitimos alertas principalmente sobre risco hidrológico e movimentos de massa, que são traduzidos como deslizamento de terra para Municípios monitorados. E nesse momento o Cemaden monitora 888 Municípios. Esses Municípios, normalmente, segundo o plano e gestão de riscos, são Municípios prioritários, a maioria deles. Prioritários por terem áreas de risco, tanto deslizamento quanto inundação. Já emitimos mais de três mil alertas desde 2011. Temos uma equipe multidisciplinar, com diversas áreas, e essa é mais uma estratégia. O Cemaden está aqui, nós fazemos monitoramento e alerta; e há o fluxo de informações que passamos. São muitas informações de diversos institutos estaduais, federais, por exemplo, Agência Nacional de Águas, CPRM, o INMET, Funceme e diversos outros.
Emitimos somente o alerta para o Cemaden e o Cemaden retransmite para as defesas civis, que aí fazem a parte da mobilização.
Como eu falei, dos tipos de alerta existem diferentes níveis. Então, dependendo do que foi observado através do monitoramento e o que o modelo pode prever, se faz uma análise, uma decisão, e a gente possui esses diferentes níveis de alerta. Então, após a observação, é que a gente fica no alerta moderado, alto, muito alto, quando o risco já é de um impacto forte do evento.
Aqui é o que eu falei, as nossas principais áreas de atuação para o alerta são deslizamentos, inundações graduais e bruscas e alagamentos urbanos severos.
E, nesse momento, estamos começando a fazer pesquisas de desenvolvimento para começar a dar alertas para o quê? Para incêndios florestais; e estamos trabalhando também na parte das secas.
Então, aqui é mais ou menos para se ter uma ideia; esses aqui em vermelho são os Municípios que estamos monitorando, alguns prioritários, outros não. Essa é a nossa rede de observação de pluviômetros automáticos instalados, que enviam informações a cada dez minutos das chuvas. Temos também medidores de sensores de nível de rio. Obviamente contamos com toda uma rede de monitoramento no Brasil da Agência Nacional de Águas, do INMET e todas essas informações nós recebemos para poder ter um alerta e monitoramento melhor do País.
Temos também... O Cemaden instalou radares, principalmente, como o Dr. Marcelo mostrou, nas áreas mais densamente populadas, que são nestas regiões aqui, e obviamente também contamos com o apoio dos outros radares de diversas instituições para fazer o monitoramento. Então, vemos, por exemplo, que temos um grande vazio neste ponto aqui.
Agora, só para mostrar, vamos começar com as partes das chuvas, do monitoramento. Aqui vamos mostrar as chuvas do Brasil na estação chuvosa, de outubro de 2013 a 31 de março de 2014, que foi a do ano passado, e comparado com a desse ano, quer dizer, outubro de 2014 a março de 2015.
Então, vemos claramente aqui, em tons de laranja, vermelho, que choveu bem menos do que o esperado e, em tons de azul, acima da média do esperado. E vemos claramente aqui na Região Sudeste as áreas secas, grande parte aqui do Nordeste, porém, acho que muitas pessoas ainda não perceberam, neste ano, nesta última estação chuvosa, vejam no Brasil como um todo.
R
Então, tivemos chuvas, realmente, bem abaixo da média para todo o Brasil. O Sudeste melhorou um pouco, mas muito pouco, vejam aqui agora nesta mancha. O Nordeste também foi, só que nas regiões que tiveram um pouco de chuva mais acima da média, no Sul continua tendo, mas o Estado de Minas Gerais, estão vendo, bem abaixo do esperado.
E esta é a comparação, principalmente já para o Sul, na Região Sudeste, que foi a estação de chuvas 2013/2014, comparada com a deste ano agora. Então, estão vendo o núcleo estava bem aqui nestas áreas, aqui está a parte do Cantareira, concentrou-se mais aqui, este ano foi um pouco melhor, porém, ainda abaixo da média.
Então, aqui mostrando, o Dr. Marcelo também já mostrou, o sistema de abastecimento, e estas são as condições dos reservatórios que abastecem a grande São Paulo no final da estação chuvosa, 31 de março. Aqui em 2013, 2014 e 2015. E como ele mostrou, realmente estamos no negativo no Cantareira. Então, como ele era um dos maiores, agora o Guarapiranga está ajudando, mas ainda assim o Cantareira e o Alto Tietê são os maiores reservatórios.
E nesta época, quando chegamos ao final da estação chuvosa, com 13%, aí o Cemaden falou: "Bom, vamos verificar e começar a monitorar quanta chuva está caindo lá no sistema". Acontece que quando fomos olhar e estudar, percebemos que havia um vazio de monitoramento nesta região.
Essas são as quatro sub-bacias, essa é a bacia principal, a maior, que é o principal reservatório Jaguari e Jacareí, em preto; não sei se dá para diferenciar, são os pluviômetros do DAEE/SAISP que fazem o monitoramento da chuva no histórico. E, aqui, não tinha nada, e o Cemaden, no final de abril e início de maio, instalou 33 pluviômetros automáticos do mesmo sistema, eles enviam informações a cada 10 minutos, quando está acontecendo.
Além das informações históricas, agora, com os novos dados, começamos a monitorar e estudar a bacia como um todo. E, bom, esse o Marcelo também já mostrou, a situação crítica, como que estava ontem, na verdade, anteontem, esse seria o 15,3%, considerando todo o volume. O volume útil mais os dois volumes mortos, as duas reservas técnicas. Então, realmente, ainda está muito crítico, mas, além do monitoramento para podermos dar um alerta, nós precisamos saber o que vai acontecer para o futuro. Então, para isso nós implementamos um modelo hidrológico, que é um modelo hidrológico relativamente simples, faz um balanço, quanto que chove, quanto que vai evaporar, quanto que vai ficar no solo, quanto que vai para o lençol freático, que eventualmente vai abastecer a parte das vazões mínimas, e o que vai para o escoamento.
E, obviamente, o que acontece? Todo mundo sabe, a maioria das pessoas sabe, é impossível prever chuva com vários meses de antecedência. É uma realidade hoje na meteorologia dos modelos que é complexa. Então, não conseguimos, o máximo que conseguimos prever é para um horizonte de sete dias, o máximo de dias, de quanto vai chover, onde e como. Para meses não conseguimos ter essa informação.
Então, o que podemos fazer? Criar cenários. Falar: "Bom, se chover na média, 25%, 50%, acima ou abaixo dessa média do esperado, o que vai acontecer?"
Então, aplicando o modelo, como o Marcelo mostrou, essas são as médias, em preto, é a vazão afluente para todo o sistema, ou seja, somando todas as afluências para os quatro reservatórios.
E, aqui, é observado neste ano, 1953, como ele também falou, era considerado o mais seco; agora 2014 está aqui.
E essa foi uma simulação que fizemos no dia 1º de junho, segunda-feira. E, aqui, este valor é o que foi observado em 1º de junho. E, aqui, estes são os diversos cenários, o que é que vai entrar no sistema, dependendo da chuva que vai chegar. Então, por exemplo, se chover na média, vamos estar, praticamente, no mesmo patamar de 1953. E se tivermos o pior cenário? Que seria 50% abaixo da média, estaremos bem próximos de 2014 novamente.
Então, isso é mais ou menos o que nos mostra. E, obviamente, além de saber quanto que vai chegar no sistema, também vamos querer saber como que vai ficar o reservatório, quanto que vai ser o que está armazenado dependendo destes cenários. Então, aqui, dependendo destes cenários, vemos, por exemplo, aqui, no final da estação seca... Então, ainda não vai ser possível. Nem chovendo no cenário mais otimista, ele vai conseguir recuperar o volume morto, ainda estamos abaixo. Está vendo o zero, aqui, nos volumes? O volume útil, aqui abaixo o volume morto.
R
E, continuando, fizemos essa simulação até 31 de dezembro de 2015, e essas seriam as diversas porcentagens, obviamente, aproximado, é um modelo. Mas é mais ou menos as condições que poderíamos chegar no final do ano. Sendo que, se vocês veem aqui, em 31 de dezembro de 2014, estava com 0,6%; então, no pior cenário, chegaria a 9,3%.
Isso se consideradas as afluências e, obviamente, as saídas, o que está sendo extraído do sistema, esses valores foram acordados, informados pela ANA, pela Agência Nacional de Águas e o DAEE. Então, estamos considerando esses valores de referência para nossas simulações.
Esse relatório, esse trabalho foi desenvolvido...
(Soa a campainha.)
A SRª LUZ ADRIANA CUARTAS PINEDA - ... ao longo do ano passado. Sempre fomos informados, e sempre se foi informado para a Casa Civil, Ministério da Ciência e Tecnologia, e nos reunimos, também, com a Agência Nacional de Águas. A Sabesp, não tivemos muito sucesso. Mas o relatório é atualizado semanalmente na página do Cemaden, então ele está público, tem essas e outras informações, é completo, umas 12 páginas, ele acompanha tudo.
Normalmente, periodicamente, também, conversamos com a Agência Nacional de Águas; então, essa é a nossa contribuição, neste momento, que, além do monitoramento, mostrar os possíveis cenários do que vai acontecer.
Também, fomos demandados, pelo Cemaden, a começar a fazer um monitoramento, uma noção, tentar fazer aquele cenário para alguns reservatórios da parte hidrelétrica. Então, começamos a fazer o trabalho para Furnas, temos alguns pluviômetros, poucos, do Cemaden.
Aqui, também, começamos. Mas esse ainda foi rodado em 25 de maio, tem um buraco aqui, é mais ou menos. Esse trabalho ainda está em andamento e estamos, também, nessa mesma linha, tentar fazer cenários, projeções de como vão ser as vazões afluentes para esses diversos reservatórios. Esse seria para Furnas. Emborcação, como falei. Também estamos aqui, estamos em desenvolvimento, estamos na fase ainda de calibração do modelo.
Bom, seca do Semiárido nordestino. O que estamos fazendo, também, é a parte do monitoramento. Aqui vemos as chuvas, alguns anos anteriores com chuvas, esses são os mais recentes, agora. Esses valores aqui são os anos mais secos. O azul mais escuro são chuvas quase acima de 800mm. Esses aqui são em torno de 60, 160mm, valores muito baixos de precipitação.
