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Senado Federal
Secretaria-Geral da Mesa
Secretaria de Registro e Redação Parlamentar
(Texto com revisão.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Havendo número regimental, declaro aberta a 12ª Reunião da Comissão Permanente de Direitos Humanos e Legislação Participativa da 2ª Sessão Legislativa Ordinária da 54ª Legislatura.
Solicito a dispensa da leitura da ata da reunião anterior e a coloco em votação.
Aqueles que a aprovam permaneçam como se encontram. (Pausa.)
Aprovada.
Daremos início à audiência pública, nos termos do Requerimento nº 20, de 2012, da CDH, aprovado em 1º de março de 2012, de autoria do Senador Paulo Paim, para instruir o PLC nº 30, de 2007, que altera a redação do art. 6º da Lei nº 10.826, de 22 de dezembro de 2003, que dispõe sobre o direito de agente público portar arma de fogo.
Dando início, convidamos para compor a Mesa as seguintes autoridades: o Sr. Paulo Sérgio Costa da Costa, Presidente da Federação das Entidades Representativas dos Oficiais de Justiça Estaduais do Brasil – Fojebra; o Dr. Rudi Cassel, advogado; o Sr. Bené Barbosa, Presidente do Movimento Viva Brasil, uma Organização Não Governamental; o Sr. Marivaldo Pereira, Secretário de Assuntos Legislativos; e o Sr. Sérgio Torres, assessor da Secretaria Executiva do Ministério da Justiça, em substituição ao Exmo Sr. Ministro de Estado da Justiça, José Eduardo Cardozo. As demais autoridades convidadas logo que se fizerem presentes serão convidadas para participar da nossa Mesa.
Na nossa prática da audiência pública, daremos aos componentes da Mesa dez minutos para suas considerações iniciais. Evidentemente, havendo necessidade, podemos prorrogar um pouco mais esse tempo. Em seguida, abriremos para a participação dos Senadores presentes. Da mesma forma, caso esses Senadores necessitem fazer alguma intervenção, será permitida a qualquer momento nesta audiência pública.
Para abrir os trabalhos e fazer uso da palavra, eu convido o Sr. Paulo Sérgio Costa da Costa, que é o Presidente da Federação das Entidades Representativas dos Oficiais de Justiça Estaduais do Brasil, para fazer uso do tempo regulamentar.
O SR. PAULO SÉRGIO COSTA DA COSTA – Senador Paulo Davim e demais integrantes da Mesa, as nossas saudações e o nosso agradecimento pela realização desta audiência pública.
Efetivamente, quando nós fizemos a proposta de debater esse projeto de lei, queríamos mostrar a condição de agente público, o direito do agente público que exerce uma atividade de risco de portar arma em sua defesa pessoal.
Oficiais de justiça, para quem não conhece a atividade, desempenham uma atividade de risco efetivo, reconhecido pelos próprios tribunais do País. Porquanto, pagam as gratificações de risco de vida, as gratificações de atividade externa.
Já na época do plano de carreira dos servidores do Poder Judiciário da União, o Deputado Carlos Leréia transcreveu uma decisão do egrégio Conselho da Justiça Federal, que, por unanimidade, reconheceu que, em função da natureza do trabalho, existia perigo de vida aos oficiais quando no exercício de suas atribuições. E, lá, eles descreviam que o risco a que estão submetidos os oficiais de justiça decorre do exercício de suas atividades já eminentemente externas. Assim que, quando do exercício dos mistérios do cargo, funcionando como auxiliar do juízo, na prática de atos de intercâmbio processual e de execução, constantemente se vê oficial de justiça em situação de perigo concreto.
Bom, nós só queremos fazer aqui um breve paralelo entre atividades de servidores de categoria funcional oficial de justiça e até mesmo dos integrantes da Polícia Federal. E já dizia o Ministro Lauro Leitão que, em verdade, os riscos a que estão sujeitos os oficiais de justiça são bem maiores do que aqueles dos integrantes da Polícia Federal, já que, quando da realização das diligências, em cumprimento às determinações judiciais, atuam sozinhos e desarmados, diferentemente do que ocorre com os agentes federais, que atuam em grupo e armados.
