30/03/2015 - 11ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Havendo número regimental, declaro aberta a 11ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública, nos termos dos Requerimentos nºs 15 e 29, de 2015, da CDH, de autoria deste Senador e de outros, para debater mobilidade urbana, acessibilidade, a importância do uso das bicicletas no transporte urbano e as mortes no trânsito. Aqui, claro, vai ter muito a ver com transporte individual.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Por isso, as pessoas que tenham interesse em participar com comentários ou perguntas aos nossos convidados podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, link: bit.ly/audienciainterativa, e do Alô Senado, através do número 0800-612211.
Teremos três Mesas, pela importância do tema, cuja introdução vou fazer rapidamente. Depois, vamos montar a Mesa.
Como a nossa audiência pública é transmitida ao vivo para todo o Brasil por todo o sistema de comunicação aqui do Senado - rádio, agência e TV -, vou situar para aqueles que nos estão ouvindo ou aos que estão nos assistindo pela TV Senado um dos motivos desta audiência pública - naturalmente, os nossos convidados vão enriquecê-la muito mais.
Podemos adiantar que faremos tantas audiências públicas quantas forem provocadas pela sociedade para debater um tema.
Vou mostrar números. Fui provocado para esta audiência pública por números assustadores.
Rapidamente, faço aqui, antes de montar a Mesa, uma introdução. Nesta audiência, vamos debater os avanços e retrocessos da mobilidade urbana no Brasil e, como propõe o tema, a ilusão do transporte individual, motorizado ou não, e a sua importância.
Infelizmente, só na última hora, pelo menos seis pessoas perderam a vida em alguma estrada do País por acidente. Repito: infelizmente. Lembro aqui que um avião caiu nos alpes franceses há poucos dias, uma tragédia que comove o mundo todo. Houve 150 mortes. Vamos aqui, sim, fazer uma homenagem aos falecidos e lamentar o que houve na cabine do piloto. Assim mesmo, queremos lembrar que essa tragédia noticiada deixou em estado de choque o mundo todo, mas é bom lembrar que, aqui no Brasil, morrem 136 pessoas por dia em acidente de trânsito, quase um avião boeing por dia. Estimativas apontam cerca de 50 mil mortos ao ano, dos quais 43 mil falecidos no primeiro momento do choque fatal, índice que se assemelha, queiramos ou não, às guerras que chegam a durar anos e anos no mundo.
A cultura "rodoviarista" foi implantada nos anos de chumbo no Brasil pelo estímulo às fábricas multinacionais de carros. Não tenho nada contra elas; que venham tantas fábricas multinacionais para o Brasil quantas queiram, porque estarão gerando emprego, mas temos também de olhar outras formas de transporte. Aqui, já estou até saindo do texto.
O sistema ferroviário, metroviário, enfim, as bicicletas, vão ser um dos pontos a serem aprofundados aqui.
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Apesar da importância da indústria para o emprego de milhares de trabalhadores - eu mesmo sou metalúrgico -, a lógica do transporte, focada apenas no veículo do transporte e no transporte rodoviário, dá, com certeza, sinais de desgaste. O abandono das linhas de trem e demais formas de transporte urbano, como o metrô, também aponta uma falha de nós todos em relação não só ao presente, mas também ao futuro.
É cada vez mais difícil compreender as críticas de alguns setores da sociedade - alguns setores, não todos -, como aconteceu, recentemente, em São Paulo, onde se tentou implementar - no meu entendimento, corretamente - ciclovias e ciclofaixas. Houve protesto contra a implantação dessa forma de transporte baseado nas bicicletas, adotada nas principais potências do mundo. Lá provou-se que pode dar certo, e não só pode, como deu certo.
Lembro aqui a minha capital - minha capital porque sou do Rio Grande -, a capital de todos os gaúchos e gaúchas, Porto Alegre. Num dia de manifestação ciclística, em que centenas de pessoas, famílias, crianças andavam nas ruas de bicicleta, houve lá uma grande tragédia: um motorista irado, irritado, avançou sobre o grupo, num ato de covardia, atropelando pelo menos nove pessoas.
A realidade é dinâmica. A história traz a evolução tanto no Parlamento, quanto na sociedade civil organizada, construindo alternativas cada dia mais reais.
A busca pelo transporte público de qualidade foi um dos estopins das manifestações também conhecidas como jornadas de junho e julho de 2013. É pelo direito, nas cidades, à mobilidade que a nossa juventude se mobiliza e demonstra que nossas lutas por liberdade não foram em vão, inclusive no enfrentamento à ditadura. Não foi por R$0,20 que eles foram às ruas. O debate da mobilidade urbana e sustentabilidade provoca a população a se manifestar por mais avanços nessa área, pelo direito humano à vida e a cidades mais humanizadas, por mais democracia nas estradas, que devem ser pensadas também para as pessoas e não só para o transporte, seja de passageiros, seja de carga.
Para isso e para essa democracia avançar, a Comissão de Direitos Humanos se enche de esperança, por ser provocada pela sociedade organizada a abrir, mais uma vez, este espaço, como já fizemos no passado, para o debate sobre o futuro do Brasil e do Planeta.
Essa foi uma rápida introdução e, a partir deste momento, nós vamos convidar os nossos painelistas, começando pela Mesa nº 1. Então, vamos para a primeira Mesa.
Eu chamo o Gerente de Acessibilidade e Transporte Cicloviário, da Secretaria de Mobilidade do DF, Sr. Ronaldo Alves. Por favor, Ronaldo Alves, que já esteve conosco, aqui, e deu grandes contribuições ao debate. Lembro-me de que, numa oportunidade, trouxe até uma bicicleta. Foi uma novela para entrar, mas, enfim, entrou com a bicicleta e a botamos aqui na frente. Seja bem-vindo, Ronaldo Alves!
Chamamos, também, o Subchefe do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho, Professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações, da Universidade de Brasília, UnB, Professor Fábio Iglesias. Por favor, Dr. Fábio Iglesias.
Chamamos a Professora Maria Rosa Ravelli de Abreu, Doutora do Decanato de Extensão da Universidade de Brasília, UnB. Seja bem-vinda também! Já esteve aqui conosco, também, outras vezes.
Edson Nunes, Inspetor Chefe da Divisão de Planejamento Operacional da Coordenação-Geral de Operações da PRF. Seja bem-vindo também!
Dario Rais Lopes, Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana, representando, aqui, o Ministério das Cidades. Seja bem-vindo!
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Aqui eu cumprimento, mais uma vez, o Ministério das Cidades, que nunca deixou de mandar um representante todas as vezes em que os convocamos ou, diria, os convidamos. Em nenhum momento deixou de mandar representante. Eu sou daqueles que dizem que, em audiência pública, não tem de, obrigatoriamente, estar presente o Ministro. Sabemos que aqui são dezenas de audiências públicas em todas as duas Casas. Eu sempre digo que o bom Ministro não é aquele que é doutor em todas as áreas, mas que tem pessoas altamente capacitadas para representá-lo em momentos como este. E é isso o que se faz agora.
Eu quero dizer que não tem nada a ver a primeira Mesa com a segunda Mesa ou a terceira Mesa na questão de hierarquia. Eu chego até, às vezes, a dizer que eu preferiria sempre estar na terceira Mesa, se fosse convidado, porque a terceira Mesa é a que fica até o final quando o debate se dá com a Mesa e o Plenário. Então, todos aqui têm o mesmo valor. Apenas eu sigo a orientação que recebi, pois é feita de forma tranquila e sem nenhuma distinção a seleção de quem deveria estar na primeira ou segunda Mesa.
Cada um dos convidados terá dez minutos com mais cinco de tolerância. Depois, vamos para a segunda Mesa, para a terceira Mesa e, então, abrem-se os debates entre os convidados, se assim o entenderem, e a terceira Mesa fica até o encerramento.
Ao longo dos anos em que presidi esta Comissão outras vezes - por duas vezes, tendo voltado este ano -, eu sempre optei por termos alguns vídeos que falassem do tema, deixando sempre as autoridades convidadas também apresentarem vídeo. Então, por provocação, melhor, sugestão da assessoria da Comissão, nós vamos passar um pequeno vídeo agora. Depois, um outro, tudo de cerca de dois minutos, mais ou menos; o outro no intervalo de uma Mesa para outra.
O primeiro vídeo leva o título: "Pateta Vive Dia de Cão no Trânsito." O personagem Pateta, de Walt Disney, torna-se um monstro ao conhecer a sensação do poder em seu carro.
Eu achei muito real quando me sugeriram, porque, às vezes, o cidadão, em posse de um volante, acha que é Deus ou o diabo, porque está ali para o mal e para o bem e se transforma. Tomara todos se transformassem para o bem! Mas a gente quer combater o mal, por isso a sugestão do vídeo.
(Procede-se à apresentação de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Como vimos, são exemplos de tudo aquilo que não poderia acontecer, mas que, infelizmente, é uma realidade.
Eu, particularmente, digo a vocês que, esses dias, fui ao cinema assistir a um filme intitulado "Relato Selvagem". No filme, os dois personagens fazem essa briga durante o trajeto e, ao final, morrem os dois com a explosão do carro. Tudo isso de tanto brigarem no trânsito. Para quem assiste ao filme fica essa mensagem no final.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Já vi que o Luduvice assistiu também ao filme.
De fato, foi chocante o resultado final: com a agressão durante todo o filme, os dois acabam morrendo dentro do carro.
Muito bem. Começamos, então, de imediato, agora, depois dessa rápida apresentação das nossas preocupações, embora descontraidamente, passando a palavra ao Gerente de Acessibilidade e Transporte Cicloviário, Secretário de Mobilidade do DF, Sr. Ronaldo Alves.
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O SR. RONALDO ALVES - Bom dia!
Eu queria, mais uma vez, Senador, agradecer o convite, que é, às vezes, até uma convocação para, mais uma vez, debater esse assunto tão importante.
Queria fazer, inicialmente, um histórico rápido aqui da importância desta Comissão para esse tema. Quando se fala em mobilidade, quem mexe um pouco mais com isso há algum tempo sabe que a palavra, o termo "mobilidade" é relativamente recente e sua compreensão de maneira clara e até conceitual é bem diversa muitas vezes.
O Senador relutou um pouquinho, mas eu vou detalhar um pouco. No dia 25 de fevereiro, aconteceu aquele incidente em Porto Alegre, em que um grupo de ciclistas do Movimento Massa Crítica estava trabalhando o seu perfil de uso de rua para divulgar as suas ações, suas necessidades nas cidades, e foi atropelado pelo Sr. Neis, que por sinal não estava livre. Isso foi um incidente que aconteceu no dia 25 de fevereiro e que provocou uma comoção nacional.
E nós, que trabalhamos pela mobilidade e pela qualidade de vida dos cidadãos, através de diversas entidades e grupos de ciclistas, a própria ONG Rodas da Paz, da qual eu era Presidente na época, fizemos aqui, nesta sala, uma audiência chamada de audiência extraordinária. Como foi uma coisa muito de imediato, não tinha como chamar os demais membros da Comissão para fazer uma reunião ordinária, nós usamos o Regimento do Senado para as Comissões. Já que o assunto era extremamente importante e a sociedade estava lá fora - porque nós fizemos um evento na rua chamado "Enterro Simbólico do Código de Trânsito", o Senador e sua assessoria nos receberam na rampa do Congresso e nos trouxeram aqui para dentro, todos de bicicleta. Só que as bicicletas não podiam entrar. E, como ele relatou agora, foi solicitado que apenas uma única bicicleta passasse - a bicicleta do Weimar Pettengill, dobrável, porque era pequenininha e foi colocada do outro lado da bancada. Isso foi importante e foi simbólico para nós: foi a primeira vez que uma bicicleta entrou de verdade nesta Casa, numa Comissão tão importante, que trata da qualidade de vida e do respeito à cidadania, que é a CDH.
Continuando, do jeito que vocês estão vendo aí, as pessoas estão falando e, às vezes, a gente conversa no pé do ouvido. E conversando com o Senador, eu perguntei a ele onde estava o PL. Cadê o PL da Lei da Mobilidade? O PL 12.587 de 2007 estava perdido aqui dentro da Casa! Na época, nós descobrimos, pela assessoria do Senador, que estava preso na Comissão de Relações Exteriores. E aí passaria por quatro Comissões. Isso era 3 de março de 2011. A gente fez um acordo com a assessoria para nos passar os endereços e contatos dos presidentes das Comissões e fizemos uma via sacra aqui, durante o ano inteiro de 2011, tentando apressar um pouco essa tramitação. Mas sem demorar muito, o PL 1.687, de 2007, no dia 3 de janeiro de 2012, vira a nossa Lei da Mobilidade, que já estava tramitando aqui desde 1995, com diversos números. Vai para o último apensamento, e vira o 1.687, e vira a Lei da Mobilidade.
Para gente, é importante lembrar como é bacana a sociedade vir a estas Casas de cunho político, tão mal faladas - hoje, a classe política está muito defenestrada -, mas é nesses ambientes que as coisas se resolvem. É neste ambiente de cidadania, de convencimento, de argumento, de conversa que as coisas acontecem.
Eu sou muito grato, Senador, pela Lei da Mobilidade ter começado um pouco com essa briga e, fundamentalmente, feito isso nesta cidade, Brasília, que é a sede dos Poderes e uma cidade, o tempo inteiro, pisoteada pelo conjunto de governos que passaram por aqui.
Esse é o primeiro agradecimento que, em nome da sociedade civil organizada ou não, dos grupos de ciclistas organizados com CNPJ ou não, hoje, junto ao grupo de pedestres - agora também estamos juntando nessa nova versão da luta -, fazemos à CDH e ao Senado da República.
Num segundo momento, quero fazer rapidamente uma contextualização e, depois, vou passar a palavra ao Secretário de Mobilidade do Distrito Federal, Sr. Carlos Tomé.
Voltando um pouco ao histórico, ainda em 2005... Para os senhores entenderem como as coisas demoram, falei agora para a Prof. Maria Rosa ali que tudo que nós queremos no contexto de política pública é muito lento na tramitação, não importa onde estejamos trabalhando, se no Legislativo do Senado, no Legislativo da Câmara, se no Executivo. As coisas são muito devagar porque os nossos anseios, nossos desejos são mais prementes do que, muitas vezes, os ritos e os processos daquilo que a gente conhece como Poder Público.
Em 2005, foi criado o primeiro grupo de trabalho, ainda no governo Roriz, para tratar de construção de ciclovias nesta cidade. Nesse grupo de trabalho, conheci a Dr. Mônica Veloso, Leandro Salim e uma porção de pessoas que participaram desse grupo. E aí saiu um relatório, em 2006, que prevê e faz recomendações, por conta dos incidentes acontecidos naquela época. Naquela época, morriam 65 ciclistas por ano; em 2005, foram 71 ciclistas. Olha, que doido! É muita coisa! E hoje, revendo um pouco a estatística, que é muito gelada, com certeza, falecem 32 ciclistas por ano nesta cidade. Não há nada a comemorar, mas a estatística também nos prova que alguma coisa foi feita de lá pra cá.
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Então, foi feito esse grupo de trabalho e com a evolução disso é que vamos começar a montar um pouco da estratégia, com a presença do secretário. Assim, temos o relatório de 2006.
Depois, temos a entrada do Governo Arruda, em que ele recebe as primeiras demandas disso. E a partir de um sistema de microrredes pesquisado na comunidade - pesquisas de origem ou de destino -, saem as primeiras linhas de um rabisco que seriam uma possível malha cicloviária para o Distrito Federal. Em seguida, ainda no Governo Arruda, ele faz a licitação de projetos executivos. Aí, temos uma prerrogativa de fazer algo: temos projetos, mas não acontece a licitação dos projetos.
Sai o Governo Arruda, por diversas razões que o mundo inteiro já conhece, e entram alguns dos seus sucessores. Foram vários mandatos-tampão. O seu Vice-Governador, que hoje chegou a Deputado Federal pelo DF, Rogério Rosso, se comprometeu num evento, no Dia Mundial sem Carro, de 2010, a investir em mais estações de ciclovias R$56 milhões. Ele assina um documento que transporta do Buriti ao Museu da República, num evento simbólico - porque era próximo de campanha eleitoral ele não podia assinar nada de muito importante -, mas faz o compromisso. Ele não executou isso, mas, pelo menos, deixou um passo do que hoje achamos na Secretaria: recurso, ainda dentro do Programa de Transporte Urbano (PTU), do convênio BID com a Secretária de Transportes antiga do Governo do Distrito Federal.
O próximo passo disso é o Governador Agnelo. Na Câmara Legislativa, numa audiência pública que trabalha sobre o PDTU ou aprovação do Plano de Transporte Urbano, nós o pegamos no corredor e falamos: "Puxa! Assina isso aqui!". Era um documento feito por ciclistas: Manifesto dos Ciclistas, havendo, depois, uma compensação disso ainda no Parque da Cidade, ao vivo, para a TV mostrar que ele se comprometia. Lá, no primeiro item, é dito: "Governador convence todo mundo aí a fazer a licitação das obras cicloviárias. Tem projeto do Executivo. Está lá no seu Governo".
Aí, andando um pouco mais à frente, em novembro de 2011, no dia 21 de novembro de 2011, sai no Correio Braziliense algo que não esperávamos: "O Governo do Distrito Federal vai investir R$122 milhões em ciclovias". A palavra "ciclovias", essa palavra soa como algo positivo em nossos ouvidos, mas pode ser bem negativo às vezes. De qualquer maneira, foi feita a licitação e essas são as obras que temos hoje no Distrito Federal: uma malha de mais de 450km de ciclovias e de ciclofaixas construídas. E é a parte mais interessante, porque funciona como uma base daquilo que é uma coisa muitíssimo antiga por que se está brigando.
Da mesma forma, Senador, em São Paulo, olhando sem muita expectativa profissional, porque não somos da área de arquitetura e urbanismo, somos somente militantes, muitas vezes, do contexto da bicicleta, apaixonados por ela, como transformação da cidade, com certeza, sabemos que não há os melhores projetos. E não vai haver mesmo, porque essas coisas são imediatas, necessárias, para que possamos dar aquele passo no sentido de botar o pé na fresta da porta para que ela nunca mais se feche.
Fazendo uma comparação rápida entre o que foi investido até agora, no Distrito Federal, em infraestrutura cicloviária - vamos confiar que foram R$56 milhões e alguma coisa a mais e o Orçamento do GDF, em 2011, dava R$33,6 bilhões -, exatamente 0,3%, 0,5% do total do Orçamento foi investido nisso. Grande parte disso foi investido em outras vias - sistema viário, viadutos, sistema de transporte, BRT e algo assim. É muito pouca prioridade para infraestrutura de bicicletas.
É por isso que louvamos, agradecemos e falamos muito bem, até hoje, da infraestrutura cicloviária. Ela foi uma vitória desta cidade, e é um símbolo. Façam!
Depois, vai acontecer a parte mais importante, falando especificamente do que estamos fazendo agora. Pesquisei nas nossas 27 Unidades da Federação e o tema "Mobilidade" realmente entrou na pauta de tudo quanto é canto. Entrou nas campanhas políticas de todos os níveis: de prefeito a governador e a Presidente da República. Então, há o compromisso da Presidenta Dilma, também do candidato Aécio e de todos.
O mais importante é que a mobilidade vai deixar, no DF, de ser apenas uma palavra e um sonho, porque, pela primeira vez na estrutura institucional, temos mobilidade dentro de uma secretaria de Estado de Governo: a Secretaria de Mobilidade do Distrito Federal, cujo Secretário chamo gentilmente aqui para compor a Mesa, se me permite, Senador, Carlos Henrique Tomé.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Encerramos a fala do Sr. Ronaldo Alves. Foi combinado o jogo antes: ele queria fazer uma pequena introdução e depois, segundo ele, a personagem principal vem à Mesa para encerrá-la, que é o Sr. Carlos Henrique Rubens Tomé Silva, Secretário de Mobilidade do DF. (Palmas.)
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Passamos, de imediato, a palavra ao Professor Fábio Iglesias, que é Subchefe do Departamento de Psicologia Social e do Trabalho, e Professor do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social, do Trabalho e das Organizações, da Universidade de Brasília, UnB.
Já registro, aqui, a presença do Senador Hélio José, sempre presente, peleador, lutador, que orgulha a Casa. É uma bela surpresa para quem não o conhecia no cenário nacional. Conheciam-no bem em Brasília, mas, como Senador... Agora, ele é Senador pelo DF e pelo Brasil.
Parabéns, Senador Hélio José. (Palmas.)
Professor Fábio, tem dez minutos, com mais cinco, como cada um dos painelistas.
O SR. FÁBIO IGLESIAS - Pois não.
Bom dia a todos.
Eu gostaria de cumprimentar o Senador Paulo Paim. Obrigado pela organização desta audiência pública.
Cumprimento meus colegas de Mesa. Acho a oportunidade, aqui, excelente para debater esse tema.
O Senador Paulo Paim começou mostrando o vídeo do Pateta, com situações que são cômicas - tragicômicas, na verdade - e servem como um bom cenário para a minha fala, porque o que vou mostrar é uma perspectiva um pouco distinta dos problemas de trânsito, que envolvem uma área específica da Psicologia, que é a Psicologia Social.
Então, o grande desafio - e isso fica claro nas falas anteriores e, sobretudo, naquele vídeo - é que precisamos mudar comportamentos. Quando se fala de mobilidade urbana, quando se fala da ilusão do transporte individual, quando se fala em aumentar o uso da bicicleta e de outros meios alternativos de transporte, basicamente, esse é um problema de mudança de comportamento.
O Brasil é antiexemplo, como se sabe, no mundo. Ele é o campeão, na verdade, de mortes no trânsito, uma estatística vergonhosa. Os acidentes matam mais que câncer e mais que homicídios, e 40% das vítimas são motociclistas e 25% são ciclistas ou pedestres, o que é outra estatística absolutamente inaceitável.
Os principais fatores costumam ser elencados como: problemas nas vias, problemas nos veículos, manutenção, infraestrutura, obviamente, problemas relacionados a treinamento ou o que se chama de educação para o trânsito, falhas na sinalização, que todos conhecemos, uso do celular, embriaguez e assim por diante, mas todos esses problemas passam por um outro fundamental, que é um problema de normas sociais. Então, o problema não é só técnico, o problema não é só de infraestrutura, é, claramente, um problema de comportamento, um problema de como as pessoas convivem, como elas se influenciam, se deixam influenciar e assim por diante.
A Psicologia é muito conhecida pelos exames psicotécnicos - todos os motoristas, de todas as categorias, ciclistas e assim por diante têm que passar por exames psicotécnicos -, mas ela é muito mais do que isso.
Então, por exemplo, a Psicologia do Desenvolvimento se ocupa com as diferentes fases do desenvolvimento. As pessoas esquecem, por exemplo, que um carrinho de bebê participa do trânsito, assim como um idoso que faz uso de uma bengala, um andador e assim por diante.
Existem problemas que estão relacionados à percepção. Por exemplo: a acuidade do motorista, a sua audição, a sua estimativa de distância, tempo de reação para evitar uma colisão. A Psicologia Cognitiva se ocupa, por exemplo, de problemas de raciocínio, memória, tomada de decisão.
A Psicologia da Saúde, por razões óbvias - aliás, o Senador Paulo Paim falou do caso lamentável que aconteceu com a Germanwings na semana passada; então, claramente, é um problema de saúde mental -, a Psicologia Social é uma área que se ocupa, ainda, de outros fenômenos que perpassam todos eles, problemas que envolvem normas, atitudes, comunicação, conflitos. Ela é, por excelência, a ciência da influência social.
Quando nós olhamos para essa foto de satélite - ela, logicamente, é uma combinação de fotos que mostram o mundo à noite -, conseguimos ver como está a concentração da população mundial. Claramente, se tem um processo crescente de urbanização, mas ele é muito concentrado em algumas áreas. As áreas escuras no globo significam que tem muito pouca gente vivendo ali. Então, 70% da população mundial, hoje, vivem um processo de urbanização e esse número é ainda maior no Brasil.
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Se nós destacarmos ali as informações do Brasil nessa foto, claramente veremos que, considerando o território como um todo, a gente tem uma média de 23 habitantes por quilômetro quadrado, mas, considerando os quilômetros quadrados urbanos, e as grandes cidades respondem, obviamente, pela maior parte da população, nós temos mais de seis mil habitantes compartilhando um espaço que é muito restrito. Entre outras coisas, isso significa crescimento vertical muito mais que horizontal, uma alta concentração. E, claro, problemas que estamos acostumados a enfrentar. O problema, por exemplo, que envolve água e energia mais caracteristicamente no Sudeste é o resultado desse processo de alta concentração e alta demanda por produtos, serviços e espaços, o que caracteriza os problemas de mobilidade, os problemas de trânsito, logicamente.
Então, o trânsito é basicamente um problema de disputa por espaço. Uma lei física descreve, claramente, que dois corpos não podem ocupar o mesmo espaço no mesmo tempo. Então, nós temos um veículo para cada quatro habitantes no Brasil e quase a cada um minuto nós temos um acidente e, a cada sete minutos, um atropelamento. De novo, estatísticas inaceitáveis.
Essa maior densidade significa que nós temos uma demanda por espaço que é muito maior do que a oferta e as consequências serão, claramente, congestionamento, barulho, acidentes, conflitos, agressões, problemas ambientais.
É importante destacar aqui que muitas vezes os problemas tomados como mais importantes são aqueles que envolvem grandes acidentes, mas pequenos conflitos que acontecem no dia a dia respondem muito mais por nossa qualidade de vida, por nosso aborrecimento diário, problemas que poderiam plenamente ser minimizados.
Esta é uma foto famosa. Quem se interessa pela temática de mobilidade, de bicicleta, conhece. Ela foi feita pela Universidade de Munique, Alemanha. E mostra que, claramente, a rua fica muito mais sustentável, muito menos densa, de qualquer ponto de vista, se a mesma quantidade de pessoas que poderia estar utilizando automóveis fizer uso de um ônibus ou simplesmente de suas bicicletas. Então, essa é uma imagem bastante simbólica. Mas há algo de errado no trânsito brasileiro na forma como estamos fomentando uma quase dependência do automóvel, do veículo automotor como meio de transporte.
Esses dados aqui mostram também, claramente, que existe uma superconcentração, principalmente na Região Sul e Sudeste do Brasil no caso dos carros. No caso das motos, está um pouco mais equilibrado por razão de ordem financeira e geográfica. Enfim, de novo essa concentração muito problemática de nossa área.
Sob o ponto de vista da Psicologia Social, isso pode ser entendido como um dilema social. Ora, o que é o dilema social? Toda vez que nossos interesses individuais são conflitantes ou contraditórios com interesses da sociedade, do coletivo. Isso é muito conhecido na chamada Teoria dos Jogos, utiliza-se muito esse paradigma em Economia. A grande questão é: eu devo utilizar o transporte individual, o que provavelmente me trará benefícios individuais: conforto, segurança, abrigo da chuva, etc., ou fazer uso de um sistema coletivo que traria, logicamente, benefícios para toda a sociedade, pois significa que estou minimizando o impacto de poluição, congestionamento, barulho, acidentes, tudo o mais? Então, os dilemas se colocam desta forma: usar o carro ou usar o ônibus; usar o carro ou usar a bicicleta; usar o carro ou fazer uso do metrô. E todas essas situações podem ser entendidas como uma dinâmica de cooperar ou competir com as outras pessoas, claro! Se eu for garantir meu conforto individual ao fazer uso do automóvel, eu estou, entre aspas, "competindo com outros usuários"; se eu fizer uso de meios alternativos, meios públicos, meios não poluentes, por exemplo, eu estou cooperando com as outras pessoas.
Então, nós podemos entender desta forma: eu tenho uma situação ideal se duas partes cooperarem, eu tenho uma situação não ideal se um cooperar e um competir.
É típico quando você pede que as pessoas mudem e adaptem seu modo de transporte elas dizerem: "Eu não vou fazer isso porque não vejo os outros fazendo". Então, é uma dificuldade muito grande. Logicamente, se todos resolverem usar automóvel, se todos resolverem competir, nós teremos uma dinâmica inviável.
O que é interessante no cenário de trânsito é que todas as situações de ultrapassagem e estacionamento ou simplesmente deixar meu carro em casa e fazer uso da bicicleta, elas atendem também esta dinâmica que é a de ceder ou forçar minha vontade, ceder ou forçar passagem. É interessante também que, se as duas partes cederem, se todo o mundo resolver cooperar, a dinâmica também não funciona. Então, há nuances aí muito interessantes, não é?
