23/03/2015 - 8ª - Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Declaro aberta a 8ª Reunião, Extraordinária, da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública, nos termos do Requerimento nº 23, de 2015, de autoria deste e de outros Senadores, aprovado, para debater as políticas públicas para a pessoa autista, por ocasião do Dia Mundial do Autismo, que é lembrado e festejado, para que todo o Brasil debata o tema, no dia 2 de abril.
Esta audiência pública será realizada em caráter interativo, com a possibilidade de participação popular. Por isso, as pessoas que têm interesse em participar com comentários ou perguntas podem fazê-lo por meio do portal e-Cidadania, link bit.ly/audienciainterativa, e do Alô Senado, através do nº 0800612211.
Nós vamos ter duas mesas para debater um tema como esse, a que também tenho dedicado parte do meu mandato, já que trabalho aqui com mais de mil projetos apresentados na Casa, e esse é um deles. Eu tive a alegria, por iniciativa de vocês, de ter participado da construção aqui, na Comissão de Direitos Humanos, da Lei dos Autistas.
De pronto, vamos fazer a primeira mesa.
Chamamos a Drª Tatiana Roque, enfermeira, mãe de autista e diretora do Movimento Orgulho Autista Brasil.
Seja bem-vinda. (Palmas.)
Chamamos Lívia Magalhães, Diretora Jurídica do Movimento Orgulho Autista Brasil, Moab. (Palmas.)
Chamamos Márcia Cristina Lima Pereira, chefe do Núcleo de Autismo e TGD da Secretaria de Educação. (Palmas.)
Chamamos Simone Maria L. C. M. Guimarães, representante da Diretoria de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do DF. (Palmas.)
Só para situar rapidamente, esta é a primeira mesa.
Na primeira mesa teremos a Srª Adriana Alves, Gianna Guiotti, Anna Cristina Pires de Mello e Martinha Clarete Dutra.
Parece-me que as mulheres tomaram conta das Mesas, pessoal. Já estou preocupado. (Risos.)
Daqui a pouco elas pedem para eu sair para que elas assumam a Presidência.
Sejam todas bem-vindas. É uma alegria enorme recebê-las aqui. Eu tenho o maior carinho por essa causa, que é uma causa de todos nós, de todas as pessoas de bem do Brasil e do mundo.
Eu vou fazer uma rápida introdução. Como a nossa audiência é transmitida ao vivo para todo o Brasil, eu discorrei um pouco sobre o tema, com a colaboração que recebi da assessoria, para que, em seguida, iniciarmos o nosso debate.
Sejam bem-vindos.
Meus amigos e minhas amigas, recebemos aqui, hoje, na nossa Comissão de Direitos Humanos, meninos, meninas e jovens autistas, seus familiares e militantes de todo o Brasil.
Nesta audiência, seguiremos no debate sobre as políticas voltadas às pessoas com Síndrome do Espectro Autista.
O momento deve ser da maior alegria pela chegada do Dia Mundial de Conscientização do Autismo, no próximo dia 2 de abril. Porém, somos tomados de preocupação, pois, após intensas lutas travadas e os esforços de todos nós que defendemos a causa, unidos aos movimentos de familiares de autistas nesta Comissão, chegamos à vitoria com a aprovação da Lei Berenice Piana de Piana, como eu digo. Para nossa satisfação, a aprovação da Lei nº 12.764, de 2012, com a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, nos deu confiança de que os direitos seriam garantidos.
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A presença de representantes do Governo Federal ligados ao Conselho Nacional da Pessoa com Deficiência e o reconhecimento da condição especial de autista nos trouxeram grandes esperanças. Ainda assim, faltava um passo crucial, do qual não poderíamos abrir mão: a regulamentação da lei, sem a qual não se pode dar efetividade aos direitos estabelecidos na mesma. Houve diversas reuniões, tentativas do Governo de regulamentar o processo por decreto, mas inúmeras questões de divergência com o movimento asseguraram que o debate deve continuar sem retrocessos, segundo o movimento.
Fizemos audiência, especialmente nesta Comissão, para evitar qualquer desvirtuação que fosse do objetivo principal.
Sei que o Governo e as famílias militantes querem o melhor e é só no diálogo que a gente vai construir tudo isso, mas, mesmo assim, segundo relato que recebo, em dezembro do ano passado, o Decreto nº 8.368 foi assinado pelo Governo. Ali, segundo as famílias, existem algumas falhas que eles querem continuar a discutir.
Os avanços são inegáveis, mas a inclusão limitada dos autistas ao sistema público de educação e a inclusão do tratamento pelos CAPS geraram preocupações. Nossas crianças, adolescentes e adultos, sejam com espectro autista ou síndrome de Asperger ou com outra forma de deficiência, enfrentam toda sorte de discriminação. Mas amor de mãe, amor de pai e o amor maior de Deus não têm limite. É preciso muito amor e abnegação para enfrentar as lutas diárias: sessões de fisioterapia, atenção redobrada, jornadas por cidades com pouca acessibilidade, tudo por amor e dedicação, porque a causa, de fato, é justa e bonita. E ainda enfrentar a falta de sensibilidade e preconceito em defesa desses meninos e meninas que dão um brilho especial às nossas vidas.
As graves propostas, segundo diz aqui o relato, na alínea "c", previstas no Decreto, junto ao Conselho Nacional, exigem discussão maior imediatamente. As famílias querem aprofundar o debate.
Enfim, aqui lembro um caso mais dramático, do Rio de Janeiro, que levantou a polêmica, mas também demonstrou que o CAPS tem dificuldade para dar controle à terapia de seus usuários, como terão dificuldade de atender às múltiplas necessidades de profissionais desse público. Enfim, o importante é manter o debate aceso e buscar soluções que atendam às reivindicações dos familiares.
A essas preocupações, segundo o relato que recebi, somam-se a falta do CAPS em vários Estados. Dos 5.570 Municípios, apenas cerca de 2.155 contam com o equipamento.
A Organização das Nações Unidas aponta cerca de 2 milhões de pessoas com Transtorno do Espectro Autista no Brasil. Negar a criação de centros especializados para atender tantas famílias não pode acontecer. Temos de encontrar um caminho.
Hoje, incluir os estudantes no sistema escolar trouxe preocupação, pela forma do decreto firmado em 2014. Segundo exposto no decreto, as escolas que negarem matrícula serão multadas conforme a situação e só serão punidas por decisão do MEC.
Houve uma série de equívocos na definição final. Por isso, esta audiência visa também aprofundar esse debate.
Enfim, o Dia Mundial do Autismo de 2015 não será dia de celebração depois dessas medidas, porque temos que aumentar a mobilização, o diálogo e o entendimento. Será de lutas, de união e mobilização e muita conversação para a gente poder chegar numa linha de entendimento, numa concertação que atenda à vontade principalmente das crianças e adultos e, naturalmente, dos familiares.
Termino usando as palavras da poeta e terapeuta Mazu Gonçalves: "Traço em rima esse amor de quem luta pela consciência".
Cito trechos do poema Eu, Autista, de Mazu Gonçalves.
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Criaram para mim
Um mundo paralelo
Obscuro, ilusório
Um mundo que não quero
(...)
Nem só de verbo
se comunica o ser
Não são só palavras
É o corpo a dizer
Nosso país não me cuida
Com devida atenção
Negligencia minha existência
Porém, tudo em vão
Sou alpinista
Escalando muros de preconceito
Sou o autista
Humano e possuo direitos.
(...)
Sou tantos Pedros,
Júlias e Marias
Sou dois milhões
De aflições e alegrias
Existo e peço
Que olhem mais para mim
E meu endereço
É o mesmo mundo sim!
Que os preconceitos desapareçam!
Viva a luta da família autista, do Brasil e do mundo! (Palmas.)
Esse pequeno relato que fiz foi uma construção coletiva que as assessorias das famílias autistas deram para a nossa Comissão. Fizeram esse registro para que as pessoas que estão assistindo à nossa reunião neste momento pela TV Senado, que está ao vivo para todo o Brasil, entendam a importância desta audiência pública e de tudo o que aqui será discutido.
Lembramos para os que estão agora chegando que teremos duas mesas. Já fiz a leitura dos nomes que comporão uma mesa e a outra mesa acontecerá na sequência.
De pronto, seguindo aqui, registro a presença, com o carinho de sempre, do Centro Educacional nº 3, de Sobradinho-DF.
Sejam bem-vindos! (Palmas.)
Fashion Inclusivo.
Bem-vindos! (Palmas.)
Profª Márcia Alessandra S. L. dos Santos. (Palmas.)
Profª Ângela Ferreira. (Palmas.)
Quero também uma salva de palmas, com muito carinho, para todos os alunos e alunas presentes, que vieram lá do seu posto escolar, de onde estão buscando sua formação e preparação, para participar e defender seus pontos de vista, aquilo em que acreditam, junto com os painelistas, pais, familiares e amigos.
Vocês são nossos heróis. Vocês é que são autores dessa lei. Por isso, ela tem que ser aprimorada por vocês, e o momento é este.
Palmas para vocês! (Palmas.)
Faço também questão de registrar a presença, além dos convidados que irão falar, que já mencionei na abertura, do nosso querido Senador José Medeiros.
O Senador José Medeiros está presente aqui na segunda-feira de manhã, firme, para acompanhar este debate. (Palmas.)
Havia a intenção de que o jovem Vinícius...
Grande Vinícius, venha cá, meu comandante, aqui na frente. (Palmas.)
Esse é o grande Vinícius. Ele é um artista, um poeta, um cantor, um compositor, tudo e mais um pouco.
Palmas para ele!
É uma alegria enorme tê-lo aqui.
Nós ouviremos agora o Hino Nacional Brasileiro, apresentado pelo jovem autista Vinícius, em posição de respeito em homenagem ao Brasil, ao Hino e a todos os autistas.
(Procede-se à execução do Hino Nacional ) (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Vinícius!
"Quem sabe faz a hora, não espera acontecer."
Só nos deem oportunidades, e nós, autistas, mostramos toda a nossa capacidade.
Mais uma salva de palmas para o Vinícius! (Palmas.)
Vamos, de imediato, dar início aos nossos debates do dia de hoje passando a palavra à Srª Tatiana Roque, enfermeira, mãe de autista, diretora do Movimento Orgulho Autista Brasil.
A SRª TATIANA ROQUE - Bom dia a todos!
Eu gostaria, primeiramente, de agradecer pelo convite para participar deste debate e agradecer ao Senador Paulo Paim por promover este evento. Eu queria, ainda, agradecer à Mesa, composta pela Srª Lívia Magalhães, advogada e Diretora Jurídica do Moab, Movimento Orgulho Autista Brasil, pela Srª Márcia Cristina Lima, professora, chefe do Núcleo de Autismo e TGD da Secretaria de Educação, pela Srª Simone Maria, representante da Diretoria de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do DF, e gostaria também de dar o meu bom-dia aos alunos da Escola de Sobradinho, aos professores, profissionais, pais, mães e a todos os Senadores presentes.
Para falar sobre autismo, temos de falar de algumas características. Primeiro, o que seria o autismo? O autismo é uma síndrome comportamental. Essa síndrome atinge três áreas importantes. Então, há uma dificuldade na socialização, há um atraso na linguagem, na fala, e há alteração no comportamento, com comportamentos restritivos e repetitivos. Assim, o autista apresenta alterações nessas três áreas.
Nós sabemos que existem vários tipos de autismo, vários níveis de comprometimento. Então, hoje, nós temos autista leve, moderado e grave, o que vai depender exatamente desse nível de comprometimento. Só que, como existem vários tipos de autismo, os autistas não são iguais. Assim, eles precisam de atendimento individualizado. Nós não podemos pegar uma receita de bolo e oferecer para todos ao mesmo tempo. Não! O atendimento tem que ser individualizado, porque cada um vai depender do ingrediente que vai ser oferecido.
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Se a gente for ver a questão da estatística, a gente se assusta. Em 1990, nós tínhamos um caso de autista para cada 2.500 crianças nascidas vivas. Hoje, a estimativa é de uma criança...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Desculpe-me, Tatiana. É que ele veio me entregar um trabalho que ele escreveu, segundo ele, em mais mais de 400 ou 500 horas, chamado O Desafiante Mundo do Autista. Eu estava explicando para ele que, depois, ele poderá, naturalmente, comentar a sua proposta.
Ele faz questão ainda...
Desculpe-me atrapalhar, porque...
A SRª TATIANA ROQUE - Fique à vontade.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - ... de fato, foi uma falha minha.
O Oswaldo Freire da Fonseca Júnior é jornalista e se dedica também a essa causa. A gente fez a interrupção, mas eu gostaria de pedir a vocês uma salva de palmas para ele pelo trabalho, que ele quer deixar à disposição de todos vocês. (Palmas.)
Este é o rascunho do livro, que vai ser publicado em nível nacional.
Certo, Oswaldo? Depois você comenta.
Por favor, Drª Tatiana, com as minhas desculpas, porque faço questão de prestar atenção a cada palavra dos meus convidados.
A SRª TATIANA ROQUE - Claro.
Obrigada.
Então, eu estava falando da estatística. Realmente, houve um aumento do número de autistas no mundo. E isso é preocupante. A ONU fala que são 70 milhões de autistas no mundo. Nos Estados Unidos, os dados oficiais falam que há um autista para cada 88 crianças nascidas vivas.
Só que o CDC, que é o Centro de Controle e Prevenção de Doenças, afirma que há um autista para cada 50 crianças na faixa etária de 6 a 17 anos. Ou seja, é um número alto. Aumentou bastante. E as políticas públicas precisam ser modificadas para atender a essa grande demanda.
Infelizmente, no Brasil, não há uma estatística oficial. Nós não temos uma estatística oficial falando quantos autistas no Brasil. Isto é uma falha grave, gravíssima! Nós precisamos mapear. Temos que saber quantos nós temos e onde estão, porque a partir daí nós iremos intensificar as políticas públicas. Só que nós precisamos cobrar dos órgãos competentes para que tenhamos essa estatística.
Estima-se que existam 2 milhões de autistas no Brasil, mas não são dados oficiais.
Nós estamos aqui para reivindicar os direitos dos nossos filhos, mas não há como deixar de falar da Lei Berenice Piana. A Berenice, que é uma grande mulher, uma guerreira, uma mãe, tem um filho de 20 anos, o Dayan, e começou essa trajetória há muitos anos. No caso, o filho dela tem 20 anos e o meu tem 6 anos. Ela, uma mãe, uma guerreira, conseguiu, junto com outros pais, a criação da lei. Mas, infelizmente, essa lei não está sendo respeitada.
A lei instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Isto quer dizer que os autistas têm os mesmos direitos que têm as pessoas com deficiência, o que não tinham. E esses direitos cabem tanto no acesso à saúde, à educação e à assistência social, principalmente nessas três áreas.
Esta audiência tem o propósito de esclarecer, primeiro, o que é a síndrome, para quebrarmos a barreira do preconceito, e cobrar das autoridades que o cumprimento da lei seja feito na sua totalidade. Só queremos assegurar os direitos dos nossos filhos. A gente não está pedindo favor a ninguém; a gente está pedindo que a lei seja cumprida, pois não está.
A lei foi criada, foi feita com o suor de muitos pais pelo Brasil afora e está no papel - infelizmente, está só no papel -, e a gente precisa que os órgãos competentes façam a fiscalização, nas escolas, nos hospitais, nas vizinhanças, onde quer que seja.
Houve uma deturpação da lei. Foi acrescentado um conteúdo que não estava no texto original, confrontando as famílias de autistas que convivem com a realidade do autismo, ou seja, nós, pais e mães, sabemos o que é o autismo. Nós lidamos com autismo 24 horas. Quem está de fora pode ter uma noção, mas sabe o que é a realidade.
Só fazendo uma breve apresentação, porque esqueci de falar no início, quero dizer que meu filho tem 6 anos. Ele nasceu prematuro. Tive uma gestação complicada, de alto risco, foi difícil segurá-lo, mas, com tanto tratamento, com muita força de vontade e com Deus em primeiro lugar, conseguimos. Ele nasceu prematuro. O primeiro ano foi para ganhar peso. Com um ano e meio, mais ou menos, ele não falava nada. Ele era não verbal. Foi quando procurei ajuda. Procurei a fono. Ele foi para a fono e da fono foi para o terapeuta. Então, ele começou o tratamento com um ano e sete meses, sem diagnóstico. Com três anos, nós fechamos o diagnóstico e, a partir daí, a gente intensificamos o tratamento com várias outras terapias. Ele hoje tem 6 anos, conseguiu, graças a Deus, muitas conquistas, muitas vitórias. Ainda tem as suas limitações, mas conseguiu vitórias. Por quê? Porque teve um atendimento precoce, específico e um diagnóstico bem precoce, o que, infelizmente, não é a realidade de muitos de que eu vou falar mais à frente.
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Então, é preciso cumprir a lei como ela foi escrita, como eu falei anteriormente. Cobramos a retirada da alínea "c" do Decreto nº 8.368, de 2014. Por quê? Porque o autista precisa do centro especializado, de uma clínica-escola, de um local específico, com equipe multidisciplinar, um local em que ele seja respeitado, em que seu direito seja respeitado, um local onde nós tenhamos psiquiatras, neurologistas, psicólogos, fonos, terapeuta ocupacional, professor de educação física, o que ele precisar. E isso foi desrespeitado na lei. Por quê? Porque na lei foi acrescentada essa alínea que fala que o autista tem de ser tratado no CAPS, que é o Centro de Atenção Psicossocial. Nós não temos preconceito contra o CAPS, nós estamos exigindo o direito de o autista ser tratado num centro especializado. Isso foi acrescentado na lei e foi retirado depois por esse decreto. O CAPS atende vários tipos de patologias e síndromes, com vários níveis de comprometimento, o que não seria específico para o autista.
Outra coisa: o CAPS, hoje, nós sabemos, não tem condições de atender, porque a demanda de autista é alta. Como eu falei no início, a estatística aumentou. Então, nos CAPS que há hoje, a fila de espera é enorme e autista não pode esperar. Quanto mais tempo espera, pior é o prognóstico, pior é a qualidade de vida no futuro. Por isso nós exigimos e estamos reivindicando um diagnóstico precoce e tratamento individualizado.
É necessário concentrar esse tratamento nesse mesmo local, como eu falei, com essa equipe toda. Por quê? Porque, se a gente concentrar o tratamento do autista no mesmo local, com tratamento intensivo, com tratamento específico, nós vamos ter ganhos, vitórias. O autista vai se desenvolver, vai ter uma qualidade de vida no futuro e, com certeza, vai conseguir viver em sociedade, estudar, formar família, casar-se e ter uma qualidade de vida. É por isto que a gente luta diariamente: para que os nossos filhos sejam felizes no futuro.
E não me venham dizer que não há dinheiro para construir os centros especializados, porque há. O que está acontecendo é falta de gestão. Vou dar só um pequeno exemplo: o dinheiro que foi desviado da Petrobras daria para construir muitos centros especializados. Não só para construir, mas para construir, equipar, contratar profissionais e atender a essa demanda. Então, dinheiro existe, só está havendo má gestão.
Outro ponto importante que eu gostaria de frisar é que, infelizmente, a Presidente Dilma vetou um artigo que havia na lei que falava sobre o horário especial, sem compensação, para os servidores públicos com filhos autistas. Nós que somos cuidadores, pais, mães, nós somos sobrecarregados. Por quê? Porque nossos filhos precisam de atendimento multidisciplinar. Por exemplo, meu filho faz seis atividades extra: terapia, terapia comportamental com o método ABA, terapia ocupacional, fono, psicopedagogia, natação e equoterapia. São seis.
