19/03/2015 - 5ª - Comissão de Meio Ambiente

Horário

Texto com revisão

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O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Havendo número regimental, declaro aberta a 5ª Reunião, Extraordinária, da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle, da 1ª Sessão Legislativa Ordinária da 55ª Legislatura.
A presente reunião destina-se à realização de audiência pública para discutir: Biodiversidade: Crises e Perspectivas, em atendimento ao Requerimento desta Comissão de nº 3, de 2015, de minha autoria.
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Devo aqui ressaltar a iniciativa louvável do Ministro Herman Benjamin, que procurou esta Presidência no intuito da realização do presente colóquio.
Por uma feliz coincidência, estamos apreciando, neste momento, um projeto importante, que é o novo marco regulatório da biodiversidade, que tramita aqui no Senado em regime de urgência e que trata da diversidade biológica e do acesso aos recursos genéticos do nosso País. Já fizemos duas audiências públicas conjuntas e agora realizamos esta que, embora não estando inserida formalmente no procedimento de instrução do projeto, certamente trará grande contribuição à formação do nosso conhecimento e na tomada de decisão sobre o tema. A participação ativa do Relator da matéria nesta Comissão, Senador Jorge Viana, no presente evento, por si só, já o demonstra.
Chamo atenção para o fato de que o número de palestrantes não permite a acomodação de todos os convidados à mesa. Portanto, vou anunciar sua composição:
- Exmª Srª Izabella Teixeira, Ministra de Estado do Meio Ambiente, que está aqui a minha direita;
- Exmo Sr. Antonio Herman Benjamin, Ministro do Superior Tribunal de Justiça, que está a minha esquerda;
- Sr. Ministro Marcus Vinícius Furtado Coelho, Presidente Nacional da OAB;
- Sr. Antônio César Bochenek, Presidente da Ajufe;
e do Senador Jorge Viana, Relator desta matéria tão importante que tramita aqui no Senado Federal: o marco civil da biodiversidade e do acesso ao patrimônio genético.
Os demais participantes serão convidados à mesa no momento das suas falas.
Informo que contaremos novamente com o serviço de interatividade, no Senado Federal, para participação dos cidadãos que estão assistindo ao vivo, pelo Portal e-Cidadania, no endereço www.senado.leg.br/ecidadania ou pela TV Senado.
O cidadão poderá enviar comentários ou perguntas para o portal e também pelo Alô Senado no número 0800-612211, além das redes sociais, Twitter e Facebook.
Informo também que essa reunião conta com serviço de tradução simultânea.
Passaremos, então, às exposições dos convidados, e, após, abriremos a palavra aos Srs. Senadores e Senadoras para questionamentos e considerações.
Então, iniciando as falas, informo que, por questão regimental, já que às 11h30 teremos sessão do Senado, sessão plenária; teremos esse espaço limitado até às 11h30.
Inicio, passando a palavra ao Sr. Antônio César Bochenek, Presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil.
A SRª ANTÔNIO CÉSAR BOCHENEK - Bom dia a todos. Gostaria de saudar o Senador Otto Alencar, Presidente da Comissão de Meio Ambiente do Senado, e, na pessoa dele, saudar todos os Parlamentares, Senadores e Deputados aqui presentes. Também saúdo o Senador Jorge Viana, intenso articulista desta Casa, que tem produzido bons resultados ao nosso País.
Cumprimento também a Ministra de Estado Izabella Teixeira, Ministra do Meio Ambiente, na pessoa de quem cumprimento todos os representantes do Executivo. Cumprimento também o Ministro Antonio Herman Benjamin, do STJ, um exemplo de Ministro, não só de conhecimento e aplicação jurídica no seu dia a dia, mas, também de um envolvimento social, especialmente com o meio ambiente, de notoriedade reconhecida no Brasil e no mundo. E, em nome dele, cumprimento todos os representantes do Judiciário.
Também gostaria de cumprimentar a todos os servidores desta Casa, os servidores do Executivo, Legislativo e Judiciário, os presentes, aqueles que nos assistem, a imprensa que também aqui faz a cobertura desse importante evento.
Falar sobre a biodiversidade no início de uma fala com tantas pessoas, tantos nomes de especialistas na matéria, realmente é uma dificuldade muito grande.
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Mas o Ministro Antonio Herman Benjamin pediu para que pudéssemos fazer uma introdução e trazer um pouco do pensamento dos juízes federais a respeito desse tema.
E, desde 1992, nas convenções do Rio de Janeiro e na declaração do Rio de Janeiro, da Convenção de Biodiversidade Biológica, temos assistido a uma evolução deste tema e desta matéria. Há um envolvimento cada vez maior da sociedade, tanto por conscientização quanto por necessidade acerca desse tema.
A utilização sustentável dos recursos e a conservação, a preservação, são temas e questões importantes a serem tratadas. E o Judiciário brasileiro tem, sobretudo, uma importante missão ao julgar essas demandas, ao julgar essas causas, ao trabalhar para que possamos ter bases fundamentais ou reconhecimento de princípios fundamentais da biodiversidade, princípios essenciais para uma reflexão daquilo que possamos conhecer do passado e projetar o futuro.
Mas, para tanto, é preciso fazer a diferença no presente, ou seja, parabenizar aqui o Senado brasileiro, ao abrir espaço dentro desse processo legislativo, de tomada de decisões do processo legislativo, que vão discutir temas com especialistas brasileiros e de toda parte do mundo sobre questões importantes da biodiversidade. Que essa reflexão de agora, do presente, sirva para nortear os caminhos desse Legislativo acerca do que queremos em relação à biodiversidade.
Gostaria, para já encerrar a minha participação nessa fase inicial, de tratar e trazer duas questões que nos parecem muito importantes: a biodiversidade, a conservação, a preservação são pontos essenciais à nossa vida futura. Entendemos que muitas pessoas lutaram e lutam para que até hoje tenhamos essa conservação. E as comunidades tradicionais, no nosso caso brasileiro, especialmente os quilombolas e as comunidades indígenas, foram aquelas comunidades e pessoas que mais preservaram a biodiversidade no seu todo. Muitas vezes, hoje, por suas condições até de inferioridade em relação a um plano total, não têm as mesmas condições de igualdade. Portanto, precisamos - a biodiversidade exige ter uma atenção especial principalmente àqueles que sempre se dedicaram por conservar e preservar a biodiversidade.
De outro lado, temos o elemento humano, fundamental e essencial na nossa vida em sociedade, em uma sociedade contemporânea, que nos implica trazer uma atenção especial a essa interculturalidade.
Meu professor do doutorado, Boaventura de Souza Santos, sempre dizia e diz ainda: "é preciso fazer uma tradução entre as culturas de modo que possamos preservar e possamos caminhar para uma evolução desses temas".
E ainda cito uma frase que ele sempre fala, o professor Boaventura: "Temos direitos de sermos iguais quando a diferença nos inferioriza e direitos a sermos diferentes quando a igualdade nos descaracteriza".
Com essas breves palavras, desejo a todos um excelente colóquio. Que possamos sair daqui com reflexões importantes para o futuro da biodiversidade do Brasil e do mundo.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Agradeço a participação do Dr. Antônio César e, em seguida, passo a palavra ao Ministro Antonio Herman Benjamin.
O SR. ANTONIO HERMAN BENJAMIN - Sr. Presidente, inicialmente agradeço o convite que me foi feito, mas, ao mesmo tempo, agradeço também a V. Exª e à sua equipe da Comissão de Meio Ambiente, do seu próprio gabinete, pela organização impecável deste colóquio.
Para aqueles que nos visitam, do exterior - e aqui está uma delegação de alto nível da UICN, os conselheiros que integram o Bureau Executivo -, o Senador Otto Alencar é do belíssimo Estado da Bahia.
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É médico e tem uma história longa de dedicação à causa ambiental. Ele ocupou praticamente todos os cargos possíveis no Estado da Bahia, desde Governador a Parlamentar. Hoje, está no Senado e, há três semanas, foi eleito Presidente desta Comissão.
Eu me recordo muito bem do trabalho que o Senador Otto Alencar estimulou, ele ajudou na proteção do Parque Nacional da Chapada Diamantina, que é um dos lugares mais exuberantes do nosso País. Então, deixo a V. Exª, Presidente Senador Otto Alencar, o meu agradecimento pessoal mas, também, à equipe, repito, do seu gabinete e desta Comissão de Meio Ambiente.
Eu queria agradecer, ainda, na perspectiva do Senado, ao Senador Jorge Viana, que é o Vice-Presidente do Senado. Está aqui a minha esquerda e é uma dessas figuras mais extraordinárias que temos no Parlamento e na vida pública brasileira. Ele é engenheiro florestal, foi Governador do Acre, um Estado em plena Amazônia, duas vezes, e fez uma revolução naquele Estado, sobretudo porque, no seu primeiro mandato, trouxe como proposta de governo a ideia de florestania, ou seja, governar e administrar um Estado daquela dimensão não contra a floresta, mas incluindo a floresta na perspectiva as políticas públicas.
Hoje ele é Vice-Presidente do Senado brasileiro e, como sempre digo, está na linha de frente de todos os movimentos de transformação do nosso País. E nós, realmente, precisamos de pessoas como ele. Eu queria agradecer, também, ao Ministério do Meio Ambiente. Está aqui a Ministra Izabella Teixeira. Eu sou bem suspeito para falar a respeito dela, porque a conheço de muitos anos, e ela tem essa capacidade enorme de cobrir todas as áreas e confins da grande agenda ambiental. E vai além dela para incluir a perspectiva social, a perspectiva econômica. Como Ministra, vem fazendo, não há dúvida, uma gestão extraordinária,que todos nós festejamos.
A Associação dos Juízes Federais, aqui representada pelo seu Presidente, Antônio César Bochenek, é uma demonstração de que os juízes brasileiros estão muito atentos às suas missões e aos seus deveres e responsabilidades no que se refere à proteção do meio ambiente. Isso coloca o Brasil em uma situação, não digo única, mas peculiar no mundo todo, porque temos um profundo envolvimento, tanto da Magistratura federal como da Magistratura dos Estados no tratamento do tema da biodiversidade.
Promove também evento a Abema, e vejo aqui o seu ex-Presidente, o novo Presidente e vários secretários que a integram. Eu queria deixar o meu agradecimento, também, a essa importante instituição e, evidentemente, aos órgãos federais aqui representados pelos seus presidentes. Vejo o Ibama e vejo o Instituto Chico Mendes, com os seus dois Presidentes.
Termino agradecendo à Ordem dos Advogados do Brasil. O Presidente, ontem, nos recepcionou a todos e hoje viaja para Porto Seguro, no Estado da Bahia, para a I Conferência Brasileira dos Jovens Advogados. Portanto, eu acredito que o Presidente Marcus Vinícius não terá condições de participar desta abertura, já que tem o voo para Porto Seguro.
São essas as considerações iniciais, eminente Senador Otto Alencar. E o meu último agradecimento é exatamente aos especialistas e a todos que estão aqui nos assistindo.
Agradeço, de novo, a V. Exª e a sua equipe. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Eu que agradeço ao Ministro Herman Benjamin e passo, agora, a palavra à Ministra Izabella Teixeira, do Meio Ambiente, para que possa para que possa fazer o seu pronunciamento.
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A SRª IZABELLA TEIXEIRA - Bom dia a todos, eu estou perguntando ao Senador Otto quanto tempo eu tenho. Ele falou que eu tenho dez minutos. Então, além de falar da biodiversidade, da gestão, da crise, perspectivas, ou seja, o divã do Herman Benjamin, como eu gosto de brincar, terei 10 minutos para fazer isso. Eu falo rápido; quem for traduzir, I'm so sorry. I do apologize. But I have to speak fast. Mas terei tolerância e resiliência, espero.
Obviamente, é um desafio e uma grande oportunidade retornar a esta Casa, que é uma Casa que acolhe a agenda ambiental. Saúdo aqui não só o Senador Otto Alencar, desejando a ele uma ótima gestão e uma parceria na Comissão de Meio Ambiente do Senado, como também saúdo aqui o Presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados. O Ministério do Meio Ambiente está completamente de portas abertas para o diálogo com os senhores, não só com os senhores do Legislativo, mas também com os representantes da Justiça Federal, particularmente o Dr. Antônio César, e também ao diálogo e aparceira cada vez mais forte com os Poderes constituídos no Brasil além do Poder Executivo.
Isso mostra a importância, a envergadura política da conservação da biodiversidade, o engajamento e a relação disso com as políticas públicas de desenvolvimento central do nosso País.
O País é um país continental, então falar da biodiversidade do Brasil também não é trivial; é quase falar da biodiversidade global. Então, os números do Brasil são sempre impactantes para o bem e para o mal. Quando falamos de perda da biodiversidade, as pessoas ficam surpresas, como também quando falamos dos ganhos. Por exemplo, do maior programa de áreas protegidos no mundo, que é o programa Arpa, em que a meta do Brasil é atingir, em 2020, 60 milhões de hectares de áreas protegidas na Amazônia. Nós vamos atingir esta meta este ano.
Qual o país do mundo tem 60 milhões de hectares de áreas protegidas no seu território, viabilizando desenvolvimento e inclusão social e inclusão política? Então, é óbvio que os números do Brasil não são números tímidos. Pelo contrário. Portanto os desafios de interlocução e de formulação e de renovação de uma agenda de conservação da biodiversidade são imensos. Se os senhores me permitirem, vou falar em três perspectivas. A primeira, estreitando um diálogo com o Senador e com o Senado Federal, também com o meu amigo Senador Jorge Viana, que é mais do que um parceiro, é um cúmplice. Obviamente, sempre encontrei aqui, no Senado Federal, essa cumplicidade com vistas à consecução dos objetivos comuns do desenvolvimento sustentável e proteção e conservação da biodiversidade.
Do Herman Benjamin, eu falo no final. Desculpem, eu o chamo de Herman. Desculpem a informalidade, mas é impossível fazer a pompa com ele. Nós somos amigos, realmente, de longa data, e tem sido mais do que uma questão de amizade, tem sido sempre uma referência. Mais do que isso, um grande formulador de saídas, perspectivas e de inovação no quadro da legislação brasileira e de soluções na gestão pública no Brasil. Então, é extremamente interessante entender essa dinâmica e a parceria com os juízes federais. Estou vendo aqui o Presidente do Ibama, com o Presidente do Instituto Chico Mendes. Como isso é importante para consolidar essa agenda.
Falarei, então, rapidamente sobre os principais desafios, e, com isso, falarei dos principais problemas.
A primeira instância que temos que olhar quando se fala de acesso... Vou fazer uma coisa de baixo para cima, não de cima para baixo. Vamos falar da questão de acesso a recursos genéticos, de repartição de benefícios. Esse é um capítulo importante, um dos tripés da convenção da diversidade biológica, que o Brasil foi exitoso na negociação, em 2010, para a consolidação do chamado Protocolo de Nagóia. E o Brasil tem um grande desafio de aprovar a legislação nacional, a nova legislação nacional com base na qual ele poderá ratificar o Protocolo de Nagóia. Então, as coisas não estão dissociadas.
Pelo contrário: há um grande objetivo estratégico de que o País tenha um novo patamar de investimentos em proteção, considerando o acesso a recursos genéticos, a repartição de benefícios, o reconhecimento daquele conhecimento tradicional das populações tradicionais, a transparência na tomada de decisão, os colegiados para a tomada de decisão, formulados, dialogando com a demanda, não só das populações tradicionais detentoras de conhecimento mas também daqueles que são agentes econômicos da transformação para o bem, do uso sustentável desses recursos genéticos.
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Nós temos uma legislação no Brasil, atual, que é de 2001, voltada ao combate à biopirataria. Ela pune o pesquisador que quer gerar conhecimento.
Hoje eu tenho pesquisadores das grandes universidades brasileiras multados por biopirataria, multados porque foram fazer pesquisa científica. E tenho indústrias, empresas, patentes brasileiras ameaçadas, porque não tiveram autorização para ter o acesso ao recurso genético.
A legislação foi voltada para punir, dar foco no malfeito, e não tem o outro lado da legislação, que é induzir as boas práticas e reconhecer os avanços necessários em relação ao quê? A repartir, a pagar o que é devido, e a viabilizar o desenvolvimento sustentável com geração de emprego, com inclusão, e dar sentido, cada vez maior, às áreas protegidas, à pesquisa in situ e à pesquisa ex situ.
Então, foi feito um grande desafio nos últimos quatro anos. E mais do que isso, nós tivemos de fazer toda a regularização de acesso a recursos genéticos dentro do Ministério do Meio Ambiente.
Quando eu assumi o Ministério, tínhamos mais de cem processos sobrestados, processos paralisados. Isso é ameaça de patente; isso é ameaça de competitividade; isso é ameaça de não se viabilizar a segurança jurídica necessária para o desenvolvimento da bioindúnstria e fazer com que a Amazônia brasileira, a Mata Atlântica, o Cerrado e os outros biomas possam ter uma indústria que seja compatível com a conservação da biodiversidade e com a geração do conhecimento e a inovação tecnológica.
Nós somos o País que detém a maior biodiversidade, uma das maiores do mundo, e temos sempre de ter papel protagônico na inovação e na formulação de novos caminhos para viabilizar o tal desenvolvimento sustentável, na prática, e, obviamente, para eliminar o malfeito. O que é eliminar o malfeito? Contratos que são feitos de gaveta.
Nós tivemos de falar com a Advocacia Geral da União para cancelar investidores estrangeiros que fizeram contrato com populações indígenas, completamente ilegal, completamente fora do quadro normativo brasileiro, gerando mais insegurança.
Então, a proposta de lei foi debatida e consolidada, envolvendo quatro Ministérios - Ministério do Meio Ambiente, Ministério de Ciência e Tecnologia, Ministério da Indústria e Comércio, e, depois, consultando o Ministério da Fazenda, o Ministério do Planejamento.
A que veio a esta Casa não envolvia, no primeiro momento, a questão de alimentos. Na Câmara, por conta de uma grande disputa entre a Convenção da Diversidade Biológica e o Protocolo Tirfa, da FAO, sobre acesso a recursos genéticos e alimentares, na Câmara, nesta Casa, resolveu-se fazer um acordo e incluí-la. E agora a matéria está sob apreciação do Senado Federal.
Então, estamos sob a Relatoria do Senador Jorge Viana, na Comissão de Meio Ambiente, e de outros Relatores trabalhando, e a importância do debate que houve na Câmara dos Deputados.
A ideia é: se aprovada, com salvaguardas, o que for necessário, etc, nós teremos mais de vinte regulamentos infralegais - para vocês terem ideia da complexidade que é regulamentar isso no Brasil -, obviamente para dotar o País de um novo quadro jurídico, com segurança, de tal maneira que você possa colocar gestão de acesso a recursos genéticos em um outro patamar.
Então, isso talvez seja realmente um ponto de inflexão em que torna obrigatório o pagamento, com a repartição de benefícios para o conhecimento tradicional, e cria um fundo para alocação desse recurso, quando o conhecimento tradicional é, como falamos, espraiado ou não associado à população a, b, c, de domínio geral.