Aqui existem exemplos típicos: se eu tenho de ceder a vez quando essa senhora está atravessando a rua, isso significa que eu terei de retardar minha movimentação e dar prioridade a ela.
Aqui, um motorista que estaciona em cima da calçada e, logicamente, passa a provocar todo o tipo de aborrecimento ao pedestre.
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Aqui é uma situação inviável. Essa é uma foto de um lugar não distante aqui do Senado.
Quando se utiliza uma estratégia como esta: um carro a menos, claramente fica evidente qual é o dilema. Quer dizer, eu estou deixando o carro em casa, eu estou contribuindo para o trânsito como um todo e privilegiando, aqui, benefícios coletivos.
O problema é que existem barreiras para se mudar comportamento. Uma delas é a incerteza. As pessoas dizem: "Não, isso não é um problema! Isso não está muito claro. Eventualmente o Governo vai melhorar o trânsito e nós vamos resolver". Ou a negação. Há pessoas que simplesmente se recusam mudar. Há pessoas que dizem: "Eu não vou mudar o meu comportamento porque eu não vejo outras pessoas mudando, então não farei esse sacrifício sozinho". Ou simples reatância: "Eu não vou fazer só porque estão me mandando, só porque existe uma lei ou um incentivo para isso". Ou o tokenismo, por exemplo, que é comum nas ações afirmativas: "Eu já faço a minha parte: eu ando de bicicleta no domingo, à tarde, com o meu filho, então eu já estou colaborando para a mobilidade urbana". Conflito de prioridade: "Eu gostaria de fazer isso, mas eu tenho uma agenda apertada, eu não tenho tempo". Falta de identificação: "Eu não sou daqui; eu não sou desta cidade; eu moro aqui há pouco tempo". E, finalmente, aquilo que as pessoas identificam como quase uma tendência à inação: "Se eu deixar o meu carro em casa o impacto é quase zero. Então não faz muita diferença e eu vou acabar fazendo do mesmo jeito". Todos pensando dessa forma, logicamente você tem uma situação insustentável.
Aqui são alguns trabalhos que temos feito na área de Psicologia, identificando quais são essas barreiras psicológicas que as pessoas acabam expressando que impendem um consumo mais responsável, no caso nosso hoje, as impede de fazerem mais uso de transporte alternativo ou simplesmente de buscar formas menos poluentes e menos conflituosas de locomoção. Tipicamente, o brasileiro ou nega o problema ou identifica prioridades que são mais importantes, obviamente, do que essa mudança de comportamento.
Em uma outra linha de pesquisa temos identificado, por exemplo, quais são as justificativas que as pessoas adotam para não se comportar de forma melhor em relação à infração de trânsito, ao respeito ao pedestre, ao respeito ao ciclista, e assim por diante.
Então, a grande pergunta: como promover uma melhor mobilidade urbana?
Claro que tecnologia e infraestrutura são fundamentais, mas elas não são suficientes. Você tem um problema que envolve mudança de comportamento.
O problema das ciclofaixas, que o Senador Paulo Paim mencionou na abertura da Mesa, mostra isto: não basta construir ciclofaixas, não basta quebrar recordes de quilômetros construídos se isso não for acompanhado propriamente de uma mudança de comportamento. Então isso envolve desafios, por exemplo, hábitos: deixar o carro em casa, deixar de usar o carro para ir à esquina comprar pão; cultura: temos que valorizar os problemas ambientais, valorizar mais a bicicleta; adaptação ao clima: pedalar no sol ou na chuva. São desafios típicos que temos em nosso País.
Algumas coisas já se sabe que não funcionam, a literatura científica mostra claramente: campanhas de “conscientização” - entre aspas -, porque se o recado for: “seja mais consciente”, não funciona; elas têm uma eficácia muito limitada. Recados do tipo: "seja melhor", "você é responsável", "não corra" não costumam, realmente, gerar uma mudança de comportamento. As pessoas não param de fumar porque a gente diz a elas que fumar faz mal à saúde. E isso é inquestionável. Leis sem fiscalização obviamente não funcionam. Todos os nossos problemas de saúde pública, direitos do consumidor, nossas leis, muitas vezes são excelentes, mas elas não funcionam. Radares e pardais têm também eficiência também limitada porque funcionam apenas localmente, todos sabemos disso. E infraestrutura sem planejamento de uso. É preciso investir em estacionamentos para bikes, vestiários, transporte alternativo, e assim por diante.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Mais cinco minutos.
O SR. FÁBIO IGLESIAS - Obrigado.
Quais são as intervenções, então, que realmente funcionam?
Primeiro, o chamado marketing de normas sociais. Um conjunto de trabalhos tem mostrado que quando fazemos levantamento de opinião pública e divulgamos o que a maior parte da população pensa e como se comporta a respeito isso gera mais mudança de comportamento. Com dados como, por exemplo: "Oitenta e cinco por cento da população são a favor das ciclovias, e você?”, as pessoas tendem a mudar suas atitudes em direção àquilo que as outras pessoas parecem estar mais expressando.
Segundo, programas de recompensa, não necessariamente financeira. Por exemplo: descontos em produtos e serviços, bônus em seguros pessoais - imagine bônus, por exemplo, em seguros de carros se você for mais incentivado a usar a bicicleta, ou ir a pé, ou de ônibus -, acesso facilitado. Um shopping aqui em Brasília tem feito uma estratégia muito interessante ao prover acesso facilitado se você chegar de bicicleta. Tem lugar até para carregar bicicleta elétrica, o que é muito interessante. E logicamente dá a impressão, estamos falando de um aspecto central de psicologia: as pessoas querem mostrar que elas se preocupam com o ambiente, que elas gostam de andar de bicicleta. Então, elas gostam de se sentir bem como pessoas que são gentis, que são cool, como se diz em inglês, que são legais. O símbolo de um carro a menos justamente passa essa ideia. Então, estratégias como essas têm que ser mais fundamentadas.
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Aqui uma série de trabalhos que desenvolvemos na Universidade de Brasília. Temos todo o interesse em fomentar mais as intervenções baseadas nesse tipo de conhecimento.
A Psicologia é, por excelência, a ciência que se volta para a mudança de comportamento. Ela é bem fundamentada, trabalha com conceitos e teorias que são robustos, métodos científicos rigorosos, análise de dados qualitativos e quantitativos - eu mesmo sou professor de Estatística lá no nosso departamento. E nós temos aplicações que têm sido testadas e aprimoradas em diversas áreas, em especial nas áreas que envolvem mudança de comportamento no trânsito. E ela costuma fomentar políticas públicas nos países desenvolvidos.
Nós aqui no Brasil precisamos seguir o exemplo, ao invés de simplesmente querer reinventar a roda - perdoe o trocadilho. A Psicologia tem muito a oferecer sobre isso, e espero que instâncias como esta audiência pública possam aumentar esse tipo de colaboração.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem. Professor Fábio Iglesias, meus cumprimentos.
Sem sombra de dúvida, a Psicologia Social e do Trabalho cumpre um papel fundamental no combate aos acidentes no trânsito, como também em outras áreas - é o caso desse avião, do piloto. Fui relator de um projeto aqui que regulamenta todo o sistema principalmente de trabalho nos aviões, dos pilotos. E os psicólogos, não eu, que vieram, na época, aqui me subsidiar nas audiências públicas diziam que isso poderia acontecer, o que aconteceu agora no âmbito internacional, devido à pressão psicológica a que os pilotos estavam submetidos. Eles deram até o exemplo mais prático, sem condenar o piloto, daquele incidente de São Paulo em que morreu o nosso presidenciável Eduardo Campos. A pressão a que eles estão submetidos é enorme.
Quanto ao caso desse piloto, no encerramento - eu pensei no encerramento para nós fazermos um debate tranquilo -, faremos uma homenagem àqueles que morreram aqui, quem sabe com um minuto de silêncio ou algo assim, no encerramento da nossa audiência pública.
Mas, meus cumprimentos. Eu entendo que, cada vez mais, nesses tempos difíceis, inclusive no Brasil - estamos, querendo ou não, em uma crise que não é boa -, a Psicologia cumpre, no meu entendimento, um papel fundamental no diálogo com todos, inclusive com os políticos. Quem sabe, com tratamento mais adequado, os políticos possam melhorar? E eu digo todos. Eu, por exemplo, tenho um irmão que é psiquiatra, e ele faz consulta normalmente com uma psicóloga, é fundamental para ele isso. Ele acha que todo cidadão deveria ter esse cuidado.
Muito bem. Vamos lá. Alguns vão dizer: "Ele está fazendo propaganda aqui para os psicólogos", mas não tem nada a ver. Acho que a Psicologia cumpre um papel importante na formação de todos nós de, enfim, trabalhar com a mente - estou certo, doutor? Estou dando um palpite, não sou psicólogo. Sou um peão metalúrgico. (Risos.)
Se você aí estiver discordando, pode dizer: "Não, não é bem assim, mas eu posso te explicar o que é".
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Tocou a campainha para mim, para eu parar de falar e passar a palavra aos convidados.
Eu queria já cumprimentar também o Senador José Medeiros, sempre presente, aqui, nas segundas-feiras, assim como o Hélio José. Sei que muitos Senadores têm suas agendas no Estado. Mas como esses estão aqui em plena segunda-feira para participar de reunião de debate, quero aqui fazer os meus cumprimentos aos Senadores Hélio José e José Medeiros neste momento. (Palmas.)
Professora Maria Rosa Ravelli de Abreu, Doutora do Decanato de Extensão da Universidade de Brasília (UNB).
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A SRª MARIA ROSA RAVELLI DE ABREU - Quero cumprimentar a todos e, mais uma vez, parabenizar S. Exª o Senador Paulo Paim pela sua luta permanente em discutir os diferentes aspectos dos direitos humanos.
O tema do transporte público, da mobilidade e das mortes no trânsito, hoje, no nosso País, nas nossas grandes cidades, é um vetor que fere os direitos humanos. Temos um transporte público que, na verdade, segrega os pobres dos ricos. Temos um modelo de transporte público que, na verdade, gera um apartheid social. Além de prejudicar muito, de ser um transporte ineficiente, que prejudica muito a economia, impacta negativamente na economia, prejudicando o meio ambiente e a saúde das pessoas, e fere os direitos humanos.
O locus, o lugar muito próprio para pensarmos o tema do transporte público, é esta Comissão, que talvez tenha o papel de buscar um pacto, uma pactuação de transição para um modelo mais humano e eficiente. O Senador falou, no início, da morte dos trilhos. Matamos os trens; somos radicais quanto a isso. O ônibus tem um papel muito importante no sistema de transporte, a bicicleta tem um papel muito importante, mas o trilho é como as artérias no corpo humano, os eixos principais, que têm grande capacidade de levar pessoas. Os ônibus alimentam, assim como as veias, os vasos alimentam nossas artérias localmente. Então, o sistema tem de ser reestruturado, e isso passa por uma pactuação.
Eu acho que é uma pactuação o que se iniciou na Europa nos anos 60, 70, chegando hoje a bom termo, a ponto de, por exemplo - vou dar o exemplo de Paris, mas isso vale para a maioria das cidades hoje -, haver um cartão mensal em que o cidadão anda no trem urbano, no metrô leve de superfície (VLT), no metrô, nos ônibus elétricos - há a transição para o ônibus elétrico, por conta das exigências das emissões e da cidade mais silenciosa. Com um cartão único, é assegurado ao cidadão o direito de ir e vir. Ele usa bicicleta, ele usa até o carro elétrico de aluguel. A última inovação da prefeita, que é uma espanhola, a Prefeita Anne Hidalgo, de Paris, é colocar uma caminhonete elétrica de aluguel para, de repente, se poder fazer uma pequena mudança, carregar um material. Então, isso tudo é compartilhamento do transporte.
É até interessante pensar que, no início do século passado, Henry Ford dizia que desejava colocar um automóvel na casa de cada americano. Talvez, hoje, principalmente os jovens pensem: "Puxa! O carro é um objeto de consumo. Eu posso compartilhar. Eu uso o meu cartão quando eu preciso". E cabe ao Poder Público ir disponibilizando essas alternativas.
Aí entramos na questão da mortalidade e dos acidentes. Em um trânsito mais suave, eficiente e humano, usa-se menos o automóvel, e a autoridade pública regula a velocidade. Podemos não acreditar, mas, em Londres, por exemplo, são 20 milhas/hora; em Paris, 30 milhas/hora. Aqui, achamos que é impossível andar a 30km/h, mas é muito agradável. O motorista começar a ver a cidade, as árvores. Na verdade, o paulistano anda, em média, a 8km/h.
Então, regular a velocidade, fazer a transição para os ônibus elétricos, fornecer o cartão mensal, semanal, diário para assegurar o direito humano de ir e vir, como diz a Declaração dos Direitos Humanos de 1948, são alternativas que temos.
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Então, para vermos como estamos, esse exemplo que roda nas redes sociais é muito interessante, para vermos, digamos assim, nosso comodismo, nosso descuido com os direitos humanos.
Xangai, na China, em 1993, iniciou o metrô. Hoje está desse tamanho. O do Rio de Janeiro continua igual. E o de São Paulo? Comparando com o de Tóquio, segundo alguns estudos de especialistas, daqui a 150, 200 anos, se continuar o ritmo, o que teremos? Nossas cidades não têm metrô. Porto Alegre é pouquinho... Na Bahia está parado. Em Recife, Fortaleza...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Há quem diga que São Paulo tem dia e hora para parar, mas parar mesmo.
A SRª MARIA ROSA RAVELLI DE ABREU - Aqui é o de Brasília, que permitiu toda uma ligação com o setor sul e oeste da cidade. É um metrô que, infelizmente, como na maioria das cidades, ficou parado nesses últimos anos. Nos últimos anos, não cresceu um quilômetro sequer, não teve uma única estação construída. Agora, o novo governo tem compromisso com a sustentabilidade, tem no seu programa melhorar o transporte público - não é, secretário? -, ampliar, modernizar. Esse já é o portal novo do metrô de Brasília.
Aqui, as medidas para redução de velocidade. Vou colocar rapidamente alguns exemplos de como fica uma cidade, essa é Londres, com o limite de velocidade. Você fica com uma cidade muito mais agradável. Ademais, há a questão dos acidentes, que diminuem. Mas, claro, foi muita campanha da comunidade.
Veja bem, essa alternativa é muito interessante para a questão das ciclovias também. Ela pode complementar a rede ciocloviária de uma cidade. Uma rede cicloviária não é só ciclovia nem só ciclofaixa. Numa cidade com a velocidade regulada e com uma via exclusiva para ônibus, como é o caso de Londres, você pode compartilhar a motocicleta e a bicicleta com segurança.
Então, vemos Paris com 30.
Esses são os veículos elétricos, que já estão circulando na maioria das cidades. É um programa da Comunidade Europeia, para fomentar a inovação do veículo elétrico, por hidrogênio, pela questão dos compromissos. Agora em novembro, em Paris, há um novo pacto em relação às emissões de carbono. Então, as cidades estão se preparando. Poucas cidades brasileiras estão se preparando para essa transição do modelo energético a energia solar, para o veículo elétrico. Nós vamos ser obrigados pelos compromissos internacionais.
Eu vejo que o mais importante é a questão dos direitos humanos. O modelo de transporte público das nossas cidades fere profundamente os direitos humanos. Ele promove apartheids sim, além de prejudicar a economia.
Vejam essas mudanças: o vermelho se torna verde; é uma transição do ônibus elétrico, em Londres. Estamos colocando esse exemplo, mas essa transição você encontra em cidades pequenas.
Aqui é o carro elétrico, que está incluído no cartão mensal. Nas cidades brasileiras, sequer temos o cartão mensal para o trem e o metrô.
Não basta apenas melhorar a tarifa; precisa também haver conforto e pontualidade. São Paulo, por exemplo, implementou o cartão mensal - não é, Senador Paim? -, mas a migração não está acontecendo porque todas as medidas que a autoridade pública, no campo da mobilidade, deve tomar são no sentido de favorecer, facilitar a migração do uso intensivo do automóvel. O automóvel é um direito da pessoa, mas tem que ser regulado e deve ser favorecido, de sorte que a pessoa não seja obrigada a usar intensivamente o automóvel no dia a dia. Para isso, essas boas práticas cabe a nós estudar.
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Esse é um utilitário, uma pequena caminhonete, também elétrico; já são 200 veículos. E isso dado o grande sucesso do uso do carro elétrico de aluguel, que são encontrados em São Francisco e em várias cidades americanas e canadenses.
A redução do diesel para 2020 é outra medida.
A prefeita Anne Hidalgo está... Evidentemente, estamos fora do circuito dessas cidades que estão competindo entre si para ver qual é a cidade mais sustentável, mais verde, qual dá mais bem-estar para as pessoas. Este é o desafio do administrador: implementar políticas públicas que tragam qualidade de vida e bem-estar na cidade, porque quase 90% das pessoas, no caso dos brasileiros, moram em cidades. Então, é aqui que precisamos ter bem-estar.
(Soa a campainha.)
A SRª MARIA ROSA RAVELLI DE ABREU - Aqui são as estações novas. Falando de bem-estar, aqui são as estações novas que os metrôs estão renovando. Esse, no caso, é o metrô de Londres. É uma das linhas que estão sendo renovadas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Permita-me, Drª Maria Rosa. A anterior chamou-me a atenção, pelo fato de vermos toda essa briga entre caminhoneiros, com diesel... "Zero Diesel a Paris em 2020".
A SRª MARIA ROSA RAVELLI DE ABREU - É.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Para a realidade brasileira, é algo...
A SRª MARIA ROSA RAVELLI DE ABREU - .... distante ainda.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - ... bem distante.
A SRª MARIA ROSA RAVELLI DE ABREU - Então, essas estações novas se ligam com a convivência democrática nas estações de metrô. Os terminais não são apenas os lugares onde se muda de veículo, onde se faz a transição de um modal para outro, mas um lugar onde se toma um café, compra um livro, encontra pessoas. Então, a qualidade de vida nas estações...
Essa é outra estação feita pelo Foster, um grande arquiteto europeu.
Essa é outra estação, feita em cima de um canal.
Aí a reorganização com racionalidade das linhas - é disso que falamos -, no sentido de que elas precisam ser integradas, com transição para o veículo elétrico, velocidade regulada, pontos de recarga para veículos elétricos, fomento ao telhado solar e compras governamentais de veículos elétricos. Por exemplo, os carros, as caminhonetes, os utilitários do serviço público são uma maneira de se fomentar a produção nacional, no país, de veículos elétricos para limpar o ar e tornar a cidade mais saudável.
No meu entender, esse ponto 6 é o fundamental. É a remuneração a valor justo do serviço público prestado pelos operadores. O modelo atual prevê maximização de lucro. Isso é natural. Se preciso maximizar meu lucro como operadora de uma linha de ônibus, vou buscar dar um transporte mais confortável, manter uma pontualidade. Esse ponto é fundamental. A Prefeita Erundina tentou fazer isso. Ela tentou essa pactuação. Foi bem sucedida. Depois, houve uma reversão no governo seguinte.
Senador Paulo Paim, quanto a esse ponto 6, a Prefeita Erundina tentou pactuar com os empresários, com os operadores esse serviço justo, não maximizando o lucro, porque, não se precisando de lucro exagerado, como era de 18%, o estudo da Ernst & Young mostrou isso lá em São Paulo, cabe ao governo, à autoridade pública, definir o critério da frota, a transição da frota para um veículo confortável, garantir a pontualidade etc.
Então, essa pactuação é a proposta que a comunidade vem fazendo nos grupos de que tenho participado. Ao governo cabe pactuar com os empresários, com os operadores, com os políticos, com os consultores que trabalham para este modelo, porque há muitos consultores que trabalham, advogam esse modelo, acreditam que esse modelo é o melhor. Só que, como foi muito bem colocado aqui, existe a questão do equilíbrio.
Foi colocado o dilema social quando o interesse individual é contraditório com o da sociedade e com os direitos humanos. Então, de repente, eu, como operadora, como consultora desse modelo injusto, posso ter meu interesse individual em contradição com o interesse dos direitos humanos, da sociedade.
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Aqui, essa foto pode ser de qualquer cidade brasileira. É o transporte, é o calvário diário do brasileiro. Isso foi tirado assim: pesquisar engarrafamento. Aí veio isso aí. Não é justo! Para quem tem a chance de morar no contrafluxo do trânsito, morar perto, tudo bem. Mas é injusto - é injusto! - e tem saída que vai beneficiar a todos.
Inclusive, ouvi uma notícia muito interessante de que o VLT de Santos vai ser operado por um grande operador de transporte público. Quer dizer, um operador desse transporte incorreto, ineficiente. O Governo pode pactuar com ele uma transição para um modelo novo, e até operar outros modais.
Esse é o cartão mensal: um é de Londres, um é de Paris, mas há em Nova York, há em todas as cidades médias e grandes do mundo todo onde o transporte é para servir as pessoas em primeiro lugar.
(Soa a campainha.)
E aqui está a questão da legislação: tanto a declaração, o art. 22, que coloca os direitos, como o transporte público, o art. 30, inciso V, da Constituição.
E aqui, finalizando, direitos humanos no transporte público. Para migração do transporte individual para o coletivo, trilhos nas artérias de alta capacidade, integração com ônibus locais, energia limpa e o cartão mensal. É pontualidade, frequência.
Então, seria o fim da segregação, fim do transporte pobre para o pobre, que é o exemplo lamentável, triste das nossas cidades. Mas é muita a fé que a gente tem, muita confiança no esforço, porque já são muitas as audiências feitas pelo Senador Paim, que tem mente e tem coração - que tem mente e tem coração para perceber as mudanças que vão beneficiar todos e inclusive a economia.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Profª Maria Rosa Ravelli de Abreu, Doutora do Decanato de Extensão da Universidade de Brasília, que vincula muito bem essa questão social com o transporte.
Digo sobre algumas MPs que saíram ultimamente que só atacam o andar debaixo, quem mora no porão. E isso não dá; não dá! Não é questão aqui de situação ou de oposição. É preciso haver outro olhar - é preciso haver outro olhar! - para a sociedade brasileira. E gostaria de dizer que esta Mesa aqui está sendo muito rica nessa exposição.
Deixem-me dar até um exemplo aqui; vou deixar uma provocação para o Secretário de Mobilidade do Distrito Federal. Falava baixinho para ele que moro longe daqui, moro na periferia de Brasília, e estou demorando uma hora e meia para chegar lá. Então, perguntava outro dia para um especialista... Moro no caminho de quem vai para o Alphaville, não moro no Alphaville, moro num daqueles condomínios; moro 10km antes do Alphaville, num condomínio por ali. Muito bem. Perguntei outro dia porque não fazem um corte, para a pessoa não ter que ir lá ao Catetinho, ou lá à Ponte JK praticamente para pode vir para cá. O que me disseram? Não, por causa das grandes propriedades. A especulação imobiliária desses terrenos que estão quase todos vazios não quer que atravessem ali uma avenida. Nisso a gente vai ter que pensar. Eles vão ter que ceder, vai ter que haver, sim! É um absurdo que, para você chegar a um ponto x, você tenha que ir do ponto h ao ponto x, para chegar no meio. Vou mencionar aqui o alfabeto: para chegar ao meio do alfabeto, você tem que ir do a ao z, e o x está lá no final. Se fizessem uma via naquela terra que está ali, em que não há propriedade, estaria resolvido um problemão, aqui em Brasília, de tráfego. Dei o exemplo.
Secretário, vamos estudar, para ver se é viável.
Muito bem, vamos lá. Então, agora ao Inspetor-Chefe da Divisão de Planejamento Operacional da Coordenação-Geral da Operação da Polícia Rodoviária Federal, Sr. Edson Nunes.
O SR. EDSON NUNES - Bom dia!
Gostaria de agradecer ao Senador Paulo Paim pelo convite à Polícia Rodoviária Federal.
Achei muito interessante a apresentação do Prof. Fábio e o que foi mencionado também pela professora. Acho que este é, realmente, o grande x da questão, quando a gente fala não só de imobilidade urbana, como na parte de acidentes de trânsito e, infelizmente, também na questão das mortes no trânsito: justamente esse dilema que existe entre o individual e o coletivo.
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Nós da Polícia Rodoviária Federal, desde 2007, 2008, temos procurado trabalhar na questão do uso da estatística para diminuir esses acidentes.
Bem no início da sua fala, o Senador mencionou a questão da comparação do acidente de trânsito com a questão da aviação. E eu achei muito curioso. Fiquei até pensando, quando ele fez a comparação com as mortes no trânsito: é quase um avião por dia, como o senhor mencionou, não é?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS. Fora do microfone.) - Um Boeing por dia.
O SR. EDSON NUNES - Um Boeing por dia.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS. Fora do microfone.) - A consultoria do Senado que conseguiu esses dados.
O SR. EDSON NUNES - É lógico que eu só posso falar em nível de rodovias federais. Para nós, seria mais ou menos um avião desses por semana, só falando em nível de rodovia federal. E aí eu faço aqui uma pergunta: será que nós viajaríamos de avião se caísse um avião por dia ou mesmo por semana? Será que teríamos coragem de andar de avião ou aboliríamos esse meio de transporte? E nós deveríamos trazer isso também para a nossa realidade, vamos dizer assim, terrestre, quando pensamos na questão do automóvel, da motocicleta, porque parece que realmente não pensamos nisso; achamos que somos meio que imortais e que basta pegar o carro e sair.
Recentemente, li um artigo muito interessante. Quando aconteceu aquele caso - a maioria aqui deve lembrar - do garoto em um zoológico, acho que em Curitiba, que foi atacado por um tigre, eu vi uma matéria muito curiosa. E, na hora em que li o título da matéria, falei: mas qual é a relação? O título da matéria era algo mais ou menos assim: o garoto e o tigre no zoológico versus acidentes e mortes no trânsito. Fiquei pensando: qual é a relação? O que tem uma coisa a ver com a outra? Aí, lendo o artigo, achei muito interessante, porque, na realidade, nos dois casos... Se analisarmos o caso do garoto no zoológico, havia, se não me engano, duas cercas de proteção antes da tela onde ficava o animal, e havia ainda vários avisos do perigo de se chegar próximo àquela jaula. Independente disso - e não vou nem entrar na questão dos cuidados ali do pai -, o garoto pulou essas duas cercas, desobedeceu a tudo isso. E o artigo fazia a analogia do trânsito: muitas vezes, o governo, a entidade pública dimensiona para aquela determinada via um limite de velocidade, ou um "proibido ultrapassar" ou "não estacione aqui". E nós, da mesma forma que o garoto, mesmo sabendo do risco, ainda continuamos fazendo a coisa errada. Achei uma analogia perfeita.
Se nós analisarmos, mais uma vez, falando, é claro, de rodovia federal, não chegam a 4% os acidentes de trânsito em rodovia federal que têm como causa a colisão frontal. O tipo de acidente colisão frontal representa, aproximadamente, de 3% a 4% dos acidentes. Porém, esse mesmo tipo de acidente, colisão frontal, representa quase 40% das mortes no trânsito das rodovias federais. Então, com base nisso, procuramos trabalhar a estatística - o professor até falou que também trabalha na área de estatística na Universidade de Brasília.
A Polícia Rodoviária Federal começou a usar, então, a sua estatística, de que forma? Primeiro, na coleta dos dados. Hoje em dia, todo Boletim de Acidente de Trânsito da Polícia Rodoviária Federal, assim que o policial encerra essa ocorrência, já faz parte do nosso banco de dados. Depois desse boletim no banco de dados, conseguimos extrair, então, e fazer uma análise de todo o acidente, das mais diversas formas, para que possamos, então, criar ações para coibir o acidente, minimizar a ocorrência de acidente e, por decorrência também, a morte no trânsito.
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Por exemplo: em que dia da semana o acidente mais ocorre? Em que horário ele mais ocorre? Qual é o tipo de acidente que mais ocorre? Em que hora e em que local? E, a partir dessa análise, vemos o que precisa ser feito. É uma questão única de fiscalização? Se positivo, qual é o tipo de fiscalização que tem que ser adotada? É uma questão de infraestrutura? Se positivo, a gente faz ofício aos órgãos responsáveis, como, por exemplo, o DNIT ou as concessionárias, no caso das rodovias que são concedidas, pedindo ou duplicação ou melhoria na sinalização ou uma simples construção de uma terceira faixa, quando a duplicação é muito mais onerosa. Às vezes, simples tachões impedindo a passagem de uma faixa para outra já fazem uma grande diferença.