Eu sou servidora do GDF, enfermeira. Eu não estava dando conta de fazer 40 horas semanais. O meu filho tem todas essas terapias e eu tenho outra filha, que é neurotípica, que, às vezes, a gente esquece... Não é que a gente esquece, mas os outros filhos ficam à mercê, porque aquela criança especial precisa de atenção redobrada. Por isto eu tive que reduzir a minha carga horária, porque eu não estava dando conta. Eu reduzi minha carga e meu salário foi reduzido pela metade. Tive que fazer outras coisas. E hoje, além de eu ter uma qualidade de vida, porque eu consigo atender às necessidades de meu filho com todas as terapias dele, eu consigo ser mãe da minha filha, o que eu não estava sendo. E isso é muito sério, porque acho que a família também precisa de ajuda. Quando se tem uma criança especial, não é apenas essa criança que precisa de ajuda, mas toda a família precisa, porque fica doente também.
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Nós do Moab temos, uma vez por mês, o Desabafo, um encontro de pais que trocam experiência. No Desabafo, ouço muito as mães falarem dos problemas que têm com os outros filhos adolescentes e adultos que não conseguem compreender por que ela dá tanta atenção para aquele outro filho especial. Eles acham que a mãe não os ama. No entanto, não é questão de amar ou deixar de amar, pois a mãe ama todos da mesma forma, mas o fato é que a criança especial precisa de atenção redobrada.
Então, esse ponto da minha filha me fez também tomar a decisão...
(Soa a campainha.)
A SRª TATIANA ROQUE - Só mais um pouquinho.
Continuando, esse ponto me fez tomar a decisão de retratar, para que eu possa ser mãe dela, o que eu não o estava sendo.
Então, tramita aqui, no Senado Federal, um projeto de lei de autoria do Senador Romário que prevê horário especial, sem compensação, para o servidor público com filho, cônjuge ou dependente com deficiência. E eu gostaria, Senador Paim, de pedir a sensibilidade dos Senadores para que essa proposta seja aprovada o quanto antes, porque ela vai ajudar muitas famílias que têm pessoas especiais.
Não é fácil cumprir toda essa carga horária, com todas as atividades, atender ao filho especial, atender à família, como falei anteriormente. E mais: precisamos estudar o autismo. Para conseguirmos ajudar nossos filhos, precisamos saber o que é o autismo, pesquisar a terapia, pesquisar profissionais, levar a criança para exames, para consultas, ir a reuniões na escola, "trocentas" mil reuniões na escola, com coordenadores, com professores, e tudo isso requer a nossa presença.
Como falei anteriormente, o diagnóstico precoce é muito importante. Precisamos capacitar os profissionais para que saibam o que é autismo e saibam fazer o diagnóstico. Com o diagnóstico precoce, o autista vai ter qualidade de vida no futuro, vai ter um atendimento mais intensificado e o mais precoce possível.
As universidades precisam envolver-se nesse projeto. A querida Deputada Mara Gabrilli tem um projeto para que as universidades tenham o autismo como matéria específica. Isto será de suma importância. Por quê? Porque seria muito importante que os médicos saíssem das universidades sabendo o que é o autismo, como classificá-lo e como diagnosticá-lo. Então, há esse projeto da Mara, que ainda está na Comissão de Educação, tramitando, ainda não aprovado.
Defendemos uma política pública mais abrangente. Temos que atingir as crianças e os adultos. Não podemos esquecer dos adultos. Infelizmente, há profissionais que só atendem crianças. Por que não atender a adultos autistas? Claro que não estamos generalizando, mas a maioria só atende a crianças. Se formos pesquisar, veremos que só há artigos que tratam de crianças. Por que estou falando isto? Porque há uma falha, sim, há uma deficiência de profissionais para atender a essa faixa etária. Não podemos nos esquecer dos autistas adultos, porque eles também precisam de ajuda, não chegou o fim do túnel.
Eu gostaria de colocar a imagem, por favor.
A saúde pública está defasada. A saúde está defasada, está precária. Sou servidora do GDF e sei o que é lidar com falta de material, com falta de profissionais, com falta de tudo. Infelizmente, a maioria dos autistas não tem uma família com condições de dar-lhes um tratamento adequado, e o governo não ajuda.
Esta imagem, para mim, é revoltante. Aqui estão dois adolescentes de 14 anos amarrados em uma cama, numa instituição em Alagoas. Por que estão amarrados nessa cama? Aliás, eles vivem assim. Porque a família não tem condições de oferecer um tratamento adequado, porque o governo não ofereceu um tratamento para essa família... Eles moravam trancados em casa. Tiraram-nos de lá e os levaram para uma instituição, mas eles continuam amarrados. Eles não tiveram um diagnóstico precoce, não têm atendimento individualizado, não têm terapias. A questão é: apenas oferecer medicação não resolve. Ajuda, mas não é a solução. Eles são medicados diariamente e amarrados.
Essa cena, para mim, é frustrante e me causa - desculpe-me a expressão - raiva. Sinto raiva por saber que temos tanto dinheiro para ser investido, sinto raiva por lutarmos tanto por uma política pública de qualidade para nossos filhos, sinto raiva porque o governo não lhes está oferecendo qualidade. Eu, como mãe de autista, fico triste e envergonhada de ver esta cena.
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Desculpem-me a emoção, mas é triste ver e saber que o autista tem que passar por essa vergonha, por esse tipo de tratamento. Se nós tivéssemos...
Volta um pouco antes, por favor.
Obrigada.
Se nós tivéssemos os centros especializados, com atendimento digno, eles não estariam aí nessa vida. Eles estão vegetando. Qual o prognóstico para essas crianças? Zero! Para uma criança que não tem atendimento, que não tem estímulo, que não tem nada, que vive amarrada ao leito, qual seria o prognóstico de vida para ela? Zero! E isso é triste!
É por essas crianças que nós estamos aqui. Não é por nossos filhos. A gente luta pelo coletivo, para que essas crianças tenham qualidade de vida, para que elas tenham um tratamento adequado e sejam respeitadas.
Próximo, por favor.
E este é o meu amado filho, o Guilherme. Ele tem 6 anos. Este sorriso é o meu combustível diário. É uma criança feliz, uma criança respeitada, uma criança que, graças a Deus, foi privilegiada, sim, por eu ter condições de lhe dar um tratamento. Contudo, se eu fosse depender do governo e das políticas públicas, ele, com certeza, estaria amarrado àquela cama.
Desculpem-me pela emoção.
Para finalizar a minha fala, eu gostaria de deixar aqui uma reflexão: que as reflexões do dia 2 de abril iluminem as mentes e os corações das autoridades do Poder Público para que os autistas tenham oferta de atendimento digno pautada no respeito e na dignidade.
Obrigada.
Bom dia. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Essa foi a Srª Tatiana Roque, mãe de autista e diretora do Movimento Orgulho Autista Brasil.
Eu faço questão de registrar a presença do Diretor-Presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil, Fernando Cotta.
O Fernando Cotta, a Berenice Piana e algumas outras pessoas vieram a esta Comissão para, aqui dentro, fazer surgir a Lei dos Autistas. Ela foi uma construção coletiva...
O SR. FERNANDO COTTA - O Ulisses Costa, do Rio de Janeiro.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O Ulisses Costa, do Rio de Janeiro.
Foi uma construção de vocês com esta Comissão, porque não havia, até aquele momento, nenhuma lei que garantisse os direitos dos autistas.
Assim, Fernando Cotta, na tua figura e na da Berenice Piana de Piana, eu queria que ficassem nos Anais da Casa que, não fosse a persistência, não fosse a teimosia de vocês, como aqui também demonstrou essa mãe, a lei não existiria. Existe uma lei porque vocês vieram aqui e me deram, meu querido Senador José Medeiros, um xeque-mate dizendo: "Paim, é agora ou nunca! Ou sai daqui essa lei, ou nós não teremos lei alguma!"
O SR. FERNANDO COTTA - Muito obrigado, Senador.
Eu queria apenas esclarecer que foi em 2009 que nós o procuramos, aqui, e conseguimos, depois de muita luta dessas mãezinhas do Brasil inteiro - estivemos representados -, sentar com a sua assessoria para traçar, de fato, como essas pessoas poderiam ser mais bem atendidas, como o Legislativo brasileiro poderia estabelecer pelo menos um protocolo, digamos assim, de atendimento a essas pessoas.
Para quem ainda não sabe - se bem que acho que todo o Brasil já conhece isso -, o senhor nos acolheu de uma forma que, como eu digo, nunca conheci. Até hoje, Senador Medeiros, nunca conheci um parlamentar que fizesse o que o Senador Paim fez. Eu me lembro, por exemplo, em uma das votações que nós tivemos, que o Senador Paim, depois que o projeto retornou da Câmara, ligou de seu telefone pessoal - era o sepultamento do então Vice-Presidente José Alencar - para que os outros Senadores pudessem retornar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Para que os Senadores que haviam ido a Minas voltassem, porque nós iríamos ficar, com a presença de vocês aqui, com a sessão aberta a noite toda, se fosse necessário, para dar quórum e votar a lei. E vocês ficaram aqui! Eu fiquei, mas vocês ficaram aqui, lotando o plenário.
O SR. FERNANDO COTTA - Pois é.
Eu não conheço, Senador Medeiros, alguém que tenha feito isso. Eu até lhe perguntei se ele tenha algum parente autista ou alguma pessoa autista conhecida. Ele disse que não. Ele realmente assumiu a causa porque viu que era uma causa legítima, uma causa sem partido político, uma causa que realmente luta pela melhoria da qualidade de vida dessas pessoas que ainda estão, Senador, da forma como essa mãe colocou.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu vi a emoção da mãe também.
O SR. FERNANDO COTTA - Mas eu quero somente, Senador, deixar muito claro que o senhor, realmente, foi quem primeiro nos deu a mão para que isso pudesse ser uma realidade, para que as pessoas pudessem dizer que há uma lei no Brasil e que nós precisamos cumpri-la.
Muito obrigado.
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Fernando Cotta, Presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil!
Já que se citou o nome do Romário de forma positiva, eu, como Presidente desta Comissão, quero dizer, sobre o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que é de nossa autoria, de que a Mara foi a Relatora, com um belíssimo trabalho na Câmara, quando a Mara veio aqui, nós fomos entregá-lo ao Presidente da Casa e o Senador Romário fez questão de estar junto. Naquele momento, nós... O Romário já tinha trabalhado lá.
Vou contar esta historinha, porque Deus conspira a favor das pessoas de bem.
Fomos falar com o Presidente Renan, e o Romário se prontificou a ser o Relator aqui, porque já tinha acompanhado a matéria lá. O Renan disse: "Olha, por mim, tudo bem! Vou fazer um esforço para que isso aconteça, mas quem indica o Relator é o Presidente da Comissão." E o que aconteceu? O Estatuto da Pessoa com Deficiência foi despachado para esta Comissão, de que sou o Presidente.
Ontem ou anteontem, na semana passada, num grande evento relativo às pessoas com deficiência promovido pelo Romário no auditório Petrônio Portela, que contou com mais de mil pessoas, eu disse: "Olha, casualmente, como o universo conspirou, veio para mim a indicação do Presidente, e eu já o indiquei. Já está nas mãos do Romário. O Romário é o Relator do Estatuto da Pessoa com Deficiência." (Palmas.)
Tenho a certeza de que o Estatuto está em boas mãos. E tenho a certeza de que a esse outro projeto de autoria dele nós vamos dar todo o apoio. Vamos trabalhar juntos.
Quero dizer do meu carinho pela Mara Gabrilli, que é a Relatora lá, e pelo Flávio Arns, que foi Senador e Vice-Governador do Estado do Paraná. Ele foi um grande Senador e nos ajudou muito, conversou muito com as APAEs sobre a construção do Estatuto, que, acredito, meu querido Senador José Medeiros, vai se tornar realidade nos próximos dois ou três meses, pela vontade de todos.
Vamos em frente!
Neste momento, convido para usar da palavra a Srª Lívia Magalhães, Diretora Jurídica do Movimento Orgulho Autista Brasil, Moab.
A SRª LÍVIA MAGALHÃES - Bom dia a todos!
Cumprimento todas as autoridades que compõem a Mesa na pessoa do Senador Paulo Paim, Presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado e parabenizo o Vinícius, pelo grande talento que ele possui. (Palmas.)
Já tive outras oportunidades de presenciar o talento do Vinícius. Ele é um grande exemplo para nós.
A Srª Tatiana Roque até embargou minha fala, depois de um depoimento tão emocionante. Não há como não se comover com a situação dos autistas hoje aqui, no Brasil.
Parabenizo a Comissão de Direitos Humanos pela iniciativa de promover a presente audiência pública, pela relevância do tema, principalmente em homenagem ao Dia Mundial de Conscientização do Autismo, dia 2 de abril.
Inicio minhas considerações reiterando a fala da Srª Tatiana Roque de que o autismo é uma síndrome complexa, que atinge muitas pessoas e que é muito mais comum do que se pensa. Não existem dados oficiais no Brasil, mas se estima que dois milhões de brasileiros possuam o Transtorno do Espectro Autista hoje. Então, além dos autistas, milhares de familiares são atingidos pelas políticas públicas direcionadas aos autistas.
Nós sabemos que, historicamente, as pessoas com deficiência enfrentam grandes dificuldades para terem seus direitos respeitados. A situação dos autistas não é diferente. A luta pela concretização dos direitos dos autistas ao longo dos últimos anos foi árdua.
Em 27 de setembro de 2012 foi sancionada a Lei nº 12.764, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, mais conhecida como Lei Berenice Piana. Após anos de batalha dos familiares, foram conferidos direitos específicos aos autistas. Eles foram considerados, a partir de então, pessoas com deficiência para todos os efeitos legais. E foram assegurados diversos direitos, dentre os quais a atenção integral às suas necessidades de saúde e o acesso à educação e ao ensino profissionalizante.
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A Lei Berenice Piana foi uma grande conquista e foi muito comemorada. Porém, a sua efetiva aplicação dependia de regulamentação. Depois de dois longos anos de espera pela sua regulamentação, foi publicado o Decreto nº 8.368, em 2 de dezembro de 2014, com o objetivo de regulamentar a Lei Berenice Piana. Entretanto, não foi motivo de comemoração, considerando-se as omissões e os equívocos que o decreto trouxe.
Vou citar dois equívocos do decreto que são mais relevantes para nós que atuamos na luta pelos direitos dos autistas. A primeira é na área de saúde.
A Lei Berenice Piana confere ao autista o acesso ao serviço de saúde, incluindo atendimento multiprofissional. O Decreto nº 8.368, hoje, confere aos autistas o direito de serem atendidos na Rede de Atenção Psicossocial do SUS, através dos Centros de Atenção Psicossocial, CAPS.
O CAPS é o responsável pelo tratamento das pessoas com transtornos mentais, incluídos os decorrentes do uso de substâncias psicoativas. Ou seja, hoje, o acompanhamento de saúde do autista é realizado pelo CAPS, mesmo local onde são atendidas as pessoas que demandam atenção em saúde mental, alcoólatras e usuários de drogas. Então, esses locais são inadequados, tanto pela falta de estrutura física quanto pela falta de estrutura profissional. Falta tratamento multiprofissional adequado para atender às peculiaridades do autista.
Conforme a Srª Tatiana Roque mencionou, o autismo é caracterizado como um transtorno global do desenvolvimento. Existem alguns comprometimentos que podem variar entre um grau leve, moderado e severo. Nem sempre o autismo está associado à deficiência mental. Portanto, o tratamento do autista tem que ser diferenciado e acompanhado por uma equipe de diversos profissionais aptos a lidar com o transtorno.
Cito aqui mais uma iniciativa da grande Berenice Piana, uma grande guerreira e lutadora pelos direitos dos autistas. Depois de 12 anos de luta, depois de 12 anos indo à prefeitura, tentando conseguir, tentando melhorar a situação dos autistas, ela conseguiu a estruturação de uma clínica-escola do autista. É a primeira Clínica-Escola do Autista no Brasil. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Sabemos que é a primeira, mas é um passo. Por isso, as palmas. É importante o seu registro.
A SRª LÍVIA MAGALHÃES - É um grande passo, e diversos Municípios vêm pedindo o projeto da clínica-escola para implantar em seus Municípios.
Hoje, a Clínica-Escola do Autista atende a cem autistas com idade entre 3 e 45 anos de idade. Essa Clínica-Escola do Autista reúne a saúde e a educação em um só local. Há uma lista gigantesca de pessoas querendo ser atendidas por essa clínica-escola. As crianças que estão na rede regular de ensino recebem o mediador, que recebe a capacitação pela própria clínica-escola, e as crianças que não têm condições de frequentar o ensino regular ou que não se adaptaram ao ensino regular têm o ensino individual na instituição e o acompanhamento de uma psicopedagoga e de toda uma equipe multidisciplinar.
É importante destacar também que as mães são estimuladas na clínica-escola. Elas participam de grupos, recebem orientação, recebem capacitação para melhor cuidar dos seus filhos. Portanto, a qualidade de vida desses autistas que estão sendo atendidos pela clínica-escola é fenomenal. Essa clínica-escola de Itaboraí, Município do Rio de Janeiro, que tem um ano de funcionamento, é a primeira do Brasil e tornou-se referência em todo o País.
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Então, parabenizo a Berenice por sua persistência de sempre, tanto pela lei quanto pela implantação da Clínica-Escola, que hoje é referência.
Se Deus quiser, se tudo der certo, haverá muitas clínicas-escolas espalhadas pelo nosso Brasil!
A outra questão que eu quero pontuar diz respeito à educação.
A Lei Berenice Piana prevê que o autista tem direito ao acesso à educação e ao ensino profissionalizante e que, em caso de comprovada necessidade, o autista terá direito a um acompanhante especializado.
Houve uma omissão no decreto. Por quê? O decreto diz que, sendo comprovada a necessidade de apoio às atividades de comunicação, interação social, locomoção, alimentação e cuidados pessoais, a instituição de ensino em que a pessoa com transtorno do espectro autista ou com outra deficiência estiver matriculada disponibilizará acompanhante especializado no contexto escolar. Porém, o decreto não especifica a especialização do acompanhante. Então, o que isso acarreta? Hoje, algumas escolas acabam contratando estagiários sem qualificação, sem preparo, para lidar com o autista para acompanhá-lo e monitorá-lo na sala de aula. E essa falta de especificação acaba impossibilitando ou dificultando muito a disponibilização desse profissional. Então, é muito importante que seja especificada a qualificação, que seja professor de ensino fundamental com treinamento específico para lidar com o autista, para que haja uma qualidade de ensino, porque, se o autista não tem um mediador, não tem uma pessoa que possa ajudá-lo, ele não vai conseguir aproveitar o ensino como deveria ser aproveitado.