Portanto, isso significa rearranjar a lógica da gestão pública em relação a acesso a recurso genético e rearranjar os fundamentos da política de conservação da biodiversidade em face do desafio do desenvolvimento sustentável deste Pais.
Então, o primeiro foco, as notícias que me vem do Parlamento são sempre quentes, os debates estão acontecendo, e isso é importante porque legitima os próximos passos em relação a esse novo desenho legal sobre conservação da biodiversidade.
O segundo patamar de um olhar - eu vou fazer aqui um olhar tradicional, como bióloga, para facilitar - é obviamente a questão das espécies, a proteção das espécies, a velocidade de extinção das espécies, particularmente caracterizada no século passado, e obviamente a estratégia de podermos trabalhar com programas mais eficientes de prevenir a extinção de espécies e, por outro lado, recuperar as espécies que estão classificadas como vulneráveis, em perigo ou ameaçadas de extinção em último grau.
Fizemos um esforço enorme no Governo e instituímos um novo programa que se chama Programa Pró-Espécies, aperfeiçoamos a aplicação dos critérios da IUCN, no Brasil - desde 1968, o Brasil tem lista de espécie ameaçada de extinção -, estabelecemos o arranjo institucional das instituições que têm competências para agirem nisso.
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Então, no caso da Fauna, o Instituto Chico Mendes; no caso da Flora, o Jardim Botânico do Rio de Janeiro, que coordenam as listas nacionais. Foi feito um esforço de mais de cinco anos envolvendo mais de mil pesquisadores do Brasil. Nós inventariamos todos as espécies conhecidas, vertebrados, no Brasil. de fauna. Foi o maior esforço de inventário de fauna do mundo que o Brasil fez. E isso resultou numa revisão da lista de espécie ameaçada de extinção obviamente e, certamente, retiram-se espécies dessa lista e incluem-se outras espécies a partir do momento em que se trabalha também e concomitantemente com os planos de recuperação de espécies. Esse talvez seja, Senador, um dos grandes desafios do País. Nós temos uma grande capacidade instalada hoje de, fazendo planos em relação às espécies de fauna, não necessariamente na mesma magnitude em relação à espécie de flora. Obviamente, precisa-se avançar nesse processo. O pessoal do Jardim Botânico está trabalhando nisso.
Além dos planos de ação, o Ministério do Meio Ambiente, com relação às espécies ameaçadas, coordenou esse trabalho técnico-científico. Isso está em banco de dados publicado em Internet, com georreferenciamento de onde essas espécies estão, com todo o conhecimento científico no País acumulado a respeito delas. Isso dialoga, por exemplo, diretamente com licenciamento ambiental. Quem for fazer um empreendimento e quiser saber se, naquele nicho onde será seu empreendimento, há uma espécie ameaçada de extinção, consulte, porque a informação está georreferenciada em todo o País.
Então, dizer que não há informação disponível não é algo que se aceita no processo, porque foi trabalhado para tornar essa informação disponível. Obviamente, é um processo de constante renovação, reavaliação, revisão em face do novo conhecimento adicionado sobre o domínio dessas espécies. É realmente o maior inventário de fauna já feito no mundo. É um grande inventário feito do ponto de visa da flora. As notícias boas é que saíram lista espécies como a baleia jubarte, a arará azul grande, o peixe-grana, mas a notícia ruim é que entra o macaco-prego galego, o peixe cascudinho. Enfim, há essa dinâmica e uma avaliação do que acontece dos biomas brasileiros.
Há outra coisa extremamente importante a ser vista. Nós, segundo os critérios da FCN, avaliamos o risco biológico. Nós não avaliamos o uso econômico das espécies. Nós avaliamos o risco biológico. A minha competência como Ministério do Meio Ambiente, como o ponto focal da conversão universidade biológica é avaliar o risco biológico. E é isso que nós fizemos com rigor técnico-científicos, segundo os critérios, segundo os trabalhos com mais de mil incentivos desenvolvidos, mais de 300 instituições científicas deste País, com painéis independentes internacionais de validação da lista. Daí a complexidade do trabalho.
Nós temos hoje o Cerrado e a Mata Atlântica trazendo o maior número de espécies ameaçadas. Nós estamos falando de 677 espécies ameaçadas no Cerrado e 1.331 espécies ameaçadas na Mata Atlântica, o que confirma obviamente a sinalização da ameaça desses biomas e a situação grave que existe muitas vezes de uma degradação, um desmatamento cada vez mais progressivo nesses biomas, que estão orientados para uma recuperação e deverão ser recuperados em face do Código Florestal.
Terceiro patamar dessa abordagem. Há espécies madeireiras. Eu posso deixar esta publicação aqui, esta breve apresentação mostrando os números. Posso seguir? É porque eu estou aqui the flash. Imaginem como é que estou. Estou parecendo o tal brasileiro que correu, estreou e ganhou na Fórmula I. sou eu. Mas eu sou disciplinada. Então, é óbvio que temos desafios de estabelecer onde há espécies ameaçadas de extinção, já que há pouco conhecimento. Isso é outro lado. Então, o foco da ciência, da pesquisa...
Ontem mesmo eu fiz uma reunião com o Ministério da Educação, com a Capes, com um novo programa de indução de pesquisa e conhecimento científico, com a nova rede de instituições científicas deste País, em que o Ministério do Meio Ambiente alocará dinheiro junto com a Capes para produzir novas pesquisas de mestrado e doutorado dentro do programa de pós-graduação, consolidando a rede de pesquisa nas unidades de conservação.
Então, vamos começar a dizer efetivamente como é induzir pesquisa na direção de consolidar essas áreas protegidas no Brasil, e não pesquisas que não necessariamente são importante, mas não dialogam com as prioridades de conservação da biodiversidade no Brasil. Isso só é possível fazer porque temos um programa de capacitação no Ministério considerado modelo na Esplanada e porque o Ministério do Meio Ambiente estruturou-se com funcionários de carreira nos últimos cinco anos da minha gestão, todos com concurso público feito todos os anos. Então, em vez de termos cargos de confiança, temos funcionários de carreira.
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Aprovamos nesta Casa, ano passado, para concurso edital a ser lançado ano que vem. São 1.400 vagas adicionais ao Ibama, Instituto Chico Mendes. Então, serão novos funcionários de nível superior, concurso público adicional ao que tenho hoje nos quadros de funcionários. Isso tudo para falar de unidade de conservação, de espécie ameaçada de extinção e qualificar esses funcionários para trabalhar com seu senso de pesquisa e em parceria.
Vamos, então, para o desafio, além das espécies obviamente, de olhar para duas situações que são absolutamente importantes: as áreas protegidas. O Brasil tem um sistema de áreas protegidas, um sistema nacional de unidades de conservação, que é uma lei federal e tem competências institucionais distribuídas nas três instâncias do poder federativo, da competência da Federação - Estados, Municípios, União. Portanto, coordenar esse sistema é talvez um dos maiores desafios que o Ministério tem, porque criar uma unidade de conservação neste País não é comum. Vou citar um dado. Nós últimos quatro anos, nenhum governo da Amazônia criou uma unidade de conservação. Nenhum governo estadual o fez. No Brasil, nós tivemos cerca de 360 mil hectares de áreas protegidas criadas por Estado, dos quais uma unidade fica no Estado de Minas Gerais, de 312 mil hectares, uma área de proteção ambiental. Todas as áreas de proteção integral foram criadas pelo Governo Federal. O que foi criado na Mata Atlântica de conservação estratégica foi feito pelo Governo Federal.
Portanto, isso mostra obviamente o desafio que temos de buscar novos locais para criar essas áreas e ter um modelo de gestão integrado com mosaicos, com tudo aquilo que são instrumentos colocados em prática pelo Governo Federal, pelos governos estaduais, pelos governos municipais.
Por outro lado, tivemos avanços expressivos na criação de áreas particulares, interesse cada vez maior de detentores de propriedade em criar essas áreas ou proporem as chamadas reservas particulares de patrimônio natural. Então, há que se entender como é que essa dinâmica acontece nos biomas em face daquilo que estamos propondo de avanço em relação a áreas protegidas.
Um segundo aspecto da área protegida é acabar com o conflito que existe de usos e de interesses de governos estaduais, de governadores - todos legítimos, todos eleitos democraticamente - e prefeitos, e se propõem, às vezes, à criação de áreas protegidas com populações residentes naquelas áreas, ignorando a existência daquelas populações. Resultado: você vai gerir com um passivo porque terá que retirar aquelas populações e, com isso, tira o acesso a políticas públicas dessas populações. É preciso entender de dinâmica de território.
Então, nós partimos para uma estratégia que é criar sem conflito e, na Amazônia, particularmente, fomos para uma estratégia de regularização fundiária das áreas, transferência para o Ministério, e criação já com regularização fundiária.
A Presidenta Dilma criou ano passado a primeira unidade de conservação, a unidade Maués, no Amazonas, 100% regularizada do ponto de vista fundiária. E vai criar agora mais de cinco milhões de hectares - nós estamos estudando isso -, fechando a meta do Programa Arpa de 2020 para agora. Nós vamos antecipar o resultado, consolidando 60 milhões de hectares de áreas protegidas na Amazônia, incluindo áreas 100% regularizadas.
Eu sou informada de que há população. Vamos ter que discutir o que existe lá. Sou informada de que autorizaram o plano de manejo em área devoluta da União. Isso não pode acontecer. Então, há órgãos estaduais fazendo isso. Nós temos que entender a complexidade jurídica disso para criarmos as unidades sem conflito e, obviamente, ampliar as áreas de proteção, particularmente no Pantanal - estamos fazendo estudos para isso -, na Mata Atlântica e no Cerrado. Por quê? Porque estamos assegurando os serviços ambientais e uma estratégia mais eficiente de contenção do desmatamento.
Vou para a minha reta final de comentários. O Brasil ainda sofre uma pressão muito grande em termos de perda de espécies da fauna e da flora, por conta do desmatamento. É óbvio que temos um programa importante, estratégico de redução de desmatamento legal e do fim do desmatamento legal no País. A Amazônia é o principal símbolo disso. Nós somos um País com 29 mil km2 de desmatamento por ano, e hoje nós estamos a 4,848 mil de uma meta de 3,925 mil para 2020. Essa meta deve ser atingida ano que vem, espero eu. Isso obviamente não é suficiente. É intolerável haver desmatamento. Não precisa haver desmatamento no Brasil e muito menos desmatamento ilegal. Mas o Brasil também tem supressão de vegetação como mecanismo legal. O Brasil é o único país que eu conheço no mundo que impõe uma restrição à propriedade privada de até 80%; o proprietário não pode mexer em 80% da vegetação nativa se a propriedade for na Amazônia.
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E, se houver área de preservação permanente, mais um tanto. Nenhum país do mundo impõe esse tipo de restrição. Nós o impomos do ponto de vista de valorizarmos a conservação e assegurarmos que a conservação as leve a um incremento de produtividade no caso do uso da terra. Essa é um pouco a estratégia que nós estamos procurando dialogar com a implementação do Código Florestal.
Meu comentário final: faço um reconhecimento público ao Congresso Nacional, particularmente ao Senado, porque foi aqui no Senado que nós fizemos esse debate. Tenho 30 anos de política ambiental neste País. Sou servidora pública. Acabei de completar esse tempo. Ou seja, perdi meu caráter de jovem. Mas efetivamente, como gestora pública e funcionária de carreira que sou, eu tenho um setor todo engajado em consolidar uma política de conservação, que é o setor agrícola engajado em fazer o cadastro ambiental rural. Foi a primeira vez que uma norma alinhou um setor produtivo com um setor de meio ambiente. Todas as lideranças políticas do setor da agricultura, todas - eu não estou falando de questão político-partidária, estou falando de questões políticas - estão engajadas da agricultura familiar ao agronegócio, com a consecução do Cadastro Ambiental Rural.
A responsabilidade disso é dos Estados e Municípios segundo a lei. E nós teremos que fazer o Cadastro Ambiental Rural para colocarmos em prática o maior desafio que este país tem: o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa - Planaveg. O cenário mais conservador nos dá um número em torno de 21 a 22 milhões ha que deverão ser recuperados neste país, por obrigação de lei, fora o que a gente pode induzir de reflorestamento, de recomposição. Então, o desafio de fazer esse alinhamento como conservação da biodiversidade.
O Brasil avançou nos quatro anos nessa nova base não só legal, normativa, mas institucional de olhar essa integração com os setores produtivos. Isso dialoga diretamente com a proposta de mudança do clima para 2015, com vistas a 2020, 2030, 2040, além dos outros setores produtivos envolvidos e talvez seja o exemplo cristalino de integração entre a conversão da diversidade biológica, a conversão de clima e a conversão de fundamentos econômicos e sociais de desenvolvimento sustentável, por intermédio da política de agricultura de baixo carbono.
E o Código Florestal nos provoca nessa direção. isso vai reinventar - vou dizer algo que o Elmo vai me matar - as relações federativas na gestão ambiental. Esse federalismo cooperativo que nós cantamos tanto em verso e prosa no sistema nacional do meio ambiente terá que acontecer na prática também sob a perspectiva econômica e social, que é o caso de transformarmos a agricultura brasileira não num programa de agricultura de baixo carbono, mas de termos na agricultura brasileira uma agricultura de baixo carbono.
Então, os mercados competidores brasileiros, quando forem subsidiar sua agricultura, vão ter que se lembrar que isso vai contribuir para efetivamente termos desmatamento. Quando você tem uma agricultura de baixo carbono e o Código Florestal em prática, a agricultura brasileira vai incrementar a produtividade e não vai desmatar mais. Então, querem proteger a Amazônia? Ajudem-nos a ter uma agricultura de baixo carbono neste País. O resto é tratar agricultura com competitividade, com transparência e, obviamente, valorizar, por instrumentos econômicos, os serviços ambientais, tudo aquilo que o Código prevê.
O Código fez uma série de avanços. É importante desestigmatizar o processo político do Código. Lembro que, quando começou esse processo na Câmara, não ia haver mais reserva legal, não ia haver APP nenhuma, e todos os estatutos foram mantidos. Aqui o reconhecimento final ao Senado, ao debate na Câmara, a todos que dele participaram, à Presidente da Comissão de Meio Ambiente, mas particularmente aos Senadores Jorge Viana, Luiz Henrique, Eduardo Braga, que foi o Relator na área de ciência e tecnologia, e obviamente meu cúmplice estratégico, o Ministro Benjamin, que trabalhou incessantemente nas comissões dentro desta Casa, para que nós pudéssemos viabilizar soluções que pudessem levar a esta situação política, um setor, de fato, comprometido, como nós esperamos, com um instrumento que mudará a realidade de produção de alimentos e de recuperação ambiental neste País.
Por isso, se há um apelo pela biodiversidade do Brasil, façam o Cadastro Ambiental Rural, entreguem o Cadastro Ambiental Rural. Falando aqui para o novo Presidente da Abema, que é um parceiro nisso, e para o antigo: trabalhem dedicadamente no cadastro, se a gente quiser fazer toda essa envergadura, esse novo desafio para o Brasil de recuperação de ecossistemas, eliminar o desmatamento e recuperar de vegetação nativa neste País, gerando emprego, fazendo inclusão social e, como o senhor diz, tratando as populações tradicionais com o respeito que merecem.
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Muito obrigada.
Foi o máximo que consegui. Não falei nem 10%. Agora, Senador, o senhor é não sustentável me fazendo correr feito uma doida, mas foi muito tolerante ao me dar de 20 a 30 minutos.
Muito obrigada.
Bom dia a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Dei a V. Exª a maior tolerância desta Comissão. Dez minutos de tolerância, quando, no máximo, seriam dois minutos.
Quero registrar aqui a presença do nobre Deputado Federal Átila Lira, Presidente da Comissão de Meio Ambiente, Deputado pelo Piauí; da Senadora Sandra Braga e do Senador Douglas Cintra, que também é desta Comissão.
Passo a palavra ao Senador Jorge Viana, do Acre, Relator do Marco Civil da Biodiversidade, e que tem debatido conosco essa questão. Essa é a terceira ou quarta audiência pública que fazemos sobre esse tema.
Passo a palavra ao Senador Jorge Viana.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Sr. Presidente, Senador Otto Alencar, que preside este colóquio internacional sobre biodiversidade. Cumprimento V. Exª, todos que compõem, a Senadora Sandra Braga, o Senador Douglas Cintra, Deputado Átila, que preside a Comissão de Meio Ambiente na Câmara e, de modo muito especial, a nossa Ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira, uma querida amiga que colocou aqui, como sempre faz, com competência não só um relato da realidade brasileira, vinculada à biodiversidade, mas também algumas provocações e desafios. Quero cumprimentar o Dr. César Bochenek, presidente da Ajufe e os representantes da IUCN que estão aqui. É um privilégio para esta Comissão do Senado tê-los aqui participando desse colóquio internacional sobre biodiversidade, principalmente na hora em que o Senado Federal, o Congresso brasileiro, o Governo brasileiro, estabeleceram como ano de um novo regramento para acesso à biodiversidade brasileira e também para compartilhar os benefícios com as populações tradicionais.
Então, é um momento muito especial que o Brasil está vivendo. É um prazer recebê-los aqui. Queria cumprimentar a todos, funcionários públicos, dirigentes, pesquisadores, toda a comunidade ligada, representantes de entidades não governamentais, toda a comunidade ligada ao meio ambiente, especificamente ao tema da biodiversidade.
Queria aqui colocar algo, já que tenho o privilégio do bom amigo, Ministro Herman Benjamin, que nos ajuda tanto a fazer reflexões e debater. Penso que não dá para discutir biodiversidade sem pensar um pouquinho, mesmo que seja rapidamente, sobre o que está acontecendo no mundo. Temos 7 bilhões de pessoas ocupando o mundo, usamos, de forma abusiva os recursos naturais, de forma irresponsável estabelecemos um modelo e um padrão de produção e consumo absolutamente insustentável.
Então, a biodiversidade do planeta está ameaçada por conta de uma espécie, da nossa atividade humana e isso o relatório do IPCC tem esse consenso e estamos alterando, por conta da maneira que ocupamos o planeta, que usamos os recursos naturais, estamos alterando o clima. Sou de um Estado, vou daqui a pouco para lá, que está experimentando cheias que nunca tivemos, ou seja, aquele sobe e desce de secas e cheias que se mantinham numa certa faixa, o ponto agora saiu fortemente e não tem uma outra explicação a não ser que algo novo está acontecendo.
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Com a seca de 2005, tivemos incêndios florestais numa floresta tropical, em 250 mil hectares de florestas! Eu nunca tinha visto. Como engenheiro florestal, sei que o fogo é parte da ecologia do cerrado, mas nunca foi e não tem teoricamente como ser, parte da ecologia de uma floresta tropical na Amazônia. Impossível e impraticável, mas nós vivemos incêndio florestal na Amazônia, numa região muito especial que é a região do Acre, na cabeceira dos rios. Então, esse é um primeiro aspecto.