A gente tem trabalhado na Operação Rodovida - vou até mostrar aqui alguns resultados -, que parte basicamente da integração entre os diversos órgãos vinculados ao trânsito, sejam eles da esfera municipal, estadual ou federal. A gente identifica, através dessa análise, quais são realmente esses pontos mais críticos, e aí cada agência, claro, dentro da sua área de atuação, faz ali, naquele ponto crítico, uma operação.
Ou seja, se o usuário está cometendo uma infração em qualquer rodovia, seja federal, estadual ou municipal, ele pode passar para outra rodovia, tentando, às vezes, fugir de uma fiscalização. Ou, às vezes, como, por exemplo, na questão que foi colocada aqui do alcoolismo, uma pessoa que ingere bebida alcoólica numa cidade de um Município pode vir a pegar uma rodovia estadual ou federal. Então, não basta apenas a fiscalização em um único eixo. Daí a necessidade, vamos dizer assim, dessa integração.
Vou mostrar rapidamente como foi feito esse trabalho e, principalmente, os seus resultados.
Esse é o comparativo 2013/2014, mas a nossa Operação Rodovida pega ali o final do ano e o início do ano, até o Carnaval. Então, o que vou chamar de 2013 seria finalzinho de 2012 até o Carnaval de 2013, e o que vou chamar de 2014 é o finalzinho de 2013 até o Carnaval de 2014.
Então, aí estão os períodos que mencionei, a comparação do período 13/14 com o 14/15. A gente chama de primeira etapa a que vai das festas de final de ano até as férias de janeiro e de segunda etapa a que a gente chama de Operação Carnaval, tanto de 13/14 quanto de 14/15.
Podemos perceber aí uma evolução da nossa frota de algo em torno de 8% ao ano. Isso é fundamental quando a gente procura trabalhar esses números, porque seria muito difícil trabalhar única e exclusivamente com números brutos, absolutos, já que a gente tem esse aumento de quase 8% ao ano em alguns casos, e, se compararmos ao longo dos últimos dez anos, esse aumento foi de 136%.
Vamos perceber aí também que há um aumento muito maior, inclusive na questão das motocicletas.
Ali, ainda em comparação a essa frota, temos os acidentes por milhão de veículos. Nessa linha vermelha, temos uma tendência. Foram feitos cálculos considerando que, se nada fosse ser feito, esse seria nosso cenário a partir dos anos de 2011 a 2015. E aí, com nosso trabalho de gestão em cima dessa integração, nesse período da Rodovida, tivemos resultados muito impressionantes. Se compararmos de 2011 a 2015, houve uma redução na quantidade de acidentes, na comparação pela frota, de 45%.
Ali, os acidentes graves. O que consideramos, para efeito dos nossos cálculos, um acidente grave? São aqueles acidentes que têm, pelo menos, um ferido grave ou um morto. No mínimo, um desses critérios têm de ser atendidos. Aí, da mesma forma, temos uma tendência de crescimento muito forte do período 2011 a 2015. Com as nossas atuações e ações promovidas pela Rodovida, houve uma redução de 45% no período, sendo que, só do ano passado para este, houve uma redução de 21%, quase 22% nos acidentes graves.
A questão dos feridos, temos aí também como era a tendência e como ficou depois da nossa atuação: 38,8%, se comparado 2011 a 2015.
E a questão mais fundamental que a gente ataca, que é a dos mortos. Também na comparação pela frota, havia uma tendência muito grave, e, com a nossa atuação, houve uma redução de quase 40% de 2011 a 2015, considerando que estamos na década de redução de acidentes da ONU, que prevê em 50% - isso em números absolutos - da mortalidade do País em dez anos, considerando 2011 a 2020.
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Aqui, os resultados em números da primeira etapa, que é aquela considerada de meados de dezembro até final de janeiro, a variação de acidentes, acidentes graves, feridos e mortos.
Aqui, já entramos na segunda etapa, que consideramos Operação Carnaval, que é, sem sombra de dúvida, a nossa operação mais crítica, até pela característica do feriado, com um consumo muito alto de bebida alcoólica e uma mobilidade muito grande entre as principais capitais, principalmente aquelas que levam ao litoral.
Aí, a questão dos acidentes, num valor relativo de 21% de redução, de 2014 para 2015; 17% no fator "feridos", também relativo; e 22% na questão da redução do número de mortos, do ano passado para cá.
Observem que, no período histórico, considerando desde 2007 até 2015, foi o nosso, vamos dizer assim, Carnaval, a melhor Operação carnaval, com uma redução expressiva no número de mortos. Se considerarmos o nosso pior Carnaval, em 2011, quando tivemos uma taxa de 3.3 mortos para cada milhão, essa taxa caiu para 1.37.
Os três Estados que, somados - isso em âmbito nacional -, contribuíram com mais de 405 do número de mortos no País, receberam reforços de toda a Polícia Rodoviária Federal, não só com incremento de efetivo, mas também de viaturas, etilômetros, radares, todos os equipamentos necessários para auxiliar esses três Estados. Individualmente, cada um deles teve redução: Paraná, 67%; Minas Gerais, 47%; e Bahia, 39%, em comparação com o Carnaval do ano passado.
Ainda com relação à Operação Carnaval, estão aí os números dos acidentes, acidentes graves, feridos e mortos, sendo que tivemos uma redução de 17% de mortos. Se analisarmos, dá quase, vamos dizer assim, não é um Boeing, mas são dois ônibus, trazendo aí para o modal rodoviário, considerando os mortos.
Ainda com relação aos acidentes, no período da Operação Total, agora, considerando o primeiro e o segundo período, que chamamos de fim de ano e Carnaval, aqui tivemos a questão dos acidentes, a questão dos feridos, 16%, e a questão dos mortos, 17% de redução em todo o período da operação; aí, os números de toda a operação.
A questão do incremento da fiscalização, mais de 1,7 milhão de pessoas fiscalizadas só nesse período da Operação Rodovida, 1,690 milhão veículos, 10 mil carteiras de habilitação recolhidas e 120 mil pessoas atingidas por ações de educação para o trânsito. Na figura, vemos um dos tipos de educação para o trânsito que consideramos extremamente eficiente, que é o Cinema Rodoviário. O motorista, no momento em que o seu veículo é abordado, ele tem o veículo e documentos fiscalizados, é convidado a assistir a palestras e a vídeos sobre educação para o trânsito. Normalmente, esses vídeos estão relacionados a algum tipo de cometimento de infrações daquela localidade onde o Cinema Rodoviário está sendo apresentado, como cinto, velocidade, alcoolemia. Depois disso, ainda é solicitado ao condutor que faça o teste do etilômetro.
Então, nunca única ação, há quatro abordagens distintas: pessoas, veículos, a questão da sensibilização da educação para o trânsito e a questão da alcoolemia.
Nesse período da Rodovida, foram feitos 516 mil testes de alcoolemia, 10 mil atuações por alcoolemia e 2 mil prisões por alcoolemia.
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Aqui, obviamente, tentamos utilizar muito a mídia como um parceiro. Um exemplo muito bom disso foi o efetuado no Rio Grande do Sul, quando tivemos lá uma operação chamada Operação Hermes, que tentava coibir, e conseguiu com bastante êxito, o aumento da velocidade nas rodovias. Então, a gente usou a mídia durante muito tempo antes da operação, dizendo: "Olha, vai ter a operação. Os radares vão ficar nestes pontos. Por favor, reduza a velocidade".
Porque a intenção nossa não é simplesmente autuar. Inclusive, para nós, o objetivo, vamos dizer assim, no mundo perfeito e infelizmente utópico, seria não precisar fazer nenhuma autuação. No mundo utópico, ninguém cometeria infração. E, mesmo assim, mesmo com aviso, mesmo com exposição na mídia das nossas operações, ainda assim, tivemos um número de autuações recorde no Estado no período da Operação Hermes.
É triste perceber que o motorista... É como a gente diz muito: a gente precisa salvar o cidadão parece que dele mesmo. É triste, mas é verdade.
E aí alguns exemplos tristes da imprudência no trânsito nas rodovias federais.
Então, a gente entende que o segredo principal é esse da integração. O uso da estatística é fundamental para essa diminuição, porque só assim a gente pode entender onde morre, por que morre e que tipo de ação deve ser feita, seja no âmbito normativo, seja de infraestrutura, seja operacional, seja de fiscalização, seja no próprio veículo ou, como disse o professor, na questão da atitude. Eu acho que, em todas essas áreas, em todos esses eixos, a integração e a estatística poderão cooperar. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem. Este foi o Inspetor Chefe da Divisão de Planejamento Operacional da Coordenação-Geral de Operações da PRF, que mostrou aqui um trabalho vinculado ao Ministério da Justiça, apontando caminhos de estatística, diálogo, entendimento, formação, preparação, enfim, que haja um caminhar juntos de todos nós, que vai ajudar, na minha concepção, inclusive a tirar o País da crise.
Passamos a palavra, de imediato, ao Secretário de Mobilidade do DF, Sr. Carlos Henrique Rubens Tomé Silva. Na sequência, falará o Sr. Dario Rais Lopes, que é Secretário de Transporte Urbano, do Ministério das Cidades, e aí os dois Senadores, se quiserem, seria o momento adequado para entrar no debate já, antes de mudar a Mesa.
Por favor, o Dr. Carlos Henrique.
O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - Bom dia, Senador Paim. Bom dia, demais Senadores aqui presentes, Senador Hélio José, meus companheiros de Mesa. Bom dia a todos que nos assistem.
Em primeiro lugar, eu gostaria de agradecer o convite feito à Secretaria de Mobilidade do Distrito Federal e parabenizar o Senador Paim pela iniciativa não só desta audiência pública em particular, mas pela insistência, persistência e perseverança com que trata esse tema da segurança no trânsito e da mobilidade urbana.
Para mim, é uma satisfação especial estar aqui neste dia, porque sou servidor do Senado Federal, sou consultor legislativo cedido há pouco mais de três meses para o Governo do Distrito Federal. Então, para mim, é uma alegria especial estar aqui hoje, poder falar um pouco sobre o nosso trabalho no Governo do Distrito Federal.
É muito difícil falar depois de tantos especialistas aqui. Eu não sou um especialista no tema, eu estou Secretário de Mobilidade do Distrito Federal, mas este é um tema que merece nossa mais absoluta atenção, nossos mais tenazes esforços para resolver. E o Governador Rodrigo Rollemberg tem repetido insistentemente que a mobilidade urbana é um dos temas que mais o preocupa, porque afeta a vida das pessoas diariamente. Todos os dias, na hora de ir para o trabalho ou voltar do trabalho para casa, as pessoas passam raiva no trânsito, passam uma hora, duas horas - o Senador Paim está aqui, já testemunhando que passa um bom tempo no trânsito para chegar ao Senado...
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - Já está acabando? Eu falo muito, hein? (Risos.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Nada, você nem iniciou o seu tempo ainda - nem iniciou. (Risos.)
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O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - A questão da mobilidade urbana, a gente precisa partir de uma constatação: não existe nenhum exemplo no mundo uma cidade que tenha resolvido o seu problema de mobilidade urbana, apostando no transporte individual. O transporte individual por automóvel não é a solução para os problemas de mobilidade. Há, claro, o seu espaço, o seu lugar para atividades específicas, mas não é, nem de longe, a solução para os problemas de mobilidade urbana.
Criar uma política de melhoria da mobilidade urbana centrada no alargamento de vias é uma falácia, porque, no final das contas, o que você está escolhendo é entre ficar engarrafado em duas faixas ou ficar engarrafado em quatro faixas ou seis faixas. É preciso reverter esse modelo, que é um modelo econômico e também um modelo cultural. Lá, desde o século XVIII, Adam Smith já dizia que maximizar a utilidade individual gerará automaticamente a maximização da utilidade coletiva. Isso é um fundamento da economia moderna, da economia capitalista, mas esse caso da mobilidade urbana é uma situação em que esse axioma não vale.
A maximização da utilidade individual representada até hoje pela utilização do automóvel tem-se mostrado um grave problema para o coletivo, para as cidades. Então, precisamos da intervenção do Estado, para corrigir, vamos dizer, essa falha de mercado.
E nós, aqui no Distrito Federal, estamos tratando dos problemas de mobilidade segundo três horizontes temporais bem definidos: os horizontes de longo, médio e curto prazo. No longo prazo, os problemas de mobilidade têm a ver com o padrão desigual de ocupação do território. O modelo de ocupação territorial do Distrito Federal é excludente; há pessoas que moram muito afastadas, enfrentam muitos problemas de mobilidade e, naquelas localidades em que elas moram, não desfrutam dos bens e dos serviços públicos com a qualidade que existe no centro.
Isso é um padrão muito comum nas cidades brasileiras, mas, em Brasília, ele é particularmente cruel, porque, entre o centro e as periferias, existem, na verdade, grandes vazios. Esse padrão pendular de deslocamento em que as pessoas vêm para o centro, em que estão concentrados os empregos, e voltam para a periferia, em que estão concentradas as moradias, existe na maioria das cidades. A diferença é que, em cidades diferentes de Brasília, entre uma coisa e outra, existe a ocupação urbana, e aqui em Brasília, é diferente, porque há grandes vazios.
Então, o primeiro horizonte em que estamos trabalhando é o horizonte de longo prazo, com o objetivo de tratar a mobilidade não como aquela atividade que a pessoa faz, deslocando-se para mais longe e de maneira mais rápida, mas, sim, que diminui a necessidade de deslocamento das pessoas, fazendo com que elas tenham uma escola perto de casa, um hospital de qualidade perto de casa, para que não precisem se deslocar para muito longe. E é claro que, nesse horizonte, você tem uma interface muito importante com a área de planejamento territorial, com a área de planejamento urbano, para reverter o modo como as coisas normalmente acontecem. Normalmente, acontecem ocupações descontroladas do território, e o Estado corre atrás, para implantar a infraestrutura necessária.
Então, surge uma ocupação urbana num determinado lugar, e o Estado vai correr atrás, para colocar água, para colocar luz, para colocar saneamento, para colocar mobilidade. É esse o padrão que precisamos reverter. É preciso conjugar o planejamento urbano, o planejamento da ocupação territorial, com o planejamento de transportes e das demais infraestruturas, para, justamente, tirar o Estado dessa posição reativa e colocar o Estado na posição que lhe é devida que é uma posição pró-ativa, de planejador da ocupação territorial.
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O segundo horizonte temporal que nós estamos trabalhando é o horizonte de médio prazo, reconhecendo que esse padrão de ocupação existe e continuará existindo por algum tempo. Portanto, nós precisamos, diante da realidade, possibilitar que as pessoas se desloquem para mais longe e mais rápido, porque hoje as pessoas moram longe de onde trabalham.
Nesse horizonte de médio prazo, estão incluídas as implantações de corredores de transporte. Aqui no Distrito Federal, aqui em Brasília, nós temos um padrão de ocupação em que, lá atrás, definiu-se que ele privilegiaria a parte sudoeste do quadrilátero, e esse é o local de maior preocupação nossa, porque concentra a maior quantidade de gente, o maior contingente habitacional, populacional. Esse é o nosso maior foco de preocupações.
Porém, nós não podemos e não vamos deixar de lado outros eixos, que são necessários também, porque estão há muito tempo abandonados: um é o eixo que vai para a cidade de Brazlândia; outro é o eixo norte, que vai para Sobradinho e Planaltina; e o terceiro é o eixo leste, que é esse a que o Senador Paim se referia, que vai para a região do Alphaville - na direção de lá, não necessariamente até lá.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Só para ilustrar a preocupação com o social: até chegar ao Alphaville, acho que há uma centena de condomínios de classe média, mais para pobre. Com carros simples - isso faz parte da vida - eles se deslocam e ficam uma hora e meia. Eu vejo por mim, o que eu gasto de combustível. Mas eu sou Senador da República, posso pagar. No entanto, essa população toda o que está gastando de combustível é, muitas vezes, o dinheiro do pão, do leite, do aluguel.
Enfim, só enriquecendo a sua iniciativa, que achei adequada, correta.
O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - E, nessa reestruturação do sistema, como diz a Profª Maria Rosa, nós temos como orientação do programa de governo do Governador Rollemberg a preferência pelo modal ferroviário.
E o terceiro horizonte que estamos trabalhando, nesse ponto aqui, no Distrito Federal, é um horizonte de curto prazo, partindo da premissa ou do entendimento de que a implantação desses corredores é necessária, é urgente, mas é demorada. É preciso, como disse o inspetor Edson, usar o conhecimento, a estatística, os dados que são levantados, o melhor conhecimento disponível para projetar bem esses corredores, e isso leva tempo. É preciso projetar, é preciso tirar as licenças, é preciso licitar, é preciso fazer a construção para, depois, em seguida, começar a operação.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Precisa ter orçamento...
O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - Precisa ter orçamento, claro.
Então, o terceiro horizonte temporal que estamos trabalhando é um horizonte anterior a tudo isso, que é o horizonte de curto prazo. E o que nós chamamos de horizonte de curto prazo? É fazer com que isso que já existe funcione. Nós temos - todas as cidades têm, e no Distrito Federal não é diferente - o sistema de transporte coletivo, temos as vias arteriais que ligam as cidades de um lado para outro, algumas melhores outras piores, mas o funcionamento, a operação disso tudo é muito ruim. Nós precisamos melhorar isso aí.
E temos uma dificuldade adicional, porque estamos em um período de transição ainda. Em 2012, foi feita uma licitação para mudança do sistema do transporte coletivo, que era da delegação por frota, associada a algumas linhas, para uma delegação por bacia. No meio desse caminho, há uma mudança de filosofia da coisa, porque antes o Estado era o gestor do sistema, o gestor direto do sistema, que determinava para as empresas quais eram as linhas que ia ser seguidas e quais os horários que iam ser seguidos, e agora o Estado precisa passar a ser - segundo o modelo que foi implantado na licitação de 2012 - um gestor de contratos. Passa a ser uma concessão pública, uma concessão de serviços públicos, e essa concessão é baseada em um contrato...
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - E o Estado passa a ser o gestor desse contrato.
Se esse modelo é adequado ou não também está aberto...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Só para avisar que V. Sª tem mais cinco minutos.
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O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - Pois não.
Prossigo: também está aberto a discussões. Mas esse é o sistema que está implantado hoje e, portanto, esse é o sistema que nós precisamos trabalhar.
Isso tudo, para quê? Para tentar gerenciar esse conflito de interesses entre a utilização de carros e a utilização de outros modos de transporte - transporte público coletivo ou transporte não motorizado. Essa equação é uma balança de dois pratos: de um lado, você precisa estimular o uso do transporte coletivo, estimular o uso do transporte não motorizado, e, por outro lado, desestimular o uso do automóvel. O problema é que, num primeiro momento, desestimular o uso do automóvel... Como se faz isso? Cobrando estacionamento, colocando obstáculos fundamentalmente econômicos ao uso do automóvel. Para se fazer isso, é preciso ter um sistema de transporte coletivo e um sistema ou uma possibilidade de uso do transporte não motorizado minimamente funcional. E estamos caminhando nesse sentido, para criar as condições de utilização do transporte coletivo e do transporte não motorizado para, num segundo momento, implantar as medidas necessárias para o desestímulo do uso do automóvel. Entendemos que desestimular o uso do automóvel sem dar opção para a sociedade não é o melhor caminho.
Um dos elementos fundamentais de todo esse assunto é a segurança no trânsito. Nós temos, nos últimos anos, como já foi mostrado aqui pelos especialistas, uma explosão no número de acidentes fatais, no número de óbitos no Distrito Federal, e o mesmo padrão segue no Brasil inteiro, por exemplo, de acidentes com morte de motociclistas. Então, esse tipo de estatística é fundamental para que possamos implantar as políticas públicas necessárias para atacar onde está efetivamente o problema. É claro que nosso desejo é que ninguém morra no trânsito, mas gerenciar é estabelecer prioridades, e a prioridade é onde mais pessoas morrem.
Se traçarmos a quantidade de mortos no trânsito no Distrito Federal, ela é praticamente constante desde 1988, quando houve a Constituição Federal, com alguns pontos de diminuição, outros pontos de ascendência. Um dos elementos que foi fundamental para a redução do número de óbitos no trânsito foi a campanha Paz no Trânsito, mas também outras campanhas foram fundamentais para isso. E o grande desafio das políticas públicas nesse campo - e da grande maioria das políticas públicas - é a permanência no tempo. Então, o que se enxerga é: uma ação, uma política pública adotada com determinado objetivo atinge aquele objetivo, e, em seguida, aquele objetivo ou deixa de ser importante ou a campanha é flexibilizada, e aquilo que deu causa à formulação daquela política volta a acontecer.
Então, há um gráfico do Detran bastante interessante, com diversas ações pontuais, como fiscalização ostensiva, campanha contra álcool no volante, campanha Paz no Trânsito. Cada vez que se adota uma campanha dessas, o número de mortos cai, mas, logo em seguida, volta a subir e se mantém num patamar praticamente constante desde a Constituição Federal, um pouco superior a quatrocentas mortes no trânsito por ano.
Bem, como é que estamos fazendo na Secretaria? Um dos elementos para tentar... Por que a Secretaria é hoje Secretaria de Mobilidade, e não mais de transportes? Nós enxergamos uma oportunidade. Foi dito aqui, em algum momento, que o termo mobilidade é um termo novo, recente, e nós enxergamos nessa nova ideia uma oportunidade...
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS HENRIQUE RUBENS TOMÉ SILVA - ... de reunir todas as políticas que são necessárias, porque era tudo muito espalhado, e acredito que essa seja uma realidade em todos os governos do Brasil.
Calçadas. Estamos buscando, para dentro da Secretaria de Mobilidade, política sobre calçadas, ciclovias, sistema viário, táxi, ônibus, todos os modais de transporte, mas também política de estacionamento, política de carga e descarga, para tentar desafogar o trânsito.
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Nesse meio, estamos propondo para o Governo do Distrito Federal uma coisa que estamos chamando de Pacto pelo Trânsito, que tem elementos para garantir a fluidez e a segurança no trânsito. Nesse programa, estarão incluídos aqueles elementos para garantir a segurança no trânsito relacionados, basicamente, à infraestrutura. Com base em estudos, identificamos que a grande maioria dos acidentes de colisões de veículos com mortes no Distrito Federal ocorrem em locais onde havia uma imperfeição na via, seja de projeto, seja por mau uso daquela via, que permite um "gato", vamos dizer assim, e esse "gato" é o gerador de um acidente. A grande maioria dos atropelamentos também ocorre a 50 metros de um ponto de ônibus, na hora de pico
Com base nesses estudos, no melhor conhecimento disponível, nós vamos implantar política pública para melhorar a infraestrutura das vias, para impedir esse mal uso da via e também para garantir que o pedestre possa fazer a travessia daquela via, no horário de pico, com segurança.
No mais, agradecer mais uma vez o convite e a iniciativa do Senador Paulo Paim e me colocar à disposição.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Secretário de Mobilidade Urbana do DF, Sr. Carlos Henrique Rubens Tomé Silva.
Vamos logo ao próximo convidado. Cumprimentando as iniciativas do DF, na figura do Carlos Henrique, Secretário de Mobilidade do DF, passamos a palavra ao Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana, que aqui representa o Ministério das Cidades, Sr. Dario Rais Lopes.
Em seguida, ouviremos dois Senadores.
O SR. PRESIDENTE (Dario Rais Lopes) - Bom dia a todos. Senador Paim, agradeço pelo convite e oportunidade.
Eu vou tentar fazer uma pontuação e a interface que nós, na Secretaria de Mobilidade, vemos entre a questão da mobilidade e a questão da segurança no trânsito.
Vou começar resgatando aquele conceito que, na academia, talvez seja o menos controverso de mobilidade urbana hoje. Mobilidade urbana seria a capacidade de deslocamento de pessoas e bens no espaço urbano, atendendo a três atributos: espaço, tempo e estado.
O atributo de espaço diz respeito à possibilidade de as pessoas se deslocarem de onde estão para onde desejam.
O atributo de tempo diz respeito à possibilidade de as pessoas se deslocarem e chegarem aos seus destinos dentro dos tempos necessários ou dos tempos desejados.
E, por fim, mas não menos importantes, os atributos de estado. Mais do que você chegar aonde você quer e no tempo que você deseja ou precisa, você tem de chegar com conforto e com segurança.
Prover possibilidade de deslocamento por qualquer modo público no qual você tem mais do que seis pessoas por metro quadrado não é prover mobilidade no sentido amplo do conceito. Prover possibilidade de deslocamento no qual o índice de acidentes é alto não é prover mobilidade, ou seja, o conceito de segurança é intrínseco à mobilidade, e a mobilidade, por tratar de atributos como tempo, espaço e estado, trabalha no âmbito urbano com, primeiro, a organização da cidade.
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Ao se trazer próximo atividades meio e fim, ou seja, habitação e trabalho, habitação e serviços, você dá melhores condições de mobilidade, porque você diminui as distâncias e permite que os deslocamentos sejam feitos por modos não motorizados.
Ao pensar nos atributos de espaço, de tempo e de estado, você pensa nas formas de circulação, o trânsito, e como os deslocamentos são feitos: de forma individual ou de forma coletiva, o transporte.
Ou seja, mobilidade é mais do que pensar o transporte coletivo, é mais do que pensar o trânsito, é pensar simultaneamente o uso do solo, que vai definir os padrões de deslocamento; o transporte, que são as formas pelas quais esses deslocamentos são feitos; e o trânsito, quem são e a própria circulação em si.
Soluções de mobilidade, portanto, acabam sendo soluções estruturantes no sentido de mudar ou aprimorar o desenho de uma cidade.
Para que se veja o impacto disso agora na questão da segurança no trânsito, vou resgatar um conceito de trânsito.
Trânsito como atividade, ele tem três grandes pilares, que, em inglês, são the triple e: a engenharia, a educação e o esforço legal, a fiscalização.
O primeiro pilar é a engenharia. E por que é o primeiro pilar? É o primeiro porque é através da engenharia que as condições físicas para a circulação serão estabelecidas. E é primeiro porque uma boa engenharia, ou seja, o uso de técnicas de traffic calming, o desenho adequado das vias de circulação, ajuda a disciplinar o mau condutor. Por outro lado, uma engenharia má, por exemplo, uma sobrelevação invertida ou um ciclo semafórico mal calculado imputa ao bom condutor riscos desnecessários.
Como é que a gente junta tudo isso, então? Junta-se através da engenharia. As boas soluções de engenharia de mobilidade são soluções que não só permitem um bom deslocamento, mas elas criam o ambiente no qual você tem a menor probabilidade de acidentes.
Como é que a gente pode ver isso na prática? Vou pegar um exemplo aqui: a primeira grande solução de mobilidade urbana do mundo, que é uma solução brasileira, são os trinários da cidade de Curitiba. Para quem ainda não está perfeitamente identificado com a ideia, trinário é um corredor, que lá em Curitiba se chama canaleta. Ao lado da canaleta, você tem uma avenida e, depois, uma ou duas quadras dessa canaleta, você tem uma avenida que funciona em binário - uma que vai ao centro e outra que vem do centro. Entre essas duas avenidas de sentido único, você chama de setor estrutural do trinário. E é no setor estrutural do trinário que você permite o maior adensamento. A partir das quadras externas ao setor estrutural do trinário, você vai reduzindo as cotas, ou seja, você vai reduzindo o adensamento. Mais pessoas morando próximo ao sistema de transporte coletivo que tem prioridade. Isso é uma solução integrada. Isso é uma solução de mobilidade.
Qual é o resultado concreto dessa história toda que começa, em Curitiba, a ser planejada nos anos 60? Para mostrar o resultado disso, vou regatar uns indicadores aí. Lamentavelmente, acho que é claro para todo mundo que a nossa situação em termos de indicadores de segurança de trânsito não é das mais confortáveis aqui no Planeta. Nós vamos raciocinar só com o indicador que é mais utilizado, que é o indicador indicado pela Organização Mundial de Saúde, que é o número de mortos no trânsito por cem mil habitantes.
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O Brasil ocupa uma incômoda posição: temos um indicador de 22 mortos por ano, por 100 mil habitantes. Isso é ruim, desconfortante, mas não é o caos - ao observar a Nigéria, por exemplo, isso aí está em torno de 35. Mas a gente não quer ser comparado à Nigéria, com todo o respeito que o pessoal de lá merece; queremos ser comparados ao benchmark. E o benchmark desse indicador, hoje, é o Reino Unido, em que esse indicador é de 3,7 no país; temos o indicador de 22, e há o indicador de 3,7.
Em termos de indicadores, somos dos BRICS, em que todos têm indicadores em torno de 19 e 22, que somos nós. Então, é uma coisa interessante, até para estudo econômico e sociológico, como esses países de capitalismo tardio e de inserção tardia, na globalização, acabam tendo, nessa questão, o mesmo comportamento. Mas vamos observar cidades isoladas.