Então, para finalizar as minhas considerações, eu enfatizo que a nossa luta continua para que a Lei Berenice Piana seja regulamentada da forma mais adequada e de acordo com as demandas específicas dos autistas. Nós não mediremos esforços para que a sua regulamentação seja adequada, seja utilizando medidas judiciais cabíveis, seja pleiteando a expedição de um novo decreto do Poder Executivo. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Drª Lívia Magalhães, Diretora Jurídica do Movimento Orgulho Autista Brasil, que enfatiza, inclusive, tanto a luta da nossa grande Berenice, que aprendi a chamar de Berenice Piana de Piana. Não sei por quê.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É isso mesmo? Então é isso! Alguém me perguntou: "De onde é que o senhor inventou Berenice Piana de Piana?" Alguém me disse que era Berenice Piana de Piana, desde que eu a conheci aqui, nesta sala, quando fui Presidente, ainda em outra gestão, já que estou há 12 anos no Senado e estive mais 16 anos na Câmara. Então é Berenice Piana de Piana mesmo, não é?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Viu como eu estava certo? Está correto!
Meus cumprimentos, doutora, pela defesa firme, clara, tranquila e, eu diria até, carinhosa do seu ponto de vista, cobrando mais investimento na área e que não se cometam alguns equívocos, como foi o caso do decreto.
Quero ler aqui a cartinha que a professora me mandou. Eu falei de improviso, mas ela deixa o quadro bem claro aqui:
O Centro Educacional nº 3 de Sobradinho se encontra, sim, aqui, Senador, com alunos do Ensino Médio, para levarem o termo "autismo" para a sala de aula, onde será produzido... Teremos textos, questionamentos e debates. A turma presente será multiplicadora para todos os demais, mostrando a riqueza do que aqui, com certeza, aprenderão.
Professora Ângela Ferreira.
Parabéns, professora! (Palmas.)
Onde está a professora?
Levante-se, Professora Ângela Ferreira!
Aí, professora! (Palmas.)
Muito bem!
Passamos, de imediato, à Srª Márcia Cristina Lima Pereira, chefe do Núcleo de Autismo e TGD da Secretaria de Educação.
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A SRª MÁRCIA CRISTINA LIMA PEREIRA - Bom dia a todos.
Cumprimento a Mesa na pessoa do Senador Paulo Paim, e minhas colegas do Movimento Orgulho Autista e agradeço a oportunidade de estar sentada aqui, inclusive ao lado da Simone. Saúde e Educação juntas na Mesa. Estamos juntas mais uma vez.
Não vou me deter em questões legais, porque a Drª Lívia já abordou esse tema, mas vou começar com alguns pontos para irmos construindo nossos comentários, nossas colocações.
A Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência traz, em seu art. 24, que trata da educação, a parte correta, definida, com relação à educação, fala do direito, que "assegurarão sistema educacional inclusivo em todos os níveis", e pontua vários aspectos que eu gostaria de abordar: as adaptações razoáveis - o que seria adaptação razoável para uma pessoa com autismo, a que tipo de adaptação eles teriam direito na questão da educação -, o apoio necessário, medidas de apoio individualizado. São termos que estão na Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.
A Lei Berenice Piana fala da questão da educação e do direito ao acompanhante especializado, que a Lívia acabou de mencionar, com o problema da regulamentação de quem é essa pessoa, de quem vai dizer qual é a necessidade, de quem vai assumir a indicação para as funções que estão prejudicadas, muitas vezes, no autismo.
A regulamentação dispõe que:
Art. 4º. É dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade assegurar o direito da pessoa com transtorno do espectro autista à educação, em sistema educacional inclusivo (...).
(...)
§2º Caso seja comprovada a necessidade de apoio às atividades de comunicação, interação social, locomoção, alimentação e cuidados pessoais, a instituição de ensino (...) [então deverá prover esse profissional].
Não quero aqui fazer um resgate histórico desses conceitos de educação, de como isso tudo aconteceu, mas quero lembrar que, quando falávamos em integração, quando propusemos essa mudança de paradigma de integração para inclusão, a integração queria dizer que essa criança estaria pronta para frequentar a educação comum, a escola regular. E a inclusão não: a escola estaria preparada para receber toda e qualquer criança, e a receber bem.
Então, tentando juntar essa questão legal, o que deveríamos dizer em relação a adaptações razoáveis? O que seria razoável? Tablets para comunicação alternativa? O acompanhante especializado que, mesmo sem definição, alguns Municípios estão tendo a iniciativa de adotar, como professor estagiário ou um segundo professor dentro da sala? Educadores ou não? Porque há pessoas de ensino médio também, em alguns Municípios, atuando nesse papel.
O fato é que, na inclusão, teríamos de ter escolas aptas a receber todo tipo de estudante, com todo tipo de necessidade, com dificuldades outras. A prática e a pesquisa demonstram que isso não tem sido efetivo. Em vários congressos fora do Distrito Federal, escutamos muito que as escolas, infelizmente, não conseguiram absorver essa parcela da comunidade na educação especial.
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Sabe-se que essa categoria de transtorno global de desenvolvimento é uma categoria com características bem diferenciadas, bem específicas e que traz uma dificuldade maior, sim, para essa adequação, para essa ambientação escolar. Eu mesma tive alunos que, infelizmente, não foram bem acolhidos na educação comum e precisaram sair da escola e hoje estão em casa, mas, felizmente, tive alunos que foram incluídos e conseguiram concluir o seu ensino básico, sua educação básica, e estão no mercado de trabalho. A gente tem experiências muito positivas na educação inclusiva, mas também temos algumas situações meio complexas.
Com relação a pesquisa, fiz um mestrado e o título do trabalho do mestrado era Pais de alunos autistas - Relatos de expectativas, experiências e concepções e inclusão escolar. E a reflexão iniciou justamente pensando nisso. Será que não se está falando de um ideal educativo quando se fala nessa inclusão que tanto se deseja e que eu também desejo. Será que a gente está falando de um ideal na realidade da educação pública que hoje a gente tem? Não estamos falando do que a gente imagina ou do que a gente deseja, mas da realidade da escola pública, com falta de servidores, com falta de recursos, com essa estrutura ou falta de estrutura que hoje se tem. Será que a gente não está idealizando, neste momento histórico, essa inclusão para todos?
E, dentro dos objetivos, então, a gente estudou o impacto do autismo na vida dessas famílias e as possibilidades e os limites essa inclusão, como as famílias avaliaram esse processo inclusivo, a satisfação, a insatisfação, as dificuldades, as possibilidades desse processo. A gente sabe que há uma representação social de segregação que é atribuída às unidades, as instituições que são exclusivas de pessoas com deficiências, embora tenham sido elas as que acolheram e que deram um lugar de aluno, muitas vezes, a essas pessoas com deficiência. Então, elas foram o espaço inclusivo, e continuam sendo até hoje, para algumas dessas famílias.
Quando a gente está falando de autismo, a gente está falando de pessoas com comprometimentos variados, falando de todo um espectro - por isso tantas cores no símbolo do autismo -, falando de um grau de comprometimentos variados. Por isso a gente também ainda tem possibilidades variadas de atendimento na educação pública aqui, no Distrito Federal.
Então, na pesquisa, a gente ouviu várias queixas e também elogios. A gente teve escolas que simplesmente trocaram o rótulo de aluno especial para aluno incluído, tivemos outras que realmente se apropriaram da ideia, da filosofia, e incluíram verdadeiramente, sendo dignas de serem chamadas escolas inclusivas. E isto é bacana. Mas, quando a gente fala de inclusão escolar, no autismo, a gente está falando de transtorno grave. Em algumas situações, em alguns casos, em alguns momentos específicos da vida de algumas dessas pessoas, essa avaliação precisa ser feita com um cuidado maior. Precisa ser feita uma avaliação caso a caso, como, por exemplo, no caso daquela cena que a Tatiana mostrou. Como a escola que temos hoje acolheria pessoas em um quadro grave naquele momento da vida deles? Será que hoje a gente tem essa condição na escola pública? Então, hoje, no DF, a gente ainda tem, sim, várias possibilidades, várias alternativas educacionais para as pessoas com autismo que vão desde instituições especializadas até a inclusão escolar tão desejada.
Espero que a inclusão um dia seja realidade mesmo para uma ampla maioria - acho que ainda há muitas com autismo que podem ser beneficiadas por esse sistema -, que a educação deixe de ser prioridade apenas nos discursos. É complicado falar isto aqui, mas acho que aqui também é um espaço em que isto precisa ser dito. A educação sempre é prioridade nas campanhas, desde a do vereador, no Município. Espero que essa prioridade um dia seja real para que, minimamente, essas adaptações razoáveis sejam de acesso a essas pessoas e que a gente consiga uma inclusão mais ampla para que essas pessoas possam ser beneficiadas.
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Ainda assim, teremos alguns casos em que a educação não está dando conta. Por isso, minha colega da Saúde está aqui do meu lado, porque a gente vai precisar desses atendimentos intersetoriais para essa colaboração. A gente precisa que a educação seja, de fato, valorizada para que essa população, que merece, seja considerada e respeitada como cidadã.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Márcia Cristina Lima Pereira, chefe do Núcleo de Autismo e TGD da Secretaria de Educação, que falou da importância da inclusão, mas que também temos que entender os casos especiais.
É isso, Drª Márcia?
A SRª MÁRCIA CRISTINA LIMA PEREIRA - Sim.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Temos que ter investimentos para garantir.
E há algumas preocupações, naturalmente, com a regulamentação da lei pelo decreto.
Agora, vamos passar a palavra, com enorme satisfação, à representante da Diretoria de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do DF, Srª Simone Maria Guimarães.
A SRª SIMONE MARIA L. C. M. GUIMARÃES - Bom dia a todos.
A gente consegue ver alguns amigos de luta na plateia: o Fernando, a Cristiane, do CAPS, a Margareth, mãe, amiga e colega de luta.
Eu gostaria de cumprimentar todos da Mesa na pessoa do Sr. Senador Paulo Paim, Presidente da Comissão, e também do Senador José Medeiros, que apoia a nossa luta.
Como a colega falou, é muito bom estarmos juntas aqui, Saúde e Educação. Eu estou aqui representando o Diretor de Saúde Mental do Distrito Federal, Dr. Ricardo Lins, que, infelizmente, não pôde comparecer. Sinto-me honrada de poder participar desta Mesa para debater este tema tão importante: as políticas públicas para as pessoas com autismo.
Sou pediatra de formação, me especializei em neuropediatria e convivo com este tema há muitos anos. Sempre trabalhei na rede de saúde do SUS, pela qual luto e na qual acredito.
Há mais de cinco anos, venho desempenhando a grande missão de ser Diretora do COMPP, Centro de Orientação Médico Psicopedagógica, o que tem me aproximado ainda mais da temática do autismo, porque une assistência e gestão.
No Distrito Federal, a Rede de Atenção Psicossocial vem crescendo, mas ainda necessita de ampliação dos pontos de atenção para promover ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral das pessoas com autismo.
Falarei um pouco sobre essa rede de saúde e o que vem sendo feito para o atendimento do autista.
Com relação à infância e adolescência, que é minha área, contamos, atualmente, com o COMPP, que foi criado em 1969, referência no atendimento e no acesso aberto às crianças e adolescentes com transtornos de aprendizagem, transtornos alimentares, transtornos do espectro do autismo, depressão, esquizofrenia, vítimas de violência, entre outros.
O COMPP conta com equipe multiprofissional: assistente social, enfermeiras, educadora física, fonoaudiólogas, nutricionistas, psicopedagogas, psicólogas, psiquiatras, neurologistas, neuropediatras e terapeutas ocupacionais, entre outros.
Conseguimos, junto com a Secretaria de Educação, através do Termo de Cooperação Técnica, que profissionais da Secretaria de Educação fossem cedidos para o COMPP para integrarem essa equipe, o que fortalece muito o nosso trabalho.
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No espaço físico do COMPP, na Asa Norte, funciona o primeiro CAPSi do Distrito Federal, que vai fazer 16 anos na semana que vem, é o CAPSi do Plano Piloto, serviço que atende em equipe interdisciplinar os transtornos mentais com sofrimentos psíquicos graves, entre esses os autistas e suas famílias. Sim, atende às suas famílias porque a gente sabe que o investimento na família é muito importante.
A Rede de Saúde conta, ainda, na área da infância e adolescência, com dois CAPSi estruturados, um em Recanto das Emas e um em Sobradinho, ambos necessitando de ampliação de suas equipes e de seu espaço físico.
Contamos, ainda, com um Núcleo de Atendimento Terapêutico no HMIB, Hospital Materno Infantil de Brasília, com o Adolescentro e com um Centro Especializado de Reabilitação, que funciona em Taguatinga, da Rede de Atenção à Pessoa com Deficiência. Ainda contamos com o Hospital da Criança de Brasília, com os ambulatórios realizados nas áreas de psiquiatria infantil e de neurologia infantil. Para os adultos com transtorno, a gente conta, no Distrito Federal, com os CAPS II Transtorno, um em Taguatinga, um em Samambaia, um no Paranoá e um em Planaltina, com os os psiquiatras dos Hospitais Gerais em seus ambulatórios, com o Hospital São Vicente de Paula, o Instituto de Saúde Mental e o CAPS I, que funciona no Instituto de Saúde Mental.
A gestão da Disam, desde o último governo, vem sendo colegiada, o que tem permitido a aproximação, o conhecimento, a integração e a articulação dos serviços de saúde mental para atender cada vez melhor essa população. Além desse colegiado maior de todos os gestores de saúde mental, existem quatro subcolegiados, um deles o da Infância e Adolescência, este subcolegiado, que já vem funcionando há alguns anos, com gestores e servidores de todos os serviços que prestam atendimento aos transtornos mentais no Distrito Federal.
Sempre nos empenhamos muito em melhorar a assistência dos pacientes com transtornos mentais os mais diversos, entre esses os autistas, pois, além da nossa formação, entendemos que há necessidade de acompanhamento e tratamento individualizado e precoce para essas crianças, além do suporte às suas famílias. Precoce por quê? Porque, quanto mais cedo investirmos nessas crianças, mudanças importantes podem ocorrer em suas vidas, já que aproveitaremos janelas importantes da plasticidade cerebral, que vem nos trazer modificações nas ramificações neuronais, se essas crianças forem estimuladas adequadamente.
Em janeiro do ano passado, 2014, a Secretaria de Estado de Saúde instituiu, através da Portaria nº 7, o grupo condutor para a elaboração da Linha de Cuidado para a Atenção às Pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo e a suas Famílias na Rede de Saúde do SUS, Distrito Federal, desde a detecção precoce dos riscos até o diagnóstico precoce, projeto terapêutico singular, profissionais e equipes de referência, tecnologias do cuidado, leitos ou enfermarias em hospitais gerais, tratamento medicamentoso, atenção à urgência, emergência e reinserção social.
Esse grupo vem trabalhando desde 2013, mais ou menos setembro. Além de considerar toda a parte da legislação, em especial, o destaque que a gente dá é para a Lei nº 12.764, de 2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, há a cartilha do Ministério da Saúde Linha de Cuidado para a Atenção Integral às Pessoas com Transtorno de Espectro Autista e suas Famílias na Rede de Atenção Psicossocial do SUS 2013/2014. A gente começou o trabalho em 2013. O grupo foi coordenado pela Direção do COMPP, com vice-direção do HMIB, e teve como representantes gestores
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O grupo foi coordenado pela direção do COMPP, vice-direção do HMIB e teve como representantes gestores dos serviços de saúde mental do DF, da Disam, da Atenção Básica, dos usuários, coordenador da Rede de Atenção à Pessoa com Deficiência do DF, parceiros intersetoriais, entre outros.
Concluímos os trabalhos em dezembro do ano passado, e esse grupo levou o documento desse trabalho, intitulado Guia de Orientação sobre a Linha de Cuidado para a Atenção às Pessoas com Transtorno do Espectro Autista e suas Famílias no Sistema Único de Saúde, voltado para gestores e profissionais da saúde. Encontra-se em avaliação. Aguardamos a autorização para que possamos fazer os retoques finais nesse guia para publicá-lo. Será um documento importante nessa área de saúde e também intersetorial.
Esse guia objetiva contribuir com o conhecimento sobre a atual rede de serviços que realiza atendimento às pessoas com o Transtorno do Espectro Autista no DF. Fizemos um diagnóstico situacional de todos os serviços, todos os pontos de atenção, além de buscar a qualificação da atenção, a ampliação do acesso e a integração dos diversos pontos de atenção dessa rede de saúde e intersetorial do DF. Visa, ainda, à incorporação da ideia da integralidade na assistência à saúde, do cuidado continuado, de fluxos assistenciais seguros e garantidos que proporcionarão acesso a todos os recursos tecnológicos de que o usuário necessite nessa rede de saúde.
Grandes desafios foram constatados no nosso trabalho como necessidade de ampliação da rede de saúde, da rede de atenção psicossocial e implementação da rede de atenção à pessoa com deficiência no DF, aumento de cobertura de equipes de Saúde da Família na Atenção Básica, organização do fluxo na rede, articulação intra e intersetorial, pactuações, capacitação de profissionais, entre outros.
O que a gente espera com esse trabalho? Que uma nova comissão seja formada pra dar continuidade e implementação a esse guia. A partir do momento em que se pensa em uma linha de cuidado, em que se pensa no atendimento dessa pessoa ao longo de toda a sua vida, desde o nascimento, com as redes que estão por aí - sabemos da importância da Rede Cegonha, por exemplo, assim como da rede de atenção à pessoa com deficiência e rede de atenção psicossocial, urgência e emergência -, então, o usuário vai se ver nesse cenário sendo o protagonista do seu cuidado.
É importantíssimo, agora, nessa fase - já começamos um trabalho como o Moab - que o usuário esteja presente e possa estar conosco nesse processo de implementação. Nós tínhamos uma representante do Movimento Orgulho Autista Brasil no nosso grupo; também uma representante também da AMA, Margareth, que está aqui conosco e muito colaborou com essa iniciativa desde o começo; a Cristiane, que é a atual gerente do Caps Infantil, que está conosco o tempo todo. (Palmas.)
Então o que esperamos desse trabalho? Esperamos que esse trabalho....
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Está todo mundo procurando vê-las. Peço que se levantem as duas.
Obrigado. (Palmas.)
A SRª SIMONE MARIA L. C. M. GUIMARÃES - A gente espera que o nosso trabalho posa ser um ponto de partida, o início de uma longa caminhada. Vislumbramos que essas orientações que estão contidas no guia e são importantíssimas possam ser norteadoras para a elaboração de políticas públicas e para a aproximação de cada profissional: da saúde, da educação, da assistência social, de outras secretarias como segurança pública e educação, para que, realmente, a pessoa com o Transtorno do Espectro Autista possa ser atendida em sua integralidade. Sabemos que eles têm as suas individualidades e precisam de um acompanhamento adequado para viver na sociedade.
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Sabemos que existe, ainda, preconceito. Temos lutado muito contra isso, e uma das coisas que a gente traz aqui é que é necessária uma sensibilização dos gestores e de toda a sociedade para que o autista possa realmente viver de uma forma plena na nossa sociedade.
Obrigada e bom dia a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Drª Simone Maria Guimarães, representante, aqui, da Diretoria de Saúde Mental da Secretaria de Saúde do DF.
Nós vamos abrir um segundo momento para as falas do Plenário.
Agora, nós vamos apresentar a segunda Mesa. Eu conclamo as minhas convidadas para que retornem ao plenário; podem ficar na primeira fila, se possível. E eu chamo, para a segunda Mesa: a Srª Adriana Alves, Coordenadora do "Desabafo Autista e Asperger", professora e mãe de autista; Gianna Guiotti, médica psiquiatra, representante da Clínica de Atendimento Psicológico a Crianças Especiais Ltda. (Cliama); Anna Cristina Pires de Mello, psicóloga, representante da Clínica de Atendimento Psicológico a Crianças Especiais Ltda. (Cliama); Martinha Clarete Dutra, Diretora de Políticas de Educação Especial da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, do Ministério da Educação. (Palmas.)