E aqui a condição, agora, dos últimos 30 e 90 dias. Então, aqui o acumulado é 30 dias, agora em maio. Então, esses Municípios tiveram somente 30mm de chuva. Então, 514 Municípios, com precipitações, acumularam, nos últimos 30 dias, menos de 30mm, muito pouca chuva.
E nos últimos 90 dias, 98 Municípios, com precipitações acumuladas, menores que 100mm. Então, realmente, muito pouca água. Essa seria a precipitação para os diferentes Estados e, acompanhando o acumulado, desde outubro a setembro, considerando o ano hidrológico, é o início, mais ou menos, das chuvas. Então vemos, também, aqui, realmente, pouca chuva para muitos, o Ceará, aqui, também, pouca. Aqui a Paraíba. Então, realmente, o panorama está difícil.
Aqui, nessa parte, nós que estamos fazendo agora, também, a parte do risco agroclimático. Principalmente, a parte de abastecimento, na que está acompanhando, a Funceme, também, para o Ceará. E nós estamos tentando focar mais na parte da agricultura, da pequena produção. E aqui vemos, por exemplo, que o norte da Bahia está bem grave, então, em números de dias, o déficit é de mais de 75 dias, está muito alto. Aqui, número de dias com déficit, 60 a 75 dias com déficit hídrico, alto também. Então, esta região está bem difícil.
E amenizou um pouquinho aqui no sul, um pouquinho aqui na Bahia, por conta da chuva no final. Estão vendo? A avaliação está sendo de abril de 2015 a maio.
R
Abril foi bem ruinzinho, estava bem seco aqui. Aqui melhorou um pouquinho, agora, em maio. Mas há bastantes locais que estão, realmente, muito secos.
Aqui, nessa parte, seria a avaliação do impacto em áreas agrícolas e pastagens, principalmente.
(Soa a campainha.)
A SRª LUZ ADRIANA CUARTAS PINEDA - Então, a região do Semiárido, dos últimos meses, afetada pela seca, em porcentagem, outubro, novembro, nos últimos anos. Esse foi atualizado em maio, principalmente.
E aqui vemos, de abril para maio, aquilo que estávamos falando, então, por exemplo. O Ceará está em uma situação realmente crítica. Cinquenta e três por cento do Estado está afetado pela seca. A Paraíba também está bem crítica.
Bom, esses são trabalhos que estão em andamento, estamos tentando criar índices de vulnerabilidade para esses impactos da seca. Então, através de informações socioeconômicas e aspectos ambientais que nos permitam juntar e avaliar quais seriam as áreas mais vulneráveis para essa seca, em função da população, da atividade econômica, agrícola e tudo mais.
E, também, está sendo desenvolvido o Sistema de Previsão de Riscos de Colapsos de Safra no Semiárido brasileiro, esse é um dos trabalhos que estão sendo feitos lá. A princípio eu falei, nosso foco está mais nessa parte agrícola, agora. E nesse caso as culturas principais são feijão, milho, sorgo, mandioca e arroz. Então, esses são trabalhos que ainda estão em desenvolvimento.
Aqui, só para mostrar, com relação à parte da previsão climática, e explicar um pouco aquilo que estava falando com relação, também, às mudanças climáticas. Essa previsão climática é feita mês a mês e é feita para os próximos três meses, para saber o que pode acontecer nos próximos três meses. Porém, ela não dá a quantidade de chuva, ela só pode dar se vai chover acima, abaixo da média, ou na média. É essa a previsão climática.
E aqui, nessas áreas, então, por exemplo, nesses aqui, em verde, vai chover acima da média, nesses, abaixo da média. E nas áreas em cinza não se tem previsão, não se sabe o que vai acontecer. Então, praticamente, o Brasil. E essa foi uma previsão de dezembro a fevereiro de 2014. Aí depois, janeiro, fevereiro e março de 2014, também não se sabia. Agora, também, novembro, dezembro e janeiro de 2015, não se tinha a previsão, principalmente, para essa região, tampouco a gente tinha para o Nordeste.
Então, é bem complicado. E essa é a última previsão, que é agora, junho, julho e agosto de 2015, só para mostrar um pouco de previsão aqui, aí se espera que chova um pouco abaixo da média aqui, no Norte do Brasil, e nessas regiões um pouco acima da média, mas nessa grande área não se tem previsibilidade. Por quê? Porque como eu falava, agora estamos em uma época de eventos críticos, eventos extremos, e que estão associados principalmente às mudanças climáticas que estamos vivenciando.
Então, infelizmente, nossos modelos meteorológicos hoje não estão conseguindo lidar com esses tipos de fenômenos que nunca tinham sido observados. Então, essa era a nossa...
Bom, aqui é só, vou deixar para vocês. Aí, depois, as perguntas.
Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Obrigado, Drª Luz, pela sua excelente contribuição.
Nós vamos agora ouvir aqui a contribuição do Sr. Antônio Gomes Barbosa, Coordenador Nacional do Programa Uma Terra e Duas Águas, pelo tempo necessário.
O SR. ANTÔNIO GOMES BARBOSA - Queria cumprimentar o Senador Donizeti; cumprimentar, também, a Senadora Regina Sousa, Senadora do meu Estado de origem. É um prazer estar aqui, inclusive.
Queria começar dizendo que o debate de crise hídrica no Semiárido já é um debate bem antigo. Na verdade, esse é um debate bem histórico. A gente queria, talvez, passar um pouco pela experiência que o Semiárido tem hoje nessa perspectiva de convivência com esse fenômeno.
Ali é um mapa comum, um mapa do Semiárido, falando um pouquinho sobre a extensão do Semiárido, o tamanho da população; nós estamos falando de uma população considerável em relação à população brasileira, que envolve nove Estados; não apenas os Estados do Nordeste, mas, inclusive, o Norte e o Vale do Jequitinhonha, lá em Minas Gerais.
R
Seca é a única coisa que naquela região é possível prever. Euclides da Cunha dizia que se há uma coisa que é previsível é a seca no Semiárido, e é importante trabalhar basicamente esse dado. Nós temos uma seca que começou em 2010, deu uma melhorada em 2011, mas volta e a gente considera a partir de 2010 a 2015. Mas é importante dizer que da chegada dos portugueses aos dias atuais, há um registro de 72 secas, 40 anuais e 32 plurianuais, das quais uma é essa, e ali há anos. Há algumas coincidências, inclusive, em relação a 82, 52, 32 e 2012; basicamente são ciclos de 30 anos, nós estamos falando de grandes secas.
São emblemáticas duas outras questões. É emblemático a gente estar discutindo em 2015 a crise hídrica, quando em 1915 nós tivemos uma grande seca no Nordeste, uma grande seca registrada, inclusive, por Raquel de Queiroz no livro chamado O Quinze, que dá conta até da quantidade grande de pessoas que morreram, ou seja, esta é uma situação bem triste.
Esse é um quadro bem conhecido, ele retrata basicamente três secas. Aquele primeiro é de uma seca que aconteceu em 1878, de uma página de um jornal chamado O Besouro, que dá conta inclusive de retratar a parte do que significa a região. E a gente tem logo abaixo ali um trilho, um conjunto de pessoas mortas, parece ser de outro lugar, mas isso aconteceu também no Nordeste, isso é no Ceará, na região de Senador Pompeu, que dizem que as pessoas, para escapar da velha do chapelão, então estamos falando ali da seca de 32. E ali em cima um retrato da seca que aconteceu em 79 e terminou em 83, que é, inclusive, um retrato do meu Estado do Piauí, de famílias que precisavam comer ratos para matar a fome.
A revista Veja, em 1993, dizia que o problema do Nordeste não era a falta de chuvas. Tem que se considerar algumas questões, mas uma das coisas que se dizia era da falta de infraestrutura. Pela quantidade de água que caía, perdiam-se 92% por falta de lugares para armazenar essa água.
É importante dizer isso porque o Semiárido hoje vive uma outra perspectiva, ele vive uma outra relação, e essa outra relação levou em consideração alguns outros elementos, e eu queria partir deles. Uma das situações é que as soluções quase sempre estão no próprio lugar, então existe um esforço muito grande no sentido de encontrar grandes soluções e procurar saídas em outros lugares e, muitas vezes, a solução está no próprio lugar; é importante reforçar isso.
É importante dizer também que, muitas vezes, a solução é algo pequeno, simples, não é tão complexa, e a gente quer construir soluções que sejam mais complexas, mais caras, então é importante partir disso. É preciso fazer um esforço imenso no sentido de identificar, e já existe no Brasil um conjunto de iniciativas não apenas no Semiárido, mas em várias outras regiões do País, no sentido de soluções simples para resolver inclusive situações de crise.
A outra coisa é que a solução precisa ser para todas as pessoas, não se pode fazer nenhum debate no sentindo de dizer: olha, nós precisamos resolver o problema de 20%, de 30%, de 50% e de 80%. A crise hídrica é intensa, mas ela afeta muito mais determinados grupos em detrimento de outros grupos. E a outra é que as pessoas não querem só assistir, elas precisam participar da solução. Eu acho que é importante, inclusive, trazer essa perspectiva para o Senado, valorizar essa audiência para esse debate. Ou seja, as pessoas não querem simplesmente assistir ao problema, elas também querem participar da solução.
Aqui há um conjunto de iniciativas em relação ao meio rural do Semiárido. São cisternas, cisternas calçadão, barragens subterrâneas, tanques de pedra, bomba d'água popular. Existem outras iniciativas como barreiras trincheiras, barraginhas, ou seja, existe um conjunto de iniciativas olhando para o Semiárido. Ali são números atuais, são números a partir da ação da ASA, a partir do programa da P1MC, nós estamos falando até o dia de ontem de 578 mil, um pouquinho perto de 579 mil cisternas de primeira água, 16 mil litros, isso construído exclusivamente na parceria da ASA, via P1MC, mas, na parceria com os Estados, o MDS, o Ministério tem falado de algo em torno de 1,1 milhão de tecnologias de captação de águas de chuva no Semiárido.