O segundo - e é quase uma provocação - que chamo à reflexão. Estamos discutindo biodiversidade brasileira. O nosso País tem a maior biodiversidade do planeta, seja do ponto de vista animal, seja do ponto de vista vegetal, mas o interessante é que toda atividade produtiva nossa, seja animal e vegetal, que é base da economia e do PIB brasileiro é com espécies estranhas à nossa biodiversidade. Os senhores já pararam para pensar que a soja não é brasileira, a cana muito menos, o café também não. Se formos para o pasto, o gado também não. Então, como pode o País que guarda a maior biodiversidade do planeta não ter benefícios direto dela?
As atividades que desenvolvemos, Sr. Presidente, econômicas, que são tão importantes para nossa economia, o agronegócio é baseado em uso de espécies animais e vegetais estranhas à nossa biodiversidade. Isso talvez nos leve à reflexão: o que está acontecendo com este País. Nós, durante décadas, trabalhamos uma lógica - desculpem-me o termo - burra de primeiro destruir o que temos e o que não conhecemos e usar o solo para atividades estranhas ao ambiente que temos.
Esse é o panorama que vivemos. A outra lógica nossa de uso de recursos naturais não tem sustentabilidade nenhuma. Começamos explorando o pau brasil e exportando matéria prima. Depois, fomos para uma coisa muito mais valiosa, para o ouro e exportamos matéria prima, o ouro como matéria prima. Manda embora. Algo muito valioso. Minério de ferro. A lógica nossa sempre foi essa.
Depois fizemos isso com a madeira. O certo é que o PIB brasileiro, vinculado ao uso de recursos florestais, não chega a 1%, é perto de 1% hoje. O PIB vinculado a pesca - olhem o potencial que temos - não chega a 0,5%. Então, são os aspectos que colocamos. Aí, como o tempo não é muito grande, vou fazer um corte, falar um pouquinho da história do meu Estado, para chegar no projeto de lei que estamos debatendo aqui que estabelece regras de acesso à biodiversidade, que estimula o conhecimento, a pesquisa, que estimula a busca de produtos, de criar mercado e compartilhar benefícios.
Olhe que estamos no século XXI e agora que estamos fazendo esse debate num país que guarda a maior biodiversidade do planeta. Então, temos que refletir nesse colóquio internacional o quanto perdemos de tempo - e não só perdemos tempo - mas danificamos o nosso patrimônio e agora estamos fazendo aqui um debate sobre o regramento de uso desses recursos e de proteção obviamente, porque as regras de uso estabelecem a proteção.
No caso do Acre, que tem muito a ver com esse debate, porque foi a Senadora Marina, eu era prefeito de Rio Branco, em 1993, a Marina era deputada estadual, nós sempre trabalhamos muito juntos. Naquela época estávamos muito juntos. Agora recentemente a Marina está buscando, com absoluta legitimidade, um caminho diferente, mas que é muito parecido com o que todos buscamos também. Lançamos a Marina como candidata ao Senado. Parecia uma coisa inalcançável, inatingível, parecia até uma afronta um grupo como o nosso quisesse ter um mandato de Senador, porque tínhamos uma história, um compromisso de vida com os ideais de Chico Mendes, das populações tradicionais.
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Nós trabalhávamos com algo que não dava voto, nunca havia elegido ninguém. O meio ambiente não elegia ninguém, no começo da década de 90. Aliás, você corria risco de morte se o defendesse. As populações tradicionais não eram motivo de nenhuma plataforma política. Isso poderia colocá-lo em risco se você estabelecesse como plataforma a defesa de populações tradicionais. E lá na Amazônia, no Acre, nós começamos isso e invertemos essa lógica, rompemos com esse paradigma, rompemos.
Eu diria que avançamos muito, ganhamos. Aliás, estamos ganhando desde aquela época, fazendo a defesa do meio ambiente, com compromisso com populações tradicionais e procurando inovar em políticas.
Na Prefeitura de Rio Branco, mesmo, criamos cinco parques. O Parque Chico Mendes foi um deles, porque o Chico é o exemplo maior do risco que se corria neste País em defender o meio ambiente, porque ele perdeu a vida, e nós trabalhávamos juntos. Nós sentimos muito a perda dele.
Uma das ideias do Chico muito forte é o que estamos propondo neste colóquio aqui, discutir a biodiversidade, o que a Ministra Izabella acabou de falar: como vivermos com a floresta e da floresta, para substituir a ideia de retirada da floresta, a ideia de que floresta é um problema e que a Amazônia precisa ser ocupada. Foi isto que no Acre nós tentamos fazer.
Quando assumi o governo, nós radicalizamos mais um pouco em 1999. Todo mundo cria slogan de todo tipo para governar. Mas alguém tem coragem de criar um slogan assim: governo da floresta? Sabe o que é que diziam para nós? "Vão agora implantar um governo para a onça, para o macaco, para os bichos, e não para as pessoas?" Eu sofri isso. Nós criamos um slogan chamado "governo da floresta" e estabelecemos conceitos como o de florestania, que é uma coisa inovadora. Não de cidadania, de querer o desenvolvimento e copiar no Acre o que acontecia em São Paulo.
Aliás, ainda bem que não copiamos, São Paulo está com sede hoje. Há quanto por cento de Mata Atlântica em São Paulo, no Sudeste? Há 50 milhões de pessoas com uma crise que não é hídrica, é uma crise de falta d'água para beber. Cinquenta milhões! Setenta por cento do PIB brasileiro está nessa região entre Rio, São Paulo, Espírito Santo e Minas Gerais. Cinquenta milhões de pessoas têm risco de não ter água potável para o consumo. E quantas mil ou milhões de nascentes foram eliminadas nessa área? Quanto de floresta protetora de curso d'água foi retirada nesse período? E parece que esse era o caminho, porque ali é que está o PIB brasileiro.
Nós não seguimos esse caminho. Nós preferimos ter um PIB pequeno, um PIB não mensurável, porque o trabalho que faz uma população tradicional, que fazem as comunidades indígenas não é quantificado. O que nós protegemos de floresta, Senadora Sandra - no seu Estado, a senhora trabalha, e também o Eduardo, nessa linha -, não é mensurável, não é ganho, não tem benefício para as populações, para os 25 milhões de amazônidas.
Então, eu peço licença ao Presidente, não preciso mais do que dois ou três minutos para concluir, para falar da Lei de Acesso à Biodiversidade.
A Marina então apresentou um projeto, em 1995. Esse projeto começou a ser debatido. Estou falando exatamente de vinte anos no Congresso. Esse projeto começou a ser debatido. À época, tínhamos o recurso das medidas provisórias; elas tinham validade de 30 dias. Esse projeto virou parte de uma medida provisória no governo Fernando Henrique e foi reeditado 16 vezes, depois ganhou uma eficácia de lei por conta de uma mudança na Constituição, em 2001, salvo engano. Depois, em 2003, se criou o CGEN (Conselho de Gestão do Patrimônio Genético). De 2003 para cá, apenas um contrato foi assinado com populações indígenas, só e tão somente um contrato de repartição de benefícios - o termo correto é este.
O que nós temos de lá para cá, nesses anos todos? Cientista não pode fazer pesquisa básica, é criminalizado. Qualquer atividade de busca de uso dos recursos da nossa biodiversidade é biopirataria. De cara, as populações tradicionais estão empobrecendo. Só não estão numa situação de penúria por conta dos programas sociais do Governo Federal criados no governo do Presidente Lula e da Presidenta Dilma, senão estariam na miséria, passando fome. E nós estamos num debate sobre a Lei de Acesso à Biodiversidade, que eu espero tenha fim este ano.
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O Brasil era um dos responsáveis e principalmente vinculado à destruição dos recursos naturais de florestas pelas emissões de gases de efeito estufa e não é mais, não ocupa os primeiros lugares, está fazendo o seu dever de casa. Estamos trocando a nossa agenda de destruição dos recursos naturais por uma agenda que eu acredito, de buscar fazer uso sustentável desses recursos.
Eu tenho muita esperança de que encontremos aí uma mediação, Deputado Átila, Presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara. Muito provavelmente esse projeto voltará para a Câmara, porque nós pretendemos fazer algumas modificações, e o Senador Douglas também. Mas eu espero que até julho o Brasil tenha uma lei que possa valer, que possa funcionar.
A que nós temos não pegou, ela envelheceu sem ter sido usada, com todo o mérito, com todo o respeito que tenho a todos que tentaram com essa legislação atual, que não é usada nem pela indústria, nem pelas populações tradicionais, nem pela comunidade científica, muito menos pelo Governo.
Então, eu concluo dizendo que um evento como esse é uma oportunidade que temos de firmar um pouco mais nossos compromissos, para tirar o Brasil dessa situação e colocar o Brasil como um protagonista no mundo, um país que parou de destruir seus recursos naturais e começa a apontar caminhos do uso sustentável, responsável e inteligente dessa riqueza que é fantástica.
Em um mundo que está implementando um modelo insustentável de produção e consumo, quanto vale esse patrimônio genético que nós temos, essa biodiversidade que nós temos, vegetal e animal? Quanto pode gerar de uma economia sustentável? Quanto pode gerar de uma economia de baixo carbono, uma economia nova? Quanto podem ficar ricas do ponto de vista da felicidade? Porque eu não estou querendo mensurar. Tem muita gente na Amazônia que não está querendo dinheiro, só está querendo ser feliz, viver melhor. Quanto nós podemos ter de felicidade se tivermos uma lei boa, novos produtos sendo desenvolvidos, regras sendo respeitadas e nós definitivamente entendendo que não é - Ministra, uma frase que acho que você usou e que eu repito sempre - uma maldição ter a maior biodiversidade do Planeta. Não é uma maldição ter a Amazônia. É um privilégio, é uma vantagem comparativa extraordinária, que, lamentavelmente, o nosso País, o nosso povo, a nossa economia ainda não aprendeu a transformar em vantagem.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Agradeço e parabenizo o nobre Senador Jorge Viana.
Vamos iniciar, agora, a série de conferências. Para tanto, convido a tomar assento à Mesa, para proferir a sua palestra, o Embaixador José Antônio Marcondes de Carvalho, Chefe da Subsecretaria-Geral do Meio Ambiente, Energia, Ciência e Tecnologia, do Ministério das Relações Exteriores, para falar sobre a posição do Brasil nas negociações internacionais sobre biodiversidade.
A SRª JOSÉ ANTONIO MARCONDES DE CARVALHO - Muito obrigado, Sr. Presidente. É uma grande satisfação participar deste evento.
O senhor vai concordar comigo que é muito difícil falar depois da Ministra, do Ministro Benjamin e do Senador Jorge Viana, mas eu tentarei, de alguma maneira, incorporar algumas dessas falas na minha exposição.
Eu tenho alguns aspectos que eu gostaria de ressaltar. O primeiro aspecto é a questão - e aqui eu já emulando ou copiando o que mencionou o Senador Jorge Viana - de que nós somos quiçá o maior país megadiverso, e essa biodiversidade tem que ser entendida como um ativo nacional. A biodiversidade representa e deve representar um dos maiores ativos econômicos e sociais do nosso País. Esta é a primeira mensagem que eu gostaria de repassar.
A segunda mensagem que é importante repassar e que de alguma maneira foi mencionada aqui é a importância da biodiversidade para os três pilares do desenvolvimento sustentável, no âmbito econômico, ambiental e social.
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A redução da biodiversidade, como foi mencionado, e menciono eu também, compromete essa sustentabilidade e a disponibilidade de alimentos e recursos naturais.
O exemplo que nós temos tido da crise hídrica é um elemento importante, um alerta fundamental, que tem que ser necessariamente escutado. E a conservação e o uso sustentável da nossa biodiversidade, além de tudo isso, resulta em benefícios incalculáveis, diretos e indiretos.
O terceiro aspecto que eu gostaria de mencionar, Sr. Presidente, é a questão da participação do Brasil no contexto internacional da biodiversidade.
Nós participamos ativamente, fomos decisivos na concepção, negociação e firma da Convenção da Biodiversidade - parece algo já histórico, não é, Ministra? -, em 1992, na histórica conferência do Rio de Janeiro. E parece outra época! Mas vejamos como foi fundamental a negociação da biodiversidade na conferência do Rio de Janeiro, a conclusão das negociações, e como ela representa um pilar fundamental na elaboração do marco internacional e o seu rebatimento aos processos internos.
Essa construção da Convenção da Biodiversidade não terminou no Rio de Janeiro, ela continuou, ela avançou, e sob sua égide nós negociamos uma série de protocolos. Negociamos o Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança - o Brasil participou também ativamente, como foi mencionado aqui -, e todo o trabalho que vem sendo desenvolvido internamente para a incorporação do Protocolo de Nagoya e todos os outros trabalhos que vêm sendo desenvolvidos.
Mas aí eu entro com o quarto elemento que eu gostaria de mencionar na minha rápida exposição, Sr. Presidente. Eu prometo que falarei menos que a Ministra Izabella Teixeira...
A SRª IZABELLA TEIXEIRA - Está aprendendo.
A SRª JOSÉ ANTONIO MARCONDES DE CARVALHO - Eu estou aprendendo. A concisão eu aprendo com o Ministro Benjamin; mas o entusiasmo e o comprometimento, sempre com a Ministra Izabella Teixeira.
A questão da biodiversidade não é uma discussão que deva estar restrita ao ambiental. Ela tem que estar inserida num debate muito mais amplo do desenvolvimento sustentável. Este é o quarto elemento que eu gostaria de trazer aqui à nossa conversa.
Um quinto elemento que eu gostaria de trazer à nossa conversa é a questão da possibilidade de reverter a tendência de perdas da nossa biodiversidade. Ela é uma possibilidade, mas ela vem com o sexto elemento que eu gostaria de trazer, que é a necessidade, mencionada aqui, de forma muito eloquente, pela Ministra e pelo Senador, mas também ela deve envolver, ela demanda o engajamento político muito mais amplo e o engajamento político de todos os atores envolvidos, incluindo o Poder Público, a sociedade, seja no campo, seja na cidade. Este é o sexto elemento que eu gostaria de trazer à nossa consideração.
O sétimo elemento que eu gostaria de trazer aqui se refere um pouco às Metas de Aichi que são metas que foram acordadas justamente pela Convenção da Biodiversidade, nos trabalhos que vêm sendo desenvolvidos. São uma série de metas. Elas foram internalizadas para metas nacionais na Conabio. E aqui eu trago o meu sétimo ponto: a questão da perda não pode ser vista só de maneira direta. Não há políticas de reversão da perda da biodiversidade se elas se restringirem apenas à vertente ambiental. Elas têm que estar dialogando, como gosta de dizer a nossa Ministra, de maneira muito mais ampla, com os nossos planos de desenvolvimento e as nossas políticas públicas de maneira absolutamente transversal. A conservação, o uso sustentável da biodiversidade não pode ser uma discussão focada apenas na vertente ambiental, ela tem que ser muito mais ampla.
O oitavo elemento que eu gostaria de trazer à nossa consideração, Sr. Presidente, é a questão de que nós estamos hoje trabalhando aqui, internamente, engajados numa negociação internacional de uma agenda de desenvolvimento pós-2015 que nós temos que adotar um novo modelo de desenvolvimento que incorpore a vertente ambiental, de maneira transversal, em toda a nossa estrutura de políticas públicas e do nosso estamento jurídico e legal.
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O nono e penúltimo elemento que eu gostaria de trazer aqui, que foi mencionado, é a necessidade - eu até seria um pouco mais enfático -, o imperativo da revisão dos padrões de produção e de consumo. A sustentabilidade tem que ser o norte dessa revisão dos nossos padrões de consumo.
O último elemento que eu gostaria de trazer aqui à mesa é a questão de que a conservação do meio ambiente, o desenvolvimento econômico, eles não podem ser concebidos ou entendidos como temas antagônicos. Nós temos que poder superar essa discussão.
Aqui foi relatado todo o esforço que vem sendo feito pelo Governo, todo o esforço que vem sendo feito pela sociedade, os debates que têm ocorrido aqui no Congresso Nacional, de termos a sabedoria de poder conciliar o desenvolvimento econômico com a conservação e o uso sustentável de um grande e gigantesco ativo no nosso País que é a nossa megabiodiversidade.
Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Eu agradeço a participação.
Passo a palavra, agora, ao Ministro Herman Benjamin, que falará sobre o marco legal de proteção da biodiversidade no Brasil.
O SR. ANTONIO HERMAN BENJAMIN - Agradeço, Sr. Presidente. Eu também pretendo ser extremamente breve e espero que com a objetividade e o conteúdo do Embaixador José Antônio Marcondes. Mas é muito difícil bater, derrotar este querido amigo quando se trata de fazer uma apresentação que diz tudo e consegue cumprir o prazo pela metade como ocorreu exatamente aqui.
Eu queria dizer que, na linha daquilo que já trouxe a Ministra Izabella e o Senador Jorge Viana, o Brasil não tem uma legislação nacional de proteção da biodiversidade como alguns países. Mas isto não deve ser entendido como falta de um regime legal, adequado e moderno de proteção da biodiversidade.
As normas que o Brasil tem - portanto, uma proteção fragmentária, e não holística, da biodiversidade - são muitas. Aqui já foi citado o Código Florestal. Nós podemos citar a Lei de Proteção à Fauna, a Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação - em inglês, áreas protegidas, para ajudar na tradução. Nós temos também uma Lei de Proteção aos Recursos Hídricos, uma Lei de Proteção à Mata Atlântica. Enfim, há um mosaico de normas que, a meu juízo, se aplicadas essas normas, nós teríamos condições adequadamente de proteger a nossa biodiversidade.
Agora, evidentemente, um sistema fragmentário de proteção da biodiversidade, tanto no plano federal como no plano estadual, e sobretudo nos Estados que têm maior riqueza de florestas... E aqui vejo a Senadora Sandra Braga, cujo Estado do Amazonas sozinho talvez seja, em termos de unidade política, o maior detentor de biodiversidade no mundo, mais de um milhão de quilômetros quadrados de floresta tropical. Então, em todos esses níveis, federal, estadual e municipal, o modelo fragmentário cria dificuldades, tanto na implementação administrativa como na implementação judicial.
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Não poderia também deixar de mencionar que a Constituição brasileira protege diretamente a biodiversidade. E, utilizando essa linha de raciocínio biológico da Ministra Izabella Teixeira, que partiu dos três níveis estabelecidos na Convenção da Biodiversidade de 1992, a nossa Constituição, que é de 1988 - portanto, anterior à Conferência do Rio, a ECO 92, como dizemos no Brasil -, trata desses três níveis: protege os chamados fundamentos da vida - vale dizer: o nível mais elementar, o nível genético da biodiversidade -, protege as espécies e protege os ecossistemas. Ou seja, o arranjo desses três níveis, na nossa Constituição, que antecede a Convenção da Biodiversidade, reflete essa Convenção, que só seria promulgada quatro anos depois. Portanto, um avanço extraordinário. E aí festejamos a Assembleia Constituinte de 1987 e 1988.