Como a gente falou tanto aqui, e corretamente, de combate a todo tipo de preconceito, a todo tipo de discriminação, só para ilustrar, entre uma Mesa e outra, e para não ficar só na fala dos nossos convidados - e eu falo demais, falo mais que os convidados, pois sobre o que cada um fala eu faço um comentário -, nós vamos passar um pequeno vídeo sobre um caso de racismo: a situação de um estrangeiro na Lituânia, em que ele participa de uma seleção de atores e ali sofre um ato de preconceito, até para lembrar que em março e abril, além do Dia do Autista, nós temos, no dia 21 de março, o dia internacional de luta contra todo tipo de preconceito, data inspirada, instituída pela ONU por conta do Massacre de Shaperville, lá na África do Sul, onde centenas de pessoas foram assassinadas porque queriam o fim do apartheid, e conseguiram, claro, embora Mandela tivesse que ficar 27 anos no cárcere com esse objetivo. Então, como são datas simbólicas de combate a todo tipo de preconceito - síndrome de Down, autismo, e também o preconceito contra a mulher, contra a criança, contra a orientação sexual de cada um, contra a sua religião -, nós achamos que, no intervalo, deveríamos passar, por dois minutinhos, um caso de preconceito que a gente, claro, contesta. No final, falaremos mais sobre a pessoa com deficiência.
(Procede-se à exibição do vídeo)
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(Continua a exibição de vídeo.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - É só uma demonstração de como dói o racismo, independentemente do tipo: contra a mulher, contra o homem negro, contra o homem branco, por ele não saber ler a língua daquele país, se é deficiente ou não é deficiente. Eu acho que foi uma criação de quem fez o vídeo mostrar como dói o racismo.
Nós todos temos que dizer, sempre: que ninguém seja discriminado por motivo nenhum! Viva a liberdade! Viva a igualdade! E direitos iguais para todos!
É isso. (Palmas.)
De imediato, concedo a palavra à Adriana Alves, Coordenadora do "Desabafo Autista e Asperger" - até coincidiu, aí, com o pequeno desabafo que foi feito ali -, professora e mãe de autista, por dez minutos, com mais cinco, se necessário.
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A SRª ADRIANA ALVES - Bom dia a todas e a todos os presentes aqui, hoje. Este é um dia muito importante para todos nós que estamos de mãos dadas pelas pessoas com autismo.
Eu gostaria de cumprimentar a todos na pessoa do Senador Paulo Paim. Muito obrigada, Senador, por nos receber tão bem nesta Casa e por ter dado as mãos à causa do autismo.
Nós temos uma história de luta desde 2005. O Movimento Orgulho Autista Brasil surgiu de uma união de pais e familiares de pessoas com autismo para dar voz aos nossos filhos. Essa foi uma missão que não foi escolhida por mim. Ela começou muito antes disso. Eu tenho um filho de 17 anos, o Fernandinho, que é autista. Sou mãe de um outro rapaz também que é neurotípico, não é autista, e vivencio 24 horas por dia os desafios do autismo. Eles não são fáceis, não são poucos.
As famílias que têm pessoas com deficiência estão abandonadas. As políticas públicas existem, mas elas são muito poucas, escassas. As pessoas que precisam não têm acesso a elas na maioria das vezes. E a Tatiana falou - mãe de autista -, com muita propriedade, de como nós precisamos estar aqui muitas vezes para falar não em favor dos nossos filhos, porque nós ainda precisamos de muito para eles, mas de tantas pessoas que não têm voz, porque muitas vezes nem sabem dos seus direitos.
Então, o Movimento Orgulho Autista Brasil surgiu com essa meta de levar a público o que é o autismo, de desmistificar isso, para que as pessoas pudessem, através do conhecimento, deixar de lado o preconceito. O preconceito existe e, como educadora, eu nisto acredito, porque sou professora do Ensino Médio: que a educação vem ao encontro da melhoria da população em geral. Então, quando a gente fala sobre o que é autismo, sobre como isso se processa, sobre as dificuldades do dia a dia de tantas pessoas, a gente está fazendo isso por uma necessidade que nós temos de ser reconhecidos e de combater, Senador, esse preconceito. Isso porque esse preconceito a gente vivencia todos os dias.
Eu estou aqui hoje porque tenho quem fique com meu filho autista, que tem 17 anos, e é um autista não verbal. Vivencio muitas vezes essa dificuldade que é para a gente ter cuidadores especializados, médicos, pessoas na área da saúde que tenham capacitação. Então, a gente luta, a gente briga por isso também, ou seja, para que seja incluído... Eu fiquei muito feliz com essa notícia hoje de que a nossa Deputada Mara Gabrilli, que é um anjo, e muitos profissionais, que são anjos sem asas, têm lutado pela gente, por essa capacitação de que os profissionais precisam para entender o que é o autismo e poder tratá-lo de maneira adequada.
O Ensino Médio é muito importante na vida dos jovens. Eu fico muito feliz de ver aqui os alunos da Prof. Angela, que vêm lá de Sobradinho, e estão aqui para multiplicar esse conhecimento para os seus colegas de escola. Procurem entender como é que vocês são privilegiados por terem essa essa oportunidade de convivência com as pessoas com deficiência. Na idade de vocês - eu fui aluna de escola pública toda a minha vida -, não tive esse privilégio. Digo privilégio porque a convivência com a pessoa especial nos torna pessoas melhores também. Eu vivencio isso com o meu filho, o quanto que aquele rapazinho que hoje tem 17 anos que, infelizmente, não está inserido numa escola, porque a inclusão não é para ele - não é porque como educadora eu não acredite, mas é porque realmente não é o perfil que ele tem, não é o melhor para ele; infelizmente, ainda não é -, mas eu vejo como isso no dia a dia nos torna pessoas mais acessíveis, pessoas mais tolerantes. Ele me ensinou muito a ser assim, ou seja, uma pessoa mais sensível, mais tolerante no meu dia a dia. E é por ele e por todos os outros autistas que eu estou aqui hoje, para falar de muitas mães que hoje, infelizmente, não puderam estar aqui, mas o coração delas aqui está. E eu sei que elas são companheiras de luta.
Ontem, ouvi um desabafo de algumas famílias falando da dificuldade do diagnóstico e que lutam muito por isso. Nós aqui já ouvimos a fala da Srª Diretora do Compp. A gente sabe o quanto a saúde carece de profissionais que tenham essa especialização, porque, infelizmente, até hoje, o autismo não tem uma forma de diagnóstico, nem de laboratório, nem de imagem para que se possa dizer: "Olha, fulano realmente é autista." Sempre fica aquela dúvida na cabeça. Por quê? Porque existe um espectro, toda uma gama de sintomas, e somente uma pessoa que tenha tido essa formação - e essa formação ainda é muito escassa no Brasil ainda - pode dar esse diagnóstico.
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Esse diagnóstico, muitas vezes, vem muito tardio. As famílias ontem, no desabafo, falavam sobre isso. E a área da educação só pode fazer esse atendimento, como a minha amiga muito competente, mestre em autismo, Márcia Cristina dizia agora há pouco, chefe de TGD do Núcleo da Secretaria de Educação, para esse atendimento, precisa desse diagnóstico.
Aqui em Brasília nós somos privilegiados sim, porque nós temos o COMPP. Os melhores profissionais lá estão. É bem verdade que o atendimento não é o que o COMPP gostaria que fosse, não é? Porque lá há uma demanda enorme para atender todo o Distrito Federal e entorno, quer dizer, é muita gente. Às vezes, uma família chega lá para ter um diagnóstico e precisa disso rápido para que aquela pessoa possa ter acessibilidade ao que ela precisa, e demora, às vezes, um ano, não é verdade?
Então, a gente gostaria que essa realidade fosse modificada. Por isso, o Movimento Orgulho Autista Brasil trabalha nesse sentido.
O Desabafo Orgulho Autista é uma iniciativa nossa para que tenhamos voz, para que possamos falar. Então, o Desabafo é como se fosse realmente um desabafo. Não é uma terapia em grupo, mas é uma ocasião em que as famílias, os parentes, as pessoas que vivenciam no dia a dia o autismo estão presentes falando sobre isso. Então, a gente tem muitos professores, profissionais.
Ontem, por essa ocasião, no Centro de Ensino Especial 1 de Brasília, que acolhe os adultos, a gente conversava com alguns professores. E eu fiquei particularmente muito feliz por ver professores lá buscando informações: "Como é que eu faço para atender melhor os meus alunos autistas?". Também estavam lá algumas colegas minhas de curso. Nós, como professoras - eu sou professora da Secretaria de Educação -, precisamos pagar pela nossa formação, porque a Secretaria de Educação tem a formação, mas ela é em número insuficiente para atender a toda a demanda.
Então, como familiar de autista, essa é uma causa que eu abracei não por vontade própria, mas porque foi uma missão que eu acredito que eu recebi. Então, eu não tive escolha. Ou eu tinha que fazer isso ou quem iria fazer?
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Fazer ou fazer.
A SRª ADRIANA ALVES - Fazer ou fazer. Exatamente, Senador.
Então, eu me sinto privilegiada por ter conhecido pessoas que iluminaram a minha vida, como o Vinícius, que foi aluno da escola em que hoje eu trabalho. (Palmas.)
Parabéns, Vinícius! Você é uma estrela brilhante.
E quero dizer que, por traz de todos esses meninos e meninas com autismo, de todo esse espectro, que são pessoas muito diferentes, não há um autista igual ao outro. Há mães que são anjos sem asas. A gente fala no nosso movimento de anjos azuis, que nossos filhos são anjos azuis. E a Rosângela, aqui presente, mãe do Vinícius, sabe dos desafios que ela enfrentou todos os dias. (Palmas.)
Parabéns, Rosângela!
Na presença da Rosângela, eu queria parabenizar todas as mães: a Tatiana, todas as pessoas, a minha amiga, que também é enfermeira, a Margareth, que tem três filhos com espectro autista - parabéns, Margareth, pela sua luta, você é uma guerreira! -, e todas as pessoas que lutam, a Gisele, todo mundo, porque a gente sabe como é difícil essa lida no dia a dia. (Palmas.)
A gente tem em Brasília, Senador, um centro muito bacana, que é a Cliama. Daqui a pouco as profissionais de lá estarão falando. É o que a gente precisa que exista na rede pública. A gente fica muito triste ao ver que, como muito bem falou a Tatiana, recurso existe; tem que existir vontade política. A gente tem que mostrar que é cidadão.
Foi muito difícil para mim, muitas vezes, não poder estar aqui presente, para ouvir, para participar, porque eu não tinha quem ficasse com o meu filho. E eu sei que muitas mães não podem estar aqui também. Quando a Tatiana mostrou para mim aquela realidade, aquilo realmente foi para mim uma faca no coração. Eu acho importante mostrar para todo mundo - sabe, Tatiana? -, porque quantas pessoas estão assim encarceradas e não têm acesso a nada? Um pai e uma mãe não trancam um filho porque querem, não. Trancam porque precisam, porque o autista não tem noção do perigo. Meu filho já atravessou na minha frente uma avenida movimentadíssima. E eu cega atrás dele. Foi o anjo da guarda, a mão divina que não deixou que nem eu nem ele fôssemos atropelados. Todos os dias a gente passa por isso. Meu filho tem 17 anos. Somente há três a gente encontrou um medicamento que fosse benéfico para ele, que melhorasse os sintomas, porque não existe nem medicamento para autismo.
As pesquisas no nosso País são muito poucas. Mas temos um pesquisador brasileiro que brilha nos Estados Unidos, o Alysson Muotri, que tem feito umas pesquisas muito boas. E temos muita fé que um dia isso venha a descortinar um mundo novo para o autismo.
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(Soa a campainha.)
A SRª ADRIANA ALVES - Porque autistas que têm, depois de uma certa idade, condições de escrever um livro, de falar o que sentem, têm um mundo interno maravilhoso. Essas pessoas realmente são anjos sem asas.
Então, por mais que a pessoa autista seja adolescente, adulta ou da terceira idade - e já há pessoas com mais idade com autismo -, autista é autista a vida inteira e eles precisam ser respeitados e acolhidos.
Eu peço a Deus que um dia eu veja um sorriso, como eu vejo no filho da Tatiana, em todos os autistas. (Palmas.)
E é por isso que nós precisamos nos dar as mãos para falar sobre isso, para conscientizar esses jovens que aqui estão que eles são o futuro do nosso País, para que eles levem e sejam os reprodutores desse conhecimento, dessa desmistificação, para acabar com esse preconceito e vermos a pessoa com deficiência como uma pessoa que pode ter eficiência e eficácia no seu dia a dia.
Fora do nosso País se faz um acompanhamento - V. Exª sabe, Senador, que no Brasil as coisas são meio complicadas -, em alguns países, desses jovens. São trabalhados desde muito cedo, e as políticas públicas lá os favorecem. Então, esses jovens conseguem ter uma vida quase independente da família. Eles, de repente, conseguem um emprego mais simples, conseguem ter alguma autonomia.
Se o Poder Público olhar para isso com a eficiência que merece, vai ver, Senador, que isso é um problema de saúde pública, porque nós estamos falando aqui de uma estatística, como falou a nossa amiga Lívia, que não é a estatística oficial; é uma estatística estimada. Imaginem: se são dois milhões de autistas, quantas famílias estão envolvidas nisso? Então, quantas pessoas deixam de trabalhar, porque não têm a redução da jornada de que necessitam para acompanhar esse filho? Quantos irmãos precisam passar às vezes uma vida inteira preocupados com a gerência do futuro daquele irmão que vai depender deles a vida inteira? Se nós trabalharmos por essas pessoas, elas vão poder deixar de ser um peso para a família.
Isso não devia ser assim. O autismo não tem de ser uma sentença de vida, não. As pessoas com autismo, assim como as pessoas com qualquer deficiência, têm potencial. Elas podem, precisam e merecem ser cidadãs, porque elas pagam impostos como qualquer um de nós.
Eu queria agradecer muito, Senador, o seu apoio a esta causa e dizer que nós, do Movimento Orgulho Autista Brasil, temos muito orgulho. Esse orgulho de que nós falamos não é um orgulho no sentido pejorativo; é o orgulho que nós merecemos ter, como cidadãos, dos nossos filhos. É um orgulho que eu tenho certeza de que esta mãe linda que aqui está, a Rosângela, sente desse filho maravilhoso que é o Vinícius. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Drª Adriana, Coordenadora do "Desabafo Autista e Asperger", professora e mãe de autista, que fez também um pronunciamento emocionado aqui, bonito, a que somou, inclusive, um pequeno vídeo de combate aos preconceitos.
Que efetivamente nós tenhamos políticas públicas que atendam às pessoas com autismo, enfim, e a outras que são também discriminadas! Principalmente no nosso caso aqui, que é em relação às pessoas com deficiência, eu tenho certeza de que os jovens levam essa mensagem.
Eu sei, pois já me informaram, que os jovens têm de sair às 11h15 - são 11h10 -, pois eles têm compromisso no colégio. Por isso, agradeço muito a vocês, antes de convidar a próxima painelista, por terem vindo aqui.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Pois não; agora.
Passo a palavra, a pedidos, a Martinha Clarete Dutra, que é Diretora da Educação Especial da Secretaria da Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, do Ministério da Educação.
Ela faz questão de falar algo antes que você saia, não é isso?
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - É isso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Então, você está com a palavra.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Obrigada, Senador.
Eu pedi esse aparte porque, como professora que sou da rede pública do Estado do Paraná e do Município de Londrina, que também fica no Paraná, eu queria parabenizá-la, Ângela, por ter oportunizado, aqui, aos rapazes e às moças, que são seus alunos e suas alunas, este momento. (Palmas.)
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É uma pena vocês não poderem ficar até o final, mas eu queria deixar para você cinco cópias de uma nota técnica emitida pela Diretoria de Políticas de Educação Especial e mais cinco cópias do parecer da Advocacia-Geral da União que trata da aplicação do art. 7º da Lei nº 12.764, porque, por meio destes documentos, nós estamos orientando todos os sistemas de ensino a cumprirem, rigorosamente, o que a lei determina. Então, é um subsídio para você compartilhar com os seus alunos.
Walter, eu queria que você deixasse também um pen drive com a Ângela. Walter é o nosso Coordenador-Geral de Políticas de Acessibilidade na Escola, do MEC. Por quê? Para você compartilhar com toda a escola, esse vai no formato digital.
Eu queria muito me dirigir, diretamente, a vocês, meninos e meninas estudantes, para vocês refletirem um pouquinho. Quando a gente lê no jornal e escuta no rádio, na televisão ou mesmo lê um livro ou a gente escuta alguém que leu, escreveu, ou fala alguma coisa do tipo: "Olha, fulano de tal não sabe conversar, não sabe ouvir ninguém, ele é um autista da política"; "Olha, o fulano de tal não compreende, não entende o que é importante, é um cara que ficou cego para as ações de Governo"; "Olha, a fulana de tal ali é claudicante, não sabe o que quer da vida"; "O outro fulano lá se faz de surdo", todas essas afirmativas estão profundamente ligadas e vinculadas a um simbolismo que a nossa sociedade criou, que é o preconceito e a discriminação contra as pessoas com deficiência. (Palmas.)
Então, olhem lá. Jamais pensem que cegueira é sinônimo de ignorância. Jamais pensem que autismo é sinônimo de isolamento, afastamento, apartheid. Jamais, jamais repitam e reproduzam a ideia de que surdez vem de quem não quer se comunicar contigo. Sabe por quê? Porque a cegueira, o autismo, os diferentes transtornos do espectro do autismo, a deficiência física, a deficiência auditiva, a surdez são apenas algumas das características do ser humano, são características que compõem as nossas outras características. Isto é, todos nós - pessoas com e sem deficiência - somos pessoas únicas e singulares. Vocês não são iguais uns aos outros e não têm deficiência.
Assim, temos que compreender que somos singulares, que a nossa condição sensorial, física, intelectual, afetiva, emocional são características também, mas não são as únicas. Nós não podemos resumir as pessoas a uma característica e, mais, a uma característica que nós queremos colocar como pejorativa. Não, não podemos, porque essa é uma forma de, primeiro, negar a diversidade humana; segundo, de desvalorizar a diferença, que nos caracteriza como seres humanos.
Então, eu queria muito agradecer a vocês por terem estado aqui, embora tenham que sair antes do término, o que é uma pena, porque a gente teria muitas outras reflexões para compartilhar com vocês. Mas eu proponho que pensem um pouco sobre essas manifestações de preconceito e de discriminação e levem com vocês uma ideia de que, quanto mais a gente conviver, valorizar a diferença e a pluralidade humana, mais a gente vai crescer como cidadãos e cidadãs.
Um abraço. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Martinha. Parabéns pela fala. Eu me comprometo com você, Martinha, a fazer com que o vídeo completo desta atividade seja também encaminhado à escola, para que eles ouçam na íntegra a sua fala.
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Queria convidar os alunos, professora, num gesto simbólico da importância, para que eles saíssem por essa porta. Eles vão passar aqui, tirar uma foto com a Mesa e sair pela porta principal. Venham todos aqui na frente, por favor.