R
Se a gente levar em consideração que, dessas, algumas devem ser de polietileno, então nós estamos falando, de qualquer forma, de 850 mil tecnologias construídas no meio rural. E mais, ali nós estamos falando de 87, 88 mil tecnologias de captação de água de chuvas para produção de alimentos, e dados oficiais falam de 120 mil tecnologias construídas no Semiárido.
Nós estamos falando de uma população no meio rural de 1,5 milhão de pessoas, então nós estamos falando que desse 1,5 milhão de pessoas, um milhão têm água de beber e 120 mil têm água para a produção. Isso tem um impacto significativo, e é isso que vai, inclusive, fazer com que a gente entenda porque não conseguimos mais visualizar imagens como aquelas que a gente estava vendo anteriormente, de pessoas mortas, de relatos de pessoas saindo do meio rural, ocupando as grandes cidades, migrando, na grande maioria.
Nós vivemos no Semiárido um processo inverso; os últimos números do IBGE dão conta de que nós vamos fazer um processo agora em que a população começa a voltar para o Semiárido, então nós estamos em um processo de aumentar a população. O último censo já diz que o êxodo do Semiárido foi menor do que a média nacional, então a perspectiva é de que no próximo se tenha até um processo de inversão.
Esses são números, nós fizemos um levantamento de 80 mil famílias recentemente no Semiárido, naquele quadro, de famílias que poderiam ter sido abastecidas com carros-pipa. E a gente acredita que esse número talvez seja bem próximo da realidade se a gente considerar um milhão de famílias. Então, se a gente considerar um milhão de tecnologias, possivelmente 50% delas tenham sido abastecidas com carros-pipa nesse período e a metade não. Esse número, por si só, não diz muita coisa, porque se precisaria discutir qual a qualidade dessa água abastecida, já que só a metade recebeu e a outra não recebeu; mas a verdade é que hoje se tem uma malha hídrica que permite que as populações rurais do Semiárido não mais passem pelo que passaram anteriormente.
Obviamente discutir a questão hídrica não passa só por água de beber, ela tem uma perspectiva e um problema central que estão associados à questão do saneamento básico. Então, existe uma lei nacional de saneamento básico, existe um decreto que regulamenta o saneamento básico e que trata também de infraestruturas no meio rural. Acho que é importante. Aqueles são números dessa mesma pesquisa de abastecimento que dão conta de que 7,15% não têm energia elétrica no meio rural, ou que 15%, 18%, quase 19% não possuem banheiro e 28% não possuem fossa. Então, isso também impacta, obviamente, na qualidade da vida dessas famílias.
Mas, ao mesmo tempo, se a gente não tem essa perspectiva de uma grande seca ou de um grande sofrimento no meio rural, não significa dizer que a gente não tenha esse sofrimento no Semiárido. Acho que as apresentações anteriores aqui já dão conta disso. E onde ela é mais sentida hoje?
(Soa a campainha.)
O SR. ANTÔNIO GOMES BARBOSA - Ela é mais sentida hoje nas grandes cidades, nas médias cidades e nas pequenas cidades. Ali, inclusive, é o registro de uma matéria que circulou ontem na imprensa: Seca que atinge o Nordeste chega aos grandes centros urbanos. E ali um outra matéria que circulou no mês passado e que dá conta de que: Famílias sofrem com a falta d'água e com a seca no Nordeste. E eu queria fazer um registro de que na área urbana do Município de Salitre, na divisa do Ceará com Pernambuco, os moradores só têm água se for comprada pelos moradores no valor basicamente de R$100.
Nós vivemos uma inversão, e a inversão é a seguinte: antes as pessoas saíam do meio rural para conseguir água nas cidades. Hoje, no Semiárido, para conseguir água nas cidades, você precisa ir para o meio rural para dividir a água das cisternas, para dividir a água das tecnologias que ali estão.
Eu queria dizer que, no campo, no meio rural, obviamente, o nível de infraestrutura aí que está colocado, de cisternas e um conjunto de outras, não dão conta de resolver o todo, é preciso fazer um conjunto de outras iniciativas, mas hoje elas conseguem amenizar significativamente a situação no meio rural. E, por necessidade, possivelmente a gente consegue ter no Brasil a única experiência de infraestrutura descentralizada de abastecimento humano, que é a questão das cisternas, porque toda a nossa estratégia sempre foi a concentração de grandes obras. Então, quando a gente fala, fala nos grandes reservatórios, mas possivelmente a gente precisasse discutir para além dos grandes reservatórios, a gente precisasse discutir estratégias intermediárias, que resolvessem problemas de comunidades de Municípios, que resolvessem problemas inclusive de regiões.
R
E aí eu falo isso. E ao mesmo tempo em que falo isso é porque quero dar um destaque para a questão do Atlas produzido pela ANA, inicialmente conhecido como Atlas do Nordeste; a ANA refez basicamente esse estudo para todo o território brasileiro. Está ali. O Atlas, na verdade, tem proposta para 5.565 Municípios. Então, já existe todo um esforço de um conjunto de técnicos do Governo brasileiro, organizados na ANA, com contribuição de várias outras áreas. A gente avalia que esse é um documento ao qual pouco se tem dado importância e validade que tem.
Então se tenta construir um conjunto de outras iniciativas, quando já existe um estudo para isso, estudo inclusive que dá conta de diminuir a pressão sobre o Rio São Francisco ou sobre um conjunto de outras fontes.
Eu queria só fazer um registro em relação ao Atlas. Ele diz o seguinte, tem uma anotação aqui que 33% dos Municípios do Semiárido já estariam com suas demandas satisfatórias, 12% precisariam concluir obras para resolver isso, 7% são soluções que já foram definidas e precisariam concluir os projetos, inclusive, vão iniciar esse projeto; 39% precisam ter seus sistemas de água bruta ampliada, ou seja, as fontes já existem, mas elas precisariam ser ampliadas com um conjunto de obras, com limpezas, com tratamento basicamente disso. Estamos falando de abastecimento humano e, quando se fala em abastecimento humano, é importante considerar três situações: a fonte em si, o tratamento da água e o transporte dessa água.
Então, um dos grandes problemas que a gente tem é o transporte. Quanto mais perto for a fonte, quanto melhor for a forma de tratamento, quanto mais próximo das pessoas... e apenas 9% precisariam de novos mananciais. Isso com toda a crise que a gente vive. Acho que é importante dizer isso.
Então, requer uma política de obras de infraestrutura que não são tão caras, é importante... porque, normalmente, quando se fala assim dá ideia de que são obras muito caras. Aqui tem uma situação do Estado do Pernambuco, um dos Estados que tem uma das maiores deficiências hídricas, apontada inclusive pela própria ANA, e que é possível suprir a partir de um conjunto de demandas que já estavam aí colocadas.
Esse é um quadro que interessa muito, em especial para o Nordeste, porque é um resumo do Atlas do Nordeste, também do Atlas do Brasil, com valores atualizados em relação ao ano passado, que precisam ser atualizados, mas com níveis de investimento, dizendo para cada Município o que precisaria fazer, qual é a obra necessária, onde está a fonte; e nós achamos que precisaríamos avançar na perspectiva de valorizar, de conhecer e de discutir o Atlas. E discuti-lo a partir de cada Estado, discutir o Atlas a partir de cada Região, a partir de blocos de Município, porque o próprio Atlas organiza os Municípios a partir das fontes.
Acho que seria importante que a gente reconhecesse, conhecesse e avaliasse um pouco essa perspectiva.
(Soa a campainha.)
O SR. ANTÔNIO GOMES BARBOSA - Esse é um quadro, também produzido pelo Instituto Nacional de Meteorologia, que pega o conjunto das precipitações de 31 a 90. Estamos falando de um conjunto de secas, e o que a gente consegue perceber com esse mapa é que chove no Brasil.
Obviamente, o Brasil é um País... É até estranho para muita gente ouvir o Brasil discutir sobre crise hídrica, por quê? Porque é um País que tem uma oferta de água acima do que se tem em quase todos os outros lugares.
Mas pegando um dado aqui levantado, acho que pelo Dr. Marcelo, esse número de 200, é por isso que está ali em percentuais para a gente entender um pouco o que significa dizer isso.
Existe um desperdício muito grande da água. Não adianta só a gente discutir a ideia das fontes, precisa discutir, inclusive, o uso dessas águas; e ali a gente tem que de cada 200 litros dessa água, 27 são para o consumo, cozinhar e ingerir, que é beber água, 27 para higiene, para banho, escovar os dentes, 12% para lavagem de roupa, 3% para um conjunto de outros usos, inclusive lavagem de carro, e 33% em descarga das bacias sanitárias; ou seja, o maior uso que se faz da água não é...
Nós temos um desperdício de água de qualidade, porque boa parte da água que se usa é água potável, é água tratada, ou seja, teve todo um processo e um gasto sobre essa água e que coloca para a gente, talvez, dois debates: a importância da água de chuva... e estava sendo levantado. Mas não é um debate para ser só um debate da sua importância, ou seja, é um debate para a gente identificar o que significa dizer água de chuva.
R
Cidades. A gente viu a apresentação ali, em que você tinha dois quadros, ou seja, a mesma cidade que tem problema de água, de falta de água, tem problema de excesso de água.
Então, como usar essa água? Como guardar essas águas nos edifícios? Como guardar essas águas para esses usos, para lavar o carro, para jardinagem, para um conjunto de outras águas? Dependendo da região, essa água pode ser usada para o consumo humano, e em outras regiões precisa tomar mais cuidado. Talvez, a região de São Paulo e outras regiões mais contaminadas precisariam fazer um conjunto de estudos sobre a qualidade dessa água, mas é uma água que é possível ser usada, ser trabalhada.
Infelizmente, no Brasil apenas duas cidades têm leis municipais que tratam sobre o uso da água: Curitiba, com uma lei de 2003, e Campinas, com uma lei de 2005. Então, investe-se muito pouco nessa perspectiva. Seria importante avançar nesse campo. Conseguiríamos resolver grande parte dos nossos problemas.