Curitiba, depois de tudo isso, tem um indicador que é de 5,2 - a média brasileira é de 22, e Curitiba é de 5,2, que é o indicador do Japão há dois anos. Ou seja, boas soluções, soluções integradas que respeitem e adotem integralmente o conceito da mobilidade criam um ambiente propício a você ter mais segurança no trânsito. Diria que as boas soluções da engenharia da mobilidade são uma condição necessária, mas não são uma condição suficiente, porque você tem que...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Só por uma questão de grande justiça, ou injustiça, quero fazer justiça... Lembra-se de Curitiba? Estive lá recentemente. Foi muito por meio do Jaime Lerner, não foi?
O SR. DARIO RAIS LOPES - Sim, foi o Prof. Jaime Lerner, que coordenou o primeiro estudo, e fez a... Tanto é que se chama canaleta, não se chama corredor, porque isso não existia nos anos 60. E foi colocado um conjunto de professores da universidade, isso foi extremamente importante no Estado, porque foi uma universidade que resolveu - e como venho da universidade também tenho que vender o meu peixe, não é? -; foi um conjunto de professores da universidade de arquitetura, universidade de engenharia civil...
E por que canaleta? Para dar a noção e a ideia para o cliente da fluidez. É na canaleta que você vê o líquido correndo, sem nenhuma solução de continuidade. Então, esse é o meu conceito de canaleta.
Mas é importante resgatar isto: as soluções de mobilidade são importantes. E é muito importante a posição do Distrito Federal, no sentido de agregar isso, a começar pela questão do uso do solo, organizando o uso do solo, dando prioridade para modos de transporte em que você tenha a redução das distâncias, e das distâncias grandes, dando prioridade aos modos coletivos.
Isso não garante que você terá um indicador de segurança que seja um indicador como o da Grã Bretanha, da Alemanha. Não, mas é uma condição importante, é uma condição necessária. Então, penso que o caminho nesse quadrante é uma condição fundamental para haver bons resultados.
Vou mencionar alguns exemplos que estão acontecendo hoje no Brasil. Estamos, na Secretaria, apoiando, entre os vários projetos que apoiamos, um projeto no interior do Rio de Janeiro - foge-me se é em Caxias ou se é em Nova Iguaçu. É muito interessante, está-se reestruturando, redesenhando a rede de transporte coletivo com os corredores, que têm alimentação tradicional.
Mas o mais interessante é que há um sistema de alimentação por bicicleta. O que acontece: o cliente sai de sua casa de bicicleta, chega à estação de integração com o transporte coletivo, há um bicicletário, e ele pode fazer essa integração. Então, existem iniciativas muito interessantes, muito ricas, no País como um todo.
Em Curitiba, de novo, tive a oportunidade de eu mesmo fazer uma experiência com car sharing. Em Curitiba, hoje eles estão implantando o car sharing, mas, como é um processo inicial, esse processo está sendo implantado entre os órgãos da Administração Pública. Então, você sai ao Palácio do Governo, vai ao Departamento de Estradas de Rodagem, ou a lugar semelhante, com os carros. Os carros são elétricos. Para quem não está acostumado, é horrível, porque você só ouve o barulho, não ouve nada naquele negócio. Então, você vai com um medo desgraçado de fazer um acidente, porque você não sabe se está ligado ou não. Mas é uma experiência riquíssima essa do car sharing em Curitiba.
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Ou seja, nós temos uma situação que não é ainda confortável, longe disso, mas eu penso que temos, ao longo do País inteiro, muitas iniciativas que devem ser resgatadas - acho que esse é um fórum muito interessante para o senhor conduzir, esse resgate - no sentido de disseminar essas boas práticas e, principalmente, disseminar a ideia de que as soluções de mobilidade devem ser implementadas com essa visão sistêmica de trânsito, transporte e uso do solo. Mas elas não são a grande solução. Há que se avançar mais para que tenhamos uma efetiva segurança no trânsito.
Era isso que eu queria colocar.
Queria, mais uma vez, agradecer a oportunidade, Senador. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem.
Esse foi o Secretário Nacional de Transporte e da Mobilidade Urbana e representante do Ministério das Cidades.
Agora, informo também a todos que a nossa audiência pública, desde as 9h, é transmitida ao vivo pela TV Senado, por todo o sistema, e também pelo canal 24 da TV a cabo. E, para as pessoas que quiserem interagir: bit.ly/audienciainterativa.
E permita-me, Senador - V. Exª pode até comentar, se assim entender -, ler algumas frases dos nossos queridos telespectadores.
Pergunta de Israel Kauan Pereira de Freitas: "não seria bom implementar novas ciclofaixas ou ciclovias?"
Depois, Anna Flávia Schmitt: "O Estado de Santa Catarina está com problemas graves de mobilidade urbana e transporte público, e muitas cidades do litoral não têm ciclovias. O interior do Estado quase não tem mais transporte público."
Eu sempre digo que leio tudo o que chega aqui, independente da posição de cada um.
João Paulo Ribeiro: "Bom dia. Sou de Salvador, tivemos [aqui] uma obra do PAC que fez a via expressa com ciclovias sem continuidade, com batentes entre um trecho e outro e não foram bem sinalizadas. Construtoras deveriam ser obrigadas a consultar a população e ciclistas para não se perder oportunidades."
João Paulo Ribeiro: "Muito bom dia [para todos]. Há propostas/requerimentos para a isenção de IPI para as bicicletas. No entanto o que vemos são [redução de] IPI dos carros inferiores às das bikes."
Só para dizer que, nessa questão do IPI, há um projeto do Inácio Arruda, há um de minha autoria e também um, agora, mais recente e que, na verdade, é mais completo, do Senador Randolfe Rodrigues, que trata dessa questão.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Pergunta João Paulo Ribeiro: "Gostaria que [...] [os ilustres convidados e Senadores comentassem] a respeito da isenção/redução de IPI para as bicicletas no Brasil. Já há [...] [inúmeros projetos] nesse sentido. Na Europa a bicicleta gera mais emprego que indústria siderúrgica, minas e pedreiras" - conforme ele.
Comentário de Ítalo Marcus de Moraes Tupinambá: "Sou ciclista, moro em Teresina-PI, as últimas reformas urbanas, notadamente pavimentações, suprimiram muitas ciclofaixas, algumas foram implantadas visando mais o lazer e o esporte" - e esqueceram o ciclista -, "a enorme frota de ciclistas da cidade é composta de trabalhadores simples" - ele fala aqui - "da construção civil."
Comentário de Ítalo Marcus de Moraes Tupinambá: "E por moradores das zonas rurais da capital do Piauí, as faixas que havia eram precárias, mas serviam para delimitar o espaço e precariamente proteger os ciclistas dos concorrentes mais próximos, os ônibus e os caminhões [...]" e carros.
Comentário, agora, de cidadão, via Alô Senado, Elias Gessé Erdman, Mato Grosso: "Em Várzea Grande e Cuiabá/MT, foram feitas várias obras para a Copa do Mundo, mas não houve melhorias na mobilidade urbana. Informa que mora há 15km do local de trabalho, mas que não pode utilizar a bicicleta como transporte, porque não há ciclovias."
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Agora, Comentário de Maria de Fátima Anselmo Edelmann, São Paulo: "Acredito que deveria haver delegacias voltadas exclusivamente para o trânsito, tornando mais célere a resolução dos problemas que ocorrem nas vias brasileiras e, consequentemente, reduzindo as demandas das outras delegacias."
Por fim, a última, do Fernando Luis Garcia Macedo, de Santa Catarina: "Quanto ao transporte individual, acredito que é preciso investir mais em ciclovias, já que o ciclista é banalizado no trânsito, pois não há respeito por falta de conscientização. Deveria haver maior rigor nas leis para valorizar a vida do ciclista."
Como vemos, os ciclistas são os que mais bombaram aqui, exigindo mais espaço e condições para que eles transitem, não só por lazer, mas também para o trabalho.
Passamos, de imediato, a palavra ao Senador Hélio José.
Em seguida, Senador José Medeiros.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PSD - DF) - Excelência, é com muita tranquilidade que quero parabenizar V. Exª por esse trabalho excepcional de discutir assuntos tão diversos e variados, mas tão importantes para os direitos humanos, para a vida das pessoas.
Sem dúvida, a questão da mobilidade está bem voltada para essa questão do direito de ir e vir de uma forma não estressante, de uma forma confortável, dentro do tempo adequado. É um direito que as pessoas têm e que nós, o Estado, precisamos garantir.
Creio que esse debate aqui vem bastante ao encontro disso e nos ajuda muito a refletir sobre a necessidade de cidades ecologicamente corretas, com trânsito mais adequado.
Eu queria saudar o Sr. Edson Nunes, da Polícia Rodoviária Federal, tão importante para nós todos; a D. Maria Rosa Ravelli de Abreu, professora, que deu aqui uma aula de cidadania; o Sr. Dario Rais Lopes, representando nosso Ministério das Cidades, e, em especial, meu querido amigo Carlos Henrique Rubens Tomé Silva, nosso querido Carlos Tomé, que fez toda a discussão técnica do nosso Governo atual, do Rollemberg, e que está cumprindo essa tarefa de Secretário de Mobilidade Urbana do Distrito Federal.
Quero saudar também nosso amigo Henrique Ludovice, mais conhecido como Ludovice, Diretor Geral do DER do Distrito Federal, que tem feito também um trabalho importante na questão das vias urbanas do Distrito Federal.
Não resta dúvida de que, quando andamos em outros países, principalmente os europeus, enchem-nos os olhos quando vemos um trânsito muito mais civilizado, muito mais adequado à realidade das grandes cidades.
Lembro muito bem: por exemplo, em Viena, na Mariahilfer, o trem passa na frente de todo mundo, não atropela ninguém, rapidinho, todo mundo subindo e descendo; em Zurique, a mesma coisa. Outro exemplo, quando você vai a Madri de carro. Madri é uma cidade centenária, e se entra e sai rapidinho. Eu estava dirigindo lá, fiquei em Las Ventas, no centro da cidade, e entrar e sair de Madri, uma cidade enorme daquela, em hora de rush, é rapidinho. Por quê? Porque há engenharia de trânsito adequada para permitir essa mobilidade com mais tranquilidade.
Então, temos esperança de desengarrafar nossas grandes cidades brasileiras, de educar nosso povo para que possa utilizar algumas formas alternativas, algumas formas mais humanas de deslocamento.
Quando a gente chega a Amsterdã, por exemplo, vê aqueles bicicletários lotados, como colocou aqui o Dario Rais, do nosso Ministério das Cidades, do meu querido amigo e Presidente do meu Partido, Gilberto Kassab. É muito importante aquele deslocamento. São pessoas de terno, pessoas preparadas para ir para o serviço, todo mundo de bicicleta, andando para cima e para baixo. Então, é uma cultura que nós, aqui, precisamos ter nas nossas cidades.
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É muito desgastante entrar em São Paulo e demorar tanto tempo para chegar ao centro da cidade, por exemplo. Brasília, hoje, é uma cidade que foi mais planejada, com ruas largas, e, se for sair aqui no final de tarde, se for para o rumo oeste, por exemplo, Taguatinga, ou rumo leste, que é Planaltina, você vai se penalizar bastante com o eixo, porque são seis vias superlotadas, com trânsito muito lento. Então, a gente precisa dar uma melhorada nisso. E acho que o Carlos Tomé tem tentado olhar com um olho mais voltado para essa questão de humanização do nosso trânsito.
Nesse final de semana, quem pôde ler o Correio Braziliense, viu que ele trouxe uma reportagem sobre a paz no trânsito, que era uma coisa que dava orgulho ao morador brasiliense.Na época do governo Cristovam, Senador aqui nesta Casa, foi instituído uma campanha muito forte com relação à paz no trânsito.
Tomé, acho que poderíamos tentar, de repente, reeducar o pessoal para respeitar aquele bate mão nas nossas faixas de trânsito, que eram orgulho de todos nós. O Uruguai é um país aonde se você colocar o pé na rua, as pessoas param. Na Suíça, a mesma coisa. Aqui em Brasília era a mesma coisa: quando o pedestre chegava na faixa o pessoal respeitava, e isso transformava as pessoas, que tinham muito mais orgulho. De repente, a gente pode resgatar essa discussão.
A questão das ciclovias. Acho que algumas quilometragens foram feitas razoavelmente pelo Governo anterior, mas penso que devemos retomar, fazendo, talvez, com mais qualidade, com mais planejamento, porque Brasília é uma cidade plana, que favorece muito a que as pessoas se desloquem em ciclovias.
Sobre a questão do VLT, acho que precisamos investir mais. Talvez essa ligação da W3 toda, a avenida comercial de Taguatinga, alguma coisa assim, Hélio Prates. Poderíamos desengarrafar essas principais vias... Talvez a Esplanada. O VLT é um transporte sobre trilhos, que vai ficar mais tranquilo e que vai carregar mais pessoas de uma vez só, evitando a poluição. Acho que vale a pena a gente avaliar isso. Há também essa questão da interligação, o aproveitamento dos trilhos de Luziânia para Brasília. Luziânia é uma grande cidade do entorno de Brasília.
Como já existem os trilhos, se melhorarmos vai ser de grande importância para o Distrito Federal, porque vai unificar as cidades de grande densidade populacional, facilitando o transporte para os pontos onde essas pessoas trabalham aqui no Distrito Federal.
Quero dizer que nós, do Distrito Federal, Senadores e Deputados Federais, estamos abertos para nos unirmos e apresentarmos emendas coletivas que possam estar contribuindo tanto com a Secretaria de Mobilidade, quanto com o DER e com o próprio Detran, a fim de possamos dar melhor harmonia e tranquilidade ao nosso trânsito. Estamos abertos, Carlos Tomé e Henrique, para discutirmos isso no tempo devido. Você que é nosso amigo desta Casa sabe bem como são os trâmites.
Quero concluir, Senador Paulo Paim, mais uma vez tendo o orgulho de participar desta Comissão como membro titular, pois sei o seu esforço no sentido de trazer os mais diversos assuntos para o debate, o que tem sido importante para o nosso País e para as nossas cidades. Assim, colaborar nesta Comissão é de bastante satisfação a todos nós, que estamos sempre abertos para colaboração.
Obrigado a todos. Estamos aí para ajudar Brasília e o Brasil a terem um trânsito mais humano.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador Hélio José.
Agora vou passar a palavra ao Senador José Medeiros. Mas noto que no plenário há diversos estudiosos, especialistas neste tema. Se quiserem usar a palavra...
Lembrei de você, Nazareno, porque trabalhou em Porto Alegre. Assim, se quiserem usar a palavra, é só se inscreverem e darem as suas contribuições ao debate, depois que terminarem as Mesas subsequentes. Mas seria importante ouvir a colaboração de todos que estão no plenário, independente dos nossos convidados.
Senador José Medeiros.
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O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Senador Paulo Paim, inspetor Edson Nunes, Secretário Dario Rais, Secretário Carlos Henrique, Prof. Fábio, Profª Maria Rosa, um debate muito importante porque, aqui já foi falado, citado, nós perdemos em vidas contáveis, o número é alto e assusta, e às vezes assusta de forma seletiva. Quando acontece uma tragédia como a da Boate Kiss, mais de 270 pessoas morreram, o País fica em verdadeira comoção, assusta-se com aquilo, ou cai um avião, morrem mais de cem pessoas. Mas todos os dias há verdadeiras tragédias acontecendo. Nós temos um corredor rodoviário em Mato Grosso que, todo ano, em torno de 280 pessoas, todo ano aquele número. É muita gente. E, nas cidades, todos os dias, acontecem verdadeiras tragédias. E às vezes a indignação é um pouco seletiva, porque vai morrendo aos poucos, isso parece fazer parte do nosso cotidiano.
Eu vejo que, na verdade, diagnosticado o problema está. Nós temos conhecimento, know-how para isso, temos casos de sucesso em vários locais do País. Brasília é um exemplo, já foi citado aqui, Curitiba também e vários outros locais. A pergunta que fica é: o que falta? Porque nós temos o conhecimento, nós sabemos do problema. Parece que a resposta óbvia é: prioridade e vontade política de que a coisa aconteça. Vejo como exemplo a Copa do Mundo, em que havia uma grande preocupação com a segurança pública, estou falando no geral, obviamente também com o fator mobilidade. Os órgãos se integraram - houve uma preocupação com isso -, e funcionou como um relógio.
O inspetor colocou aqui sobre o Programa Rodovida, e foram citados outros programas também. Foi provado matematicamente, estão aqui os gráficos, que, nessas operações específicas, como a Operação Carnaval, que se sabe que haverá fluxo de pessoas, fatores como álcool, o Poder Público foca, traz como prioridade, e os números caem. E por que isso não acontece diariamente no ano inteiro? Ou por que esses programas de sucesso não estão ocorrendo? Isso nos remete novamente à prioridade e à vontade política, porque, se for exigido da Polícia Rodoviária Federal que faça a Rodovida anual, ela não vai conseguir porque não terá efetivo para isso. Com certeza, consegue fazer a Rodovida com um esforço concentrado, em que se reagrupam as escalas, em que todos os recursos são colocados em prol daqueles, vamos dizer, oito a dez dias de Carnaval, mas não consegue manter isso durante o ano. Assim como a segurança pública da Copa, também não se consegue fazer isso durante todo o ano.
O certo é que temos muito trabalho pela frente porque nos falta, a meu ver, e digo isso por constatação aqui das falas, integração nesses órgãos. Nós temos o know-how, temos o conhecimento, e falta integrar. Eu vou dar um exemplo aqui. O Prof. Rais é do Ministério das Cidades. Este Ministério tem o Denatran, que faz parte do Sistema Nacional de Trânsito, mas boa parte...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - E o representante do Denatran vai falar também aqui.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ...do Sistema Nacional de Trânsito está meio que ligada ao Ministério da Justiça, e o Denatran está no Ministério das Cidades. A meu ver, nós tínhamos que ter uma integração maior desses órgãos todos.
Foi colocado aqui pelo professor que o principal pilar do sistema, quando colocou os três pilares, é a engenharia. Mas o que a gente vê, apesar de ela ser o principal pilar, nos exemplos em cidades, em Municípios. Como é que isso ocorre? Geralmente o setor de engenharia fica na secretaria de obras ou em outros lugares ligados ao planejamento. Dificilmente, você encontra um Município que tenha um departamento de engenharia à disposição daquele órgão, integrado às secretarias de planejamento, para pensar o trânsito, para pensar essa engenharia de tráfego.
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E mais ainda, outro fator, me parece que temos uma grande falta desses profissionais, porque eu vi uma entrevista de um prefeito que implorava, que pagava o que fosse para ter um profissional desses em sua cidade, porque ele queria fazer uma revolução no trânsito. Encontrei-o, após alguns anos, e perguntei se ele tinha encontrado esse profissional. Ele me disse que não tinha encontrado. Então, parece-me que temos pouca mão de obra capacitada nesse setor. Talvez nos grandes centros a realidade seja diferente, mas, nos Municípios do interior, há muita dificuldade a respeito.
Paralelo a isso, eu vejo que, nos Estados, nós temos o DETRAN, que, em tese, é o órgão responsável pela coisa toda, mas eu vejo os DETRANs, hoje, muito mais de forma cartorária do que como um órgão capaz de dar subsídio para os Municípios. Agregado a isso, eu vejo as secretarias de trânsito como um apêndice, como algo que "tem que ter, meio que pró-forma, para que eu possa fazer parte do Sistema Nacional de Trânsito". Quando é montada a secretaria nas Prefeituras - e eu estou falando muito de Município aqui porque é onde a coisa corre, onde a coisa acontece -, não se vê muito foco nisso. As secretarias de trânsito, na maioria, têm dificuldade de verbas para comprar cartucho de tinta. São responsáveis pelo planejamento do transporte, por tirar os gargalos dos pontos de conflito, pelos novos pontos de afluxo de pessoas, mas não têm estrutura nenhuma.
Então, temos esse caldo todo que resulta no que temos nas cidades. A engenharia faz, às vezes, obras magníficas, e um ouvinte nosso citou o caso de Várzea Grande, no Mato Grosso. Em Várzea Grande, no Mato Grosso, por exemplo, durante a Copa, foi lançado um grande pacote de obra de mobilidade urbana. E o que mais se ouvia falar era em mobilidade, mobilidade, mobilidade - palavra maravilhosa, linda! Mas o que aconteceu depois com o legado da Copa? Ficou o esqueleto de um VLT. Passou-se boa parte do tempo discutindo esse meio de transporte, se seria BRT ou VLT; veio a Copa; e o VLT não aconteceu, mas está lá, ligando nada a lugar nenhum. É um esqueleto no meio da cidade. Já se gastou R$1,4 bilhão, e fala-se em gastar mais R$1 bilhão para terminar isso. Paralelo a isso, não se vê um projeto de integração a esse corredor. Então, do que vai adiantar você ter um corredor se você não tem a linha alimentadora desse sistema?
Eu estou dando o exemplo de Mato Grosso, onde surgiu esse caso, mas a gente nota que, em boa parte do País, nós não temos um sistema de transporte integrado, e, nesse ponto, recaímos no que o Carlos falou aqui: dar alternativas para que essas pessoas comecem a migrar. Eu até noto que há certa vontade, mas o sujeito para na calçada, olha para o carro dele e pensa: "Se eu for pegar o ônibus, ele vai passar daqui a quantos minutos?"
O grande problema é que, no nosso sistema de transporte, por essas secretarias não serem, vamos dizer, aquele órgão que funciona a contento, não funciona a engenharia, e, portanto, nós não temos corredores em que esse meio de transporte possa trefegar e ser alimentado. Não existe essa integração. Nós temos um setor de transporte mal fiscalizado, e, com isso, nós não temos regularidade, não temos boa qualidade. E isso espanta.
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Eu sinto, na verdade - e aqui vai uma crítica ao setor que recebe essas concessões -, que o melhor negócio do mundo é uma empresa de transporte público. O melhor negócio do mundo seria esse. E o segundo melhor negócio seria uma empresa dessa mal administrada, digamos assim. O melhor seria uma bem administrada; o segundo seria uma mal administrada, mas ainda assim daria muito dinheiro.
Em todo negócio que montarmos, vamos ter que ficar esperando cliente, implorando para que ele venha; vamos ter que fazer campanhas de publicidade; vamos ter que pegar todo tipo de crédito, cheque, tudo; e vamos ter que ter ainda um setor de cobrança para receber isso. No setor de transporte, não. Quem espera é o cliente, ávido que passe. Faça sol ou faça chuva, ele está lá; se chover, melhor ainda. Então, é um ótimo negócio. Mas esse setor faz uma verdadeira... Judia mesmo do usuário, porque, em quase todas as prefeituras, Senador Paim, a grande verdade é que se matam os horários. No interior, o couro come. As empresas rodam nos horários-filé, mas colocam poucos veículos, e, portanto, o passageiro anda como se estivesse naquelas carretas que carregam porcos, imprensados, as mulheres até sofrendo constrangimentos. Nos horários de menos lucro, vamos dizer assim, esses ônibus simplesmente não rodam. E fica por isso mesmo porque as Prefeituras, ou por deficiência ou por corrupção dos gestores, não mantêm uma fiscalização ativa.
Então, nesse cenário, o que vai sobrar? Transporte individual. O sujeito vai comprar uma motocicleta, vai comprar um veículo e, com isso, some do transporte coletivo. Então, vejo que a saída - e esse diagnóstico eu tirei por aqui, essa conclusão eu tirei pelo que já foi falado aqui - é, em primeiro lugar, o poder público colocar isso como prioridade. "Vou resolver". Ter vontade política para isso. E colocar recursos para tal. Do contrário, vai parar. Vai ter dia e hora para parar.
Vemos que a cada dia esses órgãos são menos priorizados. Os órgãos que estão tentando fazer alguma coisa, como a Polícia Rodoviária Federal, são sucateados. Lógico que o inspetor não vai dizer isso aqui, porque ele veio com o foco de trazer os resultados, e nem cabe a ele fazer essa crítica, mas é uma constatação. Em todos os Estados, unidades da Polícia Rodoviária Federal estão sendo fechadas por falta de efetivo. Há poucos dias, a Senadora Ana Amélia falou sobre o Rio Grande do Sul; no Mato Grosso já é o terceiro que fecha do ano passado para cá. E menos fiscalização, mais acidentes. Isso é óbvio.
Paralelo a isso... Estou fazendo essa colcha de retalhos para mostrar o que está acontecendo nas três esferas. Municípios, Estados e União têm essa problemática.
Vou falar sobre um problema que tem acontecido muito nas rodovias. Estamos aumentando... Temos vias feitas para veículos da década de 70 e hoje temos verdadeiros rodotrens trafegando com pesos de 100 toneladas. E coloco o ponto: não me parece haver uma integração entre o que o DNIT libera - porque é o DNIT que libera esses rodotrens... Não vejo o DNIT conversando; e se existe essa conversa, talvez não esteja surtindo resultado. Mas não vejo essa integração entre a engenharia, a fiscalização, quem planeja, enfim, está tudo muito solto. E por essas coisas estarem soltas, o sistema não funciona.
De outra parte, vemos o Governo, o setor econômico liberando cada vez mais incentivos para a compra de automóveis. Agora mesmo a indústria está gritando aí... Daqui a pouco vem mais uma roda de incentivos. E aí a minha indagação: esse setor econômico está conversando com o Ministério das Cidades, com quem faz as rodovias, com quem faz a parte urbana, está havendo essa integração? Porque são setores que deveriam estar totalmente conversando entre si, dentro de um planejamento, para que pudéssemos resolver esses problemas. Mas, a meu ver, está indo muito a reboque.
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Eu sempre cito como exemplo, eu tenho como exemplo de tudo isso aquela ponte estaiada, linda, lá em São Paulo. Toda vez que eu vou assistir ao jornal e vejo aquela ponte, eu a vejo como exemplo disso. Fico imaginando o quanto foi gasto naquele empreendimento, e eu pergunto-me o que ela resolveu? Ela ligou um engarrafamento a outro engarrafamento. Este é o retrato que nós temos. E aí, às vezes, a gente até fala: "Mas o cidadão deveria se conscientizar e andar, pegar a bicicleta". Mas ele fala: "Como? Nós não temos uma malha viária preparada para isso". "Devia andar de ônibus". "Mas como?" Não é verdade! Essa é a reflexão que fica, porque penso que tem que partir do Poder Público.
Senador Paim, V. Exª foi de uma felicidade imensa ao puxar esse tema. Penso que temos que ter outras rodas dessa para começarmos a buscar esses atores todos, para podermos fomentar toda essa discussão, no sentido de trazer esse cliente, digamos, para o transporte público.
Para finalizar, lembro-me de entrevista dada pelo presidente do Chicago Bulls, época em que surgia a transmissão dos jogos com aquela forma maravilhosa, oportunidade em que o repórter perguntou-lhe: "Como é que vocês vão fazer para competir com a TV? Porque o sujeito vai estar na poltrona da casa dele, muito bem-instalado, comendo pipoca ou qualquer outro petisco, assistindo aos jogos, com entrevistas, e como é que vocês vão fazer para levar o público às arenas?" Ele disse: "Vou tornar a arena um lugar mais confortável do que a poltrona da casa dele". E, de fato, isso virou uma realidade nas arenas nos Estados Unidos.
Então, no momento em que o transporte coletivo for melhor do que o meu carro, com certeza, eu vou mudar para o transporte coletivo.
Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador José Medeiros. V. Exª deu um exemplo no final que, de fato, arredondou toda a sua fala. (Palmas.)
Nós precisamos disto: transporte coletivo de qualidade. E, com isso, naturalmente a população terá o seu espaço.
Eu vou pedir a esta Mesa que volte para a primeira fila, porque, neste momento, nós vamos chamar uma outra Mesa, sem prejuízo do debate, e depois vamos passar a palavra também para os nossos convidados.
O SR. HÉLIO JOSÉ (Bloco Maioria/PSD - DF) - Sr. Presidente, eu vou me retirar momentaneamente, porque tem um pessoal me esperando, mas ainda retorno. O.k.?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O.k..
Então convido, para a segunda Mesa, o Diretor do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran) e também representante do Ministério das Cidades, o Sr. Alberto Angerami.
Seja bem-vindo! (Palmas.)
Convido a Srª Cláudia Maria Cristina Macke Miani, jornalista e coordenadora, desde 2004, do Programa de Educação e Prevenção de Acidentes da Rede Sarah de Hospitais de Reabilitação; grande Rede Sarah.
Seja bem-vinda!
(Palmas.)