Ao mesmo tempo, agradeço à direção da Casa, do Senado, que, gentilmente, quando solicitamos, colocou ônibus à disposição para o deslocamento dessa moçada, para que participassem.
Por favor, venham aqui, atrás de nós, todos, todos, só para que fique uma foto simbólica dos estudantes aqui nesta atividade. Em seguida, o ônibus vai levá-los. Não se preocupem, o ônibus não sairá sem vocês.
Sejam todos bem vindos!
A SRª ÂNGELA FERREIRA - Essa escola que estou trazendo tem 1.700 alunos do Ensino Fundamental II e Ensino Médio. Essa turminha aqui, privilegiada, serão os multiplicadores do tema de hoje. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Feito, moçada.
Obrigado. (Palmas.)
Um abraço em cada um em seu nome, professora.
A moçada vai ter que retornar e nós vamos continuar com os nossos painelistas.
Chamamos agora a médica psiquiatra, representante da Clínica de Atendimento Psicológico a Crianças Especiais (Cliama), Drª Gianna Guiotti.
A SRª GIANNA GUIOTTI - Meu nome é Gianna Guiotti Testa. Faço questão de falar o meu último sobrenome, porque hoje eu tive de trazer aqui meu pai, que é aposentado da Casa. Eu o trouxe para não me perder aqui.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Como é o nome dele?
A SRª GIANNA GUIOTTI - Israel Testa.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Uma salva de palmas aqui.
(Palmas.)
A SRª GIANNA GUIOTTI - Eu queria falar que estou aqui hoje graças ao Dr. Aluísio, Diretor da Cliama, que muita gente conhece, um idealista, humanista que está há 18 anos na luta, com sua clínica aberta, atingindo a maturidade, propagando conhecimento, experiência. Estou, há cinco anos, acompanhando um pouquinho o trabalho lá.
Eu digo assim, acho que não é só aumento do número de casos de autismo que temos, eu acho que é um aumento da detecção também. Há muitos anos as crianças tinham problema e perguntavam: "O que ela tem?". Eu acho que não eram diagnosticadas. Tinham problemas, eram excluídas, saíam da escola. Com relação a isso, os pais de crianças mais velhas têm muito a falar, das que hoje estão acima de 20, 25, quase 30 anos. A assistência era praticamente nula.
Por isso que, já que o diagnóstico é precoce - o autismo é uma síndrome que a gente consegue detectar até os três anos de idade -, a assistência tem que ser precoce, porque a dinâmica psíquica da criança é muito variada e a gente pode intervir para que ela tenha ganhos importantes no seu desenvolvimento se a intervenção for precoce.
Veja bem, intervenção precoce. "Ah, detectamos que ela tem um espectro autista, ela tem um grau de autismo"; "Ah, vamos fazer hidroterapia, equoterapia, fonoterapia, psicoterapia". Não, gente. Não precisa encher a criança de estímulos. Vamos fazer uma avaliação do que ela está precisando neste momento: estímulo da linguagem, da socialização, da alfabetização. Então, a necessidade é muito individual. Hoje em dia a gente não vai entupir a criança de terapias, estímulos, porque pode ser pior. É uma avaliação muito peculiar, particular, que é para ser feita em família, na escola e na clínica.
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Ouvindo aqui a fala da colega, de todos os que já se pronunciaram - aliás, estou adorando estar aqui hoje, estou crescendo demais como profissional -, fiquei pensando, assim, que existe um nó. Por que na política pública, se tem esse autismo, eles foram passados ao CAPs? Porque a política de atenção à saúde mental é estruturada no CAPs, hoje em dia, no Brasil.
Eu fico pensando: o diferencial de atuar em uma clínica como a Cliama é a integração com a escola e com a família. Eu acredito que a gente, tendo clínicas, como essa clínica-escola, pioneira no Brasil, que fazem trabalhos que não estejam articulados à escola não temos tanto ganho quanto se a gente integrar essas clínicas de assistência à escola. Então, eu fiquei pensando assim: nos moldes do PSE, que é o Programa de Saúde da Escola, por que que a gente não evolui, junto com a comissão intersetorial - porque existe uma comissão do Ministério da Saúde e Educação -, e vai por este caminho, já que, pelo caminho de saúde mental eu não sei se a gente conseguiria essas clínicas integradas à escola? E é muito importante a gente integrar a escola. Crianças têm uns interesses estreitos. "Meu filho agora, no momento, está querendo saber sobre dinossauro", ou está querendo... Então vamos, todo mundo, aproveitar a escola, a família, a clínica, se ele tem esse interesse, e tentar fazer com que ele cresça e tenha ganhos cognitivos de socialização a partir daquele interesse que ele manifesta naquele momento.
Existem crianças que não vão se integrar à escola, em determinada ocasião da vida, por algum momento que ela esteja passando ou realmente pelo grau que ela tem. Eles percebem, eles sentem o mundo de forma diferente, eles sentem no sentido tátil, no sentido auditivo, gustativo, tanto é que eles têm particularidades alimentares que, às vezes, é difícil a gente entender e conseguir levar. Então, é muito importante, eu fiquei pensando nisso, talvez, essa integração dessas clínicas com a escola através do Programa de Saúde na Escola, alguma coisa nos moldes do programa.
Sábado me ligou uma mãe, isso eu queria até deixar registrado, falando que tentou uma medicação. Agora que a gente acertou uma medicação para o filho dela; na verdade, não é uma doença, não existe uma medicação para o autismo, mas eles têm determinadas situações e sintomas que a gente precisa intervir e que bom que a gente tem medicação, porque senão, às vezes, a gente teria que fazer contenção mecânica, que é ver a pessoa amarrada ali. Não é só de medicação que ele precisa, mas a medicação, às vezes, é muito importante. O acesso à medicação também. E me ligou essa mãe, sábado, falando: "Eu tentei, na Secretaria, o medicamento, mas que eles só liberam para esquizofrenia. A senhora pode fazer um relatório pra mim?". Eu falei: mas como eu vou relatar, atestar que seu filho tem esquizofrenia, se ele tem autismo? Já tem autismo há 23 anos. Então, acho que isto também é muito importante: o acesso à medicação. É bem básico, também.
Eu queria registrar a importância de integrar os serviços de educação, família e clínica. Não adianta a gente ter as clínicas de referência se elas não estão integradas à escola. Gente, os professores precisam de ajuda, eles precisam ter uma equipe para ajudar no estímulo, para orientar como que ele deve agir com aquela criança. Eles precisam de um núcleo de apoio. Talvez, um núcleo de apoio - eu sou médica de família, também - como existem os Núcleos de Apoio à Saúde da Família, talvez um núcleo de apoio à escola para as crianças com necessidades especiais de educação.
Além do Transtorno do Espectro Autista, também há as outras condições de crianças que precisam de atenção especial na educação. Se a gente não detecta, essa criança vai sair da escola, vai diminuir a autoestima, muitas vezes vai para a "drogadição", e os pais ficam desorientados, não sabem o que fazer.
Então, para nós profissionais, é muito importante e gratificante ver que estamos ajudando, que estamos quebrando o paradigma, o preconceito de que ele precisa de ajuda, precisa de tratamento, precisa de medicamento, precisa de terapia, de estímulo, ver que aquela criança está conseguindo progredir. "Não, ele tem espectro autista", mas ele está aprendendo, está se socializando. A gente ouve dos professores, dos pais: "Nossa, ele está outro, está superbem". E nos momentos difíceis, porque, como qualquer pessoa, há momentos muito difíceis, quando ele não consegue estar na escola, ele tem a clínica de apoio.
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Pensando sobre a questão do adulto, há um jovem autista, de quem gosto demais e também de sua família, cuja mãe disse que a psiquiatra era só psiquiatra da infância e da adolescência. Essa mãe chegou para mim, já tem dois anos que está comigo, e falou: "Ah, mas ele cresceu, ela não quer mais atendê-lo". Para mim foi um prazer poder atendê-lo. Acho que, por esse motivo, eu jamais abandonaria um paciente. Talvez porque eles queiram outra pessoa, porque realmente eu acho que eu não vou ter condições de acompanhar. Mas, por ser médica de família também, eu acho muito interessante fazer o acompanhamento linear ao longo da vida, e não simplesmente porque ele atingiu a maturidade, outra idade, passar a bola.
Para essas pessoas, esses jovens, que política pública a gente pode fazer? Talvez escolas como centro de convivência, ou gerentes de caso, que é um programa muito maior, muito mais amplo do que só o CAPs. Às vezes, no CAPs, se for um autista de alto funcionamento, ele precisará de um estímulo muito específico, de um cursinho de informática, de uma coisa mais pontual. Então, não adianta eu colocá-lo dentro de um CAPs. Talvez o modelo de gerente de caso, gerenciamento de caso. Existem já muitas experiências em outros países. Alguns CAPs têm esse modelo de ter um gerente de caso que faz um acompanhamento individualizado dessa pessoa, vendo o que ela precisa pontualmente naquele momento da vida.
E, por fim, as residências terapêuticas. Há a preocupação dos pais que vão envelhecer: "O que vai acontecer com o meu filho? Não posso colocar esse peso do cuidado só em cima dos irmãos." Então, talvez o modelo de política pública é que existam as residências terapêuticas, que hoje são muito pontuais, fazem parte do modelo de atenção em saúde mental, só que ainda estão engatinhando no nosso País. E as residências terapêuticas, onde as pessoas seriam assistidas, supervisionadas, mas integradas à sociedade.
Eu queria indicar um livro chamado A Escola de Vidro, que eu gosto muito de trabalhar com o professor, com o pedagogo. Quem me indicou foi uma psicóloga de escola. Ele fala realmente sobre isso, não só o espectro autista, quando a criança não consegue se adequar àquilo que é o modelo, que tem que ser o vidrinho. Se ela não se encaixa no modelinho, traz muito prejuízo.
Então, qual é o papel da saúde, qual é o papel da psiquiatria, qual é o papel da educação? Eu acho que é a gente aceitar as diferenças, e querer que os jovens e as crianças cresçam com autonomia e felicidade. Acho que todo mundo quer isso para os filhos.
Então, o nosso objetivo, na saúde e educação, é fazer com que eles tenham esse objetivo, que sejam felizes, que tenham autonomia dentro daquela capacidade que possuem.
Muito obrigada pela oportunidade. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, doutora médica psiquiatra, representante da Clínica de Atendimento Psicológico a Crianças Especiais (Cliama), Drª Gianna Guiotti. Meus cumprimentos por sua exposição, que mostra a importância desse acompanhamento, que é fundamental para nossa moçada.
Eu quero registrar a presença do meu querido Senador Hélio José, que esteve comigo naquele evento. Eu o vi lá de cima, humildemente ali, quietinho, ouvindo e tal. Estava quase na hora do encerramento, mas fiquei muito feliz de vê-lo e poder conversar sobre o tema em debate lá, que é o mesmo de hoje: as pessoas com deficiência.
Parabéns, Senador Hélio José! (Palmas.)
José Medeiros, eu já fiz os devidos cumprimentos. Agora, José Medeiros, vou passar a palavra para os Senadores, mas há uma mãe que fez um apelo aqui para a Mesa, e eu entendi que o seu apelo procede, porque ela tem que buscar seu filho neste momento na escola. O seu nome é?
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Vai falar agora então, porque estava inscrita para falar mesmo, só vamos antecipar, devido a esse motivo, a Srª Sibelle Verônica Batista Vieira, mãe de autista. Por favor.
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A SRª SIBELLE VERÔNICA BATISTA VIEIRA - Agradeço a abertura. Realmente tenho que buscá-lo. Se der a hora de ele sair da escola e eu não estiver lá, ele vai surtar e vai passar uns dois dias surtado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Claro, com certeza.
A SRª SIBELLE VERÔNICA BATISTA VIEIRA - É o seguinte: eu escutei - quero deixar bem claro que não é nada pessoal contra a pessoa que estava representando a saúde do Distrito Federal, a parte da saúde, falando sobre o que é fornecido dentro da saúde para o autismo, para o autista - e eu me senti completamente ofendida como cidadã, como mãe. Eu me senti uma alienígena. Eu vou dizer para o senhor, eu pensei assim: eu não devo estar vivendo no mesmo lugar que esse povo, não. Não há, dentro do Poder Público, alguém que ofereça tudo aquilo que foi dito aqui, não, não.
Hoje o meu filho tem uma vaga na Secretaria de Educação. O que é fornecido para o meu filho hoje, no momento, é só uma vaga na 316 Sul, sendo que eu moro no Lago Norte. Se eu colocá-lo dentro do carro e ficar uma hora e meia com ele no trânsito para chegar à escola, ele vai chegar surtado e não vai ter aproveitamento pedagógico nenhum.
Então toda aquela questão que foi falada, todas aquelas coisas bonitas que foram ditas, que falam que existe para fornecer para o autista, sinceramente, eu acho imoral deixar todo mundo que está aqui acreditar que é verdade. Isso não é verdade.
Eu trabalho na Secretaria de Educação, sou secretária escolar, e há crianças esperando há dois anos por um laudo. Você olha para a criança e sabe que a criança é autista, mas é preciso um laudo para que ela tenha atendimento especializado. Ela não tem atendimento, ela não fez sequer a primeira consulta. Aí falam: "Vamos fazer um tratamento precoce, um diagnóstico precoce." Se levam dois anos para fazer uma consulta, que tratamento precoce é esse?
Quando eu notei que meu filho estava com transtorno, eu achei que ele estava ficando surdo, eu levei a uma otorrino, e ela foi bem clara comigo: "Seu filho está com dois anos. Se você quiser ter a chance de vê-lo falar, você tem que trabalhar, estimulá-lo ao máximo até os quatro anos. Depois, cada vez vai ficando mais difícil." Agora, se eu precisasse do Poder Público para isso, meu filho não teria falado. Hoje meu filho é verbal, graças a Deus e a muito estímulo. Agora, se eu precisasse enfrentar a fila e ficar dois anos esperando pela primeira consulta, Gabriel hoje não falaria.
Então, olha, eu acho de tamanha imoralidade a gente ficar aqui falando, falando, falando que existe, que existe, que existe, se não existe. Eu me senti extremamente ofendida, extremamente ofendida. Calma aí, o que a gente está fazendo aqui? A gente quer ver a realidade. Eu, pelo menos, saí da minha casa hoje, revirei o mundo para estar aqui, para falar da realidade dos autistas, e não de mentira. O senhor concorda comigo? (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu acho que tem que falar a verdade. A verdade... Como é que a gente fala? Quem fala a verdade não merece castigo e está sendo honesto consigo mesmo.
A SRª SIBELLE VERÔNICA BATISTA VIEIRA - Pois é.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - A verdade em primeiro lugar.
A SRª SIBELLE VERÔNICA BATISTA VIEIRA - Então meu apelo está aqui. Gente, existe? Existe? Se existir, existe no papel. Vamos cair na real, vamos ver o que realmente está sendo fornecido, porque chegar aqui, dizer que existe e todo mundo calar é complicado.
Eu vou ter que entrar com um processo para que meu filho tenha uma vaga perto de casa, para que ele não surte no meio do caminho. Essa é a realidade do autista. O senhor está entendendo?
Eu agradeço o espaço. Preciso ir buscar meu filho. Muito obrigada.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Entendi. Nossas palmas pela franqueza. (Palmas.)
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Falou de um fato real, que você vive. Isso só vai ajudar, naturalmente, todos aqueles que estão aqui e que pediram esta audiência pública para construir, efetivamente, respostas para a família autista.
Essa foi a Srª. Sibelle Verônica Batista Vieira, mãe de autista, que fez o seu desabafo, mas também falou o que ela vive no dia a dia. São importantes esses depoimentos.
Vamos ouvir agora a Drª Anna Cristina Pires de Mello. Ela é psicóloga, representante da Clínica de Atendimento Psicológico a Crianças Especiais (Cliama). E, por fim, a Drª Martinha encerrará.
A SRª ANNA CRISTINA PIRES DE MELLO - Bom dia a todos!
Antes de qualquer coisa, faço um agradecimento muito especial ao Senador Paim e, em nome dele, a todos vocês pela presença. Alguém precisa abrir as portas da Casa para que a gente entre. E agradeço também pela fala a todos os colegas que se manifestaram antes de mim, especialmente a Gianna, que atua comigo lá na Cliama, que alguns conhecem, que falou em nome do Aluísio, que é o idealizador e mantenedor desse espaço no qual a gente tem a oportunidade de poder trabalhar com o acolhimento e a humanização, que são as bases da filosofia que ele professa e que nós seguimos.
Eu queria me referir à fala da colega que mostrou as pessoas presas a um leito, porque ano passado eu estive, a chamado do Governo do Estado de Alagoas, prestando uma consultoria, e foi muito trazida essa questão do autismo. Quando eu voltei para Brasília, eu disse: olha, Aluísio, ainda bem que a gente tem um programa que funciona, um lugar onde a gente realmente vê que as pessoas voltam para as suas casas diferentes de como chegaram. Pela vontade dele, existiria uma Cliama em cada lugar de Brasília e em todas as unidades da Federação. Eu vim hoje aqui não para mostrar o que a Cliama faz, mas para dizer que é possível fazer um trabalho de qualidade e que esse trabalho pode ser direcionado a partir da exigência de que um planejamento em políticas públicas seja mais efetivo.
Então, existe um clamor da sociedade, mas a Cliama é uma só; eu sou uma só e ele também é um só, por mais que seja um ser humano de um dinamismo ímpar e de uma força de trabalho incrível, porque acompanha a todos nós, sessenta profissionais da equipe e cento e poucos educandos que temos na nossa instituição. Utilizamos o termo "educandos" em lugar de alunos porque aluno significa um ser sem luz, e, para nós, o ser humano é olhado acima dos rótulos, e nós entendemos que é esse ser humano integral que precisa de um atendimento.
Como a imagem fala mais do que todas as palavras, trouxe um filme de sete minutos e alguma coisa. Se me sobrar algum espaço, eu finalizo a minha fala, mas peço que mostre o vídeo.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Vamos ao filme.
Alguém já mandou aqui no meu celular um recado, dizendo que, em relação ao que disse antes, o termo correto é: a verdade liberta.
(Procede-se à exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Quero só lembrar que esse vídeo foi feito na própria entidade, a Cliama. Ela me explicava que eles têm uma chácara em que vão acolhendo, instruindo, aprendendo e ensinando as crianças e adultos, naturalmente.
A SRª ANNA CRISTINA PIRES DE MELLO - A criança menor tem um ano e sete meses hoje; os mais adultos estão na faixa de cinquenta anos, com idade cognitiva de três, quatro, cinco aninhos.
Essa festividade do milho é para trabalhar os ciclos da colheita, início, meio e fim. As sementes eles ajudaram a plantar para o lanche de que eles vão usufruir.
(Continua a exibição de vídeo.)
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O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito, muito, muito bem. Show o vídeo!
(Palmas.)
Por favor, doutora - só lembro que os Senadores falam no momento em que entendem mais adequado -, está com a palavra agora, para concluir sua exposição.