Para terminar essa parte, dizer que o Semiárido é prova disso, o meio rural, o Semiárido é prova disso.
Até 15 anos atrás, se você olhasse para o Semiárido, era impossível você pensar em soluções de água para aquela região; e hoje nós somos possivelmente a maior experiência de produção de água de chuva do mundo.
Existe um conjunto de outras experiências, mas, na quantidade que a gente tem hoje, nós somos uma experiência relevante para resolver um problema social secular, que era o problema da fome, e um conjunto de outros problemas no Semiárido.
Queria terminar essa fala dizendo que o debate da água, para além dessas questões aqui colocadas, tem um problema da questão do acesso; e o acesso é diferente, não é igual para todo mundo. É preciso discutir o acesso. É muito estranho que, em períodos de grande crise, você ainda esteja usando água para irrigação.
O Brasil usa pouco, é importante dizer. O Brasil tem áreas poucas em relação à irrigação, mas é um processo caótico, que gasta muito mais água do que o necessário, que tem um desperdício muito grande nesse campo; muitas regiões não têm acesso à água. Faz-se seleção. Aleatoriamente, você tem bairros que recebem água e outros que não recebem e, normalmente, os que não recebem água são os bairros que têm mais problemas, que carecem... têm mais necessidade, que têm populações muito mais afetadas.
Há um debate sobre a questão da qualidade dessa água. Então, nós até temos água disponível, mas nós temos água que está contaminada; que está contaminada pelos agrotóxicos, está contaminada. Ou seja, nós temos as nascentes que estão contaminadas. Nós temos um problema seriíssimo em relação à Região Norte, uma Região que tem muita água, mas uma quantidade muito grande de água contaminada.
Há um debate da questão da gestão. Para terminar, é preciso valorizar um conjunto de iniciativas. Ou seja, as pessoas... Eu dizia anteriormente que elas querem participar; então, quando você discute com a sociedade o uso dessa água, como é que você consegue... quais são as prioridades que a gente precisa dar, a gente consegue construir uma outra perspectiva nesse campo.
São dados que a Senadora Regina Sousa levantava, que a ONU tem divulgado; ela já tinha levantado, anteriormente. Então, você fala em 1,7 bilhão de pessoas sem acesso à água potável, equivalente a 18% da população mundial; 2,2 milhões morrem a cada ano; e a gente saiu dessa estatística, é importante dizer isso. O Brasil saiu da estatística de pessoas que morriam por falta de água, e essa é uma contribuição importante que deve ser atribuída ao governo do Presidente Lula e da Presidente Dilma.
Até 2025, se for mantido o padrão de consumo e de poluição, 2/3 da população do Planeta poderá sofrer de escassez, e a previsão para 2050 é uma das piores possíveis. Ou seja, nós podemos construir uma outra perspectiva, nós temos caminho para isso, mas a gente precisa fazer esse debate de uma forma organizada, séria, e chamando todo o mundo para fazer o debate.
Esse não é um problema apenas dos governos, esse não é um problema apenas da sociedade, não é um problema apenas da academia dos cientistas, esse é um problema brasileiro, e nós podemos nos tornar referência. A exemplo do que virou o Semiárido brasileiro, o meio rural do Semiárido brasileiro, o Brasil pode virar uma referência de uso correto da água.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Obrigado, Dr. Antônio.
Vamos ouvir aqui algumas ponderações da Senadora Regina e, em seguida, ir para as perguntas. Em seguida, há alguns comentários e perguntas a fazer e, depois, nós vamos ouvi-los, novamente, para as conclusões finais. Aliás, as respostas às perguntas e as conclusões finais, considerações finais.
Senadora Regina.
R
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Então, o Barbosa lembrou bem... Eu chamo o Barbosa assim porque, depois que eu estive aí, não dá para chamar com o título. Era um menino e eu era quase tutora quando eles eram da juventude. Então, ele falou uma coisa interessante que é a questão do abastecimento no Nordeste, o carro-pipa, a cisterna. O carro-pipa não tem mais onde buscar água. O exemplo que eu dei lá, a Lagoa de Parnaguá, que abastecia quatro Municípios, está lá. Então, na próxima crise, no próximo aprofundamento da crise, nós vamos ter problema de achar água para carro-pipa, porque não temos cisterna ainda pra todo mundo.
Eu acho a cisterna uma tecnologia social perfeita que mostra a capacidade dos organismos não governamentais, porque foi uma invenção desse grupo que se articulou na ASA, na Articulação no Semiárido, e o Governo aderiu. Só que tem uma questão controversa no Governo, porque, de repente, em função de levar água mais urgente, mudou a concepção da cisterna.
A cisterna que a gente fazia nas nossas militâncias lá, de conversar com o povo, era a cisterna de placa, que é construída com mão-de-obra local, que educa as pessoas para o uso da água. Não é só construir a cisterna, eles são educados para economizar, tanto que vivem o ano inteiro com aquela água, não falta água de beber. A gente não vê o flagelo que víamos há 15, 20 anos atrás, que eram as pessoas desesperadas na frente das prefeituras, saqueando. Não tem mais isso. Tem as políticas sociais; mas também porque se garante a água de beber que é o nosso grande dilema desse momento: a água de beber.
E, então, inventaram uma cisterna de plástico que quando chega lá, já chega meio deformada por conta do sol que leva; e chega lá e coloca no lugar, fica levando sol, e tem muita queixa em relação a isso. E é muito mais cara.
Então, acho que a gente devia voltar, o Governo devia voltar à tecnologia da cisterna de placa de cimento, porque é muito educativa e é uma água gostosa. Adoro quando eu chego naqueles Municípios lá no sul do Piauí, que me servem uma água de chuva, uma água da cisterna que é gostosíssima, melhor água que eu já bebi. Então, é uma questão para já dizer pro Governo, as duas áreas do Governo.
Vou insistir na cisterna, porque a cisterna foi feita pra quem estava passando sede. Então, acho que ela tem que ser uma política abrangente, agora. Por exemplo, por que não as escolas todas terem cisterna? Por que ficam tentando cavar poço nas escolas, 180m de profundidade pra ter um poço? Não educam as pessoas para usar aquele poço, e, então, depois a água vai ser usada para aguar as plantas. Então, toda escola podia ter, porque é uma tecnologia barata também. Quanto está, hoje - tu lembras? - uma cisterna? Acho que não chega a R$2 mil ainda, uma cisterna. Então, é muito barato. Podia cada escola ter uma cisterna, que educava os meninos, porque vai passar por ali, pela escola, a educação ambiental. Nós vamos viver dias difíceis - as previsões da ONU são catastróficas -, se a gente não fizer uma revolução de comportamento, uma mudança radical de comportamento do uso da água.
Então, eu acho que a cisterna é uma tecnologia, e a gente vê, de vez em quando, muitas iniciativas interessantes individuais, as pessoas individualmente. Seria o caso de o Governo pegar essas iniciativas e reproduzir o que a pessoa faz, inventa pra si. Ela está vivendo o problema e inventa. E nesse momento de crise que a gente vê as invenções. Eu tenho lido muita coisa interessante sobre o reúso, porque no momento de crise a criatividade aflora, felizmente.
E outra coisa também seria o Governo e a questão das construções públicas do Governo. Tinham de já estar voltadas pra isso. Eu fiz um discurso no Dia Mundial da Água em que falava da questão da chuva: "Meu Deus, é tanta água de chuva". Então eu dizia assim: "São Paulo é aquele Estado que está morrendo de sede e com água abundante, afogado em água boa". É uma contradição muito grande; está morrendo de sede e afogado em água boa, porque chove demais naquela cidade. Então, tem que ter um jeito, uma tecnologia para aproveitar aquela água. Não é a cisterna; tem problema com a paisagem urbana, porque a cisterna na paisagem rural é linda.
Eu viajo no interior do Piauí e fico olhando toda casa com uma cisterna ali naquele telhado; é uma coisa muito bonita de ver, mas tinha que virar hábito. Na minha família, lá em casa, nós estamos construindo, vamos construir. A minha mãe mora na roça ainda, até hoje. Eu vim da roça, e os filhos que vão se aposentando estão voltando pra lá. Então, as casas que já foram construídas, todas vão ter uma cisterna, porque a gente usa muito, aguar planta, mamãe gosta de jardim, minhas irmãs gostam de jardim. Então, para não usar água do poço, que a gente tem lá, a duras penas que a gente construiu.
R
Então, pra Luz é uma perguntinha rápida. Vocês fazem todo esse trabalho, e ele é socializado com quem? Os Estados são parceiros? Vocês oferecem esses estudos aos Estados? Vai responder na hora certa aí com o pessoal, mas, assim, achei muito interessante o estudo de vocês. Se tem parceria com os Estados? Se tem algum estudo sobre o meu Estado, o Piauí? Porque você falou ali da Bahia, então quis saber se tem alguma coisa também no Piauí.
Barbosa, só parabenizá-lo e dizer que é importante que vocês continuem nessa teimosia boa, essa teimosia saudável de querer continuar nessa questão da água da chuva e da cisterna de placa.
O Luis Alberto... Tem uma coisa que a gente ouve muito quando anda por aí, na questão da criação de camarão. O camarão em cativeiro é o vilão, é apontado como um vilão. Lá no Parnaíba, por exemplo, a Lagoa do Portinho secou, um ponto turístico maravilhoso. Está agora, de novo, voltando a água, e o pessoal acusa muito os criadores de camarão. Eles analisaram a água da Lagoa nas fazendas de camarão, que, então, está apresentado como vilão.
O camarão maravilhoso, o camarão do Piauí vai para os outros Estados, mas tem isso também, porque é preciso ver como eles estão fazendo essa história. Tem sempre a intervenção humana pra destruição, mas essa mesma intervenção, essa mesma humanidade é que tem de construir.
Lá em Parnaguá, também, o que a gente ouve... Não foi só isso, claro, teve o desmatamento, as queimadas na beira da Lagoa do Parnaguá, mas os rios que abasteciam as lagoas foram barrados, fizeram barragens, os fazendeiros fizeram também suas barragens, e impediram a ida da água para a Lagoa. Então, é uma paisagem triste demais a gente ver a Lagoa de Parnaguá no Piauí.