Ao contrário de policiais federais, militares ou civis, que sempre atuam em veículos oficiais e sempre em grupo, oficiais de justiça são obrigados a atuar sozinhos. Muitas vezes sem poderem contar com o auxílio da força policial ou por essa não estar disponível para acompanhar oficiais.
E, aqui, quero abrir um parêntese, Senador, para dizer que é falacioso o discurso de que o oficial de justiça pode dispor da força pública, como se nós tivéssemos uma bola de cristal capaz de prever toda a diligência de risco. Então, por vezes, nós já vimos – e temos aqui muitos fatos para mostrar a esta Comissão – agressões, assassinatos de oficiais de justiça que ocorreram em razão de simples intimações. E outro detalhe que podemos ver é o contingente policial. Se cada oficial de justiça do Brasil, dos 26 mil oficiais de justiça em exercício, necessitar de força pública para a realização de suas diligências, eu não sei o que vai ser da segurança pública externa.
Então, nós nos vemos, efetivamente, em muitas situações difíceis. Pretendo mostrar um pouquinho que a violência é generalizada. Ela não está só nos grandes eixos: Rio, São Paulo, Brasília. Nós encontramos dificuldades ao vermos oficiais de justiça atuando rente às fronteiras. Há casos de colegas aqui em Cáceres, no Mato Grosso, que atuam na fronteira da Bolívia, notadamente uma área bastante perigosa, onde estamos vendo traficantes, e todos os agentes que ali atuam têm porte de arma, à exceção do oficial de justiça.
Eu só quero mostrar que esta Casa já vem debatendo há muito tempo as peculiaridades das atividades de risco, e o próprio Senador Paulo Paim, que admiramos, que é um dos maiores defensores do direito de aposentadoria especial aos servidores públicos, enalteceu, em discurso, peculiaridades do trabalho desenvolvido pelos policiais civis, categoria, obviamente, que nós respeitamos demais. E, entre essas atividades, pela similaridade, estava a questão de saírem diariamente para o trabalho com a angústia de enfrentar o desconhecido em seu cotidiano. É o que acontece, efetivamente, com os oficiais de justiça no cumprimento dos seus mandados; e essa situação inclui um risco de vida constante e a incerteza de volta para casa com a integridade física preservada.
Já estivemos nesta Comissão em três oportunidades anteriores e nós não queríamos debater mais somente com a nossa categoria. Nós queremos mostrar ao Parlamento, à sociedade, aos segmentos interessados na questão as nossas características laborais e o risco que estamos correndo no nosso dia a dia.
Então, para quem não conhece a atividade do oficial de justiça, queremos apresentar alguns dos nossos locais de trabalho, porque às vezes nos parece que o administrador enxerga o oficial de justiça como um personagem global, ridiculamente apresentado pela Globo, que pode sair de terno, não abre a boca para dizer absolutamente nada e entrega um pedaço de papel para um cidadão.
Ora, nós atuamos, nós subimos os morros que, por vezes, nós sabemos, no Rio de Janeiro, que precisam ser pacificados, mas a Justiça chegava lá por intermédio do oficial de justiça, que sobe e desce sozinho e retorna, para cumprir todo tipo de mandado.
Além das intempéries, nós também atuamos dentro dos presídios. Aqui, uma característica: será que o marginal com o qual a polícia lida não é o mesmo marginal que nós procuramos?