A SRª ANNA CRISTINA PIRES DE MELLO - Eu quero dizer a vocês que, cada vez em que falo em nome da Cliama, isso para mim é uma satisfação muito grande. Enquanto as pessoas têm tipos sanguíneos, eu digo que o meu sangue já é o sangue Cliama, é uma coisa que universaliza, porque nós procuramos que todas as pessoas não sofram além do necessário e porque as famílias nos chegam imersas em muita dor, em muita tristeza e conseguem, ao longo do convívio conosco, entender que a solução pode não ser de acordo com a expectativa que tinham, mas, um dia de cada vez, é possível que melhoremos, é possível dar um passo à frente, é possível melhorar. Mas é preciso fazer isso a partir deste ser humano: pai ou mãe. Que ele se cuide, para que possa olhar para o seu parceiro e para que, dentro da mutualidade, esse casal possa conservar a família, em vez de todos olharem para a criança e deixarem os outros filhos, o que é a queixa também dos irmãos que nos chegam.
Então, o nosso propósito é o de que o grupo familiar, como uma unidade socioafetiva, realmente possa estar incluída na vida em sociedade, porque esse ser humano não responde por si hoje, e não sabemos se ele vai adquirir a autonomia necessária para responder por si mesmo amanhã. Mas, enquanto essa família subsistir, enquanto esse casal tiver a condição afetiva de se sustentar, é mais fácil que essa família também tenha continuidade.
E é em nome da família, da educação e das práticas que nos conectam à realidade que a Cliama fala para todos vocês.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Drª Anna Cristina Pires de Mello. Parabéns pela exposição, pela fala.
Ela disse: "Meu vídeo deve ter uns sete minutos, mas diz tudo". Acho que disse tudo mesmo: como interagir, como participar.
A doutora me convidou, como também os dois Senadores, para visitar a Cliama. Eu me comprometi com ela. Iremos, claro, dentro das agendas. Para nós é melhor numa segunda-feira à tarde ou numa sexta-feira, devido às votações do Plenário.
Eu quero comer aquele milho ali, porque gosto muito de milho, não tenho como dizer não. Vou comer aquele milho lá com a moçada. Ainda há milho lá?
A SRª ANNA CRISTINA PIRES DE MELLO - Sim. Na realidade, o convite não é meu, é do Aluísio, o idealizador e mantenedor da Cliama, esse ser humano que eu gostaria que todos vocês conhecessem, porque, com certeza, a vida de vocês mudaria, como a minha também mudou para melhor.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador, a Drª Martinha é a última painelista. O que acha? Nós a deixamos concluir e falamos depois ou você tem de falar agora, por compromisso já assumido, o que saberemos entender?
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Até porque talvez ela possa complementar.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Talvez possa ajudar.
Então, a palavra é sua.
O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - Sr. Presidente, senhores palestrantes, público aqui presente, pessoas que nos ouvem pela TV Senado e que nos assistem...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Senador José Medeiros falando.
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O SR. JOSÉ MEDEIROS (Bloco Socialismo e Democracia/PPS - MT) - ... pela TV Senado, que nos ouvem pela Rádio Senado e que nos acompanham pelas redes sociais, porque hoje as pessoas acompanham o Senado em tempo real, eu queria cumprimentar todas as mães de autistas, no nome da Cleide, que é esposa de um amigo meu, que recentemente faleceu, que é mãe do Otávio Vautier, no Mato Grosso, na Cidade de Rondonópolis. Infelizmente abateu-se uma tragédia sobre essa família. Ele era um pai muito amoroso, cuidava muito bem do Otávio, que tem autismo, mas em novembro ele sofreu um acidente e faleceu. A família inclusive passa por uma dificuldade muito grande, porque até então o pai era o mantenedor, mas ele trabalhava como autônomo. E desde novembro o Otávio não pode mais ir para as terapias, devido à falta do pai, obviamente, e dos recursos financeiros, e se deparou de repente com as dificuldades do setor público em suprir essa demanda que existe. Eu ouvi o depoimento da mãe aqui, Senador Paim, é um depoimento muito real e retrata o que acontece na realidade. Eu vi que ela não conseguiu se expressar e nem colocar tudo o que tem ali devido à sua indignação.
E de fato a gente sente isso, a gente sabe que existe a falta de recursos para todas essas demandas. Mas quando você vê o Estado colocar as políticas e você entra na página do Governo Federal, e mesmo na dos governos estaduais, e você sente como se o serviço fosse prestado, mas quando você precisa não consegue acessar esse serviço, realmente a população fica indignada.
E só como exemplo, o Governo Federal tem um site que trata sobre o tema. Vou ler aqui: "Viver Sem limite. O plano Viver Sem Limite estabelece a meta dos centros especializados"... E aqui fala sobre a implantação dos CERs, os Centros Especializados em Reabilitação tanto física quanto intelectual, que também dão suporte, e coloca a rede de profissionais.
O Transtorno do Espectro do Autismo (TEA) tem sido amplamente utilizado para referir-se a três condições com vários aspectos em comum:
•Autismo Infantil
•Síndrome de Asperger
•Transtorno Global do Desenvolvimento Sem Outra Especificação
O CER II atenderá preferencialmente crianças com idades até 12 anos, com Transtornos do Espectro do Autismo (TEA). Contudo, os demais usuários que apresentem idades acima da descrita, também serão acolhidos no serviço. [Agora vem o ponto que quero fixar.]
Equipe Multiprofissional CER II:
•Assistente Social
•Enfermeiro
•Fisioterapeuta
•Fonoaudiólogo
•Médico (Ortopedista e Neurologista)
•Nutricionista
•Pedagogo
•Psicólogo
•Técnico de Enfermagem
•Terapeuta Ocupacional
E mais além vem todo o cabedal legislativo sobre o tema.
De forma que eu, se sou pai de autista ou tenho autista na família, vou procurar ajuda. A impressão que o pai tem quando ele busca isso é que existe realmente isso aqui. Mas a grande verdade é que, na realidade, embora existam recursos direcionados, embora exista essa vontade, os serviços não chegaram à ponta e por diversos fatores. Inclusive, como essas ações são compartilhadas com os outros entes da Federação, como os Estados e Municípios, vemos nos Municípios uma dificuldade muito grande de implantação, Senador Paim, desses centros, desde pela burocracia normal que se tem até, às vezes, pela falta de vontade política também.
De forma que existem esses centros que poderiam, na falta de uma escola integrada, como foi colocado aqui, na falta de os Municípios terem por exemplo uma escola-modelo, como nós temos aqui o Cliama, que foi colocado no vídeo, na falta disso, esses centros poderiam ajudar muito. Porque eu tenho a impressão, e ficou bem claro nas discussões, de que a inclusão forçada, a inclusão por via do decreto, da lei, da canetada, não vai resolver, não vai dar vazão às demandas, primeiro, por falta de capacitação dos profissionais.
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Eu fui professor durante sete anos e vejo que a gente tinha dificuldade de lidar com os alunos mais extrovertidos - vamos dizer assim. O professor já tinha dificuldade de controlar a sala. Então, imagine um professor sem capacitação para tratar de crianças que têm autismo. Eu sei que os pais sabem do que eu estou falando aqui. A mãe disse muito bem aqui que ela já viu o filho entrar numa avenida de grande movimento, ela e a mãe, que já têm uma vivência. As mães se tornam verdadeiras especialistas no lidar com os autistas.
Então, Senador, eu vejo que essa indignação precisa ser externada aqui. A mãe já não está aqui. Eu só faço uma correção. Eu não coaduno com a tese de que os profissionais estão mentindo. Existem as políticas públicas e é importante que neste debate não existe ninguém mentindo. Existe aqui uma reunião importante para o debate, é importante para a gente trazer essas discussões. É importante que os entes governamentais estejam aqui, que esses atores, que são geradores dessas políticas, possam justamente captar essas dificuldades para que possamos juntos - Executivo, Legislativo, pais, profissionais - chegar a um ponto em que a situação seja mitigada, porque hoje falta tudo na ponta, Senador Paim.
Aqui se falou sobre medicamentos. A dificuldade de ter acesso a medicamentos de alto custo hoje não é nem tanto de recursos. Os medicamentos existem, mas acessar isso é uma dificuldade imensa. As pessoas, às vezes, entram num ciclo: fazem os exames, o remédio ainda não chegou, depois o remédio chega, os exames vencem e os pais ficam nessa correria. E você tem, no meio de tudo isso, aqueles pequenos detalhes que, às vezes, não são colocados na equação. Ela disse: "A escola até existe, mas levar meu filho da Asa Norte até a Asa Sul..." São essas dificuldades que há no país inteiro para ter acesso aos centros. É importante as Prefeituras terem em mente a necessidade de acesso fácil a esses locais. Então, deveriam acabar com a burocracia para ter acesso a esses remédios de alto custo, para ter acesso aos centros. Eu já vi mães chorando em alguns centros, Senador Paim, porque a recepcionista às vezes, com um zelo enorme pelas filigranas dos regulamentos e leis, joga o filho dela para ser atendido duas semanas depois, porque ela havia chegado 15 minutos atrasada.
São essas dificuldades, esses emperramentos que às vezes comprometem toda uma boa ideia. Eu vejo muito boa vontade do Governo em resolver, mas precisa ajustar essa máquina para que essas coisas possam funcionar. No caso, Senador Paim, de uma discussão que eu vi aqui a respeito de eles serem tratados em centros específicos. O Governo vai dizer com certeza se existe essa possibilidade ou não, se isso pode ser discutido ou não, mas, a meu ver, foi muito coerente o fato de que eles são bastante vulneráveis e têm que ser encarados com esse caráter específico existente. O fato de ir para o Capes, onde há outras pessoas, onde são tratados, por exemplo, adictos, viciados em narcótico, e eles estariam ali também misturados...
Então, considero importante discutirmos isso para começarmos a avançar e de repente o Governo até rever essa regulamentação. Eu sei que a regulamentação é vista no sentido de resolver o problema, mas sempre quem está fazendo tem o viés econômico também. Às vezes, o Governo coloca uma regulamentação do ponto de se estar economizando também, podendo talvez comprometer e não resolver o problema.
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Penso que não esgotaremos essa discussão agora, Senador Paim. Acredito firmemente que vamos precisar ter outras reuniões dessas, talvez até com temas bem definidos para discutirmos esses assuntos mais do dia a dia que estão afligindo as pessoas mais urgentemente, como a burocracia no acesso aos remédios, e até trazer entes também das outras esferas de Governo, como secretários estaduais ou profissionais dos Estados, para que possamos ter um resultado melhor, que possa influir mais na realidade, porque sei que para nós, do Legislativo, na velocidade do processo legislativo, é uma coisa, mas encarar esse problema do ponto de vista das mães e dos pais que estão sofrendo com isso é outra.
Então, são urgentes as necessidades. A discussão e, às vezes, a resolução dos problemas são lentos. Entendo a indignação e o sentimento de impotência que essas pessoas ficam diante de um Estado lento, que encaminha as coisas, de forma a não funcionarem. Sinto essa indignação, porque as pessoas, ao mesmo tempo, veem que há dinheiro, existem os remédios e há a possibilidade de uma resolução, mas não há resolução. Sinto-me na pele desses pais e mães com essa indignação.
Quero parabenizar, mais uma vez, o Senador Paim pela preocupação e pelo trabalho que já vem fazendo nesse sentido e filiar-me a V. Exª e aos demais nessa luta, para que possamos avançar neste tema.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Muito bem, Senador José Medeiros, que deu a sua contribuição ao debate.
Está conosco também o Sr. Fausen Domingos da Costa, Chefe de Gabinete do Deputado Wellington Luiz. Seja bem-vindo!
Antes de passar a palavra à senhora, Drª Martinha, há três perguntas que vou deixar no ar. Quem puder responder... Posso até respondê-las, mas os presentes podem complementar. Como faço sempre, leio todas as perguntas que chegam na íntegra.
A primeira pergunta é da Srª Vanessa da Silva Ferreira: Qual a possibilidade da redução da carga horária dos pais com filhos autistas sem redução do salário para acompanhá-los em terapia? É aquilo que foi dito, no meu entendimento. Isso precisa ser feito através de lei ou convenção coletiva, mas, no mínimo, por lei.
A segunda pergunta é de Paula Paz: Gostaria de saber sobre o benefício de prestação continuada do INSS para os autistas. Milhares de pais e mães param de trabalhar para se dedicarem aos seus filhos, e o INSS nega o benefício, alegando renda, porque, há um princípio claro, no sentido de que o benefício só é assegurado, quando a renda per capita da família não ultrapassa um quarto do salário. Nesse caso, de novo, isso só é possível, alterando a lei. Ela diz que é um direito e, enfim, discorda do critério. Isso também precisa passar por lei.
Por fim, o cidadão José Nogueira da Fonseca informa que está faltando alimentação nas Apaes, no Estado de Santa Catarina. Por esse motivo, os pacientes precisam ir às suas residências para se alimentarem. Aí, é claro, é necessário que haja toda uma discussão entre as Apaes e os convênios, que têm de assegurar a alimentação, para que isso aconteça.
Quero agora passar a palavra, que esperou, durante todo este tempo, tranquila, ali, como sempre, a nossa querida e competente Martinha Clarete Dutra, Diretora de Política de Educação Especial, da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Muito bom dia, Senador Paulo Paim! Quero, em nome do Ministério da Educação, agradecê-lo pelo convite, por, mais uma vez, termos a oportunidade de compartilharmos este momento com a Comissão de Direitos Humanos do Senado Federal.
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Cumprimentar também todas as pessoas presentes, as famílias das pessoas com autismo, aqui representadas pelo movimento do Orgulho Autista do Brasil e também pela Ama, e as demais organizações que se fazem representar aqui, nesta manhã; cumprimentar os demais Senadores - é muito importante estarmos juntos nesse diálogo, nessa interlocução permanente -, e, é claro, cumprimentar aqueles e aquelas que nos acompanham a distância pela TV Senado.
Eu acho que o meu papel aqui é muito mais ouvir, aprender e discutir junto com vocês, com toda a sociedade brasileira, quais são os caminhos mais eficazes para que o Brasil efetive todos os princípios contidos na Constituição Federal de 1988. Esse é um grande marco no arcabouço jurídico brasileiro, porque a nossa sociedade passa a se reorganizar a partir de 88. E, do ponto de vista da definição, formulação e implementação de políticas públicas, a nossa Constituição Federal instaura um processo importantíssimo, que é a interlocução permanente entre a sociedade civil e o Poder Público, por meio dos conselhos setoriais de políticas setoriais - Conselho Municipal de Educação, Conselho Municipal de Saúde, conselhos estaduais de cada área de política pública e também os conselhos de Direito e, a partir deles, os conselhos locais, regionais. No caso da educação, também os conselhos escolares.
Por que essas instâncias foram instituídas? Não é para ser mais um protocolo. Não. É para, definitivamente, se perceber a necessidade dessa conversa e desse aprendizado comum.
O que muda na organização da educação brasileira a partir de 88? Então, o primeiro ponto: a educação passa a ser um direito de todas as pessoas, do berço ao túmulo, independentemente da faixa etária. Desde que nascem até que morrem, todas as pessoas têm direito à educação. Esse é um ponto.
Segundo: existe uma faixa de escolaridade obrigatória. Em 88, foi fixada a faixa dos 7 aos 14 anos. Em 2009, essa faixa etária foi alterada, dos 5 aos 17. Hoje, dos 5 aos 17 anos, ninguém pode estar fora da escola no Brasil.
E qual é o tipo de estratégia que se tem para garantir o que estabelece o art. 205, que diz que a educação é um direito de todas as pessoas, independentemente da sua situação sensorial, física, intelectual, econômica, política, linguística etc.?
Então, para atender essa especificidade, o que a Constituição diz que tem que ser feito? A Constituição fala que, para que esse direito à educação se efetive, tem que acontecer em um sistema educacional inclusivo. Isso significa que todas as 200 mil escolas brasileiras, sejam elas públicas, sejam privadas, têm que garantir condições de atendimento de todas as pessoas. E aí, se essas pessoas estão no interior, ou na capital, se são populações do campo ou da cidade, quilombolas, indígenas, população negra, pessoas com deficiências, pessoas das águas, da floresta, todas essas especificidades, constitucionalmente, têm que ser atendidas. Como fazer isso, num país tão grande, com uma população tão plural, com sistemas tão distintos?
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Diz a Constituição: cada ente federado terá um conjunto de atribuições. Os Municípios têm um conjunto de atribuições, os Estados, o Distrito Federal e a União. Então, a partir da Constituição de 1988, não cabe ao Governo federal ir lá e gerenciar o funcionamento de cada política pública, mas cabe à União o cofinanciamento e as diretrizes nacionais - estamos aqui falando sobre a educação, então as orientações para os sistemas de ensino públicos e privados. Porque os sistemas privados têm liberdade de funcionamento desde que obedeçam as diretrizes gerais da educação do País e, portanto, não podem deixar de cumprir nenhum item.
Muito bem. E como isso acontece para atender as pessoas com o transtorno do espectro do autismo? Isso para a gente aqui recortar e fazer o foco da nossa discussão desta manhã.
Primeiro ponto: o Ministério da Educação estabeleceu como principal diretriz que todas as escolas têm o dever legal de fazer a matrícula. "Ah, e se recusar?" Se recusar, temos a Lei nº 12.764, conquista da sociedade brasileira, representada pelas famílias que aqui estão, e obra desta Casa, do Congresso Nacional. Diz lá, no art. 7º, que cabe uma multa de três a vinte salários mínimos.
Como é que essa multa vai ser cobrada? O Decreto nº 8.368 diz que cada ente federado, que é responsável pela autorização, pelo credenciamento da instituição de ensino, cabe também a regulação, a fiscalização e aplicação da multa.
Como fazer? É este documento que o MEC publicou na sexta-feira, porque temos que orientar como isso acontece, porque até hoje ninguém nunca cobrou uma multa. E é muito importante que a gente tenha esse tipo de regulamento, esse tipo de norma. Por quê? Porque inibe, coíbe e pune quem tenta cercear o direito das pessoas com deficiência à educação.
Então, a Diretoria de Políticas de Educação Especial da Secadi, do MEC, fez uma consulta à Advocacia-Geral a União: com base no pacto federativo brasileiro, a quem compete cobrar essa multa? O MEC pode cobrar essa multa de uma escola de educação infantil lá do Município de Florianópolis? O MEC pode aplicar uma multa a uma escola de ensino médio aqui do DF? Não, não pode. Então, o que a AGU respondeu e nós trouxemos aqui para compartilhar com vocês, que é esse parecer da Conjur, da Consultoria Jurídica? Esse parecer tem treze páginas, traz toda uma fundamentação legal, na primeira parte, com base no art. 7º da Lei nº 12.764, e, depois, na segunda parte, a Advocacia-Geral da União diz o seguinte: que o Ministério da Educação é responsável pelo sistema federal e pelas universidades privadas do País. Então, toda vez que houver uma recusa de matrícula no âmbito dessas instituições federais de educação básica ou superior ou de educação superior privada, essa denúncia deverá ser feita ou diretamente ao Ministério da Educação ou ao Ministério Público Federal mais próximo da residência do denunciante. Ao receber essa denúncia, tanto faz por meio do Ministério Público ou diretamente pelo MEC, a Secadi, que é a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, instaurará esse processo e coletará essas informações detalhadamente conforme a legislação que rege os processos administrativos - isto é, dando o direito de cada se manifestar em um devido processo legal. E à Secadi caberá um parecer conclusivo e o encaminhará para a AGU, que cobrará a multa.
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Então, no âmbito federal, isso já está definido, e a Advocacia-Geral da União, mediante um parecer conclusivo da Secadi e do MEC, fará a aplicação dessa sanção.