E eu acho que é só. Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Bom, eu vou fazer também as minhas perguntas, que são poucas, mas, primeiro, quero apresentar aqui, do e-Cidadania, o Jorge Carlos Fernandes Campos, lá do Rio de Janeiro. Obrigado, Jorge, pela participação aqui na audiência que está discutindo a crise hídrica, essa coisa séria para o nosso País e para o mundo.
Então, a pergunta dele é a seguinte: "Por que não existe o aproveitamento excedente das águas das cheias dos rios do Norte para a distribuição de água para as regiões em seca, com crise de água no País?". No momento, principalmente o povo do Governo para responder... Os criadores de peixe aqui.
Foram extraordinárias as apresentações, aqui, pra esse debate que nós estamos nos propondo a fazer. E devo informar o seguinte, sobre o que eu disse no início da minha fala, quando assumi a Mesa, que nós já tomamos algumas medidas. Apresentei um Projeto de Lei que é para construir reservatórios em todos os edifícios, a partir de agora. A arquitetura tem que considerar um armazenamento da água da chuva para abastecer aquela família, aquele prédio, aquela repartição pública. Então, pode até construir... Uma vez aprovando essa lei, que eu espero que a gente logre êxito e aprove o mais rápido possível, pode até construir, mas não receberá o habite-se se não estiver considerando isso.
E fui surpreendido há duas semanas. Uma empresa baiana que está fazendo um conjunto habitacional com duas entidades, lá em Palmas, já chegou com essa solução para aquele conjunto habitacional de 800 famílias. Ela já chegou com a solução de fazer reservatório da água da chuva para poder aproveitar para o jardim, para lavagem das áreas públicas dos prédios e para usar em banheiros, por exemplo.
Então, o empresariado ou alguns empresários estão, de certa forma, na vanguarda nesse aspecto, ao analisar essa questão da crise hídrica.
R
E, então, eu quero fazer uma das perguntas, porque, na verdade, fico imaginando que a chuva cai, bate aqui, e se o solo for permeável, ela vai para o lençol freático. Ela irriga as plantas que houver, as plantas retêm uma parte, e a parte que saturar vai para o lençol freático.
Bom, à medida que nós usarmos a água para o reúso e ela não for para o lençol freático e nem subir mais - aquela água que finda com a poluição -, não vai faltar água, não vai faltar chuva?
A pergunta é: quantos por cento da água das chuvas que caem todos os anos no País seria necessário aproveitar? Vamos considerar o nosso Brasil aqui? Se fosse aproveitada, se fosse retida, não comprometeria... Ou se é verdade que pode contribuir. Isso é uma dedução minha. Eu não tenho dados científicos para dizer que comprometeria. E quantos por cento a gente usa hoje ou que poderia usar sem nenhum problema?
Nós estamos com uma audiência pública marcada, que vai debater o PSA (Pagamento por Serviços Ambientais), dia 10. Nós vamos debater isso aqui numa audiência pública que eu pedi.
Nós estamos preparando um projeto de lei. Já existe um projeto de lei tramitando na Câmara - e acho que até aqui no Senado -, mas nós estamos preparando um projeto de lei... A partir dessa audiência pública a gente quer instrumentalizar isso.
Como bem falaram aqui sobre as matas ciliares - acho que foi o Sabanay que falou -, eu tenho visto sempre essa preocupação. Um dia daqueles em que acordei mais cedo, fui assistir a um programa da TV Globo que só passa de madrugada - que eu acho que é para ninguém ver ou para poucos verem - que mostra a experiência... Inclusive o grupo que produziu essa experiência em Minas Gerais vai estar no debate aqui da audiência pública do dia 10.
Eu fiquei muito animado com aquilo, porque, como eu disse para vocês no início, eu assisti às águas desaparecendo na região médio-norte do Estado do Tocantins, à medida que a agricultura foi chegando.
E o que eu disse daquele negócio da crise da mesa e do banho: nós precisamos produzir alimentos, nós precisamos racionalizar como produzir os alimentos sem comprometer a continuidade das coisas.
Então, eu vi que as cisternas estão dentro daquela diretriz que é assim: a solução é endógena, pode ser simples. Por que ao longo de muitos séculos essa solução não foi dada para o Nordeste?
Nós ficávamos com as frentes de trabalho: aqueles grandes reservatórios que, na verdade, eram verdadeiros oásis de algum coronel, que depois serviam para vender a água para o coitado que tinha ajudado a fazer o açude para ele.
Então, penso que a solução está mesmo nas pessoas. E, Senadora Regina, essa questão da crise hídrica em São Paulo, Belo Horizonte etc. não é um azar, para se pegar aquele ditado chinês da sorte e do azar. Ela, na verdade, é uma sorte para nós; a pauta da crise hídrica hoje está tão efervescente porque foi num grande centro.
Isso está acontecendo há muitos anos, há muitos séculos no Nordeste e não prestam tanta atenção assim. Mas agora comprometeu o grande centro econômico do País. Imagina São Paulo ficar sem água e se esvaziar aquela monstruosidade para ir para o interior.
Falando da questão do interior - essa questão do retorno -, o Ministro Patrus Ananias falou para nós um negócio interessante: reconceituar os Municípios abaixo de 20 mil habitantes, dar a eles um conceito que não é de urbanismo exacerbado, mas da sua ruralidade. Essa reconceituação da ruralidade dos Municípios pequenos também pode ser uma saída para ajudar a contribuir com isso.
R
Eu falei da questão do projeto de lei dos pagamentos ambientais e, no meu discurso de posse aqui, eu disse, Senadora Regina, o seguinte: a União, os Estados e os Municípios têm que sair da condição de disciplinador, regulador e fiscalizador desse problema do meio ambiente, da questão da sustentabilidade - considerando a questão da sustentabilidade não só a existência da floresta, mas a existência das pessoas em condições dignas de viver, conviver e ser felizes -, mas precisam assumir o ônus de a floresta dar retorno para o proprietário da terra.
A minha concepção de propriedade da terra é uma concepção que não cabe muito, porque eu penso que a terra é pública, como a água. Ela tem que ser objeto de concessão, mas já era, "Inês é morta", a terra é privada e nós não vamos ter como torná-la pública.
Então, essa questão de a União, os Estados e os Municípios assumirem a responsabilidade para garantir a defesa da água passa pelo pagamento de serviços ambientais para os proprietários da terra, dentro de um parâmetro que possa contribuir para isso.
Eu fico com a pergunta que fiz - que parece um tanto inusitada, mas era essa - e com a crença de que nós estamos no rumo certo. Porque, como aconteceu lá em São Paulo, nós temos a oportunidade de discutir a crise hídrica em todo o Brasil, com a responsabilidade de envolvimento da sociedade.
Se nós perdemos 37% da água tratada... É mais do que um terço da água que nós temos lá. Então, nós não temos falta de água, nós temos uma má gestão da água. Para má gestão há solução fácil: é só fazer uma boa gestão.
Eu vou passar...
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Senador, antes de eles responderem... Eu estou com tempo, porque vou embarcar, mas quero ouvir ainda. Vou ficar uns 15 ou 20 minutos.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Eu vou, inclusive, privilegiar a Drª Luz.
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Porque eu vou, também, pegar o final do debate sobre o Matopiba lá no meu Estado - os Governadores estão lá. É uma região com a qual nós temos que ter cuidado.
Eu fiz um discurso esta semana sobre a questão ambiental, as nascentes dos rios que há naquela região. Se a gente não tiver cuidado, elas podem ser destruídas.
Então, eu quero participar, por isso vou embarcar mais cedo hoje. Mas quero convidá-lo para, a partir desses elementos que eles deram, a gente fazer uma publicação didática - pode ser os dois gabinetes, assim nós dois assinamos - para as escolas, nessas cotas de publicação que a gente tem. Usa-se a minha cota e a sua cota e a gente faz um número bom de publicações para ver se conseguimos fazer com que esse debate chegue onde tem que chegar.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Está combinado. Nem que a gente tenha que sentar com o Senador Renan para ele patrocinar, a gente vai fazer essa publicação.
Eu vou passar agora para a Drª Luz fazer as considerações e responder as perguntas que foram colocadas, porque ela também tem que pegar um avião "agorinha" mesmo - como dizem os mineiros.
A SRª LUZ ADRIANA CUARTAS PINEDA - Bom, eu vou começar respondendo a pergunta da Senadora com relação aos estudos e disponibilização dos mesmos, e as parcerias.
Realmente nós fazemos contato com os Estados, com as diversas instituições dos diversos Estados. O nosso contato principal é com a Agência Nacional de Águas.
Então, por exemplo, esse estudo do Cantareira é público, está na página para qualquer um que possa... Inclusive os dados também são públicos.
Então, quem quiser ir ou verificar... Há pessoas que vêm, perguntam, entram em contato conosco. Nós estamos 100% disponíveis para atender todas as pessoas.
Os estudos, principalmente agora do Semiárido, que eu mostrei, estão em andamento. Mas uma meta que temos é começar a publicar na nossa página, a partir de julho, os primeiros resultados desses estudos, tanto do monitoramento de colapsos quanto da vulnerabilidade - mapeamento da vulnerabilidade.
Então, esses estudos já estão em andamento e nós estamos colocando. O nosso problema é que eu falei: somos um órgão relativamente recente - começou em 2011 -, mas, na verdade, o staff permanente começou no final de 2014.
Então, temos seis meses de pessoas permanentes, pesquisadores nessa área. Então estamos nesse processo.
Bom, agora vou responder algumas das questões que o Senador Donizeti falou, com relação a por que não levar o excedente de água do Norte para as áreas que estão...