Atuamos também dentro de hospitais, enfrentamos o Movimento dos Sem Terra e dentro de uma característica peculiar, porque, quando há um movimento muito grande de reintegração e de desocupação de áreas, nós recebemos um aparato, porque, aí sim o oficial está prevendo que vai haver um conflito e pede a força pública. Mas nessa ilustração, quem é o personagem mais facilmente reconhecido? É a força pública militarizada ou aquele personagem isolado, o oficial de justiça? É óbvio que o alvo, infelizmente, por ignorância ou talvez porque não se debata muito a atividade do oficial de justiça no cotidiano, o alvo do Judiciário ou da ira das pessoas passa a ser o personagem do oficial de justiça.
E nós queremos mostrar aqui que também enfrentamos, assim como os profissionais dos Correios e os policiais, muitos animais. E animais, assim como armas, podem causar e causam estragos violentos. Sabemos de vários casos de pessoas que vêm até a falecer por ataques de cães, ataques ferozes, e nós não estamos incólumes a isso.
Lidamos com menores infratores, menores que mais adiante, no futuro, reconhecem-nos. Temos um caso concreto, no Rio Grande do Sul, de um oficial de justiça que havia encaminhado um menor para a fase. Passados alguns anos, em diligência, ele foi reconhecido e covardemente assassinado, numa situação onde, conforme as pessoas relataram, o menor, ao reconhecer o oficial de justiça, perguntou: “Tu estás lembrado de mim?”. Ele disse: “Não”. E quando ele virou as costas para ir embora, ele foi alvejado na nuca.
Pela Lei Maria da Penha, afastamos do lar, durante 24 horas – porque estamos em plantão direto, dia e noite –, para trazer proteção ao lar, bêbados; afastamos pessoas com perfil tremendamente agressivo, pessoas drogadas do lar, e estamos ali numa situação desprotegida.
Trago aqui alguns fatos concretos, mostrando que oficiais de Justiça já foram várias vezes alvo de violência, já foram assassinados em serviço. São fatos que temos comprovados, com fonte de pesquisa; viramos alvos de ladrões, de criminosos, médicos, e aí também a violência... Como se diz, onde está o rosto da violência? Qual é a face dessa violência? Onde ela está, atrás de que porta, em que esquina?
Então, temos um fato concreto, em 2001, em que um médico manteve um oficial de justiça preso dentro da sua residência, ameaçando com cachorros; há casos de sequestrados, de assaltados, daqueles adolescentes que têm granada nas mãos e que nós conduzimos, muitas vezes, para as fases; de oficial de justiça baleado, ameaçado, agredido, que sofre tentativa de homicídio; de dinamite na frente de casa, no dia seguinte. Agora, tivemos um caso, na Bahia, em que o oficial de justiça teve a sua casa queimada, e ele vinha recebendo ameaças.
Nós pedimos efetivamente que o Conselho Nacional de Justiça, a Corregedoria Nacional de Justiça, intervenha num caso desses e vá a fundo para verificar responsabilidades, porque não é só agressão ao juiz que tem de ter um severo acompanhamento. Nós somos agentes públicos representando a magistratura.
Há bandos que perseguem oficial de justiça; de baleados, assassinados, recebidos a tiros, assassinados em Samambaia; executados com mais de vinte tiros de pistola, agredidos a coronhadas, agredidos por policial militar, por esse efetivo que tem de nos proteger. Recentemente, no Amapá, uma oficiala de justiça foi covardemente agredida por quem é responsável por dar o treinamento à polícia militar daquele Estado; de agredidos com o braço quebrado, de agredidos por menores...
O meu tempo está se esgotando, senhores, mas o que quero dizer é o seguinte: temos muitos fatos que estão à disposição desta Comissão. Nós queremos mostrar que efetivamente é justa a nossa reivindicação pelo direito ao porte de arma. Não estamos aqui fazendo apologia de armar indistintamente cada oficial de justiça. Queremos seguir o regramento legal; queremos ter o treinamento, a capacitação psicológica; e aqueles que se sentem realmente ameaçados e fragilizados, no exercício profissional, que exerçam esse direito.
Hoje, a própria Polícia Federal está cerceando o direito desse agente público. Estamos tendo de entrar com mandado de segurança para garantir o nosso direito.