Convido o Sr. Henrique Luduvice, Diretor-Geral do DER-DF; o Prof. Carlos Penna Brescianini, Mestre em Ciência Pública e representante do Blog Ambiente e Transporte e, por fim, Renata Florentino, Secretária Institucional da ONG Rodas da Paz.
Para ganharmos tempo, peço aos representantes do Ministério das Cidades que continuem nesta Mesa, os dois, um está chegando e outro que já estava, porque entendo que o Ministério das Cidades ao mandar inclusive dois representantes para falarem de áreas específicas está prestigiando esse nosso debate.
Então, de imediato, eu passo a palavra ao Sr. Alberto Angerami, Diretor do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), também do Ministério das Cidades.
Sejam todos bem-vindos!
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O SR. ALBERTO ANGERAMI - Bom dia a todos!
O Departamento Nacional de Trânsito é um órgão executivo nacional de trânsito; o diretor do órgão é o presidente do Conselho Nacional de Trânsito, órgão que dita a política de trânsito no Brasil.
Já foi dito aqui que o trânsito se sustenta em três pilares: educação, engenharia e fiscalização. Eu coloco como prioridade um a educação; educação que começa nos lares, passa pelos cursos primário, secundário, superior etc.
A engenharia, como bem disse o Dr. Dario, é a utilização de vias públicas boas. Porque trânsito, segundo o próprio legislador no Código de Trânsito Brasileiro, é a utilização das vias por veículos, motorizados ou não, pessoas e animais.
A educação, a engenharia e a fiscalização precisam estar integradas para que nós tenhamos segurança no trânsito. E a segurança no trânsito depende fundamentalmente da fiscalização. Eu insisto em falar em fiscalização continuada e não esporádica, como eu insisto em falar em educação continuada e não esporádica. As campanhas educativas devem ser continuadas, diárias, como a fiscalização deve ser continuada.
Eu percebi, na minha cidade, São Paulo, que quando foi instituído o bafômetro a fiscalização era continuada. Nós sabemos que a bebida alcoólica tem provocado acidentes gravíssimos em todas as cidades brasileiras. Essa fiscalização com a bafômetro era continuada, mas ela se tornou esporádica. Francamente, eu tenho visto muito pouco fiscalização com o bafômetro.
Os números de acidentes são alarmantes. Ano passado, tivemos cerca de 50 mil mortes no trânsito no Brasil, com um índice de 22 mortes por ano por 100 mil habitantes, quando sabemos que em países onde a educação é continuada, onde a fiscalização é continuada, esses acidentes atingem de 5 a 6 mortes por cada 100 mil habitantes. E, em razão dos acidentes, das mortes no trânsito, dos acidentes com vítimas, que representam para nós cerca de 35 bilhões por ano, em razão disso a ONU editou uma resolução, um pacto com 178 países signatários, a chamada década da redução de acidentes, resolução que foi firmada em 2010, a contar de 2011 até 2020. Já tivemos uma primeira conferência internacional, em Moscou, e a segunda será aqui no Brasil, nos dias 18 e 19 de novembro.
Portanto, vamos ter que apresentar nessa conferência os nossos números, que não são tão maravilhosos. Pelo contrário. Mostram que está havendo uma falha incrível nesse tripé do trânsito seguro, que é a educação, em primeiro lugar, que eu priorizo, a engenharia e a fiscalização.
É só isso. (Palmas.)
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O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Parabéns, Dr. Alberto, Diretor do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), que complementou as informações que o Dr. Dario já havia trazido por parte do Ministério da Cidade.
Vou passar a palavra a Drª Cláudia Maria Cristina Macke Miani, jornalista e coordenadora, desde 2004, do Programa de Prevenção de Acidentes da Rede Sarah.
A SRª CLÁUDIA MARIA CRISTINA MACKE MIANI - Muito obrigada.
Bom dia, Exmº Sr. Senador Paulo Paim, Presidente desta Comissão. Agradeço muito pelo convite à Rede Sarah, na pessoa da Drª Lúcia Willadino Braga, Neurocientista e Presidente da Rede Sarah.
Senhores expositores, participantes desse debate, ao longo desta manhã, tantos assuntos já vieram à discussão, mas, espero, de verdade, somar, auxiliar nos debates e encaminhamentos dos trabalhos de hoje, desta audiência pública, visando acessibilidade melhor e, portanto, o direito de ir e vir com o respeito devido, quando fazemos uso do espaço público.
Os pilares da educação e segurança do Programa de Prevenção de Acidentes, criado pela Rede Sarah, do qual faço parte, criado para atender jovens estudantes do ensino fundamental, tem o propósito de transformar, desconstruir hábitos errados, focar em atitudes seguras e, assim, objetivamos a preservação da vida com qualidade, que é algo que perseguimos todo o tempo na Rede Sarah.
A Rede Sarah é um centro de neurorreabilitação, cujos tratamentos são de referência dentro e fora do País. Nas nove unidades que mantemos, nas capitais brasileiras, temos um mapa da violência que ora reproduzo aqui para os senhores.
Essa pesquisa foca o paciente internado, isso nos facilita, uma vez que o acesso a esse paciente está ali, já que não precisamos marcar uma possível entrevista. Nós focamos, então, o ano 2000, e, depois, os anos de 2009 a 2014.
Pois bem, nesse perfil dos pacientes, o acidente de trânsito é o trauma mais recorrente, como os senhores podem observar. Em 2000, tínhamos 38% dos nossos pacientes internados por traumas, eles foram vítimas de acidentes de trânsito. Em 2013, para trazer então mais próximo da nossa realidade, esse número era de 46%, em 2014, 49%.
É o trânsito, sem dúvida, o grande maior causador de politraumas, depois são as quedas, que aqui também vale à pena uma ressalva: a população, à medida que envelhece, as quedas se acentuam com gravidade. Então, essas quedas acarretam traumas graves, principalmente a partir dos 60, 65 anos. Em seguida, chamo a atenção também às agressões por armas de fogo, prática de esporte, acidentes por mergulho e outras causas externas. Quando falo em saltos, mergulhos, refiro-me a saltos de ponta ou saltos ornamentais, como são conhecidos.
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O meio de locomoção eu acho que precisamos reforçar como acessibilidade e o uso do espaço público. O histórico de acidente, quando ouvimos os relatos dos pacientes, o acidente é o grande causador e com mais vítimas. Já foi pior. Em 2000, 54% estava no automóvel, no momento do acidente. Em 2013, como os senhores podem ver, esse número já caiu para 38%; em 2014, caiu para 35%. Bom, ainda é considerável. Mas o meio de locomoção que mais cresce nas grandes cidades, também hoje, é o que mais traz sequelas individuais, que são as motocicletas. Em 2000, 22% foram feridos em motos. Comparemos, então, esses números, agora, com os últimos números de 2013/2014: 47%, em 2013; em 2014, 49%.
Outro referencial que acho bastante significativo para este debate é o extrato da violência no trânsito envolvendo o pedestre. Foram 7% dos nossos pacientes vítimas de um atropelamento. E esse número se manteve nos três últimos anos: 7%. Mas ressalto, Senador, não ser confortável. Por quê? Porque o perfil que chega para reabilitação no Sarah é o perfil que é salvo, aquele momento do acidente é um momento crucial em nível de agressão, e muitos não sobrevivem no ato de um atropelamento.
Outro ponto que eu gostaria de ressaltar, que os senhores representantes da segurança no trânsito também já trouxeram, é a questão dos acidentes nas rodovias e os locais relatados pelos nossos pacientes, quando se referem a acidentes. De 69%, mais ou menos, a 76% se acidentaram em rodovias. Em 2013, tivemos esse número aqui substancial: 76%, que se feriram numa pista de uma rodovia; e, em 2014, 71%. Essa é a história que ouvimos com mais frequência no relato dos nossos pacientes.
Em termos de gravidade, os acidentes de trânsito trazem politraumas, acidentes medulares, acidentes cerebrais. E, quando falo acidentes medulares, a região cervical, portanto, que é altamente mobilizante, é uma preocupação constante no nosso cotidiano de atendimento.
Ressalto, também, os acidentes nas vias urbanas. Temos aí um número significativo. Registramos, em 2000, 19% dos nossos pacientes se feriram numa estrada de terra. Já em 2013, esse número - desculpe, pode voltar - foi de 15%; e em 2014, 19%. Estradas de terra são estradas menos favorecidas, infelizmente, estamos mais expostos a uma tragédia, são estradas não pavimentadas, não sinalizadas, sem infraestrutura, sem segurança, sem socorro. Foram 10% no ano passado, o mesmo número, como os senhores podem observar em 2013.
Temos estatísticas que demonstram também, a exemplo dos senhores que cuidam da segurança, que são os dias de maior risco: finais de semana, sem dúvida, uso de bebida alcoólica é um elemento agravante, sem dúvida.
Gostaria, também, de falar sobre o gênero: as mulheres são as que menos se expõem nesses riscos; em compensação, os homens são os que mais se vitimizam nesses traumas. Então, observem que, em 2014, esses números também nos surpreenderam: mulheres: 40,2% se feriram em 2014; homens, em 2014: 59,8%. Os senhores observam friamente, parece uma diminuição, mas não é confortável também, quando olhamos os traumas altamente incapacitantes. Eu acho que é isso que eu gostaria de ressaltar agora. As lesões medulares e os traumatismos craniencefálicos são as maiores sequelas dos acidentes automobilísticos.
No ano passado, 77% se feriram com lesões medulares. Vale lembrar que é o sistema nervoso central. Ainda, na Medicina, não temos o que, confortavelmente, gostaríamos de ouvir num hospital que é: em quanto tempo, senhor médico, eu me curo? Essa resposta ainda demanda longos anos de pesquisa. A Rede Sarah está na ponta, em termos de pesquisas. Então, na verdade, é o grande desafio para a Medicina mundial. Daí eu achar que a questão da prevenção, é com o que eu trabalho, ser tão importante.
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No ano passado, então, 77% tiveram lesões medulares; em 2013 esse número foi um pouco maior: 79%. Traumatismos craniencefálico, quando falamos em lesões do sistema nervoso central, é acentuado também. Vejam os senhores aqui que, em 2000, 21%; em 2013, 13%; em 2014, 15%. Mas também, quando falamos em gravidade, as lesões neurológicas também nos preocupam muito. Dois por cento parecem pouco, numa visão macro, porém é uma lesão altamente incapacitante. Então, uma lesão que nós consideramos lesões graves.
Senhores, eu gostaria de descer a detalhes um pouquinho mais, quando falamos em lesões na medula. As lesões na medula nas áreas mais baixas, que chamamos de paraplegia, que afeta os membros inferiores, representa um maior volume de queixas de perda de sensibilidade e movimento dos nossos pacientes, vítimas de um acidente de automóvel. Foram 59%, como os senhores podem observar no gráfico, em 2013; 60% em 2014.
A tetraplegia, que é uma lesão ainda mais comprometedora, inclui a perda também dos movimentos e sensibilidade nas partes superiores do corpo, incluindo membros superiores. A tetraplegia é a lesão mais incapacitante, em que o paciente precisa contar com mais apoio, mais dedicação de nossos profissionais num trabalho interdisciplinar que o Sarah se dedica e trabalha, em todas as unidades, nas 9 unidades no País, onde mantemos o funcionamento da Rede Sarah. Quando afeta a área cervical pode até mesmo comprometer a capacidade respiratória. Essa lesão foi diagnóstico de 41% dos nossos pacientes, em 2013, e 40% em 2014.
Um outro ponto importante que precisamos trazer para debate é um instrumento tão corriqueiro, que todo mundo tem no veículo, mas nem sempre fazemos uso, e que cabemos discutir: a falta do uso do cinto de segurança, que ainda é algo que nos impressiona, os números, quando ouvimos os relatos dos pacientes, condutores, motoristas: 60% não usavam cinto de segurança na hora do acidente, nos registros que temos relativos a 2014, como os senhores podem observar ali. Portanto, 56%, em 2014; em 2013, temos esse número um pouquinho menor, 60%.
Passageiros do banco da frente, banco dianteiro. Parece que o condutor não é muito ouvido. Então, olhem só, os números são maiores. Se compararmos só 2013 e 2014, esse número foi menor em 2000, quando usamos a primeira referência. Então, 2014, 66% dos ocupantes do banco dianteiro não usavam cinto de segurança na hora do acidente; em 2013, 70%.
Banco de trás. Observem, senhores, em 2000, este número já foi bem maior, tivemos 86%, 80%. Esse número vem caindo. Em 2013, 76% e, em 2014, 68%. Sem dúvida que a fiscalização vem se mantendo mais efetiva. Mas, ainda assim, somos um tanto negligentes no nosso País em relação ao uso do cinto de segurança.
Por isso, senhores, a Rede Sarah intensificou os programas de prevenção de acidentes, principalmente acidentes no trânsito. Esse programa do qual faço parte, o Programa de Prevenção, é voltado a jovens, porque nós entendemos que ali que se constrói um futuro indivíduo mais consciente, mais preparado e, quem sabe, um condutor que não vai provocar tantos desastres no trânsito. Intitulamos Educação para Toda Vida, porque ali realmente você semeia para toda a vida.
(Soa a campainha.)
A SRª CLÁUDIA MARIA CRISTINA MACKE MIANI - Já concluo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - V. Sª tem mais cinco minutos.
A SRª CLÁUDIA MARIA CRISTINA MACKE MIANI - Então, eu participo desse programa. Levamos aos auditórios da Rede Sarah esses conceitos de informação e de prevenção, no formato de palestras - eu também ministro algumas palestras -, numa linguagem bem lúdica, bem infantil, porque a gente precisa atingir esse público - estamos no centro da Asa Sul, da Rede Sarah, no auditório da Rede Sarah. Usamos uma linguagem bastante focada no lúdico.
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Também temos informações sobre acidentes caseiros, acidentes domésticos, acidentes nas escolas. Como atravessar a faixa de pedestres, o uso da sinalização de mãos, que parece tão simples, tão básica, mas o quanto ela é importante, porque ela envia comandos cerebrais para aquele condutor. Portanto, aquele condutor será sensibilizado, e as áreas vão contribuir para uma atenção maior.
Nós também trazemos para o cotidiano dessas crianças situações do trânsito onde elas estão. Por exemplo, atravessar a faixa de pedestres, não fugir de uma faixa de pedestres, onde a gente não será respeitado devidamente. Não usar o corredor - isso a gente só assiste no Brasil. Os senhores trouxeram debates e informações, numa visão internacional, com certeza a isso a gente assiste no Brasil todos os dias, os corredores, que são corredores de motos, corredores de acidentes. A sinalização devida em todos os momentos. Não descer, acho que isso é importante sinalizar - quando nós trazemos essa informação para a criança, por mais que haja uma faixa de pedestres -, não devemos descer pelo lado, pela via, pela pista e, sim, pelo lado da calçada, onde, ao abrir uma porta, eu posso comprometer a vida de um motociclista, de um motoqueiro, de uma pessoa que trabalha fazendo entregas na rua. Com um abrir de portas, eu posso provocar um acidente, às vezes fatal. Então, usar realmente todos os instrumentos de segurança e, é claro, a educação, que em todos os momentos a gente deve fazer uso.
Nós também tratamos com essas crianças o momento certo e como atravessar. Quando estou na condição de ciclista, estou fazendo uso de um veículo. Então, eu não posso atravessar a faixa de pedestres usando aquela bicicleta. É importante trabalhar essa questão com a criança, por mais que a criança esteja num campo de futebol e vá salvar a sua bola. Naquele momento despertar para o quanto custa a vida. É um exercício que sempre faço com eles: qual é o custo da sua vida? Quando custa a bola? Quando custa a sua vida? Acho que isso é importante. O veículo que, num fator surpresa, pode vir sobre a gente.
Trabalhamos as sequelas mais graves, que são tão comprometedoras. E ali, a título de informação, a gente grifa a frase "o cérebro é o piloto do seu corpo; se ele for atingido, tudo será modificado". Passamos vídeos, que aqui trago somente a título de ilustração. Medula, por que tanto cuidado com ela? É o sistema nervoso central e, portanto, o cérebro manda mensagens via medula e ela, como uma grande avenida, distribui - e ela não pode estar congestionada -, essas informações para todo o corpo. Porém, ela é frágil, e, em caso de lesão, realmente, ela não responderá. Quanto mais alta a lesão mais ela será grave.
Então, é isso o que abordamos. Abordamos também histórias de pacientes, devidamente autorizadas pela família. Ilustramos que o não uso ou o uso incorreto do cinto de segurança, o não uso desse instrumento elevado, que favorece a boa colocação do cinto de segurança, porque a criança reclama, e quando diz que não gosta de usar o cinto de segurança procede, porque o cinto malcolocado machuca o pescoço e pode trazer uma lesão cervical pela frente. Malsentados, inclinados, podemos ser enforcados por um cinto de segurança. Tudo isso é assunto para a gente disseminar nessas palestras. O local correto de se sentar no carro. Com certeza um bebê não deve ser transportado no banco da frente. Histórias de jovens e crianças, até 7 anos, nós trazemos, uma vez que houver autorização dos pais.
(Soa a campainha.)
A SRª CLÁUDIA MARIA CRISTINA MACKE MIANI - Esse jovem - já concluo - que se acidentou com um cinto de segurança, um cinto subabdominal, que pode ferir a medula. "O motorista bebeu bastante", diz Amanda Luiza, 18 anos, que ficou tetraplégica.
Então, senhores, é isso que a gente traz a título também de debate, ilustração, mas é a realidade de um cotidiano, de um centro de reabilitação.
Queremos e propomos a esses jovens mudanças de hábito. Beber e dirigir, que não é uma prática nem legal e nem segura, isso é algo que a gente trata com esses jovens.
Eu concluo dizendo que a Rede Sarah trata os pacientes, mas há muito tempo se dedica também a educar, difundir informações, porque essa é uma forma também de cuidar da sociedade.
Muito obrigada. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Srª Cláudia Maria Cristina Macke Miani, jornalista e coordenadora, desde 2004, do Programa de Prevenção de Acidentes da Rede Sarah.
Eu dou um testemunho. Estou com um problema exatamente na cervical, não é na lombar, que irradia para toda a perna, inclusive estou usando uma cinta aqui que me indicaram lá no Sarah. É lá que eu estou fazendo o tratamento. Hoje à tarde é o dia em que eu estarei lá.
A SRª CLÁUDIA MARIA CRISTINA MACKE MIANI - Que ótimo! Não que eu queira que o senhor vá até lá, mas porque lá o senhor estará num local mais indicado e, com certeza, terá a resposta devida para as suas queixas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Meus cumprimentos à equipe lá, porque eu noto que eles atendem todo mundo. Todo mundo vai para a fila e todos são atendidos. Mesmo sendo Deputado ou Senador não se tem algum tipo de privilégio lá.
Então, aqui, me permitam, peço uma salva de palmas para a Rede Sarah e para a sua equipe. (Palmas.)
A SRª CLÁUDIA MARIA CRISTINA MACKE MIANI - Eu agradeço também a oportunidade de poder ilustrar, a convite do senhor e desta Comissão tão honrada, tão importante.
Obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem!
Passamos a palavra, de imediato, ao Sr. Henrique Luduvice, Diretor-Geral do DER- DF, e que, se não me engano, na época do governo Cristovam, ajudou a implantar o sistema, em nível nacional: Paz no Trânsito. Quando eu chegava no meu Rio Grande eu dizia: "Temos que fazer como em Brasília, porque em Brasília, na faixa de pedestre, todo mundo para, quando o cidadão levanta a mão".
O SR. HENRIQUE LUDUVICE - Perfeitamente.
Eu gostaria, primeiramente, de saudar o Senador Paulo Paim e todos os membros Senadores da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa por promoverem este importante debate e pela persistência com que conduzem esse tema.
Queria saudar também o Senador Hélio José, o Senador José Medeiros, que já se manifestaram, e a todos os componentes desta Mesa.
Quero registrar que o Distrito Federal está absolutamente compromissado, comprometido neste Governo, para que nós voltemos a alcançar indicadores como aqueles que tornaram o Distrito Federal uma referência no Brasil na época do Paz no Trânsito.
E aqui eu não poderia deixar de citar o nosso ex-Secretário de Transporte, Nazareno Affonso, assim como também o Carlos Tomé, que também já fizeram uso da palavra.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu quero parabenizar ambos, porque eu conheço o trabalho deles.
O SR. HENRIQUE LUDUVICE - Bom, quero, primeiramente, registrar que nós todos, efetivamente, temos que olhar o trânsito de uma forma diferenciada.
Quando o Brasil promoveu o Outubro Rosa, na busca da redução do câncer de mama, ou o Brasil promoveu o Novembro Azul, na busca da redução do câncer de próstata, nós verificamos que 27 mil brasileiros e brasileiras morriam dessas doenças. E efetivamente o trânsito brasileiro mata 43 mil por ano. Portanto, ele é uma epidemia, ele é uma doença de gravidade exemplar.
Por isso surgiu o Maio Amarelo que, efetivamente, é um movimento nacional e internacional que busca rigorosamente a redução dos acidentes com morte, dos acidentes com sequela no trânsito no Brasil e no mundo.
Particularmente, eu queria ainda registrar que o programa Paz no Trânsito foi uma referência em nível nacional, porque ele buscava naquele momento, naquela ocasião uma redução drástica dos acidentes com morte no Distrito Federal.
Nós temos uma cidade polinucleada, uma cidade com cidades-satélites e um centro, o Plano Piloto, interligadas por rodovias. E, efetivamente, nós também podíamos observar uma velocidade muita alta praticada no Distrito Federal. Era comum as pessoas irem até a Universidade de Brasília a 110 ou 120 Km/h. Era comum as pessoas transitarem em velocidades excessivas. E os acidentes e as famílias sofriam muito com as perdas de entes queridos e muitas vezes com sequelas duradouras de vida inteira.
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Outro dado importante naquele momento era a necessidade dessa conscientização. A sociedade se revoltou e, a partir de uma grande caminhada, com 30 mil pessoas vestidas de branco, no Parque da Cidade, ela se manifestou de forma contundente.
Havia um governo, o Prof. Cristovam Buarque, hoje Senador representando o Distrito Federal, que falava de cidadania de manhã, de tarde, de noite e de madrugada, que encampou aquela proposta da sociedade e criou o Grupo Executivo pela Paz no Trânsito, que tinha o DER, tinha o Detran, a Secretaria de Transportes, hoje Secretaria de Mobilidade, a Secretaria de Segurança Pública, a Companhia de Polícia Rodoviária, hoje Batalhão da Polícia Rodoviária, e o Batalhão de Trânsito absolutamente comprometidos com um grupo executivo pela paz no trânsito, que buscava instrumentalizar alternativas e soluções para aquelas demandas que eram da sociedade. E ali veio a duplicação de rodovias, a pavimentação de rodovias, a mudança do partido da sinalização no Distrito Federal, com a introdução dos pórticos, bandeiras duplas, bandeiras simples e também os painéis diagramados, painéis iluminados, uma revolução na sinalização do DF, com a implantação, inclusive, de 33 mil novas placas em quatro anos, todas elas refletivas, no DF.
Mas era preciso também conter a velocidade. Buscamos, então, à época, a implantação dos radares. E por que coloco isso de forma muito clara? Porque, a partir daquele programa, Senador Paim, nós passamos a ter uma reverberação do tema trânsito no Brasil inteiro.
Apenas para efeito de registro, naquela época, o Código de Trânsito Brasileiro atual, vigente no Brasil tramitava no Congresso Nacional havia 17 anos e estava efetivamente sem qualquer prioridade na nossa Casa Legislativa. A partir daquele programa, o Código de Trânsito foi aprovado e os programas que se sucederam em Estados e Municípios, de certa maneira, repercutiam o sucesso que se alcançou naquele momento sobre esse tema no Distrito Federal.
Mas, é óbvio, as continuidades são necessárias em relação a programas de governo, mas nem sempre acontecem. E particularmente há espasmos onde nós demos, como Brasil, ênfase à questão do trânsito e dos acidentes e em outros tantos momentos não tivemos essas ênfases necessárias.
É preciso então registrar que o trânsito, na verdade, sempre teve uma questão bastante importante no Brasil, pouco falada, que é uma busca de certa hierarquização. As pessoas que têm poder aquisitivo maior, as pessoas que têm carros mais potentes, mais bonitos, em geral, tentam se impor às demais também a partir da sua, entre aspas, "prioridade" ou a sua capacidade de impor certa velocidade. E é preciso repensar isso. O trânsito é igual para todos, a legislação e a sinalização são iguais para absolutamente todos, independentemente da sua renda, independentemente da capacidade ou da potência do seu veículo.
E é preciso também deixar muito claro que o País deixou de investir, ao longo do século 20, nos transportes coletivos, que efetivamente hoje retirariam muitos desses veículos de circulação no País.
Quando nós elogiamos, e aqui já aconteceu neste evento, a Europa e outros países que investiram no setor público, no setor de transportes, particularmente no metrô, nos trens, ou mesmo em corredores, nós efetivamente estamos registrando o trabalho de um século de sociedades que priorizaram isso ao longo do século 20, enquanto o País investiu em uma linha e mais um rabicho no Rio de Janeiro, agora com novos investimentos por conta da Copa e também da Olimpíada, três linhas de metrô e três linhas de trem em São Paulo, e uma linha com também um ramal aqui no Distrito Federal, e assim sucessivamente. Ou seja, nós não tratamos efetivamente o transporte como prioridade ao longo do século 20 que, efetivamente, foi aquilo que fez com que vários desses países citados como exemplo, como referência, tivessem essas malhas exemplares, algumas já aqui até demonstradas.
Outro dado importante que é preciso registrar é que nós temos que hoje buscar a implantação desses corredores, a implantação desses modais, de uma forma mais diferenciada. Por quê? Porque as cidades já estão absolutamente construídas e consolidadas, o que implica, naturalmente, investimentos muito mais caros, porque efetivamente é preciso fazer investimentos de maior monta em termos de recursos. Mas é necessário, porque as cidades não comportam mais o número de veículos e o crescimento populacional do País. Saímos, lá atrás, em 1970, de 90 milhões em ação, como se cantava numa Copa do Mundo, para 170, no ano 2000, e 190 já em 2010. Foram 100 milhões de habitantes que, de certa maneira, se incorporaram às nossas cidades em um espaço de quarenta anos.
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Enquanto algumas nações, com suas populações estabelecidas, investiam em melhorias, o nosso Brasil investia majoritariamente em carências. Educação para quem ainda não tem; saúde para quem ainda não tem; trânsito e transporte levando uma linha, puxando uma linha para mais distante, para um novo bairro que surge, para acomodar uma população que nasceu nesse período. Ou seja, nós investimos em carências, enquanto boa parte da população do mundo estabilizado, dos países centrais, efetivamente investe em melhorias.
Agora que nós estamos chegando próximos de uma população que deverá ser a população definitiva, em torno de 220, 235 milhões de habitantes, que é o que os nossos estudiosos da Geografia apontam, nós vamos ter cada vez mais capacidade de investir nessas melhorias. Mas, de qualquer forma, há uma temática hoje colocada de verdade como prioridade no País, que é a mobilidade. A população foi à rua, pediu educação de qualidade, saúde de qualidade e mobilidade, ou seja, o direito de deslocamento em segurança não só na via urbana, mas obviamente no próprio País.
Senador, a Engenharia me permitiu efetivamente conhecer o Brasil inteiro. Fui a alguns Estados, uns mais outros menos vezes, Roraima eu fui sete vezes, e nós acompanhamos, nos últimos tempos, pelo incremento do poder aquisitivo, não só a capacidade das pessoas em adquirirem veículos - e muitas das nossas cidades até então pacíficas no trânsito passaram a ter indicadores de acidentes muito duros e, mais que isso, congestionamentos expressivos -, como também verificamos que a população passou a utilizar outros meios, inclusive o avião.
E isso, efetivamente, demonstra uma capacidade de crescimento do poder aquisitivo. Mas isso, sem uma política de transporte e de mobilidade, na verdade, eleva as dificuldades de deslocamento de pessoas, de mercadorias, e interfere na própria competitividade de um Município, de uma unidade da Federação e até do próprio País. Sem contar que todas essas situações levam a uma situação de caos na própria saúde pública.
Portanto, acho que o tema trânsito, o tema transporte efetivamente tem que entrar de forma concreta e definitiva na pauta prioritária do nosso Brasil. E é importante que esta nossa Comissão aqui, no Senado Federal, possa colocar isso para conhecimento de todos os brasileiros.