Lembro ainda - e aqui falando especificamente das dificuldades para o Poder Judiciário - que o fato de termos um mosaico de leis que protegem a biodiversidade ou, se quiserem, protegem os elementos componentes da biodiversidade traz dificuldades para o juiz no momento de aplicar a norma, porque o juiz brasileiro que se defronta com o litígio afeito à biodiversidade terá que analisar não apenas uma norma, um código, uma lei específica, mas fazer um diálogo entre todas essas normas. Daí a necessidade, primeiro, de esse magistrado, esse juiz ter o descortino de todo o microssitema de proteção do meio ambiente, mas também de entender a principiologia jurídica que orienta, de um lado, a proteção do meio ambiente, de outro, a proteção da biodiversidade e, no caso específico de fauna, flora e áreas protegidas, a legislação que cuida daquela matéria particularmente. Não é um exercício fácil.
Agora, a boa notícia é que os juízes brasileiros, tanto os juízes federais como os juízes estaduais - o Brasil é uma Federação; portanto, temos dois sistemas judiciais -, vêm se defrontando cada vez mais com questões, processos, litígios no campo ambiental.
Só no Superior Tribunal de Justiça, no meu tribunal, a estatística do ano passado foi de mais de 300 recursos, apelações - enfim, tem um nome próprio: recurso especial - que cuidam diretamente - não é indiretamente - de temas afeitos à biodiversidade. Eu repito o número, que é extraordinário: mais de 300 recursos, desde os aspectos genéticos ao licenciamento no campo florestal, desmatamento, espécies ameaçadas de extinção e até mesmo diálogo com os tratados internacionais.
Termino exatamente com os tratados internacionais. O nosso País - e não gostamos de reconhecer isso - não valoriza os tratados internacionais. Se há algo que não devemos seguir do modelo dos irmãos do norte, é exatamente essa ideia de que os tratados internacionais não precisam ser seguidos pelo Poder Judiciário.
Nós fizemos um levantamento da jurisprudência brasileira e não encontramos praticamente nada de citação dos tratados internacionais. Eu me refiro especificamente à Convenção da Biodiversidade, porque, em alguns casos, Senador Otto Alencar, Embaixador José Antonio Marcondes, o juiz se dava o trabalho de pesquisar a literatura estrangeira sobre a definição de biodiversidade quando bastaria ir à Convenção da Biodiversidade, onde temos uma definição que é aceita pela comunidade científica internacional. Isso se aplica a outros tratados internacionais, como a Cites, a Convenção de Ramsar, que protege as áreas úmidas, a Convenção da Unesco para a Proteção do Patrimônio Mundial, Cultural e Natural. São pouquíssimas as referências a esses tratados internacionais no Poder Judiciário.
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Então, a tarefa que temos aqui é lembrar aos juízes. Temos lembrado, em todas as ocasiões de cursos de capacitação para os juízes, que os tratados internacionais não se dirigem apenas ao Poder Executivo, que os tratados internacionais não se dirigem apenas ao Poder Legislativo, mas que os tratados internacionais não só podem, mas devem ser utilizados pelos juízes brasileiros.
Eu vejo, no Itamaraty, no Ministério de Relações Exteriores, um esforço muito grande de levar a posição brasileira aos fóruns...
(Soa a campainha.)
O SR. ANTONIO HERMAN BENJAMIN - ... em que esses tratados e convenções são negociados na expectativa de que esses tratados venham a ser aplicados no Brasil pelo Poder Judiciário. Portanto, o dever é nosso.
Eu falei por 9 minutos e 12 segundos.
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Tem tolerância.
O SR. ANTONIO HERMAN BENJAMIN - Não utilizei meus dez minutos. Era uma questão de honra nessa concorrência que faço com o Embaixador José Antonio Marcondes. Ele ganhou de mim, mas eu não utilizei inteiramente os meus dez minutos.
Agradeço a todos. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - O Ministro do Superior Tribunal tem tolerância.
A Ministra Izabella Teixeira vai deixar a Mesa porque vai cumprir missão determinada pela Presidenta da República, Dilma Rousseff.
Bom desempenho na missão!
A SRª IZABELLA TEIXEIRA - Eu espero que sim.
Quero agradecer, mais uma vez, a oportunidade de voltar a esta Casa, Senador Otto Alencar. Mais uma vez, conte com o Ministério do Meio Ambiente. Ministro Benjamim, Luciene, Jorge e toda a parceria, seguimos juntos.
Realmente, as notícias deste ano são muito promissoras para a conservação da biodiversidade a partir da apreciação desse novo marco legal e também de uma estratégia que estamos buscando conciliar efetivamente, a partir do Cadastro Ambiental Rural, o Plano Nacional de Recuperação da Vegetação Nativa. Isso vai dar uma nova robustez, uma nova base de economia florestal para o País e, obviamente, a conservação da biodiversidade alinhada a isso.
Quero agradecer e pedir desculpas a V. Exª por ter que ser tolerante comigo, mas a missão foi quase impossível. Peço desculpas à tradutora, porque deve ter sofrido muito comigo falando, correndo. E agradecer aos que participaram. Peço licença porque, realmente, tenho que substituir a Presidenta em um evento e, em seguida, eu viajo para São Paulo.
Muito obrigada. Fica aqui o Presidente do Instituto Chico Mendes e o pessoal do Ministério, o coordenador, o Secretário de Biodiversidade interino. Toda a equipe técnica do Ministério está aqui. O Presidente do Ibama teve que se retirar por causa do vazamento de óleo que tivemos ontem no Rio de Janeiro lamentavelmente.
Muito obrigada a todos e bom dia! (Palmas.)
O SR. ANTONIO HERMAN BENJAMIN - V. Exª me permite, Presidente?
Aproveitando a menção da Ministra Izabella sobre o vazamento de óleo no Rio de Janeiro, eu já apresento ao Senador Otto Alencar as desculpas do Secretário de Estado do Meio Ambiente do Estado do Rio de Janeiro, André Corrêa, que, neste exato momento, está sobrevoando a área do vazamento de óleo no Rio de Janeiro. Ele, que falaria sobre Mata Atlântica, infelizmente, não poderá estar aqui conosco.
A SRª IZABELLA TEIXEIRA - Eu estava com André no telefone, pelo whatsApp.
Deputado Átila Lira, por favor, eu teria o maior prazer de estar com o senhor, como também com os Senadores e Presidentes das Comissões para podermos combinar uma estratégia de diálogo e de debate aqui, no Senado Federal, e na Câmara dos Deputados.
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Herman, sobre vazamento, parece que está sob controle. O Ibama já atuou desde ontem. Mas eu já estou operando com o André.
Obrigada a todos e um bom dia. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Dando seguimento, nós vamos convidar, agora, o Dr. Hélio Gurgel Cavalcanti, que é Presidente da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente, e vai fazer uma palestra sobre o Bioma Caatinga. (Pausa.)
Com a palavra, o Dr. Hélio Gurgel.
O SR. HÉLIO GURGEL CAVALCANTI - Obrigado, Senador Otto Alencar.
Muito bom dia a todos e a todas.
Gostaria de saudar todos os Parlamentares, os membros da Casa e os membros da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema), que se encontra, desde ontem, sob novo comando, pelo Presidente eleito, o Secretário de Meio Ambiente do Estado da Bahia, Eugênio Spengler, aqui presente também.
E, cumprimentando todos os senhores, as equipes de governo e todos os operadores ambientais que fazem parte dessa grande discussão, cujo tema de hoje é a biodiversidade, venho abordar, em determinados momentos aqui, em cada uma especificidade, um dos biomas brasileiros. A mim, coube trazer as informações da Caatinga, que são copiosas, que são disponíveis e que é um problema secular essa fotografia do que temos no Nordeste brasileiro.
Nós temos, aqui, dentro desse conjunto de palestras a serem colocadas, a abordagem dos biomas do Cerrado, que será feito pelo Eugênio. Nós teremos, também, sobre a Mata Atlântica, o André Corrêa, que já justificou sua ausência, Drª Camila, Secretária do Amazonas, abordando o Bioma Amazônia, Drª Ana Luiza falará sobre o Bioma Pantanal e a nós coube a tratativa sobre a Caatinga.
Nós traremos, aqui, informações que fazem o conjunto desses registros, em que abordamos um bioma tipicamente brasileiro, aliás, o único exclusivamente brasileiro, não se situa em fronteira com nenhum outro, envolvendo 11 Estados, considerando, aí, o nordeste de Minas Gerais e uma nesga do Espírito Santo.
Esse Bioma Caatinga está contido, temos, aqui, essa linha vermelha que caracteriza o limite de todo o Semiárido e o limite da Caatinga, que é representado, aqui, nos seus 751 mil quilômetros por essa área mais verde, está contida dentro do Semiárido.
Então, o Semiárido nordestino abriga, também, nesga do Cerrado, aqui, expresso nesse tom de verde mais escuro, e da Mata Atlântica, em alguns segmentos, em alguns resquícios restantes, principalmente, da proximidade do litoral.
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Essa é uma constatação de que se trata de um bioma única e exclusivamente brasileiro, que tem 27 milhões de habitantes e ocupa 11% do Território Nacional, sendo um bioma que abriga, em biodiversidade, 178 espécies de mamíferos; 591, de aves; 179, de répteis; 79, de anfíbios; 241, de peixes; e 221, abelhas. Portanto, um bioma considerado riquíssimo e com características próprias, unicidades que são encontradas.
Dentro dos recursos hídricos encontrados, nós temos, aqui, como o rio da integração nacional, o Rio São Francisco, cuja extensão, 2,830 mil quilômetros e com vazão na foz, vem se transformando, nos últimos anos, como uma esperança para solução hídrica da questão de todo o Semiárido, porque ele tem, na sua bacia hidrográfica, uma área de 634 mil quilômetros e vazão na foz de 2,7 mil metros cúbicos por segundo.
Há um projeto, não é um projeto novo, é um projeto que vem sendo aperfeiçoado, um projeto que nasceu desde o Império e já foi aventado por várias vezes, de transposição do Rio São Francisco, cuja transposição teria dois eixos, um eixo leste e um eixo norte, servindo, aqui, basicamente, todo o bioma e distribuindo o recurso de água.
Mas, nessa abordagem, nós vamos ver que, apesar da riqueza biológica, a Caatinga é um bioma brasileiro menos protegido, e menos pesquisado, e nós adotamos, aqui, para efeito dessa apresentação, um conceito que é afirmado por Edgar Morin, que é o da ciência nova, que é compreendido como um clássico para o complexo do Semiárido, um contraponto a essa ciência clássica, de extrair para uma análise um determinado assunto, mas, sim, de integrá-la dentro de um contexto.
Como nós vimos, aqui, o Semiárido abrange não somente a Caatinga, como também a Mata Atlântica e parte do Cerrado, fazendo com que esse complexo deva ser visto como concorrente e influente entre suas características próprias. A Mata Atlântica que é abrangida dentro do Semiárido tem características de proximidade com a própria Caatinga. No entanto nós temos registrado escassez de projetos que integrem o crescimento econômico, a inclusão social e a proteção do meio ambiente, a baixa precipitação pluviométrica e a escassez dos recursos hídricos que trazem o secular problema das secas.
E, apesar de perda de 50% da vegetação, a Caatinga, no Semiárido, é um bioma que possui cerca de 4,5 mil espécies diferentes de plantas, cujo potencial biotecnológico é muito grande e muito pouco usado e muito pouco pesquisado.
É um detalhe que não haveria de deixar de ser considerado que, dentro da antropização, das considerações da antropização da região do Semiárido e da Caatinga, deixamos de recorrer à colonização histórica, que se deu, de uma certa forma, com atipicidades que fogem à regra do restante do Brasil.
O Nordeste foi descoberto, praticamente, como o início do território brasileiro, vindo o português a se instalar no Nordeste do Brasil, e, daí, nós tivemos um período em que, antes de degredados, antes de condenados, vêm para cá expedições, logo que se criaram as Capitanias Hereditárias, historicamente, que se dedicaram a povoar e a colonizar.
Assim, Duarte Coelho trouxe em suas equipes de colonos os agricultores que se dedicaram à cana-de-açúcar e muitos pecuaristas que trouxeram o gado junto com eles da Europa. Essa questão trouxe a necessidade de separar a pecuária do plantio de cana, uma vez que a cana-de-açúcar era um pasto fácil para a predação daquele rebanho bovino, principalmente, e aconteceu de o gado, em sendo um incômodo, em sendo um impeditivo para plantação da cana-de-açúcar, tem uma carta régia, já, que normatizava o afastamento dos rebanhos do litoral.
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Ora, uma vez em procura de aguadas e de melhores pastos, encontrando aqueles rios secos, que são os rios intermitentes e são os dominantes na área da Caatinga, como verdadeiras estradas de adentramento ao Sertão, o gado foi sendo seguido pelo seu pastor, pelo pecuarista de então, que levava consigo todo o pessoal de manejo do gado e ali fazia uma instalação, um povoamento.
(Soa a campainha.)
Esse povoamento se dava, sobretudo, dentro de uma região, que era requerida como Sesmaria, que era um sistema jurídico adotado em Portugal para evitar, exatamente, esse êxodo rural e fazia com que, dentro de uma instalação local, eles viessem a desenvolver uma cultura própria que Ariano Suassuna definiu como cultura armorial.
Essa cultura armorial se desenvolveu ao longo de séculos isoladamente, explorando aqueles meios naturais dentro da biodiversidade da Caatinga, buscando em suas medicações vegetais, buscando em mezinhas, buscando em chás, soluções para as questões de saúde, solução para as questões, até mesmo, de curas de animais, e isso trouxe, com uma seca após outra, a resiliência que caracterizou essa tradicional população nordestina, na utilização dessa biodiversidade.
No entanto, as secas levaram a uma necessidade de um êxodo daquela área atingida de muitas populações não assistidas, criando refugiados ambientais, que foram retirantes que dali se ausentaram em busca de recursos de sobrevivência, principalmente, explodindo demograficamente as capitais, porque encontrou-se aqui, dentro do Semiárido e dentro da Caatinga, dos menores índices de desenvolvimento humano do Brasil e dos menores do mundo.
Nós temos, aí, índices entre muito baixo, baixo e médio, com raríssimas ocorrências de índice IDH alto, a ponto de, hoje, vermos que as crises são esses vetores de desertificação, as secas periódicas seculares, o aumento populacional, que é uma explosão da própria população, o uso insustentável dos recursos naturais e a desertificação que atinge, hoje, um desmatamento de 46% do bioma.
Pela exaustão dos recursos naturais, a par de ausência de manejo adequado, gerações seguidas, explotando de uma forma predatória, reduzindo, consequentemente, fauna e flora, que trouxe, dentro dessa área, uma área suscetível de desertificação, nas áreas do entorno, 712 mil quadrados suscetíveis de desertificação, e uma área já afetada pela desertificação em grau muito grave de 81 mil quilômetros quadrados em toda essa área contida dentro do Semiárido dentro da Caatinga.
Isso torna-se uma questão fundamental.
Hoje é o dia 19 de março. O dia 19 de março para o nordestino é o Dia de São José. Ele tem a crença de que, se chove hoje, vai haver um bom inverno, pela previsão das secas, e isso aí, em várias tradições religiosas, ocorre, mas, na verdade, na meteorologia nós temos isso explicado, porque é exatamente a condição que tem de encontro dos ventos alísios que provocam a chuva. E, para a felicidade dos nordestinos, nós percebemos que a previsão para hoje, 19.03, pelo INPE, é de que, no litoral, a partir do litoral do RN, possibilidade de chuva com nebulosidade variável e pancadas de chuva isoladas, e, nas demais áreas da região, muitas nuvens. Isso é um bom augúrio dentro dessa previsão.
Nós temos, aí, então, essas perspectivas como, dentro dessa região, uma possibilidade de trazermos um forte apoio ao que vem sendo o desenvolvimento do Parlamento brasileiro, notadamente, Sr. Presidente Otto, a aprovação da Lei da Política Nacional de Combate à Desertificação e Mitigação dos Efeitos da Seca, que é a matéria do PL nº 01, de 2015, e esperamos que o Executivo cumpra com a regulamentação da Lei Complementar nº 140, que distribui aos Municípios a competência de sua regência ambiental.
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Esse pacto de recuperação do bioma é necessário, porque, como instrução de inclusão no ordenamento constitucional, a gente precisa ter, também, a Caatinga assim definida. A Caatinga não entrou como patrimônio nacional na Constituição de 1988.
E, finalmente, uma criação dos instrumentos regulatórios de incentivo a Unidades de Conservação Sustentáveis.
Obrigado pela atenção, Presidente. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Eu quero agradecer ao Dr. Hélio Gurgel e dizer que a exposição que ele fez me toca profundamente, porque eu sou filho da Caatinga. Eu posso dizer, até, que eu sou um sobrevivente da seca.
Eu nasci na região mais seca da Bahia, que é a região da Chapada Diamantina, e, desde jovem, com meu pai, cuidando de cacimba para ter água de beber, água, inclusive, que não era tratada na época. E, todas as vezes que eu vejo uma referência ao Rio São Francisco, que é o chamado rio da integração nacional - ele nasce lá, na Serra da Canastra, no Estado de Minas Gerais, no Município de São Roque de Minas, passa, aí, por Minas, por Bahia, e vai desembocar lá, entre Sergipe e Alagoas -, e esse rio, que é o rio mais importante para o Nordeste brasileiro, só a solução virá dele e está em um processo de transposição de suas águas, e eu tenho procurado estudar isso, há muito tempo, e conheço todo o trajeto do Rio São Francisco, devo dizer ao Dr. Hélio Gurgel, que é nordestino como eu, e, se não houver uma ação forte, imediata, do Governo, não haverá transposição do Rio São Francisco. Ou seja, a obra vai ficar pronta, o canal vai ficar pronto, e nós não vamos ter água para fazer a transposição, porque houve, completamente, uma inversão no planejamento estratégico e no projeto de transposição do Rio São Francisco.
Na época, Vice-Governador do meu Estado da Bahia e até Governador, fiz muitas críticas, achando que era necessário, antes de qualquer coisa, se fazer a revitalização do Rio São Francisco para, depois, fazer a transposição.
Esse rio de 2,8 mil quilômetros de extensão, com 1,3 mil quilômetros de área navegável, hoje, tem, praticamente, no meu Estado, todos os afluentes da margem direita mortos, rios que eram perenes, que, hoje, são lembranças e que, no futuro, serão apenas um retrato na parede. Podia citar, aqui, rapidamente, assim, lembrando, três rios perenes com as suas nascentes, que morreram completamente, que é o caso do Rio Paramirim, na Bahia, o Rio Santo Onofre, o Rio Verde, o Rio Jacaré, e outros tantos morrerão.
Então, a minha preocupação nessa questão do meio ambiente no meu País é que eu ouço, todos os dias, através de representantes dos Governos estaduais, e até do Governo Federal, se falar em grandes adutoras, em grandes transposições de bacia, e não ouço falar na revitalização de nascentes, de riachos, de afluentes.
Então, essa Caatinga que ele mostrou aí, com essa população de 27 milhões de habitantes, esse povo está condenado a não ter água se não houver uma ação efetiva, pragmática do Governo para a revitalização da bacia. E nós só temos esse rio, inclusive formado 75% dele no Estado de Minas, com seus principais afluentes no Estado de Minas, com sedimento de esgoto em quase todos eles, com, também, sedimentos de afluentes líquidos e sólidos das fábricas que estão em torno desses rios, e a situação é uma situação de uma gravidade inimaginável.