Então, mais uma vez, Senadora, agradecendo a participação, quero mostrar que é falacioso todo o discurso que fala da força pública. Num caso recente, no Rio de Janeiro, do menino Juan Moraes, faltou carro da polícia militar para que fossem conduzidas as testemunhas faltantes a essa audiência.
Então, com isso, encerro essa minha primeira participação, mostrando que é justo – já se arrasta, desde 2007, esse projeto – e que é preciso, sim, alterar o Estatuto do Desarmamento e conceder ao agente público – oficial de justiça – o direito ao porte de arma.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Obrigado ao Dr. Paulo Sérgio Costa da Costa.
Passamos imediatamente a palavra ao Dr. Rudi Cassel, para as suas considerações iniciais.
O SR. RUDI CASSEL – Senador Paulo Davim, Presidente em exercício desta Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, demais Senadores presentes – vejo o Senador Suplicy à minha frente –, Paulo Sérgio Costa da Costa, Presidente da Fojebra, que tem sido incansável em demonstrar o que, de fato, ocorre com quem tem a missão de cumprir a decisão judicial, ou seja, aquele que tem a obrigação de levar a prestação jurisdicional ao seu destinatário quando ela deixa de ser uma teoria e passa a ser um fato.
Tivemos oportunidade de estar nesta Comissão, em outras situações, sob a Presidência do Senador Paulo Paim, do Senador Cristovam Buarque e, agora, honrados pela Presidência do Senador Paulo Davim, Comissão esta que tem acolhido, tem usado de equilíbrio e de ponderação no acolhimento desses momentos de manifestação, em que temos oportunidade de trazer aspectos, sejam fáticos ou técnicos, que definem uma determinada matéria e partem daqueles que vivenciam isso no dia a dia.
Eu olhava a pauta com os convidados desta reunião, vi aqui o Sr. Bené Barbosa, Presidente de uma ONG que é fundamental para o equilíbrio social, que tem sido muito atuante, e o parabenizo por isso. Vejo aqui representantes do Ministério da Justiça, creio que dois – ou contei mal? –, Sérgio Torres e... Exatamente.
Então, o Ministério da Justiça, sob uma perspectiva no sentido não só do Ministério da Justiça, mas também da Polícia Federal, tem desenvolvido um trabalho brilhante, com a seriedade necessária a um órgão dessa natureza.
Vejo aqui os servidores que participam desse dia a dia, do cumprimento dos mandados. Vejo outros cidadãos aqui presentes, assistindo e participando desse momento democrático que aqui se apresenta como um tributo, tributo este que tem, nos Senadores desta Casa, Senador Paulo, um elemento importante, que renova, reforça a esperança daqueles que veem na democracia o melhor remédio, a melhor forma de se levar uma determinada matéria ao conhecimento do cidadão e, em especial, daquele que vê no Senador o seu mediador.
Sobre o que nós trazemos hoje aqui, eu não preciso tratar das questões fáticas porque elas são notícias diariamente, o parecer da Comissão de Constituição e Justiça, que tratou deste Projeto de Lei Complementar nº 30, de 2007, foi bastante esclarecedor, citando, inclusive, situações recentes para aquela época, em que o cumprimento do mandado gerou, por exemplo, antes de um bom-dia ou um boa-tarde, gerou um tiro, que levou a óbito a oficiala de justiça que no caso cumpria o mandado.
Mas é fundamental situar essa matéria nesse contexto em que não se está aqui fazendo apologia, nós sabemos da delicadeza dessa matéria, e não se está aqui fazendo apologia do rearmamento. Não é isso. Nós temos uma situação bastante confortável, sob a perspectiva técnica, porque estamos em uma situação diferente, e essa situação é diferente sob vários aspectos.