E queria finalizar dizendo o seguinte: hoje, quando se fala de deslocamento, nós estamos falando, sim, de economia, estamos falando de competitividade, que é uma linguagem que muitas vezes cala mais fundo e eventualmente assume ares de prioridade do que aquelas referentes, em certos momentos, à questão humana. Nós precisamos tratar do trânsito e do transporte como uma questão humana, mas como também uma questão da economia.
A circulação em segurança é importante para construirmos uma democracia cada vez mais consolidada em termos de direitos, mas é importante para que o próprio País possa ter perspectivas em termos econômicos neste século 21.
Juntando essas duas circunstâncias, nós podemos obviamente atrair mais e mais setores para que nós possamos pensar juntos um modelo, uma proposta, uma ação de Brasil neste século 21, que priorize, sim, o transporte coletivo em detrimento do transporte individual. O conforto, a privacidade e, eventualmente, a segurança no transporte público, que muitas vezes são fatores que levavam ou levam as pessoas a buscar o individual.
Nós precisamos conceder, ou autorizar, ou buscar, ou estabelecer no transporte público valores que, muitas vezes, fizeram com que as pessoas buscassem historicamente aquele transporte que é individual.
Sabemos que é uma mudança de cultura, é uma mudança de concepção. É o País avançar democraticamente para priorizar o coletivo em detrimento do individual. Não é essa a nossa história. Não é isso que tradicionalmente escutamos e assistimos nas nossas redes de televisão e muitos dos nossos escritos.
(Soa a campainha.)
O SR. HENRIQUE LUDUVICE - Mas é preciso avançar nesse projeto para que nós possamos alcançar indicadores que tornem este País referência em termos de trânsito e transporte também em nível internacional.
Era isso que eu gostaria aqui de colocar e agradeço a oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, muito bem!
Agradeço ao Diretor-Geral do DER-DF, Henrique Luduvice, que deu aqui um panorama global da importância do social e do transporte coletivo principalmente. Uma mudança cultural. Não pensarmos no bem do transporte individual, mas pensarmos no bem do transporte com qualidade.
Quero dizer aos amigos que estão aí que teremos a terceira Mesa, com quatro convidados também.
Passo a palavra agora a Srª Renata Florentino, Secretária institucional da ONG Rodas da Paz.
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A SRª RENATA FLORENTINO - A gente vai trazer um tema bem específico hoje. A gente sabe que mobilidade é um tema muito amplo, tem várias abordagens, e aí, coincidentemente, um tema tratado por várias pessoas, que é questão da segurança em rodovias.
A gente está vendo um modelo de urbanização com uma segregação espacial bem razoável, aqui em Brasília já se está um pouco mais acostumado a isso, mas a gente vê que estão se expandindo as áreas de moradia, expandido as periferias e ainda com postos de trabalho muito concentrados.
O IBGE acabou de lançar um estudo que mostra que mais de sete milhões de brasileiros fazem esse tipo de deslocamento entre cidades, entre Municípios, seja para trabalhar ou estudar.
Quando a gente está tratando desse tipo de deslocamento entre Municípios, a gente, geralmente, está falando de deslocamento por rodovias. E aí um dos mitos que a gente tem que quebrar é achar que esses deslocamentos por rodovias, quando são motorizados, são ou por viagens de lazer, e quando são feitos por ciclistas, são ciclistas atletas. Quando a gente fala das pessoas que moram longe dos seus locais de trabalho, não por opção, mas por uma condição, e têm que se locomover por rodovias para acessar seus locais de trabalho, a gente está falando de pessoas que se expõem em vias de alto tráfego, de alta velocidade, sem que isso tenha sido, de fato, uma escolha, mas, muitas vezes, uma necessidade.
Aqui em Brasília... Isto aqui é um exemplo de demanda em ciclovia em rodovia que não atende atleta, é uma ciclovia de três quilômetros de extensão que atende a um pedido da comunidade da Estrutural para se integrar a Vicente Pires, onde muitas pessoas que residem na Estrutural trabalham.
Esta é via que liga a Estrutural à EPTG.
Muitas vezes, a gente fala da necessidade de ciclovias em rodovias. As pessoas dizem: "Mas é para atletas!" E é sempre bom trazer um exemplo concreto que mostra como esse deslocamento acontece.
Nas rodovias federais, nos dados da PRF - Polícia Rodoviária Federal - que a gente pegou, a chance de um ciclista estar envolvido no que costumamos chamar de acidente, por mais que não seja, era de 2,3%; a chance de um ciclista estar entre os mortos desse acidente era de 4,9%. Ou seja, as rodovias federais mostram uma oferta de risco proporcionalmente muito maior do que a que deveria ser se houvesse uma infraestrutura viária um pouco mais adequada.
Aqui em Brasília a gente tem um dado um pouco mais sério, na verdade. Dentro da nossa malha viária, menos de 5% dos quilômetros são rodovias e mais de 50% dos ciclistas mortos concentrados nesses menos de 5% de vias, que são as nossas rodovias distritais e federais.
Por muito tempo, quando a gente fez esse debate da necessidade de ciclovia em rodovia, caía-se no "não, mas quem utiliza é atleta".
Poxa, eu acho que dificilmente 55% dessas pessoas que faleceram eram atletas, geralmente atende esse pedido de deslocamento, e como exemplo o caso da Estrutural, seja a Estrutural, a EPTG, a EPIA, EPNB, as vias que forem. A gente tem que ser muito bem-assessorado por estatísticas prudentes na hora de tomar decisões de investimentos de políticas públicas para não ficar refém de emoções, opiniões ou bordões.
A gente viu um exemplo muito bem-sucedido agora que está acontecendo na cidade de São Paulo. De fato, uma política de mobilidade, uma política cicloviária que não é só fetichizada por quilômetros de ciclovias construídos. É uma política associada à redução dos limites de velocidade, à elaboração de um plano diretor que revê o jeito que a cidade está sendo construída, para orientar o volume dos empreendimentos que a cidade vai aceitar, o tipo de deslocamento que esses empreendimentos vão causar. E, por mais que a gente chame aquilo de ciclovia, tecnicamente, o que eles estão fazendo não é segregar a bicicleta do trânsito, o que São Paulo está fazendo é justamente incluir a bicicleta ao trânsito.
Por isso até que a Prefeitura teve uma decisão vitoriosa agora, relacionada àquele pedido da suspensão das obras por uma promotora do Ministério Publico, e a argumentação da Prefeitura é que a ciclovias ou ciclofaixas, que estão fazendo lá, não eram obras de engenharia, eram apenas sinalização de trânsito por isso não se aplicava boa parte daquelas reivindicações que a Promotora havia feito.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Que a Prefeitura, lá, ganhou, então.
A SRª RENATA FLORENTINO - Sim. O Presidente do TJ de São Paulo, o Nalini, suspendeu o efeito da liminar que estava pedindo a suspensão das obras.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, muito bem! A vitória é das nossas bicicletas.
A SRª RENATA FLORENTINO - E essa decisão, inclusive, foi tomada na sexta-feira, à noite, quando estava acontecendo a Bicicletada Nacional, aliás, internacional, várias cidades do Brasil e do mundo estavam pedalando em conjunto com São Paulo, pedindo para aquele projeto cicloviário, não só de ciclovia, mas de redução dos limites de velocidade, de campanha educativa, de corredor de ônibus, que envolve um Plano Diretor muito interessante siga adiante.
E, aí, voltando para a questão das rodovias, aqui, no Brasil, além desses dados da PRF, que mostram que as rodovias federais oferecem um risco maior do que o que deviam para os ciclistas, na última campanha de 2014, a Presidenta Dilma acenou compromisso com algumas pautas que foram propostas pela União dos Ciclistas do Brasil, que fez uma Carta Compromisso, que foi assinada pelo candidato Eduardo Jorge, pela candidata Luciana Genro, pela candidata Marina Silva, e a Dilma Rousseff deu uma resposta a essa carta, incorporando a maior parte das propostas na sua integralidade. E uma delas era justamente a questão de tratamento viário adequado para as rodovias federais, para a gente dá conta de centrar num gargalo, que concentra boa parte das nossas fatalidades.
Isso aqui é um gráfico que ajuda um pouco a sair da ideologia abstrata na hora de discutir planejamento urbano. O que é que esse gráfico indica? Quanto menor o tráfego, menor a velocidade de circulação numa via, mais adequado é ele ser compartilhado com ciclistas. À medida que o tráfego e a velocidade vão aumentando, você já pode ter uma solução intermediária, que são, no caso, as ciclofaixas de São Paulo.
Quando você tem alto tráfego, alta velocidade, que é o caso da maior parte das nossas rodovias, você tem a necessidade de ter uma ciclovia, de fato, segregada, para proteger o ciclista dos riscos aos conflitos a que ele está exposto ali.
Isso aqui orienta tanto o que está acontecendo em São Paulo, que é o que a gente acabou de mencionar, eles estão fazendo essa sinalização no asfalto, eles não estão fazendo uma infraestrutura totalmente separada, eles estão aproveitando uma infraestrutura que já existe e é o que deveria orientar a construção de ciclovias aqui, nas rodovias do Distrito Federal.
Na hora em que a gente vê aquele dado do IBGE, que fala que mais de 7 milhões de brasileiros estudam ou trabalham em Municípios diferentes, aqui, em Brasília, que a gente é considerado RIDE, não é bem um Município, esse número é de 200 mil pessoas - DF e Entorno - fazendo esse tipo de deslocamento.
Agora, o que acontece é que, se a gente olha para dentro do Distrito Federal, por mais que a gente não seja considerado um Município, a gente tem distâncias entre as Regiões Administrativas daqui que são bem consideráveis e a gente tem uma concentração de postos de trabalho altíssima. A título de exemplo, o Plano Piloto concentra 48% dos postos de trabalho e tem 8% da população.
O Plano Piloto é ligado, basicamente, por rodovias às outras Regiões Administrativas.
Águas Claras, que é um bairro, em tese, recente, planejado, conta com 4,4% da população e tem 2,2% dos empregos. Menos desproporcional do que o Plano Piloto, mas, ainda assim, você percebe que tem mais gente do que posto de trabalho. As pessoas têm que sair dali para chegar na sua fonte de renda.
Na hora em que a gente vai para a Ceilândia, Ceilândia tem 16% da população do DF, ou seja, o dobro da população do Plano Piloto, e tem a mesma quantidade de emprego que Águas Claras, 2,2% dos postos de trabalho do Distrito Federal.
Se a gente não rever esse tipo de política urbana, em que a gente diz que as pessoas são bem-vindas para trabalhar em algumas áreas, mas elas não são bem-vindas para morar, a gente tem que dar um jeito de lidar com as rodovias urbanas que a gente cria, seja a EPNB, a EPTG, o Eixão e outras vias. E a questão da redução dos limites de velocidade tem que deixar de ser um tabu. A gente sabe que Brasília é tombada, mas a gente tem que entender que a velocidade não é um patrimônio histórico, ele não tem que ser tão protegido assim.
O que aconteceu em algumas cidades, como foi o caso de São Paulo, que, também, com uma ideologia motorizada muito forte, é que a prática venceu a prevenção, na verdade. A velocidade média dos veículos foi caindo tanto, à medida que a frota aumentava e os congestionamentos aumentavam, que, aí, a resistência à redução nos limites de velocidade já foi diminuindo ao longo do tempo, mas a questão é que a gente tem que dar conta de ter medidas mais altivas e preventivas para não ser refém do apocalipse motorizado e achar que ele, reduzindo a velocidade através dos congestionamentos, é o que vai reduzir as fatalidades no trânsito. A gente tem que dar conta de tratar a velocidade das nossas rodovias urbanas com um pouco mais de critério e menos pudor.
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Em Brasília, aconteceu uma coisa curiosa. Esse é um dado que eu já mencionei, mas olhar é sempre melhor, da concentração dos mortos por tipos de via aqui no DF, nos últimos dez anos. Esse é um dado oficial, a malha viária, é um dado oficial que o DER tem, a CNT tem. O número de ciclistas mortos é um dado que o Detran produz anualmente, enfim, são dados oficiais de que o Governo dispõe.
Temos que entender que um bom dado é aliado de uma boa política pública. Se ignoramos as estatísticas que o próprio setor público produz, estamos perdendo eficiência nos investimentos que estamos fazendo. O que aconteceu aqui em Brasília, que hoje em dia tem a maior malha cicloviária do País, é que concentrou-se o investimento de ciclovias em vias de baixa velocidade. Se olharmos isso dividido por Região Administrativa, a gente vê que mais de 40% dos quilômetros de ciclovia feitos estão concentradas no Plano Piloto, que é uma área que tinha 4% dos ciclistas mortos dos últimos dez anos. Essa é uma concentração de investimentos que não colabora em nada para mudar a nossa realidade para melhor. É uma concentração de investimentos que vira uma peça de propaganda só refém dos quilômetros de ciclovias, sem perceber que ela tem que estar inserida em uma discussão de política cicloviária maior.
Mas aí, na hora em que a gente vai fazer uma argumentação: "Mas a EPTG continua sem ciclovia". A EPTG, nos últimos dez anos, teve a mesma quantidade de mortos do que o Plano Piloto inteiro. O Plano Piloto, hoje em dia, tem 140km de ciclovia, e a EPTG, que passou uma ampliação viária razoável, com recursos do BID - foi uma operação milionária na época -, continua sem seus 16km de ciclovia necessários.
(Soa a campainha.)
A SRª RENATA FLORENTINO - Voltamos, então, para esse dado que mostra que menos de 5% das vias do DF concentram mais da metade das mortes. Se a gente tivesse um planejamento orientado pelas estatísticas que o próprio Governo dispõe, a gente não teria gastado tanto dinheiro em áreas onde, às vezes, ele não era tão prioritário.
Temos que ter clareza da seguinte informação, com a qual o próprio Haddad trabalha muito: aqui em Brasília, há mais de 11 mil quilômetros de via. Acho que são 11,6km de via asfaltada. Por mais que a gente tenha uma grande malha cicloviária, de mais de 400km, isso não garante o acesso das pessoas à cidade. Se temos mais de 11 mil quilômetros de via, 400km dentro destes 11 mil, do jeito que estão distribuídos, do jeito que os postos de trabalho são concentrados e as moradias dispersas, a gente não está dando conta de garantir o direito à cidade com segurança da nossa população. Se a gente fica refém da concentração de investimento na área que já concentra a maior parte dos postos de trabalho, mas que não concentra a maior parte da população, a gente vai continuar enxugando gelo e tendo que repetir alguns investimentos sendo feitos, porque eles não foram feitos de forma adequada.
Então, essa é a mensagem que a gente queria passar, pegando um ponto específico, que é a questão da segurança nas rodovias, ainda mais relacionada aos ciclistas aqui no Distrito Federal, e colocar essas questões de fundo: sem planejamento urbano para reduzir essas segregações espaciais, a gente vai ficar refém de grandes deslocamentos, grandes distâncias; outra: enquanto a gente não der conta de avaliar as estatísticas que os próprios governos dispõem para orientar seus investimentos, a gente vai continuar refém da situação, sem dar conta de reagir. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem! Esta foi a Secretária Institucional da ONG Rodas da Paz, Srª Renata Florentino.
Agora, vamos passar a palavra ao Sr. Carlos Penna Brescianini, Mestre em Ciências Públicas e representante do Blog Ambiente e Transporte, que foi um dos que insistiu muito para esta audiência acontecer.
Na última Mesa, além do representante do Ministério dos Transportes, temos o Uirá Lourenço, colaborador do Mobilize, e Paulo Henrique da Silva Santarém, representante do Movimento Passe Livre.
Eu fiz questão de incluir aqui o Nazareno, porque quando eu comecei a falar desse tema, o Nazareno já falava. Quando eu digo "comecei a falar" é ouvir e aprender um pouco. E você, no Rio Grande do Sul, já era quem mais falava sobre isso. Eu queria lhe ouvir hoje também.
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - O.k.?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Vamos lá.
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - Senador, obrigado pela participação aqui. Serei bem rápido, porque o nosso tempo não está brincadeira, não é, Senador? Vamos lá.
Nós conversamos com o Senador Paim sobre a necessidade de tentar, de alguma maneira, impedir que este número de 50 mil mortos por ano aumente. Nossa intenção é diminuir. Tanto que a gente estava com a assessoria antes do final de semana.
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Eu pediria, inclusive, a TV Senado, que está gentilmente transmitindo a audiência, que pudesse mostrar as imagens enquanto eu falo.
Cinquenta mil mortos por ano é, mais ou menos, a seguinte conta: 42, 43 mil mortos por conta dos acidentes propriamente ditos - que deve ser o número a ser liberado, nos próximos dias, de vítimas dos acidentes no Brasil em 2014 - mais, aproximadamente, 6 a 7 mil mortos no período de 24 horas a 2 meses após o acidente - porque, várias pessoas, não morrem, necessariamente, no momento do acidente: são levadas para hospitais, são resgatadas, mas terminam morrendo em complicações decorrentes do acidente. E a gente dividiu esses 50 mil pelos 365 dias do ano, e a que nós chegamos? Cento e trinta e seis mortos por dia, que, dá, mais ou menos, um Airbus A320 ou um Boeing 737 de média configuração. Ou seja, morrem por dia, no Brasil, um Airbus desse que se acidentou. Não dá para ficar parado!
O que leva as pessoas a morarem nas cidades? Primeira coisa: as pessoas nascem nas cidades, como a gente está mostrando a imagem dos bebezinhos. Qual é a outra opção? As pessoas vão para as cidades por conta de oportunidades de trabalho; é um direito das pessoas quererem trabalhar. Outra opção: necessidade de estudar, tanto para si, quanto para seus filhos e seus parentes. É uma necessidade. Então, isso faz as pessoas irem para as cidades. Busca de saúde: tanto se curar, quanto preventivamente - praticar esporte -, para si ou para os seus filhos.
Percebam o seguinte: o gráfico de cima, a tabela de cima, mostra, em azul, o crescimento da população urbana no Brasil. A última coluna é 2050. Nós vamos ter, aproximadamente, 237 milhões morando nas cidades e menos de 6,3 milhões habitantes morando na zona rural. É um movimento semelhante ao da China. Na China - embaixo, a gente fez a mesma contabilidade -, em vermelho, é o crescimento da população saindo dos campos; em amarelo, a população que saiu dos campos. Ou seja, em vermelho, a população urbana; e, em amarelo, a população dos campos. Ocorre uma inversão. Isso é mundial: as pessoas vão para as cidades. Então, as cidades crescem, elas incham. Nós precisamos ter condições.
Aí, a gente pegou Seul, em 1961, e em 2011. A gente pegou Nova York: em 1931, e em 2005 - reparem como aumenta a quantidade de edifícios. Singapura: em 1964 e em 2004 - de novo, explosão imobiliária. Rio de Janeiro: no século 19 e no século 21. Porto Alegre - terra do Senador; isso é perto do Guaíba, não é, Senador? -: em 1890 e em 2009 - reparem só: extremamente urbanizada. Bahia, Salvador: no século 19 e no século 21 também. Brasília: em 1960 e em 2003 - reparem a pista de Brasília, aqui na Esplanada: seis pistas e congestionadas; era a cidade feita para o rodoviarismo, e congestionada. Tóquio: em 1945, totalmente devastada pelas bombas incendiárias, pelos bombardeios, e em 2007, já reconstruída como um grande centro urbano.
Vamos lá: Cidade do México: 20 milhões de habitantes, 201km de linhas de metrô, 4 milhões de passageiros por dia; ali, em cima, um mapa da linha do metrô.
Tóquio: 13 milhões de habitantes, 203km de linhas de metrô, quase seis e meio milhões de passageiros de metrô por dia - a complexidade da linha deles.
Rio de Janeiro: duas linhas, 13 milhões de habitantes, 41km de linha - olhem a diferença! Estão entendendo? Olhem a diferença!
São Paulo: 17 milhões de habitantes, quatro linhas de metrô hoje em funcionamento, 75km, aproximadamente, 2,8 milhões de passageiros. Eu não estou contando, em duplicata, passageiro que faz o transbordo na Sé, como várias vezes é contado. Então, por isso que estou utilizando o número real de passageiro indivíduo, está o.k.?
Porto Alegre: 1,4 milhão de habitantes; 34km de linhas de metrô, 203 mil passageiros/dia.
Belo Horizonte: 3 milhões... Eu vou avançar para a gente não tomar muito tempo.
Recife, a mesma situação: muitos, muitos, muitos habitantes, poucos quilômetros, poucos passageiros.
Distrito Federal: 2,4 milhões de habitantes, 42km, 160 mil passageiros/dia - olhem o tamanho da linha.
O que eu gostaria de dizer? Que o transporte é uma necessidade das pessoas. Se aumentar R$0,50 no preço de uma passagem de ônibus, de metrô, do que quer que seja, para uma pessoa que precisa do transporte público, isso serão 100 pães no final do mês, serão 15 litros de leite, 2kg de carne, são quase 15kg de açúcar, ou seja, todo preço, todo centavo no preço da passagem de ônibus, influi no orçamento das populações de menor renda.
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Essa caso da famosa D. Maria, ela está preocupada, porque se não conseguisse a vaga no colégio perto de casa, o filho não iria estudar. Então, você condena a pessoa ao subdesenvolvimento, à baixa escolaridade, ao subemprego, se ela não tiver condições de estudar e transporte. Isso é injusto.
E qual é a situação que nós temos? Nós temos o seguinte: os pedestres que são, literalmente, abandonados ao relento. Nós andamos nas cidades brasileiras, poucas têm uma política de pedestrianismos: calçadas lisas, desimpedidas, em que um cadeirante, um idoso, uma criança, um carrinho de bebê possam circular. As pessoas são colocadas ao deus-dará. Então, essa é situação.
Ciclistas, o que que eu gostaria de dizer? A bicicleta não é simplesmente um hábito de pequenos burgueses que acham muito bonito. A bicicleta é aproximadamente o principal meio de transporte no Brasil de quem ganha até três salários mínimos e não usa o transporte público.
Então, essas pessoas têm uma extrema necessidade de ter condições de trafegabilidade e segurança e não podem ser jogadas nesse caos que está se fazendo que se incentiva a velocidade. Eu vim pra cá, na audiência, e ouvindo as propagandas de automóveis, todas enfatizam a velocidade, todas. Porque é mais potente, porque é mais rápido, porque é mais poderoso, porque vai de zero a cem em tanto... Gente, nós estamos ouvindo as pessoas falando que estão reduzindo a velocidade média nos centros urbanos desenvolvidos para 20, 30km/h! Por quê? Porque existe a questão da segurança. E por que que eles podem aceitar isso? Porque eles têm um bom transporte público, esse é o principal.
Automóveis, esse é o grande problema que nós temos. Quando a gente fez esse trabalho, estávamos em 60 milhões de automóveis. Na verdade, hoje, já estamos em 74 milhões de automóveis, em 2015.
Eu gostaria de pegar o dado do Inspetor Edson, que mostrou que a gente fabrica automóveis à taxa de 8,5% de crescimento da frota, por ano. Eu queria lembrar que a população brasileira cresce à média de 1,5%. Deixa eu explicar: do ano 2000 para cá, foram fabricados 38 milhões de automóveis; do ano 2000 para cá, nasceram 20 e poucos milhões de brasileiros. O que que eu quero dizer: se fabrica mais automóvel do que nasce brasileiro.
Não cabe pessoal, não cabe isso dentro das cidades! Sabe, simplesmente, nós estamos parando. "Ah, mas tem a questão do emprego." Vamos levar os empregos para a área metroferroviária que está abandonada. É uma área ligada à metalurgia, altamente estratégica, necessária para o desenvolvimento brasileiro e que pode suprir de maneira eficiente e saudável.
Ônibus, nós temos aqui, essa é a situação dos ônibus. Isso daqui que eu estou mostrando é o sistema de Bogotá, exatamente o TransMilenio. E eu peguei essas imagens quando eu digitei a palavra caos mais TransMilenio. Então, mostra a situação de esgotamento do TransMilenio.
O TransMilenio é uma experiência baseada num modelo de Curitiba, que era um modelo feito em cima da possibilidade de Curitiba ter metrô. Curitiba ficou excluída quando houve a opção pelos cinco grandes metrôs no Brasil. Ainda não havia Brasília, ainda não havia outros. Então, era Rio, São Paulo, Belo Horizonte, Recife e Porto Alegre. Curitiba ficou em sexto lugar e ficou fora.
Jaime Lerner, espertamente, pegou a proposta de desenho e fez um sistema de ônibus baseando-se na possibilidade da linha do metrô. Só que o sistema se esgotou, ele não cabe mais. É virtualmente impossível. Tenho parentes meus em Curitiba e as pessoas estão migrando, saindo das áreas dos grandes corredores de ônibus por conta da poluição sonora, por conta da poluição atmosférica, por conta dos acidentes. Porque ficam áreas degradadas durante o dia. É só cinza. A noite, então, é abandonada, aquela imagem ruim de abandono que você tem nos grandes centros velhos de algumas cidades.
E qual é a solução? É a gente não precisar utilizar o transporte rodoviário nesse padrão. Nós vamos chegar.
Essa era a primeira ideia de ônibus, que se tinha. Omnibus, em latim: para todos. As pessoas que não tinham dinheiro para comprar cavalos pagavam para andar em carroças, carruagens.
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Olha, isso é o ônibus brasileiro típico de piso baixo. Reparem que ele possibilita que o ônibus pare na linha da calçada e que a pessoa role da calçada para o ônibus sem ter problemas de acessibilidade. Esse é o termo principal. Isso possibilita duas coisas: que o motor seja colocado atrás e que possamos utilizar também motores elétricos, o que seria um ganho de qualidade ambiental nas cidades brasileiras tremendo. Além do mais, deixaria de se consumir diesel.
Esse é o ônibus chassis alto, que é o ônibus padrão no Brasil, é o Padron. Reparem que, por ser chassis alto, ele pode ser utilizado tanto para caminhão quanto para ônibus. Primeiro para caminhão, depois para ônibus.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - Exatamente, sendo aqui assessorado pelo Dr. Dario.
Então, o que acontece? Isso é muito bom para a empresa, mas é péssimo para o passageiro. Para a empresa pegar um veículo e transformar de um para outro é um ganho, mas para o passageiro não. Todo mundo sabe que subir as escadas dos ônibus brasileiros é um elemento complicador. Dá um problema de acessibilidade tremendo. Então, nós temos nas cidades... Conversando aqui com a Cláudia, um cadeirante, uma pessoa com dificuldade de mobilidade como ela faz? Ela tem dificuldades. Então, nós temos, na Europa, nos Estados Unidos, na Ásia, cadeirantes andando no sistema tranquilamente.
(Soa a campainha.)
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - Um amigo meu foi disputar o Panamericano no ano passado, no Canadá, e ele contou que quem passou por ele andando de cadeiras de rodas motorizada foi o Stephen Hawking, aquele fantástico físico, andando sozinho, numa rua em Montreal, passando com a cadeirinha motorizada dele. Ele passou, desceu, atravessou a rua. Isso seria inviável no Brasil. Quer dizer, são essas pequenas coisas que vão pegando.
E por nós termos um culto, por estarmos assim "excedificando" a quantidade de automóveis, nossas ruas estão se impermeabilizando e se transformando em armadilhas quando chove. Então, nós passamos a ter problemas de inundações o tempo todo, porque não há condição de o sistema de drenagem drenar essa quantidade de água. É virtualmente impossível. É enxugar gelo, como disse a Renata, nós estamos enxugando gelo. Não há como captar essa água toda porque nós impermeabilizamos.
Isso cinza é a mancha urbana do Rio de Janeiro versus a área verde. Olha como está impermeabilizado. Eu vou agora botar São Paulo. Olha só, igualmente impermeabilizado. Claro que quando chover, inunda. Óbvio. Belém está quase no nível do Rio Amazonas. Então, inunda. Além da impermeabilização, nós temos o famoso problema da poluição, dos gases de efeito estufa.
Nós que pesquisando essa questão de transporte e meio ambiente estamos com um pedido do Painel Governamental de Mudanças Climáticas de estudar o máximo possível a interação entre energia e transporte, porque a geração de energia e o transporte são quase um terço da geração de gases de efeito estufa do Planeta. Então, o que pudermos fazer para reduzir essa emissão de gases de efeito estufa vai diminuir o efeito final, que é o aquecimento global. E esse aquecimento é o que desregula todo o regime das chuvas, que inundam as cidades. Vejam vocês que as coisas se tocam.