E como tem que acontecer lá no Município? No Município, analogamente, caberá à Secretaria de Educação instituir esse procedimento na atribuição que lhe cabe: se é educação infantil, anos iniciais do ensino fundamental, ou finais. De repente, tem rede municipal que é responsável por todo o ensino fundamental, tem rede municipal que é responsável pelos anos iniciais. Educação infantil é sempre o Município. Pouquíssimos Estados fazem. Quem é que autorizou a escola? Se aquela escola é privada, quem autoriza é a rede responsável: ou é a Secretaria Municipal ou é a Secretaria Estadual ou, no caso do DF, o que significa os dois. E, no caso da escola de ensino médio, é o Estado normalmente.
Então essa instância instaurará o processo, dará sempre notificação ao Ministério Público nesse caso do Estado, para que acompanhe o procedimento, e igualmente incumbirá a sua procuradoria, que é um setor homólogo à AGU, para fazer a cobrança da multa.
Essa orientação está dada por meio da Nota Técnica nº 20, que foi emitida pela Diretoria de Política de Educação Especial do Ministério da Educação, para que todos os Municípios - e ela já foi enviada para todas as secretarias de educação do País - normatizem esses procedimentos para dar celeridade a essa sanção prevista no art. 7º.
Outro aspecto importante: o profissional de apoio e o profissional de atendimento educacional especializado.
Então, no âmbito da educação, existem hoje essas duas figuras que devem apoiar a escolarização das pessoas com deficiência. E essas duas figuras estão regulamentadas pela Resolução nº 4 do Conselho Nacional de Educação. Por isso ela não consta especificamente do Decreto nº 8.368, porque na Resolução nº 4 ela está especificada.
Então quem são essas figuras? O professor do atendimento educacional especializado é de fato aquele responsável pelo estudo de cada caso, considerando que cada pessoa tem uma singularidade, um conjunto de características próprias. Então cabe ao professor o estudo do caso juntamente com a família.
Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Martinha, permita-me.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Eu vou explicar e a senhora vai continuar a exposição, porque depois vamos ter as considerações finais de cada um. Ainda tem a doutora... A mãe de autista, Drª Gisele de Freitas, que pediu a palavra e vai usá-la.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Pois não.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - Deixe-me explicar rapidamente para vocês.
Particularmente, estou passando por um momento muito complexo da minha vida política. Tanto que nesse momento, em Porto Alegre, o Santos Fagundes, que você conhece, que é sério...
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Claro, é claro que sim.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - ...está me representando numa reunião na direção estadual do Partido com relação à minha posição e às duas MPs que vocês estão acompanhando, a 664 e a 665, que tratam do direito do trabalhador e do aposentado. E eu estou... Não gosto das MPs. Vou resumir aqui porque isso não é muito do debate. E o Santos Fagundes está lá me representando e explicando por que eu quero mudar as MPs em relação aos aposentados, trabalhadores e deficientes.
O Luciano, que também é cego, está aqui, não é, Luciano?
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Luciano, eu trouxe um pen drive para você.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco Apoio Governo/PT - RS) - O Luciano é quem escreve os meus pronunciamentos. Grande parte ele escreve, principalmente, é claro, na área que ele mais conhece e sente no dia a dia. Ele está aqui e vai ficar aqui com vocês. Eu tenho que estar em São Paulo, às três horas, para conversar com o Presidente Lula. E quero também de público dizer que era de manhã essa conversa com ele, mas eu expliquei sobre a reunião com os autistas. Ele, de pronto, transferiu a agenda dele para me receber às quatro da tarde em São Paulo, para falar sobre essa situação em que estou no meu campo político.
Então eu peço desculpa a vocês. Vou ter que sair nesse momento, mas vai ficar aqui com vocês o meu querido amigo e Deputado Hélio José, que prontamente, sabendo dessa questão, fez questão de vir aqui. Eu vou correr para o aeroporto. E, nesse debate, ele vai ficar até o final, dando o espaço necessário para que todos possam, além da nossa querida doutora, fazer as suas considerações finais. Vocês permitem que eu me retire, então, devido a essa minha situação?
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A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Claro. Boa viagem, Senador.
O SR. PAULO PAIM (Bloco Apoio Governo/PT - RS) - E que dê tudo certo.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Leve um abraço nosso ao Presidente Lula. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Bom tarde a todos. Sou o Senador Hélio José, pelo PSD do Distrito Federal. Para mim, é muito prazeroso estar aqui substituindo, provisoriamente, o nosso Senador Paulo Paim. Sou membro titular desta Comissão de Direitos Humanos e estamos juntos, aqui, debatendo assuntos importantes para o Brasil.
Para mim, Martinha, você, que é uma trabalhadora do nosso Ministério da Educação, uma servidora que está desempenhando tão bem as suas tarefas, é um prazer estar ouvindo você. Depois, vamos encaminhar para os debates de conclusão a respeito desta importante audiência pública sobre um problema tão grave que atinge o nosso País, que é o autismo, que atinge tantas famílias e não escolhe cor, idade, pessoa - não escolhe: vem - e é o problema de todos nós e que precisa ser visto com muita tranquilidade, com muita responsabilidade, como está sendo colocado aqui pelos representantes do setor.
Estive ouvindo um pouco a explanação da Anna Cristina e da Gianna Guiotti e pude ouvir apelo de uma mãe, que é a Sibelle. Não tive condições de ouvir a Adriana Alves, porque tive um compromisso inadiável. Eu estava em outro compromisso ali, mas vim atender o nosso querido Paulo Paim, porque esta audiência é de alta relevância, importante para acompanhar e encaminhar, da melhor forma possível, essa regulamentação da Lei dos Autistas e todas essas questões que aqui estão sendo debatidas.
Então, volto a palavra para você, Martinha.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Obrigada. Seja muito bem-vindo entre nós. Acho que, quanto mais conseguirmos envolver nossos Parlamentares, nossos gestores com as famílias, com as organizações, mais nós vamos ganhar nesse processo. Porque nenhuma lei, nenhum, decreto, nem a Constituição se tornam realidade em nossa vida se nós não tivermos o compromisso e o engajamento, nos locais onde nós atuamos, de trabalharmos juntos. Por quê? Porque nós temos que mudar a mentalidade: a mentalidade das pessoas, a mentalidade da sociedade, e mudamos mentalidades na medida em que envolvemos as pessoas. A escola é feita de gente, o sistema de saúde é feito de gente, e são as pessoas que reproduzem preconceitos ou praticam o conceito da valorização da diversidade humana, não é verdade?
Por isso, não adianta achar que o mundo é o ideal. O mundo não é o ideal. Só que o que nos mantém nesse mundo são os desafios. O que nos faz avançar no dia a dia? São os desafios. Não podemos abrir mão, não podemos desistir nunca de construir uma sociedade melhor, e, para mim, uma sociedade melhor se constrói com política pública efetiva. Por isso, também não podemos desistir de tornar a política pública neste País um direito de todas as pessoas - todas -, sem distinção.
Então, continuando o meu raciocínio: existem duas figuras regulamentadas na Resolução nº 4 do Conselho Nacional de Educação. Sobre uma, eu já explanei: o professor do atendimento educacional especializado. É ele que, em contato com as famílias, com os professores das classes comuns, com a gestão da escola, vai fazer esse estudo de caso e propor o plano de atendimento educacional especializado. É nesse momento que esse profissional vai identificar, com a ajuda da família da própria pessoa com deficiência, se há necessidade de interface com a área da saúde, com a área da assistência social, transporte e todas as outras áreas de políticas públicas, e deverá promover essa articulação.
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Existe outro profissional também regulamentado, que é o profissional de apoio, profissional de apoio para as atividades de alimentação, de mobilidade ou de higiene. Esse é um profissional da escola, que deverá ser formado de acordo com a necessidade de quem ele vai atender, porque a gente sabe que cada pessoa com deficiência tem uma especificidade: vai ter uma pessoa que vai usar uma sonda, para fazer sua higiene pessoal; vai ter uma pessoa que vai usar uma sonda para fazer a alimentação; e vai ter uma pessoa que não vai usar uma sonda, mas vai usar uma fralda, mas vai precisar de uma ajuda para se locomover. Então, quer dizer, dentro da especificidade, como é que recomenda que esse profissional tenha uma formação intersetorial, transversal, multidisciplinar de acordo com a atividade que ele vai precisar prestar - não é verdade? Então, por quê? Exatamente para se adequar à necessidade do outro, e não o contrário.
Outro aspecto importantíssimo: a educação regulamentou, por meio da LDB, o atendimento escolar domiciliar e hospitalar. Então, toda vez que a pessoa com autismo precisar se ausentar da escola porque está em casa em algum tipo de tratamento por alguma razão, ou está numa clínica por alguma razão, fazendo ali um tratamento que vai perdurar "x" tempo, ele não deve ter o atendimento escolar interrompido. Por quê? Porque precisamos garantir essa continuidade. Esse atendimento deve ser, sim, adequado àquela condição, se lúdico, à faixa etária, à etapa de ensino e, principalmente, à condição daquela pessoa. Mas a escola legalmente deve ter esse planejamento para atender a pessoa em casa - em domicílio, não é? - ou no hospital, ou numa clínica. Então, todas essas estratégias e regulações foram criadas para atender ao máximo a especificidade de cada pessoa presente na escola.
Outro aspecto importante, que aí o Ministério da Educação tem feito um apoio sistemático ao sistema de ensino e sempre de acordo com a demanda que vem de lá - nunca daqui para lá, sempre de lá para cá -, é exatamente a contribuição na disponibilização de recursos de tecnologia assistiva, adequação arquitetônica e formação do professor. Essa é a mola propulsora. Ninguém muda sua prática pedagógica, seu projeto pedagógico de escola, se não houver um fundamento, se não houver um conhecimento, um estudo, uma ancoragem teórica e prática. Então, por essa razão, o MEC cofinancia esse programa nacional de formação continuada. Mas quem tem que organizar essas ações todas de oferta do AEE, de oferta da formação, inclusive envolvendo toda a comunidade escolar, é a rede local.
Então, por isso, minha gente, nós precisamos tornar esse debate aqui um debate que seja capilarizado lá no Município envolvendo os gestores e as famílias para estudar cada caso, porque cada caso é um caso, e nós não podemos generalizar que nenhum Município organiza nenhum tipo de ação e nem generalizar que todos os Municípios vão muito bem, obrigado. Não. Nem um caso é real nem outro.
Agora, de posse dessa...
(Soa a campainha.)
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - ...informação que essa regulamentação que hoje está dada pela própria Lei nº 12.764, que explicita, reafirma e complementa, como é que vai funcionar no Município de 15 milhões, vamos supor, de habitantes? E, no outro, de dois milhões? E no outro, de dez mil, de três mil? Então, cada Município tem uma realidade própria, cada Município tem uma rede própria de educação. E é ali naquela rede que nós vamos aprimorar esse processo permanentemente - permanentemente. E não há por que a gente desistir da implementação da política pública e desincumbir o Estado, porque toda vez que a gente desincumbir o Estado, primeiro, nós vamos segregar, apartar a pessoa com deficiência e sua família e, segundo, nós vamos tirar a responsabilidade da sociedade de se transformar e, principalmente, de se habilitar como uma sociedade cidadã, solidária, justa, com igualdade de condições para todas as pessoas.
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Então eu quero encerrar mostrando para vocês alguns dados - os últimos - da educação das pessoas com autismo no Brasil. Assim eu encerro e fico à disposição. Eu tenho aqui um sistema de voz na minha mão que vai me permitir acompanhar o que vamos colocar na tela.
Na primeira tela, nós temos um gráfico que mostra o atual número de matrículas de pessoas com deficiência em geral na educação básica. Então nós temos ali, começando em 2003, 504.039 matrículas com 29% de inclusão. E a gente chega a 2014 com 886.815 matrículas e 79% de inclusão.
Aí vocês perguntam para mim: e daí?
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Martinha, só um instantinho, porque tivemos um problema técnico e a tela não está...
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Ela não mostrou?
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - ...passando. Isso. Mas vai resolver agora, nesse instante.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Ah, então está bom.
Aí vocês perguntariam: mas e daí? Daí que nós temos, primeiro, que superar o preconceito e a discriminação no direito ao acesso. Então nós não podemos permitir que nenhuma matrícula seja recusada. Só que não basta ter matrícula; tem que ter atendimento de qualidade.
Então, para mim, hoje, o grande desafio que nesse 2 de abril a gente precisa reafirmar é esse pacto para atuarmos juntos, lá na ponta, para que de fato todas as pessoas que estiverem no sistema tenham atendimento. E quem não estiver que venha para o sistema.
Com o TGD, a gente está na tela?
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Já. Agora os gráficos já estão na tela.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Então o primeiro gráfico, vocês veem que tem duas linhas: uma que diz respeito às matrículas em classes comuns em escolas públicas e privadas; outra se refere às matrículas em classes e escolas especiais. Depois eu quero falar do papel de cada uma dessas instâncias.
No segundo, nós vamos falar só de matrícula de autistas.
Em 2003, 2009... Por que 2009? Porque é a partir de 2009 que o MEC passa a coletar essa informação no censo escolar. Antes era uma informação geral. Então a partir de 2009 a gente especifica autismo, Asperger, todo o espectro.
Então, em 2009, a gente tinha 59.480 com 82% em classes comuns do ensino regular. Em 2014, 83.307 com 83% de inclusão.
O que é importante notar? Primeiro que hoje a gente tem como acompanhar esse histórico das crianças, adolescentes, jovens e adultos que se declaram com autismo no ato da matrícula. Segundo, a gente tem como direcionar para o sistema de ensino os cursos de formação, priorizando as escolas com matrículas de crianças, adolescentes, jovens e adultos com algum tipo de autismo para os cursos nessa área. Então isso ajuda na formulação no planejamento da ação.
Aí a gente vem na educação superior, próximo gráfico. O próximo é um gráfico geral. A gente sai de 5.078 em 2003 para quase 30 mil em 2013, que é o último censo da educação superior. E quem se declara com algum tipo de transtorno global do desenvolvimento na educação superior. Aí é outro gráfico. Em 2014, 2.767 na educação superior. Deixe-me ver se falei bem. Duzentos e sessenta e sete. Perdão. Duzentos e sessenta e sete.
Então é um número muito pequeno. Por quê? Será que as pessoas não estão se declarando ou as pessoas não estão chegando? Creio que as duas coisas. Então hoje é um direito de todas as pessoas com deficiência atingir os níveis mais elevados de ensino. E à medida que nós efetivarmos e fortalecermos a qualidade da educação básica, as pessoas com autismo terão mais condições de exposição, motivação, para chegarem à educação superior e se darem bem.
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A última tela, e com a qual quero finalizar, mostra o link do Ministério da Educação para todos do Brasil inteiro, todos que nos acompanham a distância e aqui presentes, poderem acessar tanto o parecer da consultoria jurídica da Advocacia-Geral da União sobre o cumprimento da sanção, mediante recusa de matrícula, quanto a Nota Técnica nº 20, do Ministério da Educação, que orienta os sistemas de ensino para aplicação dessa multa. Acho que uma sociedade instrumentalizada, munida e informada tem mais condições de fazer o controle social e, principalmente, de atuar em conjunto.
Então, fico à disposição, assim como toda a nossa equipe do Ministério da Educação.
Mais uma vez agradeço, Senador, pela oportunidade e a vocês, pela atenção.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Pessoal, vamos ouvir agora a Srª Giselle de Freitas, mãe de dois autistas e representante da coordenação do movimento Tudo Azul.
Três minutos, Srª Giselle, por favor.
A SRª GISELLE DE FREITAS - Boa tarde. Serei breve.
Fico muito feliz de estar aqui e poder representar o grupo do qual faço parte, Tudo Azul. Externo também todo o meu respeito pelo Moab e outros grupos que me receberam na hora que mais precisei. Todas essas políticas existem. O COMPP, por exemplo, me atendeu, atendeu meus filhos, porque faço parte dos pais que não têm um carro para levar os filhos para escola, faço parte dos pais que não têm dinheiro para pagar um bom atendimento como o da Cliama, faço parte de uma realidade onde apenas temos vivências parecidas, mas não realidades.
Então, com todo o meu respeito - e fico feliz por estarmos lutando pelo mesmo fim -, posso dizer que, com certeza, nem todas as políticas que estão lá, que estão escritas lá chegam aqui, chegam a nós. Muitos pais que nós atendemos no grupo, que o próprio Moab já recebeu, que o COMPP recebe, fazem parte de casos não só de saúde pública como de direitos humanos. São pais que estão com fome, com sede e que têm que vir para um tratamento. O meu filho é uma criança auto e heteroagressiva, meu filho caçula. Sou mãe de três filhos: Ana Beatriz, neurotípica; Richard, autista; e Andrey, asperger. Fui bem premiada e agradeço a Deus, porque ele me fez ver o universo, as pessoas, lugares que jamais poderia imaginar.
O que quero dizer é que não é nenhuma história bonita. Não tenho nenhum glamour por estar aqui falando, passando na TV Senado. O que tem é a triste realidade de que o único lugar, em Brasília, que atende as pessoas que não têm condições de pagar é o COMPP. Portanto, a demanda é enorme, é monstruosa.
Tive, por sorte, não sei, um diagnóstico precoce dos meus filhos, através da Drª Rosa, e foi a grande salvação. Não foi tratamento. Não foi a escola sozinha. Houve um trabalho. Todo ano a gente sofre com os pais. Quem será o professor do meu filho? Será que ele quer trabalhar? Será que ele vai topar fazer tal projeto? Será? Será? Eu não pago conta com "será". Não é "talvez", não é "por favor". A Constituição, no preâmbulo, e nem precisava de tanta lei, se a gente pudesse respeitar e ter respeitado que todos somos iguais perante a lei... Que "igual" é esse?
Hoje, represento cidadãos brasileiros, represento aqui, com todo o meu respeito, cada associação deste País, Berenice Piana, Ulisses da Costa, Fernando Cota, Adriana, Lucinete Andrade, Leide Araújo, Presidente do Grupo do qual faço parte, e outras e outras pessoas, professoras geniais...
(Soa a campainha.)
A SRª GISELLE DE FREITAS - Só mais um minutinho...
que brigam, porque muitos não querem, não querem. Hoje o meu filho, além de autismo, tem transtorno positivo desafiante. Lutei ano passado pela bidocência, busquei caminhos para que ele pudesse ser atendido e respeitado como cidadão de direito e não como autista, porque o autismo é só a condição de nossos filhos, mas não os define.
Muito obrigada.
Boa tarde. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Pessoal, vamos passar aqui para as considerações finais.
A primeira, na Mesa, Tatiana Roque, por favor. Três minutos, Tatiana, por favor.
A SRª TATIANA ROQUE - Eu queria, mais uma vez, agradecer esse momento por estarmos aqui para discutir tantas coisas importantes.
Como a Giselle falou e como a Sibelle falou também, as duas mães que falaram a questão da realidade, isso nos deixa muito preocupados. Ficamos muito preocupadas, porque, realmente, a lei existe, os decretos existem, os locais existem, mas, como ela bem falou, aqui, em Brasília, são poucos os locais que atendem. A nossa demanda é muito grande. Nós não temos condições de atender todos os nossos autistas. Quando a gente exige a total regulamentação da lei, quando a gente exige a construção dos centros especializados, esse é um direito dos nossos filhos. Como eu falei em minha fala, ninguém está pedindo nenhum favor, a gente pede que eles sejam respeitados. Como a Giselle bem falou, existem muitos casos de famílias com rendas baixas e que precisam do Governo, mas não têm esse apoio, essa assistência, e mostrei a foto daquela criança amarrada ao leito. Então, essa realidade é a nossa, infelizmente.