Se nós observamos o Código de Processo Civil e a própria Lei 10.826, o Estatuto do Desarmamento, nós veremos ali que a autorização para porte de arma já – perdoem-me a expressão – namora a situação do oficial de justiça, já prevê um aspecto em que o oficial deveria estar ali elencado, e, de fato, estava no projeto que saiu da Comissão de Segurança Pública, que analisou isso em profundidade, quando do projeto que gerou a Lei nº 10.826 ou o Estatuto do Desarmamento. Estava ali previsto o oficial de justiça, o agente de segurança jurisdicional, do Poder Judiciário, e tivemos depois, nas demais etapas, a retirada da presença do oficial de justiça. Embora nós tenhamos, por exemplo, no art. 6º, inciso VII, da Lei nº 10.826, uma previsão de que quem atua na escolta de preso deveria o ter o porte de arma, não só porte, autorização, registro, para ter arma em residência ou no escritório, deveria ter o porte institucional mesmo, funcional. E vemos isso na Lei nº 10.826, o oficial participa da escolta de presos muitas vezes, ou tem que conduzir coercitivamente uma determinada testemunha ou um flagrante, alguém preso em flagrante, na ausência de outro auxílio, e não tem direito a esse porte de arma. E em casos – eu não vou mencionar o número de processos, porque são vários – há o indeferimento inclusive do registro e da autorização para ter arma em casa.
Nós tivemos um caso recente, em um tribunal superior, em que um profissional teve que reter um manifestante que queria invadir o plenário e bater em todo mundo. O manifestante citou seu nome, seu endereço, o de sua família. Disse que quando saísse dali a situação ia ser outra. O profissional pediu a renovação do porte de arma, não o porte funcional, mas uma autorização para ter arma em casa, e teve essa renovação indeferida sob o argumento de que não havia nenhuma situação que a justificasse, embora os registros de ocorrência e as várias situações ali consignadas gerassem vários registros de ocorrência, colocando em risco a segurança dele e a de sua família.
Temos na Lei nº 10.826, como eu dizia, essa previsão legal, no art. 6º, inciso VII, mas não temos autorização policial. Mesmo o que existe hoje passa a mensagem de que o oficial de justiça deveria ter esse porte de arma garantido. Se não fossemos à Lei 10.826 e fossemos, por exemplo, ao Código de Processo Civil... Vemos, hoje, no Código de Processo Penal, obrigações do oficial que trazem a necessidade do porte de arma. Não é uma questão de escolha. Ele tem necessidade funcional do porte de arma. No Código de Processo Civil, no art. 143, entre as várias incumbências do oficial de justiça, o inciso I afirma a questão da citação, a questão da prisão, de fazer pessoalmente prisões e penhoras. Quem gosta de ter um bem penhorado? Quem gosta de ser preso? É uma situação em que você apela para qualquer reação não comum, ainda que de cunho psicológico. Então, você tem aqui vários aspectos em que poderá se realizar um apoio policial. Poderá, na prática isso não ocorre. Poderá também não acontecer o apoio policial. No Código de Processo Penal temos vários momentos, mas vou citar dois: o art. 218 diz que o juiz poderá requisitar o oficial de justiça, caso a testemunha regularmente intimada não compareça, para conduzi-la coercitivamente; e, no art. 773, a previsão de que, se estiver solto ou internado, na fase de execução, expedir-se-á um mandado de captura que será cumprido pelo oficial de justiça ou autoridade policial. Essa situação em que você vê a autoridade policial e o oficial de justiça no fim, ou melhor, no começo daquilo que exige o porte de arma é múltipla nos códigos que regem hoje a função jurisdicional.