Quais as soluções? Primeiro, diminuir o nível de impermeabilização. Solo permeável, solo com possibilidade de absorção de águas nas áreas de menor circulação de automóvel. Segunda coisa, desasfaltamento e desconcretamento. Seul era uma pátria rodoviária. Por conta das Olimpíadas e da Copa do Mundo, desmontou sua estrutura rodoviária e, por debaixo do solo, fez cinco ou seis linhas de metrô e devolveu a cidade para os cidadãos. Então, onde havia grandes viadutos, onde havia áreas sombreadas de poluição, agora recuperou a área dos rios, que se tornaram área de convivência. Isso pode ser feito em todo o Brasil. Isso não tem nada de impossível.
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É uma comparação: uma van leva até 20 pessoas; um ônibus, 50 pessoas; um ônibus articulado, 120 pessoas; e um biarticulado, até 160 pessoas. Isto em configurações de cinco passageiros por metro quadrado, o que é muito, gente. Desculpe-me dizer, mas é muito. Eu vou entrar nisso. Um veículo elétrico sobre pneus, um ônibus elétrico leva também até 180; um VLT, que é o bonde moderno, leva até 580 pessoas, só que é bem maior; um monotrilho, 1000; um metrô, até 1840 pessoas, com seis carros.
Aonde eu quero chegar? É o seguinte: a ficar em um congestionamento com cinco ou seis passageiros, ou até mais, por metro quadrado, dentro de um ônibus ou de qualquer que seja o veículo, o passageiro vai preferir ir de automóvel, porque, a ficar congestionado em más condições, insalubres, a ficar naquela condição, ele prefere ficar no carro. Então, o quê que eu quero dizer? Se nós conseguirmos oferecer um transporte de qualidade, nós tiramos passageiros do automóvel e botamos no sistema de transporte. E a conta que a gente tem visto é a seguinte: as pessoas não costumam migrar do automóvel para o ônibus, porque o ônibus é superlotado. As pessoas aceitam migrar para o trem, para o VLT, para o metrô e, em alguns casos, para a bicicleta, quando for próximo, quando houver boas condições. Para ir para o ônibus, não. Por isso que os BRTs não têm funcionado adequadamente, porque termina sendo uma conta igual, e então a pessoa prefere andar de carro.
A gente prega muito acessibilidade.
Seria importante estar o Secretário de Transporte e Mobilidade do Distrito Federal aqui.
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - É preciso a integração total dos meios de transporte. Quem pegar uma única passagem pode mudar de ônibus pra trem, pra metrô, para o que quer que seja, pagando uma única passagem justa. Senão, não vai ter condição. O que a gente fala de acessibilidade é isto: a pessoa poder se deslocar no mesmo nível de piso. Isto é fundamental para a gente poder fazer cidadania, direitos humanos para todos os deficientes e não deficientes.
Reparem que as calçadas são planos, lisas, com indicações.
Aqui são propostas de ciclovias, ciclofaixas, com média e grande segregações. Isso garante a proteção ao ciclista. Nós temos tido muitos embates aqui, em Brasília, por conta da questão: ciclista na rua ou não? Eu tenho muito medo de colocar ciclistas na rua com o trânsito de Brasília ou de outra cidade. Eu tenho defendido muito as ciclovias, mas eu não sou contra a ciclofaixa.
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - Mas nós precisamos garantir a segurança; se não, todo mundo vira estatística. Isso é fundamental. Grandes estacionamentos. Políticas de aluguel de bicicletas, vestiários em locais de trabalho... Nós estamos em um País tropical, onde a necessidade de mudar de roupa e tomar banho após andar de bicicleta é uma necessidade.
Aqui, alguns exemplos. Eu queria só mostrar isso daqui.
Esse é o melhor dos mundos, que a gente tinha feito um estudo. Isso daqui é uma cidade no Distrito Federal chamada Taguatinga. Isso daqui é Taguatinga Norte. Nós fizemos um estudo com essa proposta. Está parada há oito ou nove anos. Não vai pra frente. Nós alargaríamos as calçadas, colocaríamos todas planas, lisas, com caminhos, trilhas para deficientes visuais, para cegos. Essa faixa do meio é a ciclovia, a faixa na direita, depois da CEB, é a passagem do Veículo Leve sob Trilhos...
(Soa a campainha.)
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - ..., bonde, e, do outro lado, finalmente, a passagem do automóvel e dos ônibus. Tudo aqui bem bolado, simples. As pessoas poderiam deixar seu automóvel em casa e seguir normalmente.
A mesma coisa aqui aplicada para outra área, vista de outro ângulo, com contador de vagas para a pessoa que tiver automóvel ver a quantidade de vagas e não precisar entrar inutilmente.
Finalizando, Senador, foi a apresentação expressa mais rápida que eu já fiz.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Mas foi muito bem.
O SR. CARLOS PENNA BRESCIANINI - Obrigado.
O que eu gostaria só de frisar é o seguinte: a necessidade de se retirar as pessoas do ambiente de risco é fundamental. Se não, elas viram estatísticas, e os sobreviventes, se tiverem sorte, vão ser atendidos no Sarah ou se tornar um peso econômico para suas famílias e para o Estado. Nós não podemos deixar essa mortalidade, esse assassinato, esse genocídio continuar na sociedade brasileira.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Prof. Carlos Penna Brescianini, Mestre em Ciência Política, representante do blog Ambiente e Transporte.
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Convido os companheiros da mesa a retornarem à primeira fila e chamo a terceira mesa.
Chamo o Uirá Lourenço, colaborador do Mobilize, e também o Paulo Henrique da Silva Santarem, do Movimento Passe Livre, e Nazareno Affonso, coordenador do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos, MDT/ANTP, e ex-Secretário de Transportes do DF.
Eu iria pedir que, enquanto montam a mesa rapidamente aqui, que a gente passasse aquele pequeno vídeo ali.
É uma propagandazinha que você usou aqui, rápida.
(Procede-se à exibição do vídeo.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Isso mostra, num impacto rápido, o que pode acontecer.
Nós vamos, de imediato, aqui, passar a palavra ao Uirá Lourenço, do Mobilize, que trabalha nessa causa há muito tempo, pelo tempo concedido a todos, naturalmente, 10 minutos, com mais cinco, e, em seguida, ao Paulo Henrique e ao Nazareno, que fecha essa mesa.
O SR. UIRÁ LOURENÇO - Bom dia a todos.
Obrigado pelo convite, Senador.
Bom, eu tenho uma apresentação que eu ia fazer, na verdade, para contextualizar a questão da mobilidade urbana nas cidades, com foco na mobilidade saudável. Então, farei algumas considerações. É bom que muitas pessoas já tenham falado aspectos que vou ressaltar aqui.
Pode passar, por favor.
Bom, como a gente está aqui na Casa de Leis, é importante fazer um resgate do nosso marco legal, uma importante política que a gente tem, a Política Nacional de Mobilidade Urbana, de 2012, que está aí com princípios bem condizentes com o motivo da nossa luta. Acho que muitos dos que já falaram aqui têm realmente esses princípios em mente, a gente luta por isto: acessibilidade universal, a questão da priorização dos modos coletivos e saudáveis. Eu prefiro o termo "modo saudável" do que "modo não motorizado" porque acho que tem que ser algo afirmativo. A gente quer uma cidade saudável, ativa. Então, esses princípios estão bem elencados nessa lei.
Temos aí o Código de Trânsito Brasileiro também com questões importantes para a nossa luta. Está bem estabelecido lá que o maior protege o menor, que o motorizado deve cuidar do não motorizado, que todos devem prezar pelo pedestre. A gente sabe que, no dia a dia, isso não acontece, mas está aí bem estabelecido. Outras garantidas aí do Código de Trânsito: a questão da distância lateral de segurança - ao passar por um ciclista, manter a distância mínima de um metro e meio -, a preferência que o condutor deve dar ao pedestre e ao ciclista ao virar uma via, coisa que está muito boa na teoria, mas que a gente sabe que, na prática... O Pateta, como foi muito bem mostrado no início, expressa bem essa euforia, com as pessoas querendo ganhar alguns segundos e comprometendo a vida de muitas pessoas por causa de segundos. A questão da redução de velocidade ao ultrapassar o ciclista também está bem expressa no Código de Trânsito.
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Bom, um marco superimportante é a Década de Ações pela Segurança no Trânsito, que a gente está vivenciando. Aqui, no Distrito Federal, a gente tem um marco legal bem estabelecido já desde 2005 em relação à acessibilidade, ao incentivo ao uso da bicicleta... Então, realmente, a parte de legislação é bem vasta.
Mas aí o que a gente tem, o quadro que todo mundo já colocou, que todo mundo conhece no dia a dia, é esse caos de norte a sul do País, com as pessoas imobilizadas, uma perda de economia de recursos, uma perda de tempo, excesso de poluição, enfim, com todos os malefícios advindos desse sistema de transporte baseado no carro, na moto, no transporte individual motorizado. Essa legislação que a gente tem parece ir no caminho contrário, quer dizer, de alternativas a esse caos que a gente tem.
Só para ficar mais claro, aqui, no Distrito Federal, também diversas vias com a mesma situação de caos, aqueles caos pendular no início do dia, para ir para o trabalho, e no final do dia, para voltar do trabalho. A gente conhece bem o círculo vicioso, mas eu só tentei sintetizar aí que é totalmente insustentável. Quanto mais você investe em carros, mais caos, mais poluição, e isso compromete também a velocidade, por exemplo, do transporte coletivo, que se torna mais lento, mais caro.
Então, a gente tem dois caminhos para seguir: continuar com essa lógica absurda, lógica atrasada de ampliar vias, de dar ainda mais espaço aos carros, porque, como congestionou, tem que ampliar as vias, ou reverter esse processo e buscar uma cidade mais humana, saudável.
E aí uma constatação que a gente tem no dia a dia. Bom, eu só uso bicicleta no dia a dia, não tenho carro por opção já há mais de dez anos, e estou sempre com a câmera para observar a cidade. Isso aqui - a Renata já falou - é a EPTG, nossa curiosamente chamada Linha Verde, que não tem nada de verde. Então, ali o ciclista no meio do caos, pois a ciclovia prometida nunca saiu do papel, e lá morrem várias pessoas a cada ano. O pedestre, da mesma forma, ali, jogado. Ali ainda está seco, mas, no período de chuvas, aquilo é um barrão escorregadio. Então acaba que, na realidade, apesar da nossa legislação, o pedestre e o ciclista ainda são seres invisíveis ao nosso Poder Público .
Várias cenas ainda na nossa Linha Verde. É a isso que se sujeita... Não bastasse a ampliação viária que desconsiderou totalmente ciclistas e pedestres, ainda temos os "patetas" do trânsito invadindo o acostamento. Eu não sei se dá para sinalizar com esse... Ali, do lado esquerdo, seria um corredor de ônibus, que nunca operou, e aqui, do lado direito, onde está a linha vermelha, são os nossos motoristas que invadem o espaço que poderia ser do ciclista, na falta de ciclovias.
Aí se fala muito: "ah, mas ciclista também tem que seguir a lei, tem que andar na mão". Na falta de ciclovias, esses dois trabalhadores seguem esse caminho porque não há o menor sentido em ir lá do outro lado para, depois, dar uma volta e se sujeitar a ainda mais conflitos. Então, eles vão pela contramão... Eu fazia esse caminho. Eu morava em Águas Claras e fazia esse trajeto todo dia, também tendo que ir na contramão, por falta de opção. Não é que ciclista seja infrator. Enfim, a gente tem que repensar essa visão também. Parece que as pessoas não são vistas no dia a dia.
Ali, novamente a nossa Linha Verde, com os pedestres no barrão, a nossa W3 aí também... Enfim, não é só em Brasília. Mais uma vez a Linha Verde... Em Belém também, a mesma coisa... Enfim, isso aí acontece no País inteiro. Ali, São Paulo, na 23 de Maio, também um ciclista em meio ao caos.
Portanto, do ponto de vista governamental, realmente a gente ainda é invisível e, muitas vezes, expressamente proibido, tolhido de circular. Inclusive, alguém comentou - eu não me lembro de quem foi, acho que foi um dos Senadores - sobre a ponte Estaiada. Ela está ali, com a sua placa bem convidativa às pedaladas e caminhadas. E isso acontece em várias cidades. Eu quis buscar justamente exemplos pelo País para não parecer que é uma coisa localizada.
Aí, pode-se pensar: "para não tornar essas pessoas invisíveis, vamos investir em infraestrutura, um componente importante".
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O que temos aqui em Brasília, que foi considerada a capital das ciclovias, são algumas imagens da nossa infraestrutura. É interessante resgatar a colaboração de alguns internautas, que colocaram a questão de falta de continuidade. É bem interessante. Inclusive, pintaram uma interrogação: "E agora? Para onde vai? É teletransporte?" Então, alguém ali, revoltado com a condição... É uma ciclovia que acaba de repente, num bairro nobre, o Sudoeste, que poderia trazer pessoas do automóvel para a bicicleta, mas que, realmente, não oferece condições mínimas de conforto e de segurança.
Ali também, o pai com o filho, a ciclovia termina de repente... Lama... Realmente, a infraestrutura não é de qualidade. Não bastassem as imperfeições, os nossos motoristas que não têm uma formação cidadã estão bloqueando ali, sem cerimônia. Então, que tipo de incentivo a gente quer dar às pessoas para trocar o carro pela bicicleta? Basta construir ciclovia?
Esse é o meu trajeto diário, na Asa Norte, na altura da sete, oito. Todo dia a mesma coisa. As pessoas indignadas colocam isso que chamo de multas-cidadãs: "não estacione na ciclovia", "perdoe-me"... Enfim, elas tentam sensibilizar. Por falta de ação do Poder Público para ir lá fiscalizar, multar e guinchar, isso acontece todo dia, as pessoas tentam sensibilizar na base da multa-cidadã. Na ausência do Estado para fiscalizar, essa é a atitude. Só para reforçar, acho que é bem emblemático, não só no Distrito Federal, mas em nível nacional, essa autointitulada Linha Verde. As pessoas também ali grafitaram justamente pedindo. Não é por falta de demanda que as melhorias não vêm, as pessoas estão se expressando. As mobilizações, desde junho de 2013, mostram isso, pois um dos lemas é o transporte.
Só para ilustrar, apesar de todos os problemas ilustrados, Brasília tentou emplacar essa coisa de ser referência nacional e internacional em ciclovias. Que referência é essa? Basta construir 200, 300km de ciclovia e é referência?
Para sintetizar, além de infraestrutura, a gente precisa muito mais de educação, fiscalização. Já se falou também em incentivar ao uso de bicicleta ou ao transporte a pé e, juntamente, desestimular o uso do automóvel. Com a soma desses fatores, a gente vai ter cidades para as pessoas, como, na Europa, Amsterdã, Copenhague, que são boas referências de mobilidade, onde as pessoas usam, sim, bicicleta. Existe uma infraestrutura adequada, é caro estacionar nas áreas centrais. Então, vários fatores implicam uma cultura dessas. A gente viaja para fora e fica encantado, mas volta para cá e parece que tem que, necessariamente, voltar à vida enclausurada do automóvel.
Aqui são algumas manchetes, na França, incentivando diretamente a pessoa a usar bicicleta, e ela é remunerada por isso. Na área central de Paris, eles querem banir o automóvel. A Profª Maria Rosa trouxe esses exemplos das cidades europeias que combatem a dependência do automóvel. Aqui, nossos projetos ainda vão na contramão. Duas manchetes para contrapor: uma de estacionamento subterrâneo na Esplanada - quer dizer, você quer trazer ainda mais carros para a área central -, ideia que, felizmente, não emplacou, mas deve estar lá na gaveta esse projeto perigoso, que vai na contramão, e a questão da isenção do IPI, de que já se falou também, essa coisa danosa de abrir mão de recursos em favor de um segmento, da indústria automotiva, do lobby automotivo, cujos empregos poderiam ser gerados em outras áreas, como bem falou o Carlos Penna, como na questão do setor metroviário. Quer dizer, as pessoas não vão ficar desempregadas, é só você reordenar de forma a ter uma mobilidade saudável, uma indústria da mobilidade saudável.
Para dar um painel mais específico da questão da bicicleta, ainda há essa questão muito arraigada de que é meio de transporte das populações de baixa renda, o que é um fato, mas é uma realidade. A gente tem, em várias cidades, essa cultura, que, infelizmente, parece invisível, mas, se você notar bem, há muitas cidades, como Recife, Belém, São Paulo, grandes capitais que estão inundadas de bicicletas. Em Belém, na Avenida Principal, chega a ter congestionamento de ciclistas, que usam a bicicleta para diversos fins, seja para levar a criançada para a escola, seja para levar carga. Isso aí é um painel bonito da mobilidade que a gente tem que, realmente, incentivar.
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Transporte de carga... Só para ilustrar bem. E existe uma demanda reprimida, justamente pelo fato de o Poder Público não estar atento, ainda. Então, as pessoas estão usando bicicleta mas não há lugar, por exemplo, para estacionar. Uma coisa simples.
Então, ali no terminal de ônibus, por exemplo, de Florianópolis, a pessoa vai fazer a integração com o ônibus e tem que largar a bicicleta ali, de qualquer jeito, do lado de fora.
Ali um supermercado em São Mateus, interior do Espírito Santo. Também bicicletas aos montes, estacionadas de qualquer forma. Inclusive, esse lugar tem bicicletário, mas está abarrotado e as pessoas têm que parar fora.
Aí uma cena interessante, uma árvore que dá ótimos frutos, árvore de bicicletas em Belém. Isso aí é uma obra em construção e os operários todos indo para lá de bicicleta, e tendo que parar de qualquer forma. Tem o lado bom, que é o de que as pessoas estão usando, mas tem o lado ruim, que é a demanda reprimida. Quer dizer, não há lugar para você realmente deixar a bicicleta.
Só para registrar, também, a questão do transporte coletivo, que é muito ruim. Quer dizer, a gente vê a bicicleta como algo integrado. O transporte coletivo tem que estar, e, infelizmente, o transporte coletivo é superprecário e também precisa ser melhorado.
Questão do pedestrianismo, que também é negligenciado. Então, há vários locais... Aqui, em Brasília, a Capital Federal, você tem uma situação inadmissível de carros invadindo calçadas, calçadas destruídas ou, muitas vezes, nem há calçada. Então, você tem essas situações na Capital do País, situação vexatória, pior ainda para os cadeirantes, que têm necessidades ainda maiores. Muitas vezes você tem rampas bloqueadas, você tem cadeirantes que precisam andar pela rua porque não tem espaço adequado. Então, aí em outros locais, aí também, em Belém, no Espírito Santo, em vários outros locais essa é a situação que você encontra: cadeirantes andando no meio da rua.
Bom, aqui só para elencar algumas questões aí, realmente para levar a bicicleta, mobilidade saudável a sério, você tem vários pontos aí: não só a infraestrutura, mas um contexto urbano mais saudável. A questão de campanhas educativas é bastante importante. Até alguém falou a questão de ser algo positivo. A campanha tem que ser positiva. E eu não coloquei aqui na apresentação, mas achei interessante. O DF investe muito pouco - eu vou mostrar mais a frente - em educação no trânsito. E uma das poucas que eu vi nos últimos anos, do ano passado, coloca lá uma propaganda relacionada à distração no trânsito e coloca a foto de um ciclista estatelado lá, no chão. Quer dizer: isso é você ressaltar a bicicleta? Quer dizer, nas poucas campanhas, nos poucos anúncios que você vê no jornal o que se vê é o ciclista morto, esquartejado, associando-o à distração. Quer dizer, há que se rever esses pontos.
Então, eu vou passar rapidamente essa parte. São só alguns tópicos, realmente, para se ter em mente.
A questão do policiamento, que pode ser feito de bicicleta, algo que é superpositivo e tem em várias cidades, inclusive aqui do Brasil, mas aqui em Brasília ainda é incipiente.
A questão do transporte de passageiros, que é bem avançado lá fora. Quer dizer, você tem cartões postais da Alemanha, da França, tem o bicitáxi circulando, algo superpositivo que a gente também mal vê aqui no País.
Algo fundamental, de que também se falou, é a velocidade, que é absurda. A gente estava falando de um limite teórico de 80, mas a gente sabe que, na prática, fora do alcance do radar, ela chega a 120, 150. Enfim, a gente sabe que a redução na velocidade traz mais pessoas para a rua, convida mais a pessoa caminhar, a pedalar.
E há a questão, também, dos acidentes de trânsito. Como o nosso colega do Sarah colocou muito bem, é muito importante você prevenir, você reduzir esse limite de velocidade para, realmente, evitar politraumatismos. Enfim, a gente precisa repensar isso. Fala-se muito em ciclovia e infraestrutura, mas se fala pouco em algo básico, que é esse limite absurdo de velocidade que a gente tem nas vias.
Aí, só para ilustrar como é positiva essa redução de velocidade. Reduzem-se drasticamente as mortes e as lesões pela diminuição da velocidade.
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Isso serve para ilustrar as manchetes. Uma coisa que a gente vivencia é essa violência no trânsito. É algo que precisa ser sempre colocado.
Aqui, no Distrito Federal, só para mostrar alguns dados, de 2001 a 2010, aplicou-se muito, quase R$800 milhões, em obras de duplicação, mas, no mesmo período, o investimento no metrô foi quatro vezes inferior.
Eu tinha falado da educação no trânsito. Entre 2012 e 2014, o Detran arrecadou R$356 milhões em multas e destinou apenas 3,5% a campanhas de educação no trânsito. E esse baixíssimo percentual ainda é mal aplicado, como ilustrei, em campanhas que não são positivas, que colocam o ciclista como algo negativo, sujeito à morte.
Então, a gente precisa realmente repensar sobre isso. É preciso que haja uma mudança cultural, não só uma mudança de infraestrutura. É preciso passar da cultura motorizada. Atualmente, muitas de nossas crianças não pedalam mais e já vão para o seu carrinho motorizado, para a sua moto. Então, a gente precisa repensar essa atitude. É uma questão que envolve várias áreas, não só a de mobilidade e a de meio ambiente, mas também a de saúde.
É legal também a cultura europeia da bicicleta, que muitas pessoas conhece. E também temos a nossa cultura, mas temos de ser criativos. Não temos aquelas bicicletas com caixas, mas adaptamos as nossas caixas. Então, crianças em caixas também estão sendo levadas para a escola, para a diversão, mas não são vistas. Acho que é importante falar, nesta Comissão de Direitos Humanos, que há crianças, mães e trabalhadores que precisam ser ressaltados, que precisam de segurança.
Falas-se muito da bicicleta como transporte individual, mas há famílias sendo transportadas todo dia, e elas precisam de atenção. Será que ela serve só como transporte individual? Eu me nego, realmente, vendo essas imagens, a considerar a bicicleta como mero transporte individual.
Há alguns exemplos de pessoas que abandonaram o carro e que usam a bicicleta no dia a dia, felizmente. Cada vez mais, temos de ter isso como exemplo e temos de incentivar isso ainda mais.
Para resumir, aí estão os vários benefícios do uso da bicicleta, sejam relativos à saúde, sejam relativos ao meio ambiente.
Há a questão democrática, que acho bem interessante. Então, para um ambiente acolhedor, você traz pessoas com mobilidade reduzida. Dizem: "Ah, a ciclovia é só para ciclista." Não! As pessoas vão usá-las, como as pessoas com cadeira de rodas que antes ficavam presas em casa. Então, você dá a possibilidade de as pessoas realmente vivenciarem a cidade.
(Soa a campainha.)
O SR. UIRÁ LOURENÇO - Acho que essa é a mensagem.
Os nossos agentes ambientais são pouco vistos também. Há pessoas que carregam latinhas, que fazem a coleta seletiva com o auxílio de bicicleta. Quer dizer, não só há a questão de não emitir poluentes, mas também a de fazer a coleta seletiva. Há vários exemplos que, às vezes, também passam despercebidos.
Há uma campanha sobre antissedentarismo. Muitas pessoas falam de desculpas. No vídeo do Pateta, dá para ver isso também. As pessoas falaram aqui da questão psicológica. Lembrei do professor de Psicologia. Dizem: "Ah, não tenho preparo nem idade". A bicicleta é democrática. Se for preciso carregar peso, dizem: "Ah, vou de carro." Sempre se dá um jeito. Enfim, essas são algumas desculpas que tento contrapor, só para refletirmos.
Por fim, quero só deixar alguns tópicos.
O foco da mobilidade tem de ser a segurança no trânsito.
Há a necessidade de integração de políticas. Infelizmente, vivemos num contexto, numa estrutura governamental formada sempre por caixinhas: Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Saúde. Precisamos integrar estas políticas: saúde, educação, turismo, economia.
Precisamos aplicar as leis. Como mostrei, temos um marco legal até interessante, mas é preciso pôr isso em prática.
É preciso haver coerência no planejamento, com conexões entre as ciclovias. O caminho do ciclista precisa ter qualidade. Queixaram aqui algumas pessoas que se manifestaram pela internet, dizendo: "Ah, foram pavimentar as ruas e destruíram as ciclovias. Fizeram a ciclovia, mas ela não tem continuidade." Precisamos de qualidade.
É preciso haver mudanças culturais. Temos de pensar em medidas de curto, médio e longo prazos.
Já estourei meu tempo. É isso aí. Agradeço a oportunidade.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem!
Meus cumprimentos ao Uirá Lourenço, que coordena este movimento de mobilização e que apresentou um belo trabalho. Com certeza, todos aqueles que nos estão assistindo aprenderam um pouco mais sobre a importância da mobilidade urbana.
Com a palavra, Paulo Henrique da Silva Santarem, representante do Movimento Passe Livre.
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O SR. PAULO HENRIQUE DA SILVA SANTAREM - Boa tarde a todos e a todas.
Acho que, como muita gente já falou nesta manhã, como muitas questões sobre esse tema já foram colocadas, vou tentar restringir minha fala. Talvez eu não fale pelos dez minutos a que tenho direito. Talvez eu não ocupe a totalidade desse período. Vou tentar realizar uma fala, então, mais pragmática, todavia centrada em três pontos.
Antes de tudo, eu queria apresentar o posicionamento do Movimento Passe Livre a esta Casa: posicionamento contrário à redução da maioridade penal; posicionamento contrário ao encarceramento da população jovem e negra, das crianças negras brasileiras; posicionamento contrário a essa medida reacionária e conservadora que tem sido encabeçada pelos piores setores da sociedade brasileira e que está chegando, hoje, à votação no Congresso Nacional, em uma das comissões, medida contra a qual lutaremos com todas as nossas forças e contra a qual lutaremos também caso ela se apresente aqui. Esperamos a colaboração da Comissão de Direitos Humanos para que não se realize esse retrocesso brutal e genocida com relação à população negra brasileira. (Palmas.)
Para além disso, seguindo nesse esteio, eu gostaria de recordar algumas coisas sobre a configuração socioeconômica da população vitimada por mortes no trânsito. A população mais vitimada por atropelamento é a que está de bicicleta.
Dados específicos da Codeplan, que se reproduzem no Brasil inteiro, dão maior vulnerabilidade a mortes por causas externas. A maior vulnerabilidade a mortes por causas externas por acidentes de trânsito está concentrada na juventude negra brasileira, essa juventude negra brasileira que, por diferentes motivos e fatores, é acometida por mortes no trânsito, seja na direção do automóvel, seja por atropelamento, seja por atropelamento de bicicleta. Então, é relevante, em alguma medida, nós compreendermos quem é esse público das mortes no trânsito. Quem são essas 50 mil pessoas que morrem anualmente no Brasil por morte no trânsito com as quais estamos lidando? É uma população negra, é uma população periférica, majoritariamente. Aí, nós temos que pensar isso e vincular políticas destinadas a esse setor. Este é o primeiro ponto, tentando dimensionar racialmente esse conflito.
Uma segunda questão - isto já foi dito aqui, está tácito, quero só tencionar em uma dimensão este ponto - é que as mortes no trânsito são, principalmente, oriundas da política de transporte individual motorizado, da política rodoviarista, da política de dar a todo mundo um carro, da ideologia de que todo mundo deveria ter um carro para poder andar pelas vias quando quiser, da forma que quiser, como se o carro possibilitasse isso.
Esse tipo de política - queria colocar alguns questionamentos - tem estruturado a economia brasileira pelo menos nos últimos 60 anos, essa política rodoviarista de vincular a economia brasileira à indústria automobilística, de vincular a economia brasileira ao lobby do petróleo, aos gasolinômetros, de vincular a economia brasileira a uma necessária estrutura de consumo, de precisar baixar o IPVA, essas coisas, para as pessoas poderem consumir mais carros e, assim, fazer circular a economia nacional.
A economia brasileira está vinculada a uma máquina de assassinato, a um processo de assassinatos e a um processo de mortes, a uma máquina de guerra, não uma máquina de guerra como os teóricos apresentam, mas como uma máquina de morte, de matar pessoas, de moer gente. Isso tem assassinado a população brasileira. Então, há um problema de saúde pública grave.