R
Bom, porque - aquilo que o Antônio falou - é custo, é o transporte, é longe, são milhares de quilômetros. Acho que é importante procurar soluções um pouco mais locais. Por exemplo: no Semiárido, a partir das cisternas. É aquilo que estamos falando. Eu não mostrei, mas os principais centros urbanos produzem o efeito de ilha de calor, bem conhecido. Aquele efeito, o que faz? Produz aquelas chuvas intensas, que estão aumentando. Nós temos séries que mostram que, na cidade de São Paulo, as chuvas estão aumentando desde 1960, e no Cantareira estão diminuindo nos principais meses de chuva: dezembro, janeiro e fevereiro. Então, a 80 quilômetros de distância, São Paulo está cheia de água. As pessoas não estão percebendo ainda que realmente está faltando água, porque em São Paulo está chovendo. As pessoas perguntam: "Ué, por que todo mundo fala que está faltando água se estamos quase nos afogando?"
Com relação a isso, vamos usar essa água da chuva? Eu acho que é válido, porque nesses centros urbanos a maioria da área é impermeável. Então a água que está caindo está escoando. Tudo bem, está indo para os rios. E os rios a jusante, eles vão ter que manter assim, mas acho que pode ser feito um manejo. Eu não tenho a parte de engenharia, estudo mais a parte dos processos. Então essa área, eu não conheço, mas acho que dá, sim, para tentar fazer um uso como aquele que você falou: os prédios começarem a pensar em outras alternativas, fazer construções diferentes. Então não é só a arquitetura; a engenharia precisa se reinventar e pensar em novas soluções. É disso que eu acho que precisamos.
Com relação às mudanças climáticas, você apontou também uma coisa muito importante: as mudanças do uso do solo.
Realmente, com o desflorestamento, com as mudanças que estão acontecendo ao longo de todos esses anos, o que está acontecendo? Com aquela entrada da agricultura diminuiu bastante essa precipitação na região. E o que está acontecendo agora com a Amazônia? A água vem principalmente do Atlântico, entra pelo norte da América do Sul, atravessa toda a Floresta Amazônica e, nesse processo, chove, evapora, volta para a atmosfera, mas é criado um ciclo de reciclagem. Muita daquela água que está chovendo à medida que os ventos entram no continente vem da própria reciclagem da floresta, então é importante a manutenção dessa floresta. Na hora em que ela for acabando, realmente pode começar a secar.
São estudos recentes. Aconteceu já na china. No interior da China, por conta das mudanças de uso e do desflorestamento, foi começando a ficar mais e mais árido. O que aconteceu agora? Eles estão reflorestando novamente. Então é realmente muito importante. E agora a Mata Atlântica. Também precisamos pensar em recompor os biomas da Mata Atlântica não só pela quantidade, mas também pela qualidade.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Em nome da Senadora Regina, em meu nome, do Senado Federal e desta Comissão, Drª Luz, nós queremos agradecer.
Nós acabamos de ouvir a Drª Luz Adriana Cuartas, que é pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais.
Se a senhora precisar se retirar, fique à vontade. Desde já, muito agradecido. E pedimos a sua autorização para publicar o debate realizado nesta Comissão, nesta manhã.
Vamos ouvir agora o Dr. Antônio Gomes, Coordenador Nacional do Programa Uma Terra e Duas Águas.
O SR. ANTÔNIO GOMES BARBOSA - Queria, na verdade, finalizar agradecendo o convite. Acho que é um debate importante.
Queria fazer dois outros registros antes de agradecer.
Um é dizer que existe uma iniciativa, a partir de agora, de um programa chamado Cisternas nas Escolas cuja intenção é levar cisternas para as escolas rurais. Já existe uma experiência em andamento. Obviamente, ela está sendo melhor formatada e discutida, mas esse é um problema geral que nós temos no Semiárido, ou seja...
A SRª REGINA SOUSA (Bloco Apoio Governo/PT - PI) - Urbanas também, porque quando falta água manda o menino para...
O SR. ANTÔNIO GOMES BARBOSA - A nossa experiência é rural. É importante ver... A falta de água é geral.
R
Uma situação é importante quando se discute água. Necessariamente ela apareceu aqui, mas é importante fazer o registro de qualquer forma. De fato é a expansão das fronteiras agrícolas. Esse é um debate difícil, é um debate caro. Muitas vezes fica essa contradição: "Ah, são contra a produção; não são contra a produção".
De qualquer forma, concordando ou não com o conjunto de teorias que estão aí, uma coisa que se percebe muito fortemente é que o avanço das fronteiras agrícolas, o desmatamento da Floresta Amazônica, de fato, têm mudado o ciclo de chuva, em especial na Região Sudeste, com toda essa perspectiva que a Drª Luz colocava anteriormente. Há teorias sobre a história dos rios voadores. Esse é um debate que precisa ser aprofundado. E, de fato, os efeitos são nefastos, são grandes.
Outro debate que precisamos fazer está associado à ideia da transposição de águas. Normalmente se acredita que a solução seja transportar água. O Brasil tem uma situação de água bem diferenciada, mas a solução para cada região é solução dentro de cada bacia. Então, se temos 12 bacias, precisaríamos discutir o planejamento a partir dessas bacias ou como se abastece cada população a partir das suas necessidades dentro de suas bacias. Obviamente, em eventuais situações, até poderia haver transposição de águas, mas a situação que vivemos no Brasil hoje é o que diz, inclusive, o estudo da ANA a partir do Atlas: não seria necessário isso. Então precisaríamos privilegiar o que tem sido estudado e o que tem sido proposto.
Queria agradecer o convite em nome da Asa, da Articulação do Semiárido, e nos colocar à disposição inclusive para continuar esse debate, em especial da contribuição que a Asa tem dado e da experiência que se tem no meio rural sobre captação e manejo de água de chuva. Essa é uma água importante; uma água com a qual existem experiências em vários outros lugares do mundo, como Estados Unidos, Alemanha e Japão, só para citar alguns, inclusive experiências urbanas, além das experiências rurais que ocorrem no México, no Peru, na China e em vários outros países.
Agradeço o convite e nos coloco à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Nós falamos muito aqui, mas não tocamos numa questão, que é a água subterrânea, a questão dos aquíferos.
Eu me lembrei disso porque está no material que li hoje e queria fazer uma pergunta que talvez o companheiro Marcelo possa responder.
Ao que me parece, pelo que aprendi até hoje, existem as áreas de recarga dos aquíferos, não é? Não é em qualquer lugar que chove e a água vai para o aquífero. Ele tem as suas áreas próprias de recarga.
Os dois maiores aquíferos, que são o Guarani e o Alter do Chão, da Amazônia, são internacionais ao que parece.
E lembrei que alguém já me disse que o Tocantins é um dos locais de recarga do Aquífero Guarani. Essa é uma questão importante também de se saber, porque há muita água embaixo da terra, mas também depende... Ela aflora nas nascentes e depois volta.
Vou passar a palavra, então, para o Luis Alberto de Mendonça Sabanay.
Tivemos uma audiência pública em Palmas, essa semana, da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária, para discutir agricultura de baixo carbono e piscicultura. E, na agricultura de baixo carbono, encontra-se solução para amenizar - eu não diria que é a solução total - essa questão e produzir de forma sustentável, com mais qualidade, articulando a lavoura, a pecuária e a floresta. A Embrapa está bastante avançada nesse trabalho. O Brasil tem um programa chamado Agricultura de Baixo Carbono, que já é um compromisso com a questão das mudanças climáticas. Então é importante esse programa. E nós estávamos, sexta-feira, discutindo essa temática lá em Palmas, nossa capital, a capital mais bonita do Brasil.
Com a palavra, Alberto de Mendonça Sabanay.
O SR. LUIS ALBERTO DE MENDONÇA SABANAY - Obrigado pelo convite para participação nesta importante audiência pública.
Quero considerar três questões nas minhas considerações finais.
Primeiro, nós temos mais de 1,5 milhão de famílias que, em vez de estarem na terra, estão nas águas brasileiras por subsistência, por necessidade de produção, por cultura e por perspectiva de futuro.
R
Então, é um contingente populacional significativo no Brasil. Eles eram invisíveis durante muitos anos. Os trabalhadores e as trabalhadoras das águas brasileiras passaram a ter um endereço e um lugar nas políticas públicas do Estado e do nosso País, com potencial e perspectiva de desenvolvimento e de futuro.
O segundo registro que quero fazer, um pouco na fala da Senadora Regina, é que obviamente houve distorções no processo de desenvolvimento no nosso País. Foi citada a questão da carcinicultura no Piauí, mas, obviamente, em se tratando de um recurso público de múltiplo uso, de responsabilidade comum na sociedade brasileira, o desenvolvimento da produção de pescado deve necessariamente ser muito bem planejado. Então, envolve vários interesses, envolve um recurso significativo e comum, de múltiplo uso, que é a água do nosso País, e deve estar incluído na nossa pauta de debates todo o tempo.
Dei um exemplo do modelo de planejamento da carcinicultura no Maranhão, que é um modelo em que temos, na medida do possível, de implementar e corrigir as distorções que houve nesse sentido durante todo o processo; não só as distorções de desvio de rios, mas as distorções sociais precisam ser corrigidas nesse processo.
A terceira consideração que quero fazer é com os meus Pares de Mesa, invocando inclusive a presença do Senado Federal. Precisamos ter uma ação integrada e sistemática em relação a isso, porque o que impacta tanto na questão do controle das variações climáticas quanto também das crises produzidas por várias situações no recurso hídrico pode gerar impactos significativos no desenvolvimento do nosso setor. Então, quero invocar essa articulação para que possamos avançar nesse processo.
Por último, gostaria de dizer que temos ainda um desafio no nosso País, que é a questão de segurança alimentar e nutricional, ou seja, alimento de qualidade. O pescado pode ser um vetor e uma característica, um proporcionador dessa oportunidade diferenciada no modelo de desenvolvimento. Que nós, do ponto de vista do Estado e da sociedade, tenhamos a responsabilidade de dividir bem não só o espaço de produção, que é a água, mas dividir a própria água, para que o Brasil não cometa as injustiças que cometeu, em consequência da má divisão dos seus espaços durante quase cinco séculos.
Então, temos esses desafios a cumprir. O Ministério da Pesca e Aquicultura está à disposição na vanguarda desse processo. Queremos nos disponibilizar a esse debate toda vez que for necessário, principalmente quando envolver água e produção no nosso País.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Ouvimos o Dr. Luis Alberto de Mendonça Sabanay, Assessor Especial para Assuntos Estratégicos do Ministério da Pesca e Aquicultura.