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Na minha presença aqui, no Senado, e no meu Estado, eu coloquei isso de forma muito clara, Sr. Hélio Gurgel. A minha presença aqui é em defesa dos interesses do Brasil, porque o Senado defende a Federação, mas, no caso específico, é em defesa da revitalização do Rio São Francisco. Ou o Governo Federal toma uma decisão - ou os Governos estaduais -, ou, então, como disse há pouco, aqui, dentro de dez anos, vinte anos, o Rio São Francisco vai ser, apenas, um retrato na parede, uma lembrança de um rio que está morrendo de forma e com uma velocidade inimaginável.
E isso me preocupa muito, Senador Jorge Viana, o senhor é da região das águas, mas o Rio São Francisco, também, já teve uma vazão média, no inicio do século XIX, século XX até, uma vazão média de 5.700m³/s, e, agora, nós estamos com 1.100m³/s. Uma vazão, quase que cinco vezes menor em função do desmatamento das nascentes de forma criminosa, do desmatamento das mata ciliares dos riachos e rios afluentes, que eram perenes e, hoje, são temporários. E tem que se tomar uma providência urgente! Não é muito, não custa muito revitalizar, desassorear o Rio, tratar o esgoto das cidades ribeirinhas.
Então, o que me preocupa muito é que a Mata Atlântica - aqui está o Secretário de Meio Ambiente do Estado da Bahia, onde nós temos, lá, três biomas: Caatinga, Cerrado e Mata Atlântica; inclusive um que a gente considera que é o litoral: a área de mangue e de beira de costeiro - então, a Mata Atlântica, hoje, é uma grande lembrança na Bahia: você apenas tem a mata de cabruca, que é a que preserva o cacau; todas as outras árvores foram, praticamente, destruídas, e eu poderia dizer, citar aqui: caviúna, que é uma árvore muito bonita; cerejeira; baraúna; imbuia; pau d'arco; soba; juazeiro; jatobá; pau-ferro; angico; gameleira; aroeira; todas essas árvores destruídas da Mata Atlântica e que não existem mais. Então, ou se toma uma decisão de Governo, estrategicamente de Governo, para preservar a nossa biodiversidade, ou, então, o nosso País, sobretudo a minha região, o Nordeste, nós vamos ter dificuldades com abastecimento humano, animal e industrial.
Eu estava, há pouco, lendo uma matéria do grande cientista norueguês James Lovelock, onde ele diz que o aquecimento global, a destruição da Natureza neste século vai levar seis bilhões de pessoas à morte - estava lendo e acho, até, quase que o profeta do apocalipse, mas ele tem autoridade para dizer isso.
E, no nosso País, ou se toma uma decisão dessa natureza, ou, então, nós teremos uma situação muito ruim. E a Caatinga, o Cerrado e a Mata Atlântica já são as vítimas dessa ação do homem contra a Natureza.
Portanto, eu fico muito preocupado! E quando falo em Rio São Francisco, parece que se fala na minha alma, no meu espírito, porque eu sou da Região e me preocupo muito com isso.
V. Exª queria falar, Senador Jorge?
Eu vou passar a palavra ao Senador Jorge Viana.
O SR. JORGE VIANA (Bloco Apoio Governo/PT - AC) - Era só mais para reforçar e agradecer a exposição.
E, também, Senador Presidente Otto, V. Exª, desde que eu o encontrei, começamos a conversar sobre a sua possível vinda para cá, para a Comissão, e V. Exª disse: "Eu vou ter, como uma das missões do meu mandato e da minha Presidência na Comissão de Meio Ambiente do Senado, procurar cuidar do São Francisco." Eu quero estar junto.
V. Exª está falando de uma vazão, hoje, de 1.100, 1.200m³/s que já foi 5.000m³/s. O Rio Madeira, a média de vazão no Rio Madeira na cheia é 45.000, 46.000m³/s, mas chegou a 57.000m³/s - 10.000m³/s a mais do que qualquer série histórica que se tinha. Então, nós estamos vivendo uma situação... A água do Planeta, ela vai faltar aqui, sobrar num outro lugar, ela vai mudar de endereço, a movimentação vai estar presente.
Então, eu acho que nós temos que tratar, sim, com muito cuidado, com muita dedicação, de temas como este que nós estamos abordando aqui.
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O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Seguindo a lista dos palestrantes, eu quero passar a palavra à Drª Ana Luiza Ávila Peterlini Souza, Secretária do Meio Ambiente do Mato Grosso, que falará sobre o Bioma Pantanal.
Drª. Ana, por favor, a senhora pode tomar assento. (Palmas.)
A SRª ANA LUIZA AVILA PETERLINI SOUZA - Bom dia a todos.
Primeiramente, gostaria de agradecer o convite do Senador Otto Alencar e do Ministro Herman Benjamin, e dizer que é um prazer e uma honra poder participar deste seminário e contribuir, de alguma forma, com as informações que nós temos do Bioma Pantanal.
Eu sou Secretária de Estado de Meio Ambiente de Mato Grosso, e é importante para nós, inclusive, aproveitar esta oportunidade para falar um pouco sobre o nosso Estado.
Eu preparei uma apresentação, ela é, até, bem ilustrativa, e, ao menos, se não servirem as informações, as fotos vão ficar registradas, certamente, na memória de vocês.
Onde é que passa? (Pausa.)
(Intervenção fora do microfone.)
A SRª ANA LUIZA AVILA PETERLINI SOUZA - Está o.k.
Bom; Mato Grosso possui três biomas bem definidos. Nós temos o Bioma Amazônia, que ocupa a maior extensão do Estado, com 53%; temos o Bioma Cerrado, também extenso, ocupando 40% do nosso Estado; e o Bioma Pantanal, ali a sudoeste, ocupando apenas 7%, o que não significa que ele seja menor, já dada à sua grande importância, não só para o Estado, como para o próprio Brasil.
Este daqui é um mapa: o Pantanal está inserido dentro da Bacia do Alto Paraguai. Nós podemos observar que a área alagável corresponde a 141.510km². Essa é uma área que a gente considera como a maior planície inundável do Planeta. Ela, praticamente, confere com o Bioma Pantanal. E ela é toda circundada por planaltos. Essa parte marrom são os planaltos, que ocupam boa parte desse território.
Bom, o Bioma Pantanal, também, não se restringe ao território nacional: nós temos 40% dele no território da Bolívia e do Paraguai, sendo 20% em cada um deles. No Brasil, também, nós temos 40% do território no Estado do Mato Grosso, e 60% dele, no nosso vizinho, o Estado do Mato Grosso do Sul.
Dada a importância do Pantanal, ele já recebeu diversos títulos conferidos pelo mundo. Primeiramente, ele é reconhecido pela Constituição Federal de 1988 como um Patrimônio Nacional. Em 2000, a Unesco reconheceu o Pantanal como Reserva da Biosfera. Também em 2000, a Unesco reconheceu, como Sítio do Patrimônio Natural da Humanidade, o Parque Nacional do Pantanal, que está inserido dentro desse bioma, e a RPPN Dorochê, no Mato Grosso, a RPPN Acurizal, no Mato Grosso do Sul, e a RPPN Penha, também no Mato Grosso do Sul. O Sítio Ramsar, em 1993, também reconheceu o Parque Nacional do Pantanal e a RPPN Sesc-Pantanal como uma área úmida de grande importância.
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O Pantanal é considerado uma área úmida, e, em razão de ser conceituado como área úmida, o Brasil, em 1993, assinou a Convenção Ramsar. Assim, hoje, o Brasil é signatário dessa Convenção internacional e tem, como obrigação - não é? - exercer uma política nacional para a gestão inteligente e para a proteção das áreas úmidas e sua biodiversidade.
Daí, dizer para os senhores, como disse o Ministro Herman, que nós temos que nos valer dos tratados e convenções internacionais, que têm força de lei para o nosso País e nos coloca, como obrigação, na defesa dessas áreas úmidas.
E o que significa "áreas úmidas"? Áreas úmidas são ecossistemas na interface entre ambientes terrestres e aquáticos. Eles estão permanente ou periodicamente inundados; as águas são rasas; os solos estão constantemente encharcados, são doces, salobros ou salgados; e há uma infinidade de comunidades de plantas e de animais que são adaptadas a essa dinâmica hídrica, tanto a dinâmica aquática, como a dinâmica terrestre.
E o que move o Pantanal? Qual que é a importância do Pantanal? É, justamente, esse pulso de inundação: esse período em que o Pantanal fica, parte do ano, alagado e, parte do ano, seco. Isso faz com que a gente tenha a oportunidade de ter, no Bioma Pantanal, um dos biomas mais preservados, justamente porque o uso acaba sendo restritivo, sendo que, parte do período, acaba ficando alagado por conta desse pulso de inundação.
Nós temos no Pantanal, por conta dessa importância e, principalmente, por conta desse pulso de inundação, uma grande biodiversidade. Nós temos cerca de 263 espécies de peixes. Nós estamos vendo, ali, foto de dourado, temos pintado, piavuçu, piraputanga. Temos cerca de 650 espécies de aves, como tuiuiú, garça e a própria arara. Temos, também, 132 espécies de mamíferos: temos uma foto, ali, de uma onça-pintada, macaco, capivaras. E cerca de 150 espécies de anfíbios e répteis. Esses dados foram tirados do Ministério do Meio Ambiente, são dados oficiais, e, claro, que pode haver uma variação nesse número de espécies.
Aqui, eu acho interessante: a gente traz imagens da paisagem do Pantanal. Nós temos um período de seca e um período alagado, onde vocês podem notar a grande biodiversidade de flora. Nós temos cerca de 2.000 plantas catalogadas. Ali ao fundo, no primeiro eslaide, a gente pode ver a piúva, que é a árvore símbolo do Pantanal; aquela amarela é o ipê - não é? -; e, abaixo, a gente vê a vegetação típica das áreas alagadas, das áreas de campos. E, na verdade, o Pantanal acaba sendo um cerrado baixo que passa boa parte do seu tempo sujeito à alagação.
Nós temos, também, unidades de conservação dentro do Bioma Pantanal: 8,5% do nosso Pantanal são áreas protegidas, são unidades de conservação. Nós temos oito áreas protegidas, sendo dois parques estaduais, um parque nacional, que é o Parque Nacional do Pantanal, três estradas-parque e três Reservas Particulares de Patrimônio Natural.
A Secretaria tem feito mapeamento dos ninhais, que são grandes locais de reprodução das aves. Nós temos uma quantidade muito grande de aves e, constantemente, a Secretaria de Meio Ambiente faz o monitoramento para garantir a preservação e a reprodução dessas espécies. Esses ninhais, também, acabam sendo focos de turismo de observação: nós temos muitos turistas que vão ao Pantanal para fazer esse turismo de observação.
Uma outra grande riqueza do Pantanal é a pesca...
(Soa a campainha.)
A SRª ANA LUIZA AVILA PETERLINI SOUZA - ... são os recursos pesqueiros que nós temos. E, também, fazemos um monitoramento constante para que a gente possa definir exatamente o período de reprodução e, em razão disso, definir os períodos de piracemas, que são os períodos de defeso para a pesca. Hoje, esses períodos de defeso são definidos de outubro a fevereiro... Não, desculpem: de novembro a fevereiro, são quatro meses. Mas há intenção de aumentar esse período para seis meses - estudos estão sendo feitos nesse sentido.
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Bom; como todo bioma, nós temos a crise também em razão, por exemplo, da qualidade de água. Nós fazemos um monitoramento, só que a gente pode observar, por esse eslaide, que temos alguns rios que são os principais afluentes do Pantanal, como o Rio Cuiabá, o Rio Paraguai e o Rio Vermelho, também, que eles cortam grandes áreas urbanas. Então, quando o rio passa por essas áreas urbanas, infelizmente, eles recebem grande quantidade de esgoto. Cuiabá, por exemplo, nós só temos, por enquanto, 30% de rede de esgoto, e esse esgoto acaba indo para o Pantanal. É assim também com Várzea Grande, que é uma das maiores cidades, e Rondonópolis.
O Pantanal sofre o desmatamento, mas, ainda, não é expressivo. A gente pode perceber, pelos números, que, tanto o Bioma Amazônia, como o Bioma Cerrado, acabam, em razão do uso, sendo mais desmatados. O Pantanal, hoje, ele tem 24%, apenas, da sua área desmatada. Isso acontece também porque ele passa boa parte do tempo alagado, como eu já lhes disse.
Alguns momentos, principalmente quando os períodos de cheia não são intensos - não é? -, o Pantanal está muito sujeito aos incêndios. Então, nós temos um grande número de incêndios florestais quando a gente tem períodos de seca mais prolongados.
Grande parte do impacto, também, que tem sofrido o Pantanal acontece, principalmente, na região do planalto. Nós temos cerca de 75 usinas hidrelétricas em operação e em instalação, sendo que 4 são hidrelétricas e 71 são PCHs. Isso, realmente, traz preocupação, não por serem as Pequenas Centrais Hidrelétricas nem tão impactantes, mas pela quantidade delas ao longo de um mesmo rio.
A agricultura, também, na região de planalto, que é a região onde se localizam as principais nascentes e as cabeceiras do Pantanal, a agricultura é intensa e isso tem causado preocupação. Inclusive, amanhã, nós temos um seminário, em Cuiabá, para que a gente discuta um pacto pela proteção das nascentes da Bacia do Alto Paraguai.
A pecuária, também, causa, evidentemente, determinados impactos.
E, ali, é uma foto do lixo sendo colhido nas baías que ficam próximas ao Pantanal, depois de já ter passado pela região de Cuiabá e Várzea Grande.
Quais as perspectivas - já estou encerrando; mais 30 segundos - para o Pantanal? Atividades sustentáveis. E, talvez, a mais sustentável delas seja, de fato, a pecuária extensiva - não é? Ela já existe na região há mais de 300 anos, e ela garante essa sustentabilidade porque, primeiro, em razão de passar boa parte do tempo alagado, não é possível a colocação de muitas cabeças de gado, porque, no período das águas, essas cabeças de gado precisam ser colocadas em áreas mais elevadas e que são essas áreas secas. A pesca, também, é intensa, mas nós precisamos fazer um trabalho, porque, de fato, hoje, a pesca é profissional, ela ainda não está sustentável; temos muita pesca predatória. E o turismo de observação, o ecoturismo e o turismo de pesca mostram-se como usos sustentáveis para esse espaço protegido, assim como o turismo cultural.
Eu agradeço a todos, e me coloco à disposição para eventuais esclarecimentos.
Obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Eu passo, agora, a palavra ao Dr. Eugênio Spengler, Secretário de Meio Ambiente do meu Estado, o Estado da Bahia, que falará sobre o Bioma Cerrado.
O SR. EUGÊNIO SPENGLER - Primeiramente, agradecer o convite do Senador Otto e do Senador Jorge Viana. Faço uma menção, aqui, ao Ministro, que, também, esteve envolvido na organização deste evento. Cumprimento os outros Parlamentares aqui presentes, na pessoa do Deputado Átila, Presidente da Comissão de Meio Ambiente da Câmara dos Deputados.
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Eu, agora, estou numa função, substituindo o Dr. Hélio, na Presidência da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema). E tanto em relação à Comissão de Meio Ambiente do Senado, quanto em relação à da Câmara, a gente gostaria de manter a relação, que sempre foi estreita nesse período. E manter essa relação porque nós temos uma agenda importante, de interesse dos Estados, e que o Congresso Nacional, necessariamente, pode nos ajudar. E isso desde questões legislativas, como também no apoio a alguns projetos que são estruturantes e que estão relacionados à questão da biodiversidade.
O meu convite foi para falar um pouquinho sobre o Bioma Cerrado.
Alguns números importantes.
O Cerrado abrange 2,1 milhões km² do Território Nacional...
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. EUGÊNIO SPENGLER - Eu não tenho apresentação, Deputado. Eu não sei falar com apresentação.
(Intervenção fora do microfone.)
O SR. EUGÊNIO SPENGLER - Então, me desculpa, mas, realmente, quando coloca uma apresentação para mim, eu me perco totalmente.
Ele abrange 2,1 milhões km² de área e o território de catorze Estados e do Distrito Federal. E, desses catorze Estados, três deles... Na verdade, além do Cerrado que a gente conhece aqui - Sudeste, Centro Oeste, Nordeste -, nós temos três Estados que têm área de cerrado, que é o Amapá...
ORADOR NÃO IDENTIFICADO (Fora do microfone.) - Piauí.
O SR. EUGÊNIO SPENGLER - E, sim,... Não, mas aí é Nordeste. Eu estou falando que, além da Floresta Amazônica, nós temos Cerrado no Amapá, Roraima e, também, algumas regiões do próprio Estado do Amazonas, que têm área de cerrado, porque, quando a gente fala de Cerrado, desconsidera essa peculiaridade e essa característica desse bioma.
Dos 2,1 milhões km² de área de cerrado, nós já temos, segundo dados oficiais do próprio Instituto Chico Mendes, 700 mil hectares com ocupação antrópica, principalmente com atividade agrícola e pecuária - obviamente, tem cidades em cima, mas a grande ocupação é dada pelas atividades "agrosilvopastoris", e por aí vai. Ele representa em torno de pouco mais de 22% do território nacional.
E, um outro dado importante, retirado do Instituto Chico Mendes, é que 8% da área do Cerrado são constituídas de unidades de conservação. Então, nós precisamos aumentar, obviamente. O ideal é que a gente tenha, pelo menos, 10%, mas estamos com uma concentração bastante boa, e acho que se tem que atingir, aí, no próximo período, o que está acordado.
Uma outra questão importante - é importante salientar aqui: nós temos três grandes bacias hidrográficas que dependem do Cerrado: a Bacia do São Francisco, que já foi referenciada aqui pelo Senador Otto Alencar e pelo Dr. Hélio Gurgel; a Bacia do Prata; e a Bacia do Tocantis/Araguaia. Observem que o Cerrado se constitui numa grande caixa d'água e ele impacta a questão de recursos hídricos de todas as regiões brasileiras.
O Aquífero Urucuia, que tem uma boa parte da sua localização no território baiano, mas abrange Tocantins, Piauí, um pedaço de Minas Gerais, e, também, me parece que pega uma faixa de Goiás - me ajudem aqui, por favor -, mas, o mais importante que eu quero dizer é que, em alguns períodos do ano, ele pode contribuir com até 90% da água do São Francisco. E nós estamos com um processo extremamente intenso de uso da água desse aquífero para atividade econômica. E eu não estou me manifestando, aqui, contrário.
O grande desafio é: como é que se equaciona o uso econômico do recurso hídrico com uma estratégia que garanta recarga para termos a quantidade e a qualidade de água necessária para garantir a sustentabilidade do Aquífero e de todas as bacias hidrográficas penduradas nesse Aquífero?