Como falei, estamos aqui para lutar pelo coletivo. Para o coletivo, a realidade é outra, e a gente tem que ir atrás disso. A Cliama faz um trabalho muito bom, muito interessante, mas não atinge a totalidade. A Cliama atende não só autistas. Atende outras patologias, e isso, às vezes, deixa a gente um pouco preocupada. Há alguns casos que têm evolução, que têm progresso; outros, não.
Para finalizar, a questão de que a Drª Martinha falou muito bem.
Doutora, que bom que já há fiscalização em relação às escolas particulares, porque, infelizmente, a nossa realidade é que não aceitam e, quando aceitam, não estão preparados para atender as nossas crianças. Os profissionais não são capacitados.
(Soa a campainha.)
A SRª TATIANA ROQUE - O professor, ele não quer atender, ele tem a opção de não atender, e isso é preocupante. Eu tenho vários casos de mães, porque eu faço parte de vários grupos além do Moab, que relatam que passam um ano para conseguir um atendimento na Precoce e não conseguem; um ano para conseguir atendimento no COMPP e não conseguem. Por quê? O problema está no COMPP? Não, está todo na estrutura. Faltam profissionais para atender a nossa demanda.
Eu queria mais uma vez agradecer e pedir que nossas reivindicações sejam atendidas, sejam lembradas, sejam discutidas. Com certeza, nós vamos ter outros momentos para dar continuidade a nossas reivindicações.
Obrigada, bom dia. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Srª Tatiana, com certeza, serão consideradas, lembradas, porque senão não estaríamos aqui. É muito importante ouvi-las. Eu sou pai de uma filha com TDH. Sei o que são os preconceitos e a dificuldade que é para acompanhar tudo isso. Pode contar com a nossa Comissão de Direitos Humanos. No que puder, nós vamos ajudar.
Eu vou alternar democraticamente as duas Mesas. Passo para Adriana Alves, Coordenadora do Desabafo Autista e Asperger. É isso mesmo?
A SRª ADRIANA ALVES - Asperger
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Professora e mãe de autista.
A SRª ADRIANA ALVES - Isso.
Pode ser "asperguer" também. Vem do alemão. A pronúncia também pode ser essa. Está correto.
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Muito obrigado, Adriana.
A SRª ADRIANA ALVES - Então, como eu havia falado antes, não viemos aqui para brincar, mas para falar de coisas que, para nós, são muito sérias, que fazem parte do nosso dia a dia. Quando falamos sobre autismo, trazemos uma carga emocional muito grande, porque vivenciamos isso. Sou mãe, sou profissional também, sou professora, sou docente e vivencio essa situação. No Desabafo Autista e Asperger, vemos que, para a realidade das famílias, a lei só existe no papel. A gente fica muito se sentido próximo ao sentimento da Sibelle Verônica, que teve que sair mais cedo para buscar o filho. Eu pedi licença aqui para falar um pouco antes da ordem, porque eu também, Senador, tenho que sair para buscar meu filho na escola.
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Na prática, toda essa beleza que a gente vê falando nos gráficos, não faz parte da nossa vida, não faz parte da vida do meu filho, não faz parte da vida do filho da Sibelle, não faz parte da vida de muitas outras pessoas que aqui não estão porque não podem vir, não porque elas não saibam desse evento, mas porque não têm condição, não tem com quem deixar seus filhos. A escola para elas não é uma opção.
Há pessoas, como ela falou, há dois anos esperando uma vaga para ser atendido no COMPP, para ter um diagnóstico. Que tratamento precoce é esse? São dois milhões de pessoas, por uma estimativa aproximada, mas, creiam, é muito mais, muito mais do que isso. Multipliquem isso pelo número de mães, pais, familiares...
Realmente, nós precisamos provocar esse debate. Por isso, estamos aqui hoje.
Gostaria de terminar falando que o Movimento Orgulho Autista existe com a finalidade de conscientizar as pessoas sobre o que é o autismo, e vamos continuar nessa batalha para que a gente consiga a acessibilidade atitudinal, que é mudar a atitude das pessoas. Não precisamos de rampa para autista. Claro que, para o autista, pode não ser só o autismo. Muitas pessoas com autismo têm outras coisas também, como o transtorno opositor, entre outras. Mas, principalmente, o que o autista precisa é que as pessoas conheçam o autismo e parem de encarar o autismo como se fosse uma coisa que as famílias têm que se virar sozinhas: "Não, a gente já tem isso aqui. Vamos aproveitar o que a gente já tem". Não! A gente não vai calar. A gente vai continuar falando. A gente vai continuar vindo a essa Casa, porque principalmente esta Casa é uma Casa do povo, e a gente considera essa como uma Casa nossa também, não só aqui, no Congresso Nacional, como na Câmara Legislativa - e, aqui, nós temos presente um representante de um Deputado, o Deputado Wellington, que, sempre que possível, nos apoia. A gente vai continuar buscando esse apoio, porque os homens e as mulheres públicas do nosso País nunca vão saber o que nós precisamos se nós não formos lá e dissermos a eles. Então, nós somos cidadãos, cidadãs e os nossos filhos também, e a gente precisa mostrar isso todos os dias, se for possível.
Gostaria de agradecer por essa ocasião e dizer pra vocês que, por favor, não se calem, continuem falando. Vamos fazer como a Sibelle. É difícil a gente falar daquilo que não é agradável para os outros ouvirem, mas é a nossa missão. A gente não está aqui, como eu falei, por um outro motivo. É uma coisa muito séria.
Então, obrigada e uma boa tarde a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Obrigado, Adriana Alves e Tatiana Roque, que falou anteriormente.
Eu queria passar agora para a Srª Lívia Magalhães, Diretora Jurídica do Movimento Orgulho Autista Brasília, Moab. Por favor, três minutos, Drª Lívia.
A SRª LÍVIA MAGALHÃES - Agradeço em meu nome o convite da Comissão de Direitos Humanos para participar da presente audiência pública, e agradeço em nome também dos autistas do Brasil e seus familiares, e debater esse tema que é tão relevante e que, com certeza, não ficará só por aqui. Nós vamos debatê-lo em outras oportunidades.
Eu ressalto, aqui, por fim, que o nosso foco é desenvolver iniciativas que garantam o acesso de todos os autistas, tanto à educação escolar pública, para todas as idades, seja educação básica, seja ensino profissionalizante... Não podemos esquecer dos autistas adultos também. Só falamos de crianças, mas os adultos precisam também desse amparo e das políticas públicas. Que essa educação escolar seja adaptada às reais necessidades dos autistas! Nós lutamos também para que haja informação e preparação dos profissionais, tanto da área de educação, quanto da área de saúde, dos familiares e da população como um todo.
As pessoas têm pouco conhecimento sobre o transtorno, e essa política de conscientização é, sem dúvida, primordial para que todos possam conviver da melhor forma possível para que a inclusão realmente seja efetiva. Para tanto, nós continuaremos lutando pela regulamentação adequada da Lei Berenice Piana, principalmente quanto aos centros especializados na rede pública de saúde, para que haja um tratamento integrado da educação e da saúde para os autistas. Como a Drª Gianna pontuou, realmente, esse tratamento integrado de educação e saúde é muito importante. A qualificação dos profissionais é primordial também para que haja um acompanhamento e um tratamento bem eficaz para os nossos autistas.
Desejo uma boa tarde a todos e nos veremos nas próximas oportunidades.
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O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Obrigado, Drª Lívia, pelo pronunciamento.
Vamos passar, agora, para a Drª Gianna Guiotti, médica psiquiatra, representante da Clínica de Atendimento Psicológico a Crianças Especiais, Cliama.
A SRª GIANNA GUIOTTI - Eu queria agradecer a oportunidade, na pessoa do Dr. Aluísio, Diretor da Cliama, de estar aqui, hoje.
Quero esclarecer que a instituição ideal não é aquela em que a criança se adapta a ela, mas, sim, a que tem certa flexibilidade e se adapta à necessidade da pessoa e da criança. Assim, misturar crianças e jovens com diagnósticos diferentes não tem tanto problema, desde que, dentro da dinâmica da instituição, possamos oferecer algo que proporcione um crescimento que seja viável para a criança. Quando recebemos um caso que pode ser diferente, pode ser difícil de acompanhar, temos uma discussão em equipe e vemos se será possível acolher.
O que é muito bonito de ver são as faixas etárias diferentes, como a Anna Cristina falou. Temos crianças de menos de dois anos, jovens, adultos já maduros, quase beirando os 50 anos. Há troca de experiência entre as famílias, nos grupos de famílias que a Ana tocou. Os jovens, os maiores acolhem, ajudam as crianças pequenas. Isso é muito rico, ajuda na socialização. Não se preocupem se vai haver misturas. Tudo bem, para determinadas patologias, não dá certo mesmo. Não vou misturar com pessoas em recuperação de dependência química. Nesse caso, realmente, não estaria bem adequado, só que, de outras formas, passando por uma discussão técnica, se vermos que é viável, é muito rico.
Quanto à evolução, se há progresso, acho que isso é uma coisa que todo mundo que trabalha com uma condição crônica tem que estar sempre se perguntando. Então, a equipe tem que estar se reavaliando, vendo o que pode fazer, e isso é muito rico. A gente tem que estar sempre se criticando, se questionando, para não "cronificar" junto com a pessoa.
Por fim, eu queria dar um recado aos pais, aos familiares, aos educadores: acho que realmente estamos evoluindo. Falta muito coisa ainda, mas estamos evoluindo. A representante do Ministério da Educação mostrou como era muitos anos atrás. Está diferente. Acho que temos que nos unir, falar, brigar e lutar mesmo.
Obrigada!
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Quero agradecer á Drª Gianna Guiotti e passar para a Drª Márcia Cristina Lima Pereira, Chefe do Núcleo de Autismo do ITGD, da Secretaria de Educação do Distrito Federal, saudando o meu querido Deputado Wellington. Sou Senador pelo Distrito Federal, pelo PSB, e Wellington, Deputado Distrital. Ele está aqui sendo representado pelo Fauser Domingues da Costa. Meu abraço para o Wellington. Também está representando, aqui, o Fernando Cotta, Diretor-Presidente da Moab.
Vamos ouvir, agora, a nossa querida Drª Márcia Cristina Pereira.
A SRª MÁRCIA CRISTINA LIMA PEREIRA - Obrigada, eu queria desejar uma boa tarde a todos e agradecer, mais uma vez, o convite e a oportunidade de estar aqui, não só em meu nome, mas no de toda a equipe que componho, a minha Coordenadora estava presente, a Coordenação de Educação Especial da Secretaria de Educação do Distrito Federal.
Quero dizer que, nesta tentativa de avançar nas políticas públicas de educação, estamos finalizando a elaboração de uma minuta de portaria que regulamente esse acompanhante especializado dentro da Secretaria de Educação do Distrito Federal, visto que esse profissional que já foi citado até pela Martinha, esse profissional de apoio anterior, infelizmente, no caso da Secretaria de Educação, estava restrito ao apoio na alimentação, na locomoção e na higiene, o que nem sempre contempla as necessidades da pessoa com autismo, que, às vezes, precisa de uma medida de ação mais pedagógica. Na regulamentação, vieram as questões de interação social também e de comunicação. Então, vamos tentar regulamentar um outro profissional, de preferência professor. Estamos pleiteando junto à Secretaria de Educação que seja professor esse acompanhante especializado.
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Espero que a gente consiga avançar nisso, que a gente tenha êxito nessa empreitada. Temos outras construções pensadas, mas inicialmente o nosso investimento maior é no acompanhamento especializado. Espero ter essa boa notícia antes de desocupar este cargo e voltar para a escola, que é a minha função como professora.
Obrigada.
Boa tarde a todos.
Espero dar uma boa notícia ainda este ano. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Queria agradecer à Drª Márcia Cristina Lima Pereira pela belíssima exposição e passar a palavra à nossa querida Anna Cristina Pires de Mello, psicóloga, representante da Clínica de Atendimento Psicológico a Crianças Especiais do Cliama.
A senhora dispõe de três minutos, por favor.
A SRª ANNA CRISTINA PIRES DE MELLO - Então, novamente, gostaria de agradecer a oportunidade de ter aprendido tanto com as falas de todos e também de dar algum esclarecimento.
A Cliama atende a diversos tipos de convênio, e temos uma faixa de atendimento a custo zero, que é preenchida todos os anos e uma lista de espera bastante expressiva, o que nos deixa muito satisfeitos, porque demonstra a confiabilidade que a nossa instituição tem aqui no Distrito Federal e fora daqui, pois prestamos assistência e consultoria para universidades e para outros Estados que nos procuram em busca não só da questão do autismo, mas também de outras deficiências.
Conforme vocês viram no vídeo, as nossas crianças, os nossos educandos, partilham do convívio com outros iguais, portadores de outras deficiências.
No caso do autista, o convívio do Down com eles tem trazido um progresso bastante expressivo para ambos, em se tratando do nosso Projeto Centopeia, que é o projeto de estimulação precoce de 0 a 7 anos. Quanto à questão que aflige tanto as famílias de autistas não falantes, eles recebem, por vezes, uma estimulação tão grande dos coleguinhas falantes, que isso os auxilia também.
Lembro a todos vocês que, se queremos inclusão, precisamos estar prontos também para alterar algumas coisas na nossa forma de ser e de pensar, porque as nossas famílias, incluídas no mundo aqui fora, não vão ter um mundo disponível só de autistas e de famílias de autistas, mas de pessoas com todas as suas condições de convívio e de peculiaridades.
Então, essa condição de fazermos parte da mesma cirande é que nos enriquece.
Muito obrigada a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Queria agradecer a Drª Anna Cristina Pires de Mello pelo pronunciamento e, ao mesmo tempo, passo a palavra para a Drª Simone Maria L. C. M. Guimarães, representante da Diretoria de Saúde Mental, da Secretaria de Saúde do DF.
A SRª SIMONE MARIA L. C. M. GUIMARÃES - Bem, gostaria inicialmente de solidarizar-me com a mãe, com a Sibelle, que trouxe realmente a indignação de não ter conseguido ou não estar ainda conseguindo algum atendimento na Rede de Saúde. Ao mesmo tempo, gostaria de dizer que existem pessoas sérias, que estão lutando pela causa do autismo, que estão incessantemente trabalhando para que essas crianças, esses adolescentes e adultos possam ter uma vida em sociedade. É um direito de todos.
Nós sabemos que há uma dificuldade na rede de saúde muito grande, mas temos buscado soluções e estar junto aos gestores superiores, os gestores maiores da Secretaria de Saúde, sensibilizando-os quanto a esta causa.
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Temos trabalhado na capacitação de profissionais de todas as áreas da psicologia, psiquiatria - temos uma residência médica em psiquiatria da infância -, porque estamos buscando, realmente, ajudar a rede a crescer e a fortalecer o atendimento a todas as pessoas que precisem de qualquer que seja o atendimento em saúde mental.
E com relação à parte das deficiências, o que a gente tem oferecido, também, ao agregar com a educação, com a segurança, com o esporte, a possibilidade de essas pessoas terem uma vida plena.
Um bom dia a todos e muito obrigada por poder participar deste evento. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Queria agradecer à Drª Simone Maria e dizer que eu, como Senador da República do Distrito Federal, faço questão de colaborar. Acho que é uma questão fundamental a saúde mental, essa questão aflige as famílias. Hoje mesmo, na reunião do Conselho Político com o Governador Rollemberg, hoje à noite, nós vamos estar juntos e vou lembrar a importância deste fato, o porquê de estarmos hoje aqui.
Estava conversando com a Drª Gianna, que tem uma chácara próximo ao Paranoá, próximo, inclusive, de onde resido. Resido no Condomínio Villages Alvoradas, próximo do Paranoá, ao lado da Ermida Dom Bosco. Faço questão de tentar marcar uma visita, uma ida para conhecer esse importante trabalho da Cliama. Quero me inteirar mais nestes assuntos, já que tenho uma filha com TDH e outra com depressão, e sei o tanto que isso é importante. Tem o Inasp (Instituto Nacional de Saúde Psíquica), que é uma ONG de que eu participo, que apoio e que discute a questão, também, regimental. Vamos fazer o que pudermos para colaborar nesta questão.
Queria passar para a Drª Martinha Clarete Dutra, nossa Diretora de Políticas de Educação Especial da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério de Educação.
Mas, antes, Drª Martinha, reconhecer o seu grande trabalho, seus méritos, de estar colaborando no nosso Governo, em um Ministério importante, que é o Ministério da Educação, em uma área sensível, que é essa da inclusão social, e dizer que eu sou da base aliada, ajudo a Presidente Dilma, e que tenho muito orgulho de ver vocês batalhando tanto para nos ajudar a resolver assuntos tão caros, tão importantes para nossas famílias, como este que aqui estamos debatendo.
Passo a palavra para a senhora.
A SRª MARTINHA CLARETE DUTRA - Muito obrigada, Senador. O Brasil inteiro precisa conhecer e trabalhar dia após dia. Pensar um país para todas as pessoas pressupõe derrubar barreiras e eliminar preconceitos. Por isso, quero concluir dizendo que cabe a todas as instituições especializadas em educação especial neste País apoiar o processo de escolarização em escolas inclusivas, sejam escolas públicas ou privadas. A sociedade brasileira não pode ficar passiva diante de qualquer ato de discriminação. Deve denunciar e exigir punição. Fazer um país melhor depende da ação de cada um e de cada uma de nós.
Então, o Ministério da Educação fica inteiramente à disposição por meio do telefone (61) 2022-7661 e do e-mail dpee@mec.gov.br para quaisquer informações complementares a fim de fortalecer a nossa luta. Uma educação de qualidade é necessariamente uma educação inclusiva. Lutemos todos nós, em conjunto, por esse ideal, por esse Brasil melhor, por essa pátria educadora!
Obrigada. (Palmas.) (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Hélio José. Bloco Maioria/PSD - DF) - Queria agradecer à Drª Martinha por sua exposição belíssima aqui, pelo seu trabalho.
Queria saudar aqui o nosso querido Babalorixá Antônio de Oxalá, que está lá atrás e que vem debater a possibilidade de uma audiência pública pela tolerância, pelo direito de livre culto, pela livre profecia das questões, e dizer que a Comissão de Direitos Humanos estará sempre de portas abertas para garantir todas as manifestações, conforme a nossa Constituição. Somos um país livre, laico, com livres cultos. Saudades! Quero desejar um abraço a ele, à comunidade do Gama que ele representa!
E quero dizer aqui, para as senhoras e os senhores envolvidos com a questão dessa audiência pública tão importante, que a Comissão de Direitos Humanos estará sempre aberta, sempre solícita a colaborar com assuntos de tamanha relevância para as políticas públicas deste País para a compreensão, para o bem-estar geral e social. Sabemos o tanto que os nossos meninos que, porventura, tenham essa questão sofrem com intolerância, com falta de compreensão.
Então, muito obrigado a todos vocês!
Quero declarar encerrada esta reunião e dizer que estamos juntos nessa luta.
Obrigado a todos. (Palmas.)
(Iniciada às 09 horas e 28 minutos, a reunião é encerrada às 13 horas e 08 minutos.)
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(Em execução.)