O contraponto que se apresentou, no conjunto das mesas, é o da política de transporte coletivo, para que seja transformado em transporte público, e o da política de outras formas de mobilidade, como o Uirá disse, de mobilidade saudável ou de mobilidade ativa, uma mobilidade que não seja baseada no modelo rodoviarista e não seja baseada, necessariamente, no modelo motorizado.
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Trata-se de colocar nossa bandeira, o contraponto que nós colocamos nas ruas nesses dez anos de Movimento Passe Live, que é o fortalecimento do transporte coletivo, tanto com as dimensões tecnológicas e de respeito aos direitos humanos, que já foram colocadas pela Maria Rosa e pelo Carlos Penna Brescianni, como também pela política da tarifa zero. Aliás, acho que é sempre bom reapresentá-la aqui, é a nossa concepção de transporte coletivo. Achamos que o transporte coletivo tem que deixar de ser um serviço, tem que deixar de ser uma mercadoria e tem que passar a se consolidar enquanto direito e passar a ser público, e algo que é público, é incentivado, é universalizado e é de acesso a todos.
Em 2010, nós tínhamos 37 milhões de brasileiros que não podiam andar de ônibus simplesmente porque não tinham dinheiro. São essas pessoas que são assassinadas ao redor das paradas de ônibus? Não, essas são as que andam de ônibus. Esses outros 37 milhões de pessoas estão onde? Onde estão esses 37 milhões de pessoas que não podem pagar para utilizar ônibus, que não vão ter acesso ao financiamento de um carro ou de uma moto? Essas pessoas estão andando de bicicleta, essas pessoas estão andando a pé nas ruas, essas pessoas estão jogadas na marginalidade, cometendo delitos e, possivelmente, sendo jogadas nas cadeias e nas prisões brasileiras, numa tentativa de acirrar seu encarceramento e, voltando ao tema, ao seu genocídio.
O transporte está vinculado a um tipo de política que é responsável por grande parte das mazelas que vivemos neste País. A política de transporte leva a economia brasileira a um tipo de progresso consumista, a um tipo de progresso que desestrutura, a um tipo de progresso que ataca o meio ambiente e que desestrutura uma série de relações sociais, é um tipo de política que gera segregação necessariamente, gera violência, necessariamente, e, necessariamente, gera morte.
Então, a nossa proposta de política de tarifa zero e de universalização no serviço é justamente pensando na dimensão ambiental, na dimensão da qualidade, na dimensão social, na dimensão do desenvolvimento da vida humana e no desenvolvimento nacional e internacional, no desenvolvimento dos povos e não no desenvolvimento do capital. Não vou entrar em pormenores da política aqui, mas só apresentar como ela se vincula ao tema específico que estamos colocando.
Por fim, sei que não se trata propriamente de uma hipocrisia, mas é curioso estar debatendo aqui mortes no trânsito quando esta Casa tem se calado sobre um tema essencial à política de trânsito pelo menos desde dezembro de 2013. No dia 3 ou dia 4 de dezembro de 2013 foi aprovada, no Congresso, a chamada PEC nº 90, que instituiu o transporte como direito social. Essa proposta de emenda constitucional acrescenta o transporte aos outros 11 direitos sociais que estão previstos na Constituição, a saber: educação, saúde, trabalho, alimentação e uma série de outros. Incluiria o transporte nele, como uma resposta imediata às mobilizações de junho de 2013. Mais que a resposta às mobilizações de junho, é uma compreensão do papel do transporte nas cidades brasileiras, na nossa sociedade. Ela chega aqui no dia 11 de dezembro de 2013, ela é entregue a esta Casa. Eu estava aqui olhando o celular para obter essas datas claramente. Ela é discutida na CCJ entre o dia 20 de janeiro e o dia 24 de abril de 2014, ela é discutida e seus pareceres são lidos na CCJ. A partir do dia 28 de abril de 2014, ela está na mesa do Presidente desta Casa esperando inclusão na pauta da Ordem do Dia. Mas não foi a discussão até o momento. Então, esta Casa, se quer discutir a política de transporte coletivo, tem que colocar em votação a Proposta de Emenda Á Constituição nº 74, que está aqui, que transforma o transporte num direito essencial.
Aí, a sugestão que queremos colocar aqui, enquanto Movimento Passe Livre, é que, desta reunião da CDH, tanto as entidades como, principalmente, os Parlamentares aqui presentes encaminhem ofício ao Presidente da Casa para que essa pauta seja colocada em votação.
É isto: Renan Calheiros, ponha a PEC nº 74 em votação! Largue de se calar sobre o nosso direito de transporte! (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Paulo Henrique da Silva Santarem, representando o Movimento Passe Livre.
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Eu, de pronto, sem certeza de que esta é a posição do Plenário, vou atender sua solicitação. Vamos fazer um requerimento, baseado nesta audiência pública, em que a Comissão de Direitos Humanos, todos os Senadores presentes e os painelistas pedem a aprovação da PEC nº 74.
Se todos que estão aqui concordam com essa proposta, embora seja mais fácil dizer que fiquem como estão, peço que se manifestem. (Palmas.)
Então, vou encaminhar o seu pedido ao Presidente Renan, até porque concordo, na íntegra, com ele. É uma PEC amplamente discutida, aprovada na Câmara, aprovada aqui na CCJ, e tem tudo para ser votada no plenário. Tenho quase certeza de que o pedido será aceito. Tenho quase certeza de que o pedido que faremos será aceito e de que a matéria irá à votação.
O último painelista é o nosso querido convidado Nazareno Affonso, coordenador do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos (MDT-ANTP).
Repito: fiz questão de convidá-lo porque ele foi a primeira pessoa que ouvi falar em mobilidade urbana, no Rio Grande do Sul. A partir daí, passei a ter mais cuidado com o tema.
O SR. NAZARENO AFFONSO - Senador, muito obrigado pela oportunidade. Tenho acompanhado esta Comissão. V. Exª tem me chamado várias vezes. Tomei ciência de última hora, pelo pessoal do Rodas da Paz, mas eu não poderia deixar de estar aqui acompanhando este trabalho.
Eu queria dizer ao nosso Secretário que estamos esperançosos com ele. Depois de um tenebroso inverno, temos um secretário formado na área. Isso facilita muito o trabalho desenvolvido no Conselho das Cidades, onde existe um comitê de mobilidade bem estruturado e que foi responsável, logo depois das manifestações, a pedido de três ministros da Presidente Dilma, de elaborar o Pacto Nacional pela Mobilidade Urbana. Nesse pacto, nós praticamente chegamos a 180 propostas. A sua elaboração contou com a participação do pessoal do Movimento Passe Livre e de vários convidados, além dos conselheiros do Conselho das Cidades. E, dessas 180 propostas, nós chegamos a uma resolução. Há uma parte com propostas claras de como baratear a tarifa, de como garantir recursos, a questão da acessibilidade está presente e está presente uma questão abordada eu acho que até pelo Senador, sobre a capacidade de gerenciar dos Municípios. Eles não têm capacidade nem de planejar nem de projetar e de implantar; e, na outra ponta, como eles vão gerenciar. Então, nós estamos com R$143 bilhões para aplicar em sistemas estruturais, tanto em sistemas metroferroviários, que são responsáveis por 66% desses recursos, como em sistemas rodoviários de média e alta capacidade, e temos esperança de que isso venha a acontecer.
Esse pacto foi esquecido pelo Governo. A todo momento nós o estamos questionando. Foi aprovado no Conselho das Cidades em outubro de 2013 e só foi publicado no Diário Oficial em julho de 2014, algo parecido com a questão da PEC, que também defendemos, faz parte desse pacto a defesa da PEC.
Então, eu queria apenas deixar isso e depois encaminhar para a Comissão, para vocês terem conhecimento e nós vermos como podemos fazer uma mobilização.
Dentro do Conselho das Cidades, foi formado um GT só para tratar disso, e nós vamos ter o apoio aqui da Semob para detalhar essa proposta, ver a factibilidade e tudo mais. Temos outro grupo de trabalho, no âmbito da SRI (Secretaria de Relações Institucionais), que começou, deu o prazo de novembro, mas também não encaminhou. Então, é um tema que nós gostaríamos de colocar em pauta.
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Então, é um tema que nós gostaríamos de pôr em pauta.
Outro ponto que nós estamos colocando lá no comitê de mobilidade é exatamente o tema da violência no trânsito. Nós vamos ter este ano um desafio para o País, porque vamos ter o encontro de ministros para fazermos o balanço da década. Infelizmente, apesar dos esforços da Polícia Rodoviária Federal, os nossos números em mortes têm aumentado. Há uma colocação em que parece que, em 2013, houve uma estabilização, mas não temos certeza ainda desses números. Mas o que tem acontecido é que nós assinamos isso e, nesse período, nós aumentamos em mais de 10% o número de mortes em vez de reduzir os 50% que foram assumidos nos dez anos, pela década, de redução de acidentes.
A nossa esperança - e lutamos por isso há muito tempo - é de que isso venha a acontecer. E o nosso posicionamento é muito claro: educação é fundamental. Nós temos que ir para escolas e temos de educar o motorista. Porém, a violência no trânsito existe pela ausência do Poder Público. Vimos, por esse trabalho aqui da Polícia Rodoviária Federal, que basta um início de presença do Poder Público para uma mudança radical. Se nós formos ver, 3% da frota é fiscalizada. Eu acho que há um projeto na Câmara - não sei se morreu nesse processo todo - em que deveriam ser fiscalizados pelo menos 30% da frota. Então, o que vamos ver?
Nós temos dois eixos fundamentais de violência no trânsito: a velocidade e o álcool - o álcool principalmente. Falam de outras drogas, mas é o álcool o principal. As outras drogas atingem mais o transporte de caminhões, que também é outro problema que nós temos de enfrentar. Nós sentimos as dificuldades recentemente.
E a esperança que nós temos, aqueles que lutam há muito tempo, é de que, de fato, o Governo se unifique. E, neste particular, há uma outra iniciativa, que é o Comitê de Mobilização pela Saúde e Paz no Trânsito, do qual eu participei, que elaborou uma outra carta, tipo esse pacto da mobilidade, em que estão todas as propostas detalhadas - detalhadas, Senador! Totalmente detalhadas, para atuar na questão transporte público, desde o desenho das ruas até toda a parte de fiscalização, de gestão; está tudo lá detalhado.
Nós tivemos uma notícia boa, no final do governo passado, quando houve uma resolução do Contran que retomou a política nacional de trânsito e fez um resumo praticamente do que foi desenvolvido. Mas colocou que nós entramos agora numa fase de elaboração do Programa Nacional de Trânsito.
A ideia desse Programa Nacional de Trânsito é pegar o material desse comitê, que, aliás, foi congelado pelo governo já faz mais de um ano... Quer dizer, era o único espaço no Sistema Nacional de Trânsito que não era tutelado, como participação. Em todos os outros, o diretor do Denatran escolhe quem vai ser o membro de cada câmara temática; nesse, não. Nesse, são representações da sociedade, haja vista nós chegarmos a um resultado que foi reconhecido pelo próprio Denatran para se chegar a isso.
A nossa esperança é de que esse Comitê seja reativado e que, ao ser reativado, nós possamos retomar essas propostas todas. É aquela sensação: a sociedade se reúne, elabora, propõe, dá as soluções. Nós estamos vendo nessas mesas apresentadas - o Uirá colocou várias coisas e vários dos palestrantes também colocaram - que nós temos soluções; não temos de inventar a roda, está tudo dado. O que precisamos nesse processo todo é de reconhecer que algumas coisas não dão certo: o automóvel não é o meio de mobilidade para todos, ele é um meio que deve ser integrado ao sistema, à mobilidade sustentável toda, e não apartado. Diz-se: "O automóvel é aquele bicho ruim e tal". Não! Mas, ao mesmo tempo, têm que ser reduzidos os privilégios dele.
O que acontece hoje? Ele ocupa mais de 80% do sistema viário. No transporte público, estamos vendo as dificuldades de se fazer uma faixa exclusiva de ônibus. Até 2011, nós tínhamos, no Brasil, 410km de faixas prioritárias. Juntando Curitiba, Porto Alegre, juntando tudo, não as faixas de São Paulo, nós tínhamos 410km. São Paulo, numa tacada só, fez 380km de faixas exclusivas, em um ano e pouco. Quer dizer, é possível. E aí, no MDT, do qual sou coordenador nacional, está defendendo que esse número aqui seja de 10 mil quilômetros de faixas exclusivas no Brasil. Para isso, tenho defendido - e o pessoal da área de trânsito não gosta dessa proposta - que seja proibido, em qualquer via em que circule transporte público, estacionamento de carro. Estaríamos facilitando para as prefeituras todo embate com comerciante, tudo que hoje segura para que a gente não tenha as faixas exclusivas.
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A outra é que temos de acabar... Infelizmente, há dois palestrantes com os quais, toda vez que eu venho aqui, tenho uma desavença. Eu sou metroviário de formação. Aposentei-me pelo Metrô de São Paulo e o conheço profundamente. Estive no seu nascedouro, em 1971. Entrei como estagiário. Não tenho dúvida de que eu gosto do metrô. Mas acho que não podemos trazer, em lugar nenhum, um confronto de modais e toda hora vermos colocarem o ônibus como um sistema de terceira ou quarta categoria, só como alimentador de um sistema que sabemos que tem seu tempo de implantação muito longo. São Paulo está fazendo um esforço gigantesco para fazer 72km de metrô. Sabe para quando, Senador? Conforme falado pelo Governo, esse sistema estará à disposição da população em 2020, Não estará pronto antes disso. Não porque nós não saibamos fazer projeto, não saibamos implantar, mas porque nós temos, não só no caso do metrô, mas também no caso dos BRTs, um problema de entraves: nós temos o Ministério Público, nós temos todas as questões ambientais... Você pode fazer uma rodovia urbana em qualquer lugar e você não tem impedimento, mas você vai fazer metrô e o cara diz que faz muito barulho, enquanto três ou quatro caminhões passando fazem muito mais barulho do que isso aí. É nisso - nós estamos trabalhando no MDT, juntando todo mundo - que nós precisamos trabalhar, trazendo o Ministério Público para junto, trazendo o Tribunal de Contas para junto, trazendo todo mundo, porque não podemos ter um sistema desses com tamanho impedimento. São dez anos! O Secretário de Transportes Metropolitanos disse: "Entre estar com o projeto pronto...
(Soa a campainha.)
O SR. NAZARENO AFFONSO - ... e a implantação, nós temos dez anos para uma linha de metrô estar implantada." É um absurdo! Um absurdo! Estamos lutando contra isso.
Por outro lado, temos sistemas... Desculpem-me, mas conheci Bogotá e não vi nenhuma cena como a que ele apresentou aqui. Eu visitei. Aqui estamos com a Diretora Luísa, nós visitamos juntos. É outra coisa! É um sistema que atende... Há gargalo. Mesma coisa se a gente for hoje visitar, infelizmente, a Estação Sé do metrô. Você precisa ter capacidade de se mover lá dentro. Fui à Estação Anhangabaú e tive de esperar seis carros para conseguir entrar na estação de metrô. O que acontece? Quando o sistema estoura, vamos ter de buscar outro. O que está acontecendo em Bogotá? Em algumas áreas o governo já estudando o sistema metroferroviário. O que não podemos é imaginar em Brasília, com essa quantidade de área pública disponível, a gente não usar um sistema com o nível... Os corredores, aqui, em Brasília, até chegarem à capacidade do metrô, ainda vão muito longe. O metrô daqui é ridículo: 42km para carregar 160. Mas isso por quê? Porque ele foi todo mal projetado. A gente, na época... Eu era criticado no governo Cristovam porque eu exatamente questionava o metrô. O pessoal dizia: "Você é contra metrô?" Eu dizia: "Sou o único metroviário do Governo. Eu só quero que o metrô vire algo que a população use." E foi uma briga com as empreiteiras na época porque eles queriam fazer, antes, as estações aqui, no Plano Piloto, que eram estações... Para se ter ideia, essas estações que estão fechadas, que vão voltar a colocar, elas carregavam... A quantidade de gente que entra é equivalente a duas linhas de ônibus. E custavam não sei quantos milhões. Eu acho que eram US$10 milhões. Era uma coisa assim monstruosa. Por isso elas foram fechadas por esse tempo todo. Não havia demanda dentro dela. Por quê? Colocaram dentro de um vazio, quando ele deveria estar passando na W3. Ele deveria ter chegado lá em Taguatinga, entrado na comercial e depois na comercial lá de Ceilândia, mas, por interesses de empreiteiras, eles foram para lugares mais simples. Era muito mais fácil passar no Eixão, era muito mais fácil passar por fora de onde existia o comércio.
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Então, o que nós estamos defendendo agora? Nós temos, sim, de cuidar dos sistemas convencionais de transporte. Nós estamos defendendo isso. Nós temos o sistema da CBTU, Senador, que tem coisas vergonhosas, trens que passam a cada duas ou três horas. Quer dizer, são coisas assustadoras que nós temos no sistema da CBTU. Então, nós achamos que temos de cuidar disso. Temos de cuidar do sistema convencional, que é fazer essas faixas exclusivas e generalizar pelo País, para que isso se multiplique enormemente. A gente já tem dados de São Paulo que mostram ganho de tempo de viagem de mais de 40 minutos por dia com esses sistemas. E nós temos que pôr na cabeça, definitivamente, que a questão do automóvel não é... O discurso que eu mais ouço: vamos criar condições para que o cara deixe o carro em casa e pegue o transporte público. É o discurso que o MDT faz, que a gente faz na ANTT, em todos os lugares. E não é isso. Vamos tirar privilégio do automóvel. Se, no dia em que ele pegar o carrinho dele, quando tiver que se deslocar, ele perceber que consegue chegar 20 ou 30 minutos mais rápido de transporte público, e, quando chegar à ponta, deixar de ter a via urbana subsidiada pela sociedade e tiver de pagar R$1.000,00 de estacionamento por mês, aí eu quero saber se o cara não começa a deixar o seu carro em casa, mesmo se o transporte público não estiver bom como a gente tem por ônibus, como a gente tem hoje no sistema metroferroviário de São Paulo, que não tem hoje a qualidade que tinha de quando nós o implantamos.
Então, Senador, nós estamos defendendo que parte desses recursos, dos 143 bi, se volte para quê? Mudar a tecnologia do ônibus, como foi colocado pelo Penna. Isso é urgente. Nós temos que parar de ter caminhão encarroçado para ter ônibus. Nós temos uma das melhores fábricas de ônibus do mundo. É só fazer isso...
(Soa a campainha)
O SR. NAZARENO AFFONSO - Concluindo.
E outra coisa: nós temos abrigos em todos os lugares, nós temos uma política de pavimentação de corredores por onde circulam ônibus. Quer dizer, dar qualidade ao sistema convencional, tanto o metroferroviário, no caso da CBTU, quanto o de transporte público.
Então, é isto, meu caro Senador. Parabéns pela iniciativa! Eu acho esta Comissão de Direitos Humanos algo fantástico.
Para fechar, eu só queria pegar uma última frase, do nosso amigo Rolim, de Porto Alegre...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Grande Rolim!
O SR. NAZARENO AFFONSO - ..., que está agora no Tribunal de Contas. Acho que ele está no Tribunal de Contas. Não sei. Ele saiu do...
Eu conversei muito com o Rolim, dizendo que nós temos que transformar essa questão da violência no trânsito numa questão fundamentalmente de direitos humanos. E ele não consegue incluir. A gente discute várias facetas, mas a violência no trânsito, as mortes no trânsito... É o maior desastre de políticas públicas que nós temos. Não existe outro. Nenhum desses acidentes, não há nada parecido com a política pública dizimando seres humanos.
Então, é isto.
Parabéns para o senhor!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem!
Vamos acatar a sua sugestão de que a violência no trânsito seja uma questão de direitos humanos. Vamos trabalhar com essa questão.
Você está se referindo ao Rolim que foi Deputado Federal.,,
O SR. NAZARENO AFFONSO - (Fora do microfone.) Isso, nosso amigo lá do Rio Grande.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Militante histórico pelos direitos humanos.
O SR. NAZARENO AFFONSO - Isso. Eu sei.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Sempre caminhei ao lado dele. Ele é um intelectual preparadíssimo. Eu gosto muito dele. Para mim, uma das referências da vida pública é o Rolim.
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O SR. NAZARENO AFFONSO - Para mim também.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Como você também é.
Este foi o Nazareno Affonso, coordenador do Movimento Nacional pelo Direito ao Transporte Público de Qualidade para Todos, MDT-ANTP, e ex-Secretário de Transportes do DF.
Senador José Medeiros, para suas considerações finais.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - É rápido. Eu creio que avançou bastante o debate. O Paulo até se mostrou inquieto, e eu entendo essa inquietação, porque a Casa é multifacetada mesmo. Então, você veja que às vezes não são só conflitantes as propostas, mas não se consegue entender mesmo. Mas o debate político é justamente colocar as coisas em crise, para fazer acontecer.
Eu vejo que o Prof. Nazareno colocou aqui bem que soluções já temos, de sobra até, agora falta integrar todo esse conhecimento, todos esses ingredientes, para que a receita dê um prato bom.
Eu continuo batendo na tecla sobre a questão dos Municípios. E aí eu acho que é um desafio para o Dr. Dario, que vai ter que ter...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Ele vai falar em nome dos painelistas no encerramento.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Ah, sim!Porque justamente...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Permita-me só fazer um esclarecimento a todos. Eu gostaria que todos falassem, mas o nosso problema é sermos obrigados a encerrar às 14h. Então, como o Dr. Dario está na Mesa, ele faz uma consideração final, e nós vamos encerrar.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Correto. E nesse meio, ainda tivemos que sair para a posse.
Mas, finalizando, eu creio que a saída está nos Municípios, obviamente. Não temos como fazer qualquer coisa, como avançarmos, se não conseguirmos chegar lá para fazer quase que uma conscientização dos prefeitos a darem prioridade a esse tema, para podermos avançar. Senão, vamos continuar fazendo as boas políticas aqui, tendo ilhas de excelência. Vamos continuar andando em ônibus "encarroçados", numa situação de que não vamos avançar. Vai continuar o automóvel se proliferando cada vez mais, e não vamos sair da situação em que estamos.
Então, é isso aí, Senador. Eu queria agradecer mais uma vez por essa brilhante ideia de abordarmos o tema. Espero que não seja a última e que possamos ter mais dessas.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador José Medeiros. (Palmas.)
Eu gostaria, repito, que todos pudessem falar agora, no final,mas, devido ao nosso horário, eu pediria que, rapidamente, também o Sr. Dario Rais Lopes, que é Secretário Nacional de Transporte e Mobilidade Urbana, fizesse as suas considerações, para podermos encerrar a nossa audiência, com o compromisso de voltarmos novamente a esse debate com um prazo maior.
O SR. DARIO RAIS LOPES - Boa tarde, eu queria parabenizar todos e pontuar algumas coisas muito interessantes para mim. É a primeira vez que estou nesta Casa. Vi, aqui, de uma maneira mais acalorada, um debate que há muito tempo tenho na academia.
Na academia, já existe um consenso entre todos os pesquisadores e acadêmicos puros que trabalham nessa área de transporte e mobilidade de que você tem que aproveitar todos os sistemas. A grande discussão que se tem hoje na academia é sobre os limites de validade, ou seja, os intervalos a partir dos quais você pula de um sistema para outro, de quando é que você passa do sistema sobre pneus convencionais para o sistema sobre pneus segregados e de quando você passa do sistema sobre pneus segregados para o sistema sobre trilhos. Hoje, o estado da arte da discussão acadêmica são esses indicadores.
E hoje, mais do que isso, para pegar o que já se falou por aqui, passou-se da questão da demanda e está-se discutindo muito questões de externalidade. A função utilidade deixa de ser a função utilidade individual e já está incorporando aspectos de externalidade para você definir.
Ou seja, eu vejo com muita satisfação que uma discussão que era eminentemente acadêmica foi travada, pelo menos parcialmente, aqui com tanta...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Elegância.
O SR. DARIO RAIS LOPES - ... elegância... (Risos.)
... e, mais do que elegância, com tanta vibração, com tanto envolvimento.
Há muitas coisas muito importantes nesse grande elenco de soluções. Eu gostaria de ressaltar uma só, que foi colocada pelo Uirá, que é uma discussão muito grande, também, que se tem sobre a questão das garagens subterrâneas. Isso é um tópico que eu acho que merece um capítulo especial e uma mobilização especial.
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Vou dar um exemplo para quem não teve a experiência: a mobilização que foi feita nas garagens subterrâneas de Madrid. O que aconteceu? Um enorme receio de você incentivar o uso do carro. Aí, a mobilização da sociedade fez com que você colocasse as garagens subterrâneas e, ao tirar a vaga da pessoa, alargasse a calçada. Então, o ganho do espaço urbano foi para o pedestre, não para o veículo. Então, você faz uma garagem muito cara e desincentiva. Ou seja, só vai usar quem realmente quer, e o ganho ficou para o veículo. Quem não conhece, vai só à Porta do Sol, La Puerta del Sol, e, depois, tenta pegar fotografias antigas. Então, você aumentou o passeio.
Eu acho importante que se mobilize, porque, senão, você pega um instrumento, que pode ser um instrumento bom, e ele acaba sendo de incentivo ao transporte individual.
Por fim, há uma do Senador José Medeiros. Talvez seja o maior desafio que nós tenhamos na Secretaria de Mobilidade saber como tratar a mobilidade num país tão diferente como o Brasil.
Uma primeira abordagem que nós estamos tentando fazer: as cidades que já passaram do limiar da motorização, cidades com 200 ou 250 mil habitantes, têm de ser objeto de investimento. As cidades que estão abaixo desse limiar da urbanização, acima de 20 mil, são cidades que têm de fazer plano de mobilidade. Então, isso permite que você organize, um pouco, a questão.
Para cidades menores do que 20 mil, que são muitas, nós estamos tentando estruturar, dentro da Secretaria, não um escritório de projetos, mas, pelo menos, uma equipe que dê o apoio. A que é que nós estamos orientando? Que os Municípios se juntem em consórcios para que a gente dê pelo menos um termo de referência para facilitar a contratação por parte desses Municípios.
Então, nós vamos tentar fazer com que as cidades que estão abaixo do limiar da motorização cresçam com um pouco mais de consistência e sustentabilidade e as cidades que estão acima do limiar nós vamos tratar, realmente, com investimento.
Não sei se é a melhor solução. É lógico que esse espaço é um espaço muito propício para que isso seja discutido. Se for conveniente, se for necessário, eu me coloco à disposição dos senhores para vir aqui e discutir este e outros temas.
Eu queria só agradecer a todos.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Isso é muito importante - só um parêntese -, para que as prefeituras tenham um norte, porque tem Prefeitura que vai gerenciando o trânsito assim: deu problema, coloca um quebra-mola.
O SR. DARIO RAIS LOPES - Estamos tentando. Nós não vamos resolver - vou ser bem claro -, mas eu acho que, se a gente tentar agregar um pouco de valor, isso faz com que, com o tempo, as pessoas comecem a praticar a engenharia com um pouco mais de consistência.
Mais uma vez, muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Dr. Dario Rais Lopes!
Eu iria propor agora - estou esperando uma informação, porque me parece que já estava no discurso de abertura que eu fiz - um minuto de silêncio em homenagem aos 150 mortos no acidente do voo. Peço que, se puderem, passem, como havíamos combinado, aquele videozinho na tela e que façamos um minuto de silêncio e encerramos a sessão, porque não deixa de ser morte no trânsito, pela simbologia e até porque, como aqui foi dito por todos, esse número de pessoas, 136, morre praticamente todos os dias no País.
Então, um minuto de silêncio enquanto o vídeo corre ali de forma silenciosa, em homenagem a esses passageiros que morreram no voo.
Havíamos combinado antes que esse seria o videozinho de encerramento. Ainda não começou o minuto. Esse videozinho passaria numa homenagem às 150 pessoas que morreram nesse acidente aéreo, porque, lamentavelmente, o piloto acabou dirigindo o avião para o choque nas montanhas.
Então, vamos a um minuto de silêncio.
(Faz-se um minuto de silêncio.)
R
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Feito o minuto de silêncio, que as palmas sejam energia para aqueles que morreram e para outros tantos que lutam até hoje também para que isso não volte a acontecer. (Palmas.)
Está encerrada a audiência pública.
(Iniciada às 9 horas e 2 minutos, a reunião é encerrada às 14 horas.)