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. Esse é o aspecto central. Do ponto de vista da recarga de aquífero, há alguns estudos que apontam que a supressão de vegetação não afeta, de forma definitiva, a recarga do aquífero. O que se precisa garantir é o manejo adequado do solo, com curvas de níveis, terraceamento, barraginhas para permitir a infiltração da água, o cuidado com o assoreamento, com erosão, alguns cuidados importantes e, obviamente, a proteção das principais nascentes, ou das nascentes, o que vai garantir o equilíbrio desse processo.
É fundamental salientar, Senador Jorge Viana, que a toda a água superficial, principalmente nos 150.000Km² de Cerrado que estão na Bahia - aproximadamente isso -, a água subterrânea e a água superficial são a mesma água. Os rios do cerrado baiano, principalmente - e essa é uma característica dos rios do cerrado -, mantêm um equilíbrio bastante próximo do período de chuvas que se registra agora - e nós estamos no final deste período, no cerrado - e no período de seca, que entra a partir de maio, principalmente, e vai até outubro, novembro, variando ano a ano o período climático. Isso porque, justamente, são os aquíferos que mantêm vivos e abastecem esses rios e todo o recurso hídrico superficial.
Então, é importante esse detalhe. Uma característica fundamental é essa.
A outra característica importante é que nós temos, segundo dados do Chico Mendes, mais de 10 mil espécies vegetais catalogadas, chegando a 11 mil e qualquer coisa, ultimamente, espécies vegetais; mais de 800 espécies de aves catalogadas e mais de 160 espécies de mamíferos já catalogados, todos igualmente fundamentais para a questão do equilíbrio e da biodiversidade.
Só uma complementação: se a supressão de vegetação não é tão determinante para recarga do aquífero, segundo dados de estudo, ela é extremamente impactante em relação ao equilíbrio da biodiversidade como um todo. Isso para não ficar informação incompleta aqui, nesse aspecto.
Então, esse são alguns dados que a gente precisa ter bem presentes quando se discute.
Em relação ao projeto de lei que está em discussão, aqui no Parlamento brasileiro, eu gostaria de salientar algumas coisas importantes. E aí, me desculpem, eu não tenho todos os dados dos Estados; eu vou acabar focando um pouquinho mais em algumas coisas da Bahia.
Nas áreas de veredas, que são as áreas mais úmidas, nas áreas mais próximas aos rios, é muito comum a ocupação dessas áreas por comunidades de feches de pasto. São comunidades cujas áreas, a grande maioria delas, são de uso coletivo; que vivem ali há 100, 150, 200 anos. Eles foram se estabelecendo ali trabalhando, inclusive, na fazenda, e o fazendeiro permitia que eles ocupassem o fundo da fazenda. Havia o aspecto de moradia, de produção de algum alimento e, também, segurança da própria fazenda, evitando caça, roubo e uma série de fatores. Assim, esse grupos foram se estabelecendo. E eles são responsáveis por grande parte da proteção e do conhecimento acumulado em relação ao uso de ervas medicinais, à chás e determinados alimentos que hoje são industrializados, inclusive, por determinadas indústrias, que acabaram até patenteando isso. Ocorre que essas pessoas não têm o retorno desse benefício que construíram e desse conhecimento acumulado que eles têm e que contribui, fundamentalmente, para a questão da nossa biodiversidade.
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Então, é um problema fundamental. No nosso caso - o Dr. Otto foi Vice-Governador e eu estou lá há cinco anos como Secretário de Meio Ambiente -, nós estamos mapeando essas comunidades, esses grupos. Normalmente, essas áreas são áreas devolutas do Estado; são áreas pertencentes ao Estado. O Estado da Bahia tem um grupo de trabalho, na Procuradoria-Geral do Estado, que está fazendo levantamento fundiário do Estado, para identificar quais são as áreas, não só do cerrado, mas de todo o território baiano, que são áreas devolutas, para que a gente possa ter uma estratégia voltada para a conservação dessas áreas e a regularização fundiária, assim por diante. Então, esse é um aspecto importante, que a gente gostaria de ressaltar.
O outro aspecto, na minha opinião, que é fundamental e que a gente precisa ter em conta é a identificação agora, principalmente, para os atos autorizativos. Veja bem, o Estado da Bahia, e eu não vou mentir aqui... A maior fronteira agrícola do mundo está no cerrado brasileiro. Isso, também, ninguém esconde. E não vamos imaginar que nós vamos resolver o problema ou que vamos conseguir atingir o desmatamento zero. Nós estamos perseguindo desmatamento ilegal zero, porque é uma área de expansão agrícola, a principal área de expansão agrícola, e o que a gente precisa fazer - e esse é o grande desafio - é o zoneamento do cerrado.
O Governo Federal fará o zoneamento do cerrado todo; nós concluímos o zoneamento do Estado da Bahia, inclusive o do cerrado; e nós precisamos, através do ordenamento territorial, da organização do território, estabelecer quais são as áreas para garantir corredores de biodiversidade, a ocorrência de espécies ameaçadas de extinção, e presença de espécies ameaçadas de extinção, da flora, da fauna, do conjunto da biodiversidade, levando em consideração a presença de comunidades tradicionais, fundo de pasto, feche de pasto, povos e comunidades indígenas, e assim por diante, e áreas prioritárias para conservação, áreas importantes para recargas de aquífero, e, assim, fazer um mapeamento para estabelecer, aí, o limite da expansão econômica.
Garante-se, com isso, uma parcela fundamental de cota de reserva ambiental; e o Código Florestal nos dá um instrumento importante da cota de reserva ambiental, a fim de compensação da reserva legal, dos 20%, - no caso do cerrado não amazônico, são 20%; no cerrado amazônico é 30%. Possibilita a garantia de corredores de biodiversidade, a garantia de equilíbrio alimentar e reprodução das espécies e, fundamentalmente, o reconhecimento do acúmulo de conhecimento, em relação à biodiversidade, de povos e comunidades tradicionais, pequenos agricultores que contribuem, fundamentalmente, para o desenvolvimento de conhecimento social da biodiversidade e para a preservação desse patrimônio.
Era isso, basicamente. Eu já passei bastante do meu tempo.
Agradeço o convite e coloco sempre, tanto a Abema, como o Estado da Bahia, à disposição dos senhores, no Senado e na Câmara.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Agradeço ao Dr. Eugênio e convido a Drª Kamilla Botelho do Amaral, Secretária de Meio Ambiente do Amazonas, para falar sobre o Bioma Amazônico.
A SRª KAMILLA BOTELHO DO AMARAL - Bom dia, Senador. Agradeço pelo convite, pela oportunidade de apresentar aqui o Bioma Amazônico. É um desafio, mas eu espero que a gente consiga passar alguns números, e os convidados aqui, da Comissão de Meio Ambiente, vão poder ver os superlativos dos Estados que compõe a Amazônia.
Obrigada.
Bom, como o tema é Bioma Amazônico, eu não poderia deixar de falar sobre todo o bioma, contemplando assim todos os países que compõe o nosso Bioma Amazônico.
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Temos 7,7 milhões de km², com nove países compondo o que é chamada de Panamazônia.
Os Estados brasileiros, que são nove, chegam a mais de 5 milhões de km². Então, visualmente, a gente consegue perceber que os Estados brasileiros são os que mais têm espaço na Panamazônia.
Muitas pessoas acham que só há um tipo de floresta, a Floresta Amazônica, mas já há estudos que demonstram que há identificados até 22 tipos de florestas que compõem o Bioma Amazônico.
Então, é uma diversidade. Isso corresponde só aos estudos no bioma brasileiro, na Amazônia brasileira, onde há uma composição de florestas, várzeas, campinaranas. Há uma diversidade que compõe esses nove Estados brasileiros.
A gente também precisa destacar o trabalho feito para a proteção dessas áreas.Todos os Estados da Amazônia possuem 315 áreas protegidas. Isso significa dizer que há 179 áreas protegidas estaduais e 136 federais.
Eu queria apontar para vocês que essas áreas que estão aqui em cor meio alaranjada são Unidades de Conservação federais. Então, dá para perceber quanto é abrangente a proteção de áreas federais no Bioma Amazônico. As áreas em azul são as Unidades de Conversação estaduais, e as áreas aqui em vermelho, também. Vocês podem observar aqui uma concentração.
A gente já vai explicar que cada trecho de área desse tem uma explicação, uma composição de áreas. Eu fiz uma sobreposição aqui de áreas protegidas versus desmatamento. Este aqui é um mapa do desmatamento consolidado, Senador Otto, até o ano de 2012.
A gente pode verificar como as áreas em vermelho estão avançando nos Estados. Há concentrações muito específicas, e isso é muito em razão do uso do solo. É muito fácil conseguir notar como as áreas protegidas, essas que estão aqui em linhas brancas, essas divisões brancas, conseguem conter o desmatamento.
Dando um zoom aqui neste espaço, a gente consegue verificar, no Estado do Acre, no Estado do Amazonas, aqui na região do Pará, em Mato Grosso, que, onde há áreas protegidas, são essas exatamente o limitante do desmatamento, mesmo que estejam próximas a grandes rodovias federais, demonstrando-se, assim, o resultado positivo que criações de áreas protegidas trazem, para que consigamos realmente que haja a conservação ambiental. É uma resposta realmente muito positiva.
Lembro que, nos Estados amazônicos, há 43% de áreas protegidas, somando-se as áreas indígenas e as Unidades de Conservação federais e estaduais.
Como se têm dado a ocupação e o uso do solo nesses Estados? Existe uma área com uma pressão muito forte, uma pressão humana consolidada especialmente pela agropecuária, pelas estradas; a área urbana, que é pequena; e especialmente o desmatamento.
Mas existe uma lógica para isso acontecer. O desmatamento ocorre primeiro pela retirada de madeira, a primeira riqueza a ser retirada; depois disso, há a consolidação com a agropecuária, com a passagem de estradas. E há, nos nove Estados amazônicos brasileiros, 19,25% de pressão humana consolidada.
A área em amarelo - vocês conseguem verificar aqui que é uma área bastante extensa - é a nossa preocupação: é a pressão humana iminente, onde se tem a expansão da agropecuária, a expansão do desmatamento, a expansão da ocupação humana. Então, é bastante preocupante verificar uma grande concentração - a cor amarela aqui, que vocês podem verificar - pressionando essa área verde de floresta, que é de 46,45%. Para chegar aos 100%, a gente não pode deixar de destacar a porcentagem de água, 2,1%.
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O que está em risco, com essa pressão e com essa retirada de floresta, com essa substituição do solo da floresta por agropecuária, por área de pastagem? Nós temos uma biodiversidade com 30 mil espécies de plantas, 1,8 mil espécies de peixes, 1,3 mil de aves, 311 mamíferos e 163 anfíbios e ficamos depois da Mata Atlântica em números de espécies. Isso não significa que estejamos realmente em segundo no ranking, mas, sim, pela falta de pesquisa.
A Região Norte do País, a Região Amazônica, é onde menos se tem concentração de pesquisadores, onde se tem menos levantamento de todo o Brasil. Existe um começo, ainda, de levantamento de dados. Então, esses números podem ser muito maiores.
Nós estamos na lista, com 23 espécies em extinção, e o risco iminente é que, por mais que exista uma oscilação - não é Vicentin? - e que se tire da lista... Mas, quando se tira da lista de extinção, isso não significa que eles saíram da ameaça. Eles voltam para um nível abaixo, e ficamos sempre correndo e tentando...
Como sempre alerto, o problema não são somente os animais que estão na lista de extinção ou os que estão ameaçados. O problema são aqueles que a gente não conhece, que nem identificou, que ainda não tem catalogados. Essa é a nossa grande preocupação.
E centenas, dezenas de animais, de espécies podem ter sido perdidas pela nossa falta de pesquisa e pela nossa falta de proteção territorial. Esse é um alerta.
A hidrografia, como falei, são os nossos superlativos. Nós temos o maior rio do mundo, que começa desde os Andes peruanos e que vai até a foz no Oceano Atlântico. E temos a maior concentração de rios navegáveis, com 25 mil quilômetros quadrados.
Isso significa dizer que, através desses rios, as populações se comunicam, o comércio se comunica. E a gente poderia também investir bastante, para que os Estados amazônicos tivessem transporte em 25 mil quilômetros de rios navegáveis. Faço questão de repetir.
De toda a hidrografia do Bioma Amazônico, 66%, essa faixa azul aqui, da pizza, é nossa, é brasileira. E os outros oito países dividem aí os 40%, sendo a maior concentração no Peru e na Bolívia.
(Soa a campainha.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Pode continuar.
A SRª KAMILLA BOTELHO DO AMARAL - Obrigada.
Nós temos 25 milhões - infelizmente nosso Senador do Acre não está aqui; ele falou de 5 milhões de amazônidas, gostaria de enfatizar isso - divididos em 775 Municípios, 16% da população nacional.
E um dado que preciso muito registrar é que quase 70% da população amazônica é residente urbana e que apenas 30% residem em área rural. Esse número tende a diminuir, porque há um êxodo rural na Região Amazônica. As pessoas estão saindo das áreas rurais e indo para as sedes dos Municípios, para as áreas urbanas.
Então, muitas pessoas pensam que, na Amazônia, há pessoas morando somente na área rural, mas esse é um dado que a gente precisa corrigir.
A grande questão, para ir finalizando, falando de crises e perspectivas, é a questão fundiária, ressaltando aqui a fala da Ministra Izabella Teixeira. Nós não temos - e a gente tem enfatizado muito isto - como fazer a regularização ambiental, sem fazer a regularização fundiária.
E a questão fundiária amazônica é uma das mais problemáticas, Senador, do Brasil. Enquanto o Brasil não encarar a questão fundiária amazônica, a gente vai continuar perdendo floresta, vai continuar perdendo biodiversidade, vai continuar lutando contra a ilegalidade.
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Então, esses números são: 35 milhões de hectares de área em posse. Isso significa que 52,8% do Brasil que está em posse se concentra na Região Amazônica. São pessoas que não têm nenhum tipo de documento, nada, não têm nenhuma concessão de direito real de uso, nenhuma documentação de terra, apenas a possuem, apenas estão lá, apenas existem, apenas estão lá naquela área.
Desse total, é importante também dizer que 283 mil, o que significa 95%, têm até 400ha, o que significa que são os pequenos, a agricultura familiar; e 5% são os chamados latifúndios. Repetindo o número, a questão fundiária só não é mais grave, porque 43% do nosso território amazônico está em terras indígenas e áreas protegidas, federais ou estaduais, o que não significa dizer que as áreas protegidas já estão regularizadas, mas, pelo menos, já estão identificadas e delimitadas, precisando ser regularizadas.
Quais são os desafios? Senador, eu tive a ousadia de elencar alguns pontos que, com certeza, não são os únicos desafios, mas são os principais:
Melhoria da qualidade de vida. Infelizmente, a população amazônica se encontra com os menores IDHs do Brasil, o que é um grande absurdo, porque, se temos os maiores números - o maior rio, a maior floresta, a maior biodiversidade -, é inaceitável que Municípios estejam ainda com IDH de 0,2, com números tão incipientes para saneamento e uma qualidade de vida tão abaixo do padrão médio brasileiro.
É necessário que a gente faça um ordenamento territorial ecológico e econômico. Existe uma proposta de várias instituições, de vários pesquisadores, para que sejam feitos polos econômicos regionais onde se possa concentrar o desenvolvimento econômico em algumas regiões, para que não se fique com aquelas áreas espalhadas. Por exemplo, se existe um polo moveleiro, um polo madeireiro, um polo de produtos extrativistas, se faz uma concentração, ordena e consegue fazer com que o crescimento seja menos desordenado, como funciona hoje.
Regularização fundiária e ambiental. O cadastro ambiental rural está impulsionando muito a regularização fundiária. Eu espero que a gente consiga caminhar junto com essas duas agendas.
Investimentos para a proteção ambiental. Manter uma área protegida é caro - o Vicentinho sabe disso, o ICMBio sabe disso, os Estados do Amazonas, Amapá, Acre, os Estados amazônicos sabem como é caro ter áreas protegidas -, em razão do risco do aumento de animais em extinção, que é gritante, é a maior preocupação na agenda ambiental do Brasil hoje.
O desafio da segurança hídrica. Se a gente não conseguir, realmente, ter áreas protegidas, a gente está colocando em risco a maior quantidade de água existente no Brasil, tendo reflexos no Sudeste brasileiro e na economia nacional.
Por fim, ao longo da minha fala, eu trouxe muito isto: a pesquisa científica e a qualificação técnica, nós precisamos investir em pesquisa científica na Amazônia, e os extremos climáticos. Senador, os números dos extremos climáticos de seca e cheia na Amazônia estão trazendo prejuízos econômicos para o Brasil quando se precisa pagar auxílios imediatos em razão da cheia, quando se perde agricultura. Na última cheia, no ano passado, houve animais boiando na cheia. Isso demonstra que nem os animais estão conseguindo acompanhar as mudanças climáticas extremas.
Então, era isso o que eu queria colocar para vocês. Agradeço e finalizo, trazendo um trecho do hino do Amazonas que fala: "Amazonas de bravos que doam, sem orgulho nem falsa nobreza, aos que sonham, teu canto de lenda, aos que lutam, mais vida e riqueza".
É um pouquinho da Amazônia para vocês. Espero que eu tenha conseguido trazes esses números e essas informações.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Parabéns.
Eu queria, agora, dando seguimento, convidar, para fazer a sua palestra, o Dr. Jonathan Hughes, Diretor-Presidente do Scottish Wildlife Trust, pelo tempo de dez minutos.
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Mas, Kamilla, complementando, eu acho que a natureza do nosso País, os rios são como os generosos: fazem muito mais pelo Brasil do que o Brasil por eles. Então, temos que inverter essa lógica.
O SR. JONATHAN HUGHES (Tradução por profissional habilitado.) - Muito obrigado pela oportunidade de falar aqui, hoje, durante este evento tão importante. Meus agradecimentos a Antonio Benjamin, por organizar este evento, e aos tradutores, pelo trabalho muito bom que estão fazendo.
Nós ouvimos alguns discursos apaixonados, hoje, de vários representantes eleitos aqui, no Brasil. Eu gostaria de ouvir a mesma paixão dos meus políticos do Reino Unido. Evidentemente, há uma comunhão e uma compreensão, um relacionamento, no Brasil, entre o povo brasileiro e o próprio meio ambiente, e isso está claro aqui, hoje pela manhã. Foi muito bom ver isso.
Vou falar um pouco sobre capital natural. Qual é a diferença entre isso... Qual é o conceito, e como é diferente do ambiente natural, dos ativos naturais, os recursos naturais? Para mim, isso vai além do conceito, o conceito de capital natural vai além da ideia do ambiente sendo apenas um ativo ou um recurso a ser explorado.
Volto ao que Senador falou: nós temos que ir além do PIB. Quais são os resultados que estamos buscando, como uma sociedade, para o nosso ambiente? Precisamos tratar o meio ambiente como um sistema vivo que nós temos que nutrir, temos que recuperar, e, se assim fizermos, ele vai continuar beneficiando o homem. Isso causou uma mudança na nossa visão sobre o meio ambiente, nos últimos anos, e no nosso programa internacional, que fala sobre soluções baseadas na natureza. A natureza não é algo a ser consertado, exige recursos e investimentos em dinheiro, mas ver o meio ambiente como algo que fornece muitos benefícios e soluções para a raça humana.