Vamos ouvir agora o Dr. Marcelo, Secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente, mas, antes, quero citar um dado que dá o tamanho da nossa responsabilidade. Não estou com a fonte, mas diz o seguinte: 97,2% das águas são os oceanos; 2,8%, portanto, são de água potável. O desesperador aqui é que 2,38% desses 2,8% são de água constituída de gelos glaciais; 0,39% são de água subterrânea e apenas 0,029% são os lagos e os rios do Planeta.
R
Então, imaginem se essas águas que estão em gelos glaciais se descongelarem mesmo. Isso será uma tormenta que vai devastar todo o Planeta. Tudo vai virar praticamente mar.
Mas vamos ouvir, então, o Dr. Marcelo, para as suas considerações e respostas às perguntas.
O SR. MARCELO MEDEIROS - Pois é. Tenho uma lista de respostas. Vou colocá-las pela ordem das perguntas.
Sobre o uso da água em construções públicas, em 2005, na ANA, lançamos um manual sobre isso, para fomentar a eficiência da água em edificações. Assim, é possível, com pequenos gastos, reduzir e muito o uso da água em qualquer edificação.
São dois os exemplos bem sucedidos no País. Primeiro, é aquele aerador de torneira. Em qualquer prédio, hoje em dia, as torneiras têm aerador. Ele reduz em torno de 50% do consumo da água que usamos para lavar a mão, na cozinha e tal. Outra coisa que qualquer prédio construído há menos de 10 anos tem são aquelas descargas com um ou dois botões em cima. Antigamente, aquela descarga de parede gastava em torno de 50 litros por segundo, enquanto aquela pequena, que é a caixa acoplada à descarga, gasta 4 ou 5 litros e tem dois botões - um para mais e outro para menos água.
Fizemos isso em 2005. Também daí saiu, a partir desse manual, uma iniciativa nossa, no sentido de induzir os Estados a fomentarem o hidrometro individual em apartamentos. Também é algo interessante, porque se você pega pelo bolso e mostra à pessoa que ela consome muito, ela reduz o consumo.
Bem, agora, no início do ano, pelo Ministério do Meio Ambiente, relançamos essa publicação. Fizemos uma nova publicação sobre uso eficiente da água, principalmente voltado para edifícios públicos. Em fevereiro, participamos de um grupo de trabalho no Ministério do Planejamento, e fizemos uma Portaria Federal que obriga todas as edificações públicas existentes e novas a adotarem essa medida, inclusive captação de água de chuva.
Para nós, do Executivo Federal, isso é Normativo Mandatório. Somos obrigados a seguir esse tipo de portaria do Órgão Central Administrativo, que é o Ministério do Planejamento.
Isso é muito interessante, porque são coisas pequenas que podem ser feitas, mesmo indicações existentes, que vão levar a um uso muito menor da água. Acho que edifícios antigos, ainda mais em áreas urbanas consolidadas, que não têm mais espaço em volta, não foram construídos para aguentar aquela carga dos grandes reservatórios, mas é possível essas pequenas coisas serem feitas.
Bem, isso me leva à pergunta do próprio Senador, no sentido de podermos aproveitar 100% do reúso, 100% das águas da chuva. Do ponto de vista técnico, isso é possível, mas você tem de considerar o ponto de vista econômico, pois é muito caro fazer um equipamento para reúso, principalmente se for de uma água de dejetos humanos. É muito difícil tratar esse tipo de água. Conseguimos tratar bem a água com gordura, a água da pia, a água que se usou para lavar o piso, mas o custo econômico disso é muito alto. Tecnicamente, isso é possível, mas a nossa visão de reúso de água de chuva é de outro tipo, é um pouco menor.
Há algo interessante, que são mudanças invisíveis, que demoramos um pouco para perceber, mas a construção civil, já há alguns anos, entrega prédios para a classe média, classe média alta, com reservatório de água da chuva.
Por exemplo, aqui em Brasília, nesse bairro novo, o Noroeste, todos os edifícios têm reservatórios de água de chuva. É interessante. Conversando com o pessoal de construção civil, eles nos dizem que isso é uma demanda dos moradores. Nos condomínios novos, eles pedem que se implante esse tipo de sistema.
Em São Paulo, floresceu muito - o que se via muito pela televisão - aquele comércio de vender bombona, ou de reservatório de água de chuva. Sumiu, não é? Não se conseguia mais pequenos reservatórios um tempo atrás. Só que, já há alguns anos, há um serviço profissional, que é o de reúso de água. Há várias empresas que oferecem esse serviço para reaproveitar a água de lavanderia comercial. Se o indivíduo for a algum shopping center, na cidade, pode-se ver que as pessoas lavam o chão com água colorida, geralmente azul ou verde, porque ela é água de reúso.
Então, dentro da engenharia nacional, há várias empresas, oferecendo esse tipo de serviço. O que estão nos pedindo, e estamos começando a fazer agora, é uma norma nacional para reúso. Existem normas complementares, mas eles queriam uma norma que desse segurança jurídica ao empresário, para que ele faça o reúso na empresa.
Sabemos que diversas empresas nacionais fazem reúso, só que, geralmente, não é declarado, porque não se pede para se declarar esse tipo de coisa, mas elas já fazem reúso. Vemos isso por causa das outorgas que temos.
Várias empresas reduziram a demanda de água, pediram para reduzir o volume de outorga, porque eles estão usando em algum tipo de ciclo fechado, porque ele não precisa mais captar água, ou da rede de abastecimento, ou de algum rio.
Então, já há isso em andamento. O que precisamos é ajudar a regulamentar para que ele tenha conforto jurídico na hora de fazer a medida.
R
Sobre essa pergunta que houve de usar a água do Norte. Recebo muitas contribuições de populares sobre a crise. Isso é recorrente. Há um problema sério em retirar a água da Amazônia, e levar para outras regiões do País, principalmente essas mais distantes, como Sudeste e Sul, e não é tanto a distância, a distância vencemos com o canal - estamos fazendo isso na transposição. O nosso maior problema é vencer o desnível geográfico: como é que jogo água para cima?
Eu sou de Minas Gerais. Lá, se você vai para o meio rural e olha para o lado, você vê as divisas das bacias. É muito claro para a gente. Para quem mora no Centro-Oeste e nunca foi para o meu lado e para a Bacia Amazônica, essa divisa está mais distante, mas existem os grandes desníveis. E, para vencer um desnível, tenho que elevar a água, usando estações de bombeamento.
O custo energético disso é até mais alto do que a construção. Isso implica outro problema: preciso ter energia gerada para poder fazer isso. Eu preciso gastar água para gerar energia hidroelétrica, e o custo de bombeamento costuma ser muito mais caro do que a obra. Então, torna-se inviável esse tipo de coisa.
Quanto ao pagamento por serviço ambiental, estamos tentando no Ministério... Temos o Bolsa Verde, que está caminhando, mas, no campo de recursos hídricos, temos duas iniciativas muito boas da Agência Nacional de Águas. Uma chamamos de Produtor de Água, que, dentro de bacias rurais, principalmente nas menores bacias, nos mananciais e nascentes, paga-se um valor ao produtor rural para que ele preserve as matas, principalmente ao redor de nascente. E não é só a ciliar - a ciliar é interessante, é muito interessante, porque ela retém assoreamento, diminui a carga de sedimento na beirada, retém, por exemplo, agrotóxico, dá uma diminuída na carga poluidora -, mas tem também que repor topo de morro, poque a maior carga de sedimento vem de topo de morro e, se eu não tiver vegetação nas partes altas, principalmente em áreas agricultáveis ou onde está havendo movimentação de solo, por conta de novos assentamentos urbanos, isso tudo vai descer para o rio também. Então, isso tudo tem que ser considerado.
Esse programa faz o ressarcimento ao produtor rural por este tipo de serviço, inclusive o cercamento da vegetação remanescente. O custo é pequeno, e já temos vários experimentos científicos que comprovam que, por meio das pequenas coisas, incluindo barraginha, é possível haver de volta a vazão no rio; há ganho em água depois.
Temos uma nova legislação ambiental. Existe a Lei Complementar nº 140, que mudou um pouco a relação entre o licenciador e os licenciados e que distribuiu competência entre os Governos. Então, passa a haver uma competência muito forte no Município. E o Município para nós é uma coisa que tem que se trazer para mais perto de Estado e União, porque podemos legislar sobre meio ambiente, legislar sobre recursos hídricos, mas Município detém o uso do solo. Então, posso dizer que ele não pode poluir, mas ele vai e instala um distrito industrial. Então temos que trazer, nem que seja através de legislações complementares, o Município para perto de nós.
Temos no Município também o plano de saneamento. O saneamento é uma concessão municipal; o Município é responsável por dar a concessão a alguém e por fiscalizar. Nesse saneamento, estamos ouvindo muito, inclusive de pessoas comuns, sobre a perda de água na rede - a perda de água tratada, que é a perda mais perversa. A água já foi retirada do manancial, foi tratada, foi distribuída, e há uma perda.
No Brasil, esses índices variam de 20% a 76%. Está em 20% no Sudeste, principalmente em algumas cidades, como São Paulo, e chega, no Amapá, a 76% de perda.
Só que essa perda tem dois componentes. Há um que é a perda física, que é mais fácil de entendermos, que é quando se perde água por vazamento. No Sudeste, isso já é mais bem resolvido; há um alto índice; mas ele é mais bem resolvido.
O que não resolvemos é a outra perda, que é a que chamamos de aparente: a água foi tratada, chegou ao consumidor, mas não foi medida ou não foi contabilizada por algum motivo. Vários Municípios no País optaram por não cobrar água, isso é muito comum em Municípios menores. E há várias companhias estaduais até em Municípios maiores que optaram por...
Tudo bem ele não mede, mas ele cobra uma taxa referencial. Isso para nós de recursos hídricos é um problema. Tudo bem que há considerações sociais que têm que ser levadas em conta, mas, se você não cobra ou se você cobra apenas uma taxa referencial, a pessoa tende a gastar mais do que ela devia, porque ela não é cobrada por aquilo; então, temos que reduzir isso.
No Estado do Rio de Janeiro, a Cedae, pelo que lembro, tem 50% de perda por causa disso. Além das perdas físicas, existe alto índice de Municípios em que se aplica a taxa referencial. Aqui mesmo no DF temos isso, principalmente fora do Entorno, nos limites do DF, em que há a taxa referencial.
Por fim, sobre essa questão de aquíferos. Já fui da CPRM por muitos anos, coordenei grandes projetos de hidrogeologia, trabalhei no projeto do Aquífero Guarani, fizemos 12 mil cisternas, as primeiras do Governo Federal, e estamos num esforço, já nos últimos 15 anos, para aumentar o mapeamento hidrogeológico do País.
R
Houve, na década de 60, grande contribuição do DNOCS, depois ficou parado; a CPRM retornou com isso há 15 anos; e a própria ANA também está fazendo isso, principalmente em regiões metropolitanas. E temos dois objetivos. Além do conhecimento da disponibilidade de água, outro muito grande é o de conservação, que protege áreas de recarga, como bem o Senador disse. Grandes sistemas aquíferos, como o Guarani, têm área de recarga - vejam que ele está lá no Paraguai, Argentina, mas chega até Goiás.
Então, há áreas espalhadas por oito Estados da União. O Alter do Chão talvez seja maior do que o Guarani - ele está para ser estudado, e provavelmente é maior do que o Guarani -, porque o Guarani não é um aquífero único, são blocos compartimentados, que têm ligações entre si.
E funcionam, às vezes, como uma coisa única, mas a área de recarga é muito exposta, porque está muito na superfície. E é uma região muito porosa. Então, qualquer coisa em cima contamina - posto de gasolina, força negra, qualquer coisa pode contaminar a água subterrânea.
E, nas regiões metropolitanas, o nosso medo ou a nossa preocupação é quanto a aquíferos que são mais superficiais, porque o aquífero não é uma rocha única, há camadas de rochas de formações diferentes, de materiais diferentes, que compõem aquela rocha. E cada uma dessas rochas porosas é um sistema aquífero. O Guarani está lá embaixo, no Paraná, está há 4 mil metros de profundidade, e, acima dele, há o Serra Geral, e, acima desse, há outras formações.
Essas que estão mais próximas da superfície estão muito sujeitas à contaminação, como falei. É uma rocha porosa e aceita qualquer coisa que se jogue lá de cima. E o pior é que elas são as mais usadas, principalmente nas cidades, porque você não vai escavar 4 mil metros, para chegar até o Guarani, é muito caro; você vai escavar 50 metros e tirar a água de um aquífero mais superficial. Só que a maior parte da carga contaminante não é visível, e os exames laboratoriais são caros.
Para benzeno, existente em postos de gasolina, é fácil, pois a água tem cheiro. No entanto, o resto - coliformes fecais, um monte de outros patógenos - não dá odor e nem cor. A água sai límpida, e você acha que ela está limpa, mas, na verdade, pode estar contaminada. Então, estamos fazendo estudos em regiões metropolitanas.
E estamos dizendo isto também em vários discursos: a crise é uma oportunidade para testar o sistema de gestão e para modificá-lo e aperfeiçoá-lo.
A Luz falou sobre o Cemaden. Ele foi criado em julho de 2011, e participei da criação, porque, na época, trabalhava com desastres hidrológicos na Agência Nacional de Águas. E foi por causa daquele desastre de janeiro de 2011, no Rio de Janeiro, na região serrana, que criamos um sistema de alerta.
A Luz não teve tempo de explicar, mas temos reuniões diárias entre vários órgão federais e estaduais, com o Cemaden. E isso inclui os institutos oficiais estaduais e federais de metrologia, Agência Nacional de Águas, a CPRM. Tudo é retirado desses locais, agregado dentro do Cemaden - que é a nossa base pensante para monitoramento e previsão - e levado à Defesa Civil.
E também, por conta desses desastres, reformulamos todo o Sistema Nacional de Defesa Civil. Antes, não existia carreira; hoje em dia, temos uma carreira de Defesa Civil, e essas pessoas trabalham por meio de informações que recebem do Cemaden e dos outros órgãos. Então, houve uma mudança.
Essa crise é uma oportunidade para vermos o nosso sistema e as falhas que acontecem e tentar mudar. Temos proposições do Senado e da Câmara quanto a isso. E, desde o ano passado, este número de proposições aumentou.
Sei disso, porque sou o responsável pela pasta do Meio Ambiente dentro do Governo Federal. E canalizamos os PLs, quando eles saem da Casa e vão aos ministérios. Então, há um aumento muito grande de proposições. E a grande maioria são boas intenções - principalmente essas de fomentar o reúso, fomentar o uso da água de chuva, regras diferentes de acesso à água, cobrança pelo uso da água. São medidas muito boas e têm que ser implementadas.
E temos também outra oportunidade que é justamente a transposição do Rio São Francisco. Tirar a água de uma bacia e levar ao Nordeste - não vou discutir os benefícios de distribuir essa água - cria um conceito para nós de bacia estendida. Isso muda as regras de alocação de água, ou seja, entra água nova no sistema, mas, ao mesmo tempo, há o doador, que tem que ser revitalizado.
E, se não for revitalizada a Bacia do Rio São Francisco, como é que vou tanto continuar mantendo essa entrega de água na própria bacia, quanto criar essa bacia estendida? Então, também temos que ter essa ideia. Por isto estamos refazendo o nosso programa de revitalização de bacia: justamente por causa do Rio São Francisco.
Tenho que agradecer. É muito bom poder explicar o que fazemos e, principalmente, tirar dúvidas. E, quando você vai em ambientes diferentes, você passa a ter ideias diferentes - somos muito acostumados a pensar dentro da caixinha.
R
Recursos hídricos, até pouco tempo atrás, era uma coisa pequenininha. Ficava entre nós da Agência Nacional de Águas e o setor elétrico, que é mais diretamente envolvido por conta do planejamento energético. E, nos últimos cinco anos, nós conseguimos ampliar isso para os outros ministérios. Temos uma conversa muito melhor hoje com Minas e Energia, com Cidades, com Integração Nacional e mesmo com Pesca, que não tínhamos.
Estamos tendo essa oportunidade porque a água influencia qualquer política setorial. Não dá para fugir. E a água, se não for bem usada, principalmente nas políticas setoriais, nós vamos criar conflitos. E nós temos muita água, nós temos boa disponibilidade ainda. O que nós precisamos, como o Senador disse, é de gestão. Nós temos de resolver problemas de qualidade da água, mas isso não é o suficiente para que criemos conflitos por conta de políticas setoriais mal programadas.
Obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Donizeti Nogueira. Bloco Apoio Governo/PT - TO) - Nós estamos encerrando aqui os trabalhos. Eu quero agradecer, em meu nome, em nome da Senadora Regina, em nome da Comissão de Meio Ambiente do Senado, ao Dr. Marcelo, Secretário de Recursos Hídricos e Ambiente Urbano do Ministério do Meio Ambiente, ao Dr. Luis Alberto de Mendonça Sabanay, Assessor Especial para Assuntos Estratégicos do Ministério da Pesca e Aquicultura, ao Dr. Antônio Gomes Barbosa, Coordenador Nacional do Programa Uma Terra e Duas Águas, e à Srª Luz Adriana Cuartas Pineda, pesquisadora do Centro Nacional de Monitoramento e Alerta de Desastres Naturais.
Terminamos esta audiência e queremos deixar aos ouvintes da Rádio Senado e da TV Senado a seguinte mensagem: o Senado, através das comissões, tem debatido permanentemente essa temática desde o início deste ano. Hoje, por exemplo, nós estamos nesta Comissão. Haveria às 14h30 outra comissão, que é a Comissão de Mudanças Climáticas, também fazendo esse debate. Foi suspensa a reunião hoje, para ser feita na semana que vem. É presidida pelo Senador Fernando Bezerra, que tem feito um debate também extraordinário sobre essa questão. Ou seja, embora às vezes as pessoas não percebam, o trabalho aqui no Senado Federal não se reduz a ir ao plenário votar, apertar um botão e fazer discurso; está havendo uma discussão muito intensa sobre os diversos problemas que o nosso País enfrenta.
E em um momento que eu considero muito oportuno, porque eu disse esta semana duas vezes já que estou como aquela música do Raul Seixas: "Eu não preciso ler jornais, mentir sozinho eu sou capaz." Porque o que vemos nos meios de comunicação, principalmente nos grandes conglomerados de comunicação do País, o que vemos por parte da oposição é que o País acabou e que nós estamos vivendo um desastre, que nós estamos no caos. E, na verdade, nós estamos vivendo um Brasil muito intenso.
Ontem eu fui à Câmara Federal, à Comissão de Agricultura, participar de uma discussão sobre o Matopiba. Estive, no final da semana, discutindo agricultura de baixo carbono etc. Mas o que eu quero dizer é que está havendo, neste momento, no País, um debate intenso sobre os problemas, e estão sendo produzidas alternativas que vão ser consolidadas num curto espaço de tempo, o que fará certamente o Brasil dar um salto ainda maior na qualidade de vida para o seu povo, no crescimento da renda distribuída e uma nação mais soberana perante o mundo, mais feliz e fraterna. Então nós somos otimistas com o Brasil que nós estamos vivendo neste momento, porque o que pode esta crise trazer para nós? Uma grande oportunidade de resolução dos problemas, que vai resolver os problemas para as próximas gerações, para muitos e muitos anos, certamente, porque eu acredito nesta geração, acredito neste País, acredito nas pessoas, acredito no Brasil.
Encerro aqui, então, a audiência pública da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle nesta manhã de quarta-feira, um trabalho intenso, bem feito, e, com o compromisso da Senadora Regina e meu, nós vamos trabalhar para ser publicado, para colocar a serviço da sociedade brasileira o que foi discutido e proposto aqui hoje.
Está encerrada a audiência pública. Muito obrigado e até a próxima, com fé em Deus.
(Iniciada às 10 horas e 20 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 45 minutos.)
R
(Em execução.)