Então, capital natural é um termo que significa viver com as nossas contas, digamos, de capital nacional e saber como recuperar isso, como utilizar esses benefícios enquanto conservamos e protegemos isso contra as consequências. Essa é a minha mensagem para os Ministérios da Fazenda do Planeta, e não apenas para os ambientalistas, por causa das decisões que são tomadas e que afetam o meio ambiente, mas que não são tomadas nos Ministérios do Meio Ambiente.
O que é, então, o capital natural? Eu vou colocar uma definição na tela, daqui a pouco, mas quero mostrar algo que fizemos, recentemente, para a Burns Night. Para aqueles que não sabem - eu moro na Escócia -, Burns Night é uma celebração ao poeta Robert Burns.
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As pessoas tomam muito uísque, na noite de Robert Burns, dia 27 de janeiro. Bebem uísque e comem haggis.
E nós perguntamos como que nós podemos mostrar a ligação entre o uísque como produto e o capital natural? O que tem no uísque? Vai ter água, claro, ouvimos muito sobre água aqui hoje, nós temos cevada, árvores do tipo oak também para os barris... É preciso sistemas também para criar o produto final. O que precisa é um sistema, é uma paisagem em que funcione o sistema de água, para poder fazer o uísque. A próxima vez que vocês forem a um Free Shop que vende um uísque 12 anos, pensem em mais de 10 mil anos, porque levou muito tempo para formar as turfas, esse tempo todo.
Então, isso, as turfas... Isso é uma coisa um pouco mais interessante do que a definição técnica, devíamos chamar de uísque de 10 mil anos, porque é exatamente isso.
Então, a definição técnica é o estoque dos ecossistemas naturais da terra, incluindo o ar, a água, a terra, o solo, a biodiversidade e os recursos geológicos também. É esse estoque que fundamenta a nossa economia, a sociedade, a produzir valor para as pessoas, tanto direta quanto indiretamente. Mas coloquem nesses termos aqui e pensem no exemplo do uísque.
Então, nesta apresentação tão breve, eu quero considerar três coisas: por que capital natural? Por que ver desse jeito? Quais são os mecanismos disponíveis nesse paradigma de capital? E quero deixar vocês com algumas ideias de políticas que vocês podem olhar ou não no futuro. Talvez estejam fazendo já aqui no Brasil.
Então, por que capital natural? Até 2050, a produção agrícola vai crescer cerca de 60%. Vamos chegar a uma população em torno de 10 bilhões em 2050. E com isso nós vamos ter demanda de produtos de carne, com crescimento de 76%. Isso vai exigir o aumento, a curto prazo, na área dedicada à agricultura, de aproximadamente 1 milhão de quilômetros quadrados. Isso vai exigir a conversão de áreas para esse uso. As plantações de dendê, por exemplo, devem aumentar de aproximadamente 6 milhões de hectares agora para 20 milhões em 2030. E isso utilizando as turfas e as florestas.
Olhando onde isso vai acontecer, onde estão as maiores pressões, vão ver que o Brasil está no meio do gráfico, com um aumento na década de 2020 e depois uma pequena diminuição. Mas, evidentemente, vai haver pressões imensas no sistema brasileiro.
Esses são dados da Organização de Desenvolvimento e Cooperação Econômica. E vamos ver isso em várias partes do mundo. Austrália e Brasil são dois dos mais altos. China também está lá em cima.
Então, mais do que metade das bacias hidrográficas do mundo contendo 2,7 bilhões de pessoas vão enfrentar, já enfrentam falta de água pelo menos uma vez, pelo menos durante um mês por ano hoje. São 2,7 bilhões de pessoas. Isso representa uma das maiores ameaças que o homem enfrenta hoje em dia.
Então, continuar como está não é uma opção quando discutimos o capital natural.
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Por trás da ideia de capital natural está pensar o valor real de como nós dependemos e impactamos o ambiente natural. Este gráfico, que foi produzido pela equipe para publicação em 2010, dá um bom resumo. As barras verdes são sistemas de conservação e as marrons são os ecossistemas que estão sendo convertidos para monoculturas.
Se você olhar isso em termos de dólares de um sistema contra o outro sistema, em toda a metodologia, no mundo inteiro, temos estudos e a conclusão é que o valor atual de todos os serviços que temos desses sistemas é sempre mais alto do que a monocultura.
Então, não faz sentido converter sistemas naturais em áreas para monoculturas. Nós temos que aprender a trabalhar com a natureza e não contra ela.
Houve estudos no Brasil também, a Conservation International trabalhou nisso nas plantações de dendê. Esta apresentação eu espero esteja disponível para vocês depois. A conclusão são as barras cinzas que mostram o valor, a valoração monetária que existe nessas plantações.
Não faz sentido, como negócio, destruir o ecossistema em que a plantação depende e modificar o sistema resultando uma mudança na cadeia de fornecimento do produto. Então, o que nós estamos fazendo? Nós estamos, até um certo ponto, abandonando ou nós temos que fazer o argumento para isso. Sempre há uma necessidade. Nós estamos criando um imperativo socioeconômico de proteção à natureza. Não é questão só do meio ambiente, mas é questão de proteger as nossas sociedades e as nossas economias.
Então, quais são os mecanismos disponíveis? Há várias ferramentas que estão aparecendo. Algumas relacionadas com o mundo de negócios e que estão associadas com a ideia de capital natural.
Vou passar algumas. Há a valoração e o mapeamento de capital nacional, movimentos liderados pelo Estado. E as Nações Unidas estão trabalhando com isso em nível internacional, o Banco Mundial também está fazendo a mesma coisa, criando valores para os ecossistemas.
Alguns países estão olhando o sistema de reforma radical de subsídios, o quanto é dado para os subsídios de gás e de carvão todos os anos, e muito pouco o quanto está sendo dado para os subsídios agrícolas. Temos que aprender a usar os subsídios para coisas positivas do meio ambiente e não o contrário. Também biodiversidade e outras formas de compensações.
Isso aí é uma área em que eu trabalho e é um assunto muito complicado, mas há maneiras de tirar benefícios disso. Esse sistema de compensação, com dez bilhões de pessoas no Planeta em 2060, vamos ter que ter isso.
Deslocamento das políticas de investidores. Isso é muito importante, se os bancos começarem a olhar os seus perfis de risco e ver que as empresas estão esgotando o capital natural rapidamente, aumentando o preço do financiamento. O que está acontecendo com o Banco Nacional da Austrália? Eles estão olhando o perfil de risco dos fazendeiros e aumentando o custo de financiamento. Isso pode provocar uma verdadeira revolução em termos de como administramos nossas empresas.
Aqui a questão de exposição ao risco. Estamos ficando mais inteligentes e entendendo melhor qual é o risco a longo prazo para o capital nacional. E as empresas estão olhando também na contabilidade do capital natural.
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Temos o protocolo de capital natural, que é uma maneira de olhar o mundo de negócios, olhar sua cadeia de suprimentos, para ver como é que eles podem melhorar o uso desse capital natural com maior eficiência em nível global.
Então, para terminar, apenas algumas ideias de políticas governamentais e o trabalho que estamos fazendo no Reino Unido. Nós estamos trabalhando com o governo da Escócia, que é quase que independente do Reino Unido, mas eles têm uma estratégia econômica diferente de nós. Eles acreditam em três fundamentos de prosperidade. Capital natural é apenas um. O capital social é muito grande, mas a ideia de capital nacional, sustentabilidade, competitividade e igualdade são as três pernas do desenvolvimento sustentável. E há vários caminhos para chegar lá e que a meta é uma Escócia próspera.
Então, nós estamos olhando isso e tentando instalar solidamente o conceito de capital natural no Governo e nas estratégias econômicas do governo da Escócia. E olhando as melhores opções em termos de prioridades governamentais e buscar essas prioridades em primeiro lugar. E o Conselho Mundial de Negócios está buscando isso em termos de desenvolvimento, olhando a eficiência e as diversas intervenções governamentais. E a grande bolha do lado direito é a reforma do sistema de subsídios. Isso é o mais importante. Eu falei isso antes no outro eslaide, pagar pelas coisas boas do meio ambiente. Não as coisas ruins do meio ambiente. E compensando os conceitos de perda de meio ambiente.
Eu não quero que vocês leiam tudo isso aqui, mas é apenas um indício dos trabalhos que estamos realizando agora. Há algumas coisas lá que nós consideramos pioneiras: o estabelecimento de indicadores de saúde do ecossistema; as condições, os habitats naturais e a sua conservação; o grau de fragmentação da paisagem; as perdas ou sequestro de carbono e outros indicadores como penetração de espécies e erosão do solo e os índices. Juntando isso tudo, nós vamos ter uma boa ideia daquilo que está acontecendo numa dada área, escala que é muito importante.
Poderia fazer isso para o Brasil, mas acho que isso não forneceria as ferramentas necessárias para os tipos de intervenções que são necessárias. Isso tem que ser feito na escala correta.
A Austrália já fez isso. Este é um mapa muito difícil de ver, mas a ideia aqui é que são catchments, áreas de água, represamento de água. Há algumas áreas aqui, áreas de captação de água que são mostradas aqui e isso se mede pelo sistema de índices de saúde do ambiente
Então, as recomendações seriam olhar para ver o que é aplicável no Brasil, refletir as unidades onde isso poderia ser aplicado e estabelecer metas para melhoria, combinado com a determinação de valores econômicos para essas melhorias.
Eu vou encerrar aí, ninguém vai conseguir ler isso, mas eu vou deixar os eslaides com vocês aqui, se alguém quiser ver depois, mas eles são as três recomendações que eu faço: Valor e mapeamento do capital nacional no nível local de captação e em nível nacional, criar ciência para desenvolver os ecossistemas de indicadores de saúde de ecossistemas e incentivar as instituições de financiamento para trabalhar com as áreas de classificação econômica.
Essa é a linguagem que nós temos que abraçar se nós vamos fazer mudança.
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E, finalmente, focar sem descansar nas ameaças chave à biodiversidade brasileira e regular melhor, e implementar melhor para proteger o capital nacional contra os danos de curto prazo e danos violentos que ocorrem a curto prazo.
Muitas vezes, esses sistemas são absolutamente destruídos por interesses particulares em período de tempo muito, muito curto, com os seus efeitos, na economia e nos países.
Eu espero que tenhamos perguntas mais adiante.
Muito obrigado.
Nosso centro é em Edimburgo e eu espero ver vocês, todos vocês, lá para o nosso próximo evento.
E muito obrigado em nome da Scottish Wildlife Trust pelo convite tão gentil de falar aqui hoje. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Vamos passar agora a palavra ao Dr. Mohammad Shahbaz, Pesquisador-Chefe da Rede Interislâmica de Desenvolvimento e Manejo da Água, da Jordânia.
Com a palavra pelo tempo de dez minutos.
O SR. MOHAMMAD SHAHBAZ (Tradução por profissional habilitado.) - Muito obrigado, Presidente Alencar, por essa fantástica oportunidade de compartilhar com os senhores esse tema tão importante que os senhores estão discutindo neste fórum de hoje.
Eu Sou Mohammad Shahbaz, sou da Jordânia. A Jordânia é um país muito pequeno, que corresponde em torno de 5% do Brasil, entretanto nós estamos lá sendo uma encruzilhada de civilizações, já há 7 a 10 mil anos. Estabelecemos, portanto, muito conhecimento e muita tradição.
Eu gostaria também de agradecer ao Ministro Benjamim por me proporcionar a minha primeira visita a este lindo país, que é o Brasil. Infelizmente, eu estou viajando há dois dias e meio, o que me deu apenas de cinco a seis horas para conseguir dormir. Então, é muito difícil focalizar a atenção sobre aquilo que estamos falando aqui hoje.
Eu serei extremamente breve; evidentemente compartilhei toda a informação que eu pude compartilhar. Então, mais uma vez, Antonio, muito obrigado por esta fantástica oportunidade de estar aqui neste país lindo.
Eu preciso dizer que é uma lástima que o legado biológico do Brasil não seja apenas um tesouro nacional para os senhores. É uma preocupação gigantesca também para o resto das pessoas no mundo inteiro, porque é tão importante para cada pessoa que vive no Planeta. E é por isso que estamos aqui todos, a IUCN (União Internacional para a Conservação da Natureza). E é por isso que há tanto interesse no Brasil e é por isso que nós estamos nos unindo ao Antonio tentando dar suporte ao Brasil.
Eu não estou aqui tentando dar aos senhores uma solução mágica, não estou aqui tentando cozinhar uma mágica. Na verdade estamos aqui para cooperar. Estamos aqui para aprendermos uns com os outros, conseguindo oferecer algum tipo de suporte e assistência, uns para os outros. E é assim que nós vamos abrir o diálogo e canais para que isso seja possível.
Na verdade, eu estou profundamente interessado naquilo que os senhores criaram aqui, principalmente nas deliberações que ouvimos hoje de manhã.
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Na verdade, os senhores já têm uma lei, os senhores já têm o braço legislativo, o executivo e o judiciário juntos, falando uns com os outros, de forma horizontal e não vertical, um olhando para o outro, conversando um com o outro, criando um diálogo. Isso é extremamente importante pelos seguintes motivos: é importante que os senhores estejam sincronizados. Essas instituições enormes do seu país têm que estar sincronizadas ao redor de um tema de grande importância, que é o tesouro mais importante do Brasil, que evoluiu durantes milhões e milhões de anos e que existe para ser usado de forma racional.
É muito importante também tentar diminuir as diferenças, a concorrência intergovernamental entre essas diferenças, é muito importante reduzir essas diferenças. Então, seria importante um falar com o outro, um olhar para o outro de forma vertical, com grande transparência.
Outro ponto: os senhores podem avançar, com base nisso, para o futuro. E avançar rapidamente. A biodiversidade é um domínio gigantesco. Se eu quisesse falar sobre isso, nem eu nem ninguém aqui poderia falar durante uma sessão ou duas, na verdade, levaria dias. Entretanto, o que estou tentando fazer aqui é apresentar a minha humilde experiência, um componente pequenino, que é o seguinte: o que estamos fazendo com as populações locais, com o conhecimento tradicional etc? Que seja importante para todo o conhecimento que desenvolvemos, do ponto de vista científico, no século XXI e globalmente. Como tudo isso pode ser integrado? Até que ponto tudo isso é importante? O que estou sugerindo aqui é que o conhecimento tradicional e as leis tradicionais são muito importantes. É uma lacuna que precisa estar relacionada às convenções internacionais. É uma forma muito fácil, um custo muito eficiente de administrar as coisas de forma simples. Nós precisamos de soluções simples, nada complexo para o manejo dos recursos de biodiversidade.
Portanto, as políticas internacionais, os arcabouços de cooperação estabelecem metas para os países do mundo, considerando uma solução que seja boa para todos. É uma situação muito difícil, não é possível encontrar uma solução que seja boa para todos. É um critério de extrema dificuldade. Há sensibilidade entre os países a esse tipo de abordagem e há um dilema a ser solucionado, principalmente no domínio da biodiversidade, em que toda localização geográfica sobre o globo é singular em termos de seus recursos naturais. Então, uma solução que sirva para todos não possibilita o manejo de recursos naturais. Como resultado desse argumento, existem muitas lacunas nos tratados ou convenções de cooperação. Nenhuma instituição, nenhum país pode fazer isso sozinho. Tem que ser uma abordagem de cooperação coerente.
A diversidade dos sistemas naturais apresenta a capacidade de uso desses recursos, capitalizando sobre os diferentes níveis que existem ali, como, por exemplo, a cadeia alimentar. É por isso que a diversidade é tão importante. Se não fosse pela diversidade consistente, as espécies jamais sobreviveriam, porque um é alimento para o outro. É uma cadeia.
A questão é como nós conservamos. Não é por que nem onde; é como. O aspecto mais importante, na minha opinião, são questões que tem a ver com governança. Os senhores podem ter todas as informações que quiserem, os senhores podem dispor de todos os procedimentos que quiserem, de todas as convenções; é como se governam esses sistemas, como os senhores tomam as suas decisões, no final das contas.
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Ao mesmo tempo, a grande maioria das pessoas que se beneficiam desses recursos naturais são pessoas e comunidades que usam esses bens e esses serviços oferecidos pelos sistemas naturais e pelos ecossistemas. Historicamente, essas comunidades criaram as normas mais práticas a serem observadas pelos indivíduos ou grupos para acesso e uso dos recursos naturais. Normas que existem, na verdade, há milhares de anos e que jamais falharam, como estruturas sociais e leis tribais.
Esse tipo de governança é oriundo da necessidade de existir da parte das pessoas e das comunidades, quando percebem que todo habitat natural tem a sua capacidade. Se essa capacidade for excedida, o ecossistema vai se quebrar e os beneficiários perderão oportunidades. Os legisladores deixaram passar essas leis comuns. Não é responsabilidade deles escavar essas leis; é responsabilidade dos órgãos técnicos encarregados do manejo dos recursos. O legislador, na verdade, deve ficar satisfeito com as iniciativas que precisam de um esforço e de um trabalho mínimo. O Estado deve acomodar as comunidades e as partes interessadas, cooperando para que tudo funcione. No lado dos receptores, as partes interessadas devem ficar satisfeitas em manter seus interesses vivos. É isso o que os senhores chamariam de situação ganha-ganha: nenhuma parte perde.
Eu continuo ou não? Paro? Continuo? Muito bem.
Então, é isso o que chamamos de uma situação de ganha-ganha. Nenhuma parte perde com um interesse que tem importância na sobrevivência das pessoas ou na governança dos recursos.
Eu quero apresentá-los a um sistema de governança antigo de recursos, que foi desenvolvido na minha parte do mundo. Para dar um exemplo da vida real, o sistema de governança de Hema - hema significa, em árabe, proteção e conservação - foi criado na comunidade árabe de conservação. Foi inventado por pessoas e foi executado também pelas pessoas. O Hema foi construído sobre três pilares: a lei tribal, o judiciário tribal e o monitoramento e execução. Considerando o exemplo dos pastos para animais, a lei diz: "Não se deve deixar que um animal paste uma plante antes que ela esteja completamente crescida, para sustentar o ciclo natural de reprodução". Para monitorar a situação, há guardas tribais que monitoram como os recursos naturais, na verdade, estão sendo manejados, mantêm olho vivo sobre as pastagens, tentando garantir que a lei não seja infringida. Se a lei for violada, eles falam com o xeque da tribo. Em seguida, o xeque reúne o tribunal tribal; o juiz tribal garante que a violação seja tratada de forma adequada.
Há tantos exemplos no mundo que podem servir como modelo a parcerias com comunidades locais pela conservação da natureza.
Senhoras e senhores, permitam-me que eu resuma o que eu acabo de apresentar. A capacidade de conservação da natureza, em parceria com as partes interessadas e com as comunidades é algo muito válido. A conservação, a governança reside na parceria com os usuários das comunidades locais. Essa é uma situação de ganha-ganha. Vamos passar do monólogo para o diálogo. Esse é um conceito muito importante. A questão de considerar esse tipo de parceria não deve se afastar das iniciativas internacionais e globais, nem de convenções, como a CVD e outras.
Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)
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O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Com a palavra a Srª Marina von Weissenberg.
A SRª MARINA VON WEISSENBERG - Bom dia e muito obrigada pelo convite. É um prazer estar aqui, não é a primeira vez no Brasil, mas a primeira vez em Brasília. Também quero agradecer ao Antonio Benjamim pelos arranjos.
Tenho muita experiência no trabalho com as convenções de biodiversidade. Em dez minutos, quero falar um pouco sobre as conclusões e algumas propostas para o futuro.
O conteúdo de apresentação vai ser este: o SDG e o pós-2015 em biodiversidade. Não vamos falar nisso, mas é um momento muito importante, olhar os alvos 14 e 15 de todos os SDGs, biodiversidade marinha e terrestre. Isso começa em Nova York, na semana que vem.
Quero dizer apenas que, em relação ao SDG e pós-2015, é muito importante neste momento. Então, as seis convenções de que vamos falar são estas que estão na tela, de importância para implementação e fazem parte da política de biodiversidade. São estas: a Convenção de Diversidade Biológica; a Convenção sobre Comércio Internacional de Espécies Ameaçadas, de 1973; a Convenção sobre Espécies Migratórias; o Tratado Internacional sobre Recursos Genéticos; a Convenção de Áreas Alagadas; e a Convenção do Patrimônio Mundial.
A cúpula mundial, até um certo ponto, é uma coincidência, mas essa decisão muito importante tomada aqui no Brasil, no contexto da política agora para todas as convenções, é importante observar que os alvos para 2020 foram adotados para todas as convenções. De uma forma ou de outra, cada país está criando suas estratégias, mas a biodiversidade, a ação necessária, em todos os níveis. De acordo com os peritos, milhares de espécies de plantas e animais estão sendo ameaçados hoje. A perspectiva de biodiversidade mostra que, dos 20 alvos, o alvo 11 foi discutido aqui, de áreas protegidas, ou o alvo 12, de espécies ameaçadas também. Nós estamos, todos os países estão indo bem nesses dois pontos. Mas o alvo 5, por exemplo, subsídios prejudiciais, não estamos alcançando nem de perto esse alvo. Acho que estamos indo em marcha ré. Isso tem a ver com outras questões. Se não conseguirmos os alvos em biodiversidade, ou envolver os negócios de biodiversidade no setor econômico, ou na área tecnológica, ou na área de infraestrutura, ou de uso do solo, não vamos alcançar as metas. Essa é a questão principal que estamos enfrentando.
A Ministra Izabella falou a mesma coisa. Temos que continuar, no campo ambiental, a invadir, a penetrar, digamos, os outros setores dos países. Essa é a nossa meta.
Mas, agora, a perda de biodiversidade, como o GBO-4, se continuarmos desse jeito, não vamos alcançar o alvo. Do ponto de vista político, é uma falha muito grande e tem que ser levada a sério.
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Também a ligação com a mudança climática e também os serviços dos ecossistemas. Os serviços têm que ser garantidos em 2050 - isso também está no planejamento. O conceito de serviço e de ecossistema é algo que vou mencionar mais adiante e que considero muito importante. Não temos terminologia legal para esses serviços e a definição desses serviços.
Qual é a capacidade de sustento para muitos países? Essa é questão que estamos enfrentando nas negociações entre os países desenvolvidos e em desenvolvimento. A necessidade e capacidade, a perda da biodiversidade está custando anualmente 700 bilhões, 750 bilhões por ano. Essa é a questão que temos que enfrentar, porque isso é muito ligado com a saúde humana e com o bem-estar humano.
Já mencionei que a integração dos setores é o desafio. Trabalhando no Ministério do Desenvolvimento diariamente, a questão principal é que o Ministro, esse Ministério é sempre visto como fraco, em comparação a outros ministérios, de comércio, de finanças - esses são os Ministérios fortes. Isso é um desafio. A mudança de clima e degradação dos solos são outros ares. Temos que entender as linkagens e negociar, em termos de Kyoto e Paris, em 2015. No campo de biodiversidade, temos situações em que só se pode ganhar quando implementamos essas duas convenções, que não são separadas, são ligadas uma com a outra.
A questão da mudança climática, trabalhando com a biodiversidade também, que é a solução, temos que o Global Environment Facility, o IUCN tem seu mandato agora no projeto, para facilitar isso, que é uma medida muito importante, uma tarefa importante, temos que mobilizar as finanças, os recursos, em benefício da biodiversidade. O papel do setor privado e do mundo dos negócios é muito bem conhecido. Devo dizer que, em Curitiba, por exemplo, o Brasil foi muito ativo, envolvendo o setor privado e as empresas. Temos que continuar com isso, porque há muito trabalho a ser feito nessa área ainda e também com suporte para implementação. E também o contexto para os relatos, como os relatos são feitos, quais são os indicadores necessários, quais são os problemas, incluindo a preparação desses indicadores. Muitos países vêm preparando indicadores. No meu próprio país, temos um contexto já na internet, temos aproximadamente cem indicadores que medem os alvos de saúde dos ecossistemas.
Então, com essas oportunidades, embora nós tenhamos uma crise de biodiversidade e tenhamos falhado em termos do alvo de 2010, acho que há uma grande oportunidade, ao mesmo tempo, dentro do marco legal institucional, para o desenvolvimento sustentável da Rio+20. Tudo isso tem que funcionar. Temos que aumentar a cooperação e as sinergias, tanto em questões problemáticas quanto na maneira de enfrentarmos as questões, especialmente as questões em nível nacional e local.
Temos agora o IPBES, que também tem sido muito importante como base científica. Estabelecemos também na área IPBES, que é a plataforma de biodiversidade e serviços de ecossistema, que vou mostrar daqui a alguns minutos quais os produtos que teremos no período entre 2014 e 2017, porque estamos mobilizando milhares de cientistas por trás desse movimento. A falta de capacidade significa que temos que compartilhar e cooperar mais ainda. A proteção da biodiversidade exige integração de setores. Já falei isso três vezes e vou falar mais umas dez vezes, porque sei da sua importância.
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O que significa que a legislação tem de estar em dia. Por exemplo, na Finlândia, a primeira lei de proteção ao meio ambiente foi em 1926 e foi renovada somente em 1996. Então, essa ligação com essas questões com a legislação é uma ligação muito importante.
Então, a avaliação de impactos é muito importante para o planejamento do uso dos solos e a indicação dos indicadores de saúde, um dos maiores desafios que nós estamos vendo agora. O maior problema que eu acho é a ausência de vontade política. Há muitos interesses competitivos entre si na sociedade. E aqueles responsáveis pelas decisões começam a deixar a biodiversidade para depois enquanto tomam outras decisões. Os incentivos, os subsídios, em grande parte, têm efeitos negativos em biodiversidades. Não sei qual o poder que nós temos para mudar isso, mas acho que isso tem de ser modificado, e o PIB tem de ser um dos conceitos que se deve levar em consideração na questão de biodiversidade. Isso tudo é marcado pela fragmentação... Não há fragmentação da legislação quando se tem um bom sistema nacional. Finlândia, por exemplo, no meu País, nós temos um sistema bem fragmentado. Então, temos legislação... Não conseguimos ainda a integração que nós desejamos ter. Nós não precisamos de uma lei de biodiversidade. A situação é bem semelhante no Brasil neste sentido: problemas sociais e os povos indígenas. É importante... No meu país nós temos nossos povos indígenas no norte do país. Isso foi discutido na semana passada em uma reunião específica nas Nações Unidas sobre essas populações. Temos de continuar essa discussão, falando sobre bens e serviços também.
Em termos de estabelecer valor de biodiversidade e o serviço de ecossistemas, precisamos promover o uso mais amplo de ferramentas e de enfoques para a biodiversidade. E há espaço para o desenvolvimento aqui. A questão de ligar isso à saúde e com o bem-estar humano, eu acho que deve ser o próximo passo do futuro. E o IUCN está tratando muito bem disso. A questão de integração dos valores naturais também em transformar isso em políticas e em decisões como, por exemplo, no caso do PIB, e também melhorar a compreensão de capital nacional e seu relacionamento com a biodiversidade. Isso tem de ser um dos tratamentos fundamentais. E, em último lugar, nós temos de aprender a comunicar melhor. Comunicar e compartilhar o conhecimento para as crianças, para os jovens.
Eu estou tentando entender essas gerações, mas vocês são muito melhores nisso do que eu. Mas nós precisamos ensinar às futuras gerações por meio da educação. Isso é um papel de grande importância. Só para mencionar essa questão do IPCC. A avaliação tem a mesma informação que nós temos.
Como eu prometi, vou deixar esses eslaides para vocês, mas nós vamos ter esses seis produtos vindo das avaliações de IPBES por nação e por coordenadores associados com a produção de alimentos, a análise de cenários e biodiversidades serviços de ecossistemas, conceituação de valores de biodiversidades, benefícios da natureza para as pessoas, degradação dos solos e sua recuperação, a invasão de espécies alienígenas e, finalmente, o uso sustentável e a conservação da biodiversidade, um assunto em discussão entre milhares de cientistas.
Só para mostrar, os serviços de ecossistemas essenciais, nós temos indicadores que podem ser utilizados.
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A parceria de indicadores de biodiversidade já está usando esses indicadores. E isso mostra o tipo de pensamento que nós precisamos ter. Temos esses temas dos relatórios que já foram publicados e nós temos de fazer isso entrar mais simplificado para podermos nos preparar para nosso trabalho com a biodiversidade.
No futuro - esse é último eslaide -, eu acho que a ligação entre os serviços de ecossistemas e a economia verde, capital natural, têm de ser incluídas as decisões econômicas e formulações de políticas. Temos de olhar as causas fundamentais da perda de biodiversidade - que é o homem.
Finalmente, desenvolver sinergias entre as convenções de biodiversidade. Se nós conseguirmos os recursos financeiros para o manejo e a administração de todas essas convenções, fazendo com que cheguemos a conclusões e a resultados melhores.
Muito obrigada. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Passo agora a palavra ao Dr. Spencer Thomas, Embaixador para Tratados e Convenções Ambientais de Granada, para finalizar nossa palestra de hoje.
O SR. SPENCER THOMAS - Muito obrigado, Sr. Presidente. Também gostaria de agradecer pelo convite e me unir a meus colegas e agradecer por esta ocasião. Além disso, eu gostaria de agradecer a Antonio pelos arranjos que estão excelentes.
Hoje, falamos sobre países de tamanho continental, falamos sobre milhões de quilômetros quadrados. Então, muito obrigado por permitirem um ponto de vista de um tipo diferente de um país. Estamos falando aqui sobre apenas poucas centenas de quilômetros quadrados, uma pequenina ilha.
Acho que este colóquio é realmente internacional quando podemos falar sobre países insulares e países de dimensões continentais. Então, vou dar o ponto de vista de uma ilha. Eu gostaria de sublinhar três pontos importantes, estabelecendo alguns vínculos entre eles. Meu primeiro ponto é o fato de que a biodiversidade e a mudança climática, quando combinados a desastres naturais, são a principal restrição para o desenvolvimento de pequenos estados insulares. Observamos que esses três aspectos têm um vínculo profundo. Na verdade, nós o chamamos de perigos tríplices para o desenvolvimento dos pequenos países insulares. Acreditamos que esses vínculos são muito claros.
O relatório de avaliação do IPCC-5 mostrou isso com muita clareza. Achamos também que o relatório GBO-4 foi muito claro sobre a situação da biodiversidade. Ouvimos, muito nitidamente, que a mudança climática é real. Recentemente, houve uma discussão no Senado de outro país do norte em que, de 100 senadores, 98 disseram que a mudança climática não existia. Ao mesmo tempo, o principal debate é que nós não somos responsáveis pela mudança climática. Foi um Senado que disse isso também.
Nós vemos os vínculos fundamentais entre a mudança climática, a biodiversidade e os desastres naturais, que estão também ligados ao desenvolvimento socioeconômico dos países. Principalmente, a questão aqui é a proporção do PIB. Em vários desses estados insulares, as proporções com o PIB são de mais de 100%: 120%, 130% - e isso é muito nítido. A metade dessa dívida vem por causa das situações que têm a ver com a perda de biodiversidade, mudança climática e desastres naturais.
É muito claro que isso ocorra. Por exemplo, só em Granada, há um caso muito importante: a situação de que, durante 50 anos, não fomos atingidos por furacões e, em dois anos, nós tivemos dois furacões de categoria 3, um dos quais danificou o país até o ponto de 200% de nosso PIB.
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Os danos chegaram ao fato de que 95% dos manguezais e 95% das áreas de floresta foram destruídos. Nossa biodiversidade foi sujeita a dificuldades. Esta é a situação. A questão é que, quando falamos hoje e ontem também na conferência no Japão sobre a redução do risco de desastres, quando ao mesmo tempo ciclones tropicais ou furacões atingem Vanuatu, causando um dano significativo, a reconstrução do país vem juntamente com uma dívida séria pela população de Vanuatu. A questão aqui é: será que há uma questão ética nos países que não contribuem para o problema climático? Será que eles não têm de responder ao problema climático em comparação às pessoas que causam a dívida e que têm de submeter suas populações a uma situação de austeridade.
Há um tema ético que nós gostaríamos de explorar: a regra dos poluidores em comparação com a regra das vítimas e a necessidade de repetir essa situação. Esse é meu primeiro ponto. O segundo ponto, a segunda questão é que a Agenda Global de 2015 nos dá oportunidades para enfrentar os problemas causados pela perda de biodiversidade, mudança climática e redução do risco de desastres. Nós temos uma meta de desenvolvimento sustentável e há um debate muito ativo na comunidade das Nações Unidas agora. Acabei de falar sobre a questão de redução do risco de desastres e na reunião que acabou de terminar no Japão. Mais cedo ou mais tarde, se não me engano em junho, nós teremos a reunião do financiamento para desenvolvimento, que é um fórum muito importante. Já temos a convenção sobre a diversidade e as metas IHT. Nós estamos entrando em uma década internacional sobre biodiversidade. Temos também o Tratado de Samoa, sobre países insulares, a estratégia para eles.
E, no final deste ano, teremos a Conferência da Cúpula de Paris, quando esperamos poder alcançar um acordo vinculante para podermos lidar com a questão de gases geradores do efeito estufa. Esses são um fóruns globais que podemos explorar neste ano. Essas questões têm um vínculo profundo. Eu acho que é a oportunidade para uma abordagem holística para a perda de biodiversidade, mudança climática e também a redução de riscos de desastres. Meu terceiro ponto tem a ver com... Para os pequenos países insulares, nós achamos que a estratégia para enfrentar os impactos da perda de biodiversidade, mudança climática e desastres naturais está na construção de resistência dos ecossistemas e nos sistemas econômicos sociais, naturais e políticos.
Eu gostaria apenas de usar um exemplo específico para, depois, concluir minha apresentação. As emendas constitucionais, uma questão que houve em Granada, muito já foi dito aqui hoje de manhã. Agradecemos muito ter ouvido a experiência brasileira sobre isso, porque Granada está considerando uma emenda a sua Constituição para fazer referência específica à mudança climática e à perda de biodiversidade. Especificamente, o que a minuta mostra até agora fala sobre o dever de proteger recursos naturais, o meio ambiente, minimizando a contribuição e protegendo contra os impactos da mudança climática. Nós temos uma redação semelhante com relação à biodiversidade. Isso é um dispositivo constitucional e foi muito bom ouvir o que ouvimos aqui hoje de manhã. Estamos tentando entender onde no mundo isso existe, e eu imagino que o Brasil possa estar em uma situação singular e peculiar.
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Eu acho que é verdade, porque nós estamos procurando muito onde encontrar dispositivos constitucionais e apenas alguns poucos me vêm à mente: o caso da República Dominicana, do Equador, da Tunísia, da Noruega, da África do Sul e da Índia. E, agora, evidentemente, o Brasil.
Então, nós temos algumas perguntas. Pergunta número 1: quais são as lições que esses países, com dispositivos constitucionais para mudança climática aprenderam ao longo dos anos? Será que houve dispositivos e como eles foram interpretados pelos tribunais? Eu espero receber informações sobre isso.
A questão da doutrina da escolha do público é também algo que foi muito examinado. A questão é: até que ponto é prática a doutrina da opção do público e até que ponto nós podemos aplicar isso? Ouvimos do Equador a questão da filosofia. Até que ponto isso é prático, até que ponto isso é possível em nível internacional. Será que essa regra pode ser importante na mudança climática? Será que devemos recorrer à lei e a processos legais para tratar da questão da mudança climática? São questões com as quais estamos lidando para ver nosso arranjo constitucional.
Permitam-me concluir. Eu gostaria de dizer que começamos esse processo há muito tempo, biodiversidade e mudança climática, na década de 80. O relatório do IPCC foi publicado em 1990. Tivemos a Convenção do Rio também em 1992. Mas eu acho que podermos classificar a situação como um fracasso geral em termos de tratar o problema do clima. Tivemos a COP 21, a Conferência das Partes de Paris. Qual é o prognóstico? O que está em jogo? Eu tenho de afirmar que há muito em jogo. Talvez seja essa nossa última chance.
Na negociação, queremos defender a universalidade da ação.Todos os países devem participar. Será que podemos estar assim tão granulares ainda? Todo tribunal, toda jurisdição, toda legislação tem de ser parte. Todos devem agir. A COP de Paris, a Conferência das Partes e também o Clube de Paris, para nós, tudo está vinculado quanto ao desenvolvimento dos pequenos países insulares. Portanto, a Conferência das Partes de Paris e o Clube de Paris estão profundamente vinculados para os pequenos países insulares. Nós achamos que os pequenos países insulares vão ter que continuar a pagar aos poluidores. Essa é a ideia que estamos ouvindo... Será que isso é ético? Eu gostaria de dizer que se a Conferência das Partes de Paris achar que precisamos de um tribunal especial, talvez não em Paris, para lidar com a questão da mudança climática? Para nós, essa é uma questão existencial, não é uma questão de vida, mas uma questão de morte.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Otto Alencar. Bloco Maioria/PSD - BA) - Quero parabenizar a todos os palestrantes e dizer de nossa satisfação de tê-los recebidos aqui no Senado Federal, na Comissão de Meio Ambiente. Destaco aqui a presença do Ministro Herman Benjamim, que tem colaborado muito com nosso País e também é um grande defensor da biodiversidade. Coloco-me à inteira disposição para outras palestras que queiram que aconteçam para debater esse tema, que é muito importante para nosso País, sobretudo meu Estado da Bahia, que tem uma biodiversidade muito grande e que passa por problemas muito graves.
Espero, aqui no Senado, colaborar para conter essa situação que preocupa o Brasil e preocupa o mundo.
Muito obrigado a todos vocês.
(Palmas.)
Está encerrada a reunião.
(Iniciada às 9 horas e 15 minutos, a reunião é encerrada às 12 horas e 18 minutos.)