Mas nos lembramos apenas daqueles que estão, digamos assim, em que há um marketing maior. Há uma consciência maior de que aquelas pessoas específicas precisam de um porte de arma. E o oficial de justiça, em verdade, fica numa situação em que ele se expõe sem essa garantia, ainda que seja para não usar. Entre os oficiais pode haver divergência sobre a necessidade ou não do porte de arma. Agora, não ter a opção dessa segurança é inaceitável. Vemos que essa divergência sobre a atuação do oficial e sua natureza de risco não existe nem na Polícia Federal, sob a perspectiva normativa. Ela existe sob a perspectiva do deferimento ou não do porte hoje, em várias situações, em todas elas, praticamente. Mas sobre a conceituação isso não existe. Há uma instrução normativa da Direção-Geral da Polícia Federal, a de nº 23/2005, inclusive usada nos mandatos de injunção que reconheceram a atividade de risco que desenvolve o oficial de justiça, pelo Supremo Tribunal Federal, para fins de aposentadoria especial. Essa instrução normativa regulamenta alguns aspectos do art. 6º e do que define a atividade de risco. Ela diz expressamente quais são, entre as funções de Estado, as que se configuram em uma atividade de risco, junto com a função policial, junto com a função fiscal. Os auditores fiscais já obtiveram essa garantia em uma lei anterior, embora estejam aqui no projeto também e não há prejuízo nisso. Lá no art. 18 dessa instrução normativa que regulamenta alguns aspectos das atividades de risco, do Estatuto do Desarmamento, a Direção-Geral da Polícia Federal afirma que a execução de ordens judiciais, essa instrução de 1º de setembro de 2005, como eu dizia, provém e define a execução de ordens judiciais como atividade de risco, junto com a função policial, junto com a função de segurança lato sensu. Então, não é compreensível. Os projetos de lei que regulamentaram as atividades do oficial de Justiça em âmbito estadual e federal, em todos eles – a exemplo da União, o PL 5.845/2005, que tramitou nas duas Casas, na Câmara e aqui – criou-se uma gratificação; e a justificativa, aprovada por todos os tribunais superiores, é de que o oficial exerce uma atividade de risco.
Há várias situações, hoje, que objetivam a característica da atividade de risco do oficial de Justiça. O que não há é o reconhecimento formal numa lei. E daí a necessidade, porque boa parte dos que estão aqui hoje enfrentam isso diariamente. Há servidores aqui, por exemplo, de Roraima, que chegam a receber trinta mandados por dia, trinta mandados para cumprir por dia. E, se você não cumpre no prazo, porque não tem apoio policial e ultrapassaram-se os vinte dias, abre-se processo administrativo disciplinar por desídia no cumprimento da função. Você vai esperar o apoio para cumprir com a sua obrigação? Para abrir processo administrativo, não progredir na carreira? Sei lá onde isso vai parar.
Exªs, mais do que nunca, um projeto que venha a se tornar lei, prevendo porte de arma para o oficial de Justiça é fundamental para a função, e não digo só para o oficial, digo para a segurança pessoal do oficial; é primordial para a função jurisdicional e para a cidadania no Brasil.
Muito obrigado. (Palmas)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Obrigado, Dr. Rudi Cassel.
Já se encontra presente em nossa audiência o Presidente do Sindicato Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal do Brasil, o Sindifisco, o Sr. Pedro Delarue Tolentino Filho.
Convido à Mesa. Seja bem-vindo.
Vamos convidar para fazer suas considerações iniciais o Presidente do Movimento Viva Brasil, Bené Barbosa, que disporá de tempo regulamentar.
O SR. BENÉ BARBOSA – Meus cumprimentos ao Senador Paulo Davim, a quem estendo aos demais Senadores aqui presentes, bem como aos integrantes deste Mesa e a todos os demais presentes.
Infelizmente, no Brasil, criou-se uma grande mitificação da arma de fogo. A gente fala em porte de arma e só se lembra da arma de fogo. Na realidade, quando a gente fala em porte de arma, estamos falando essencialmente do quê? De legítima defesa. E a legítima defesa no Brasil é um direito pátrio. Ela faz parte da nossa legislação. É sabido que, se você agredir ou vir até a matar alguém em legítima defesa, não será preso por conta disso. Além disso, ela é um direito natural. Não existe animal no mundo que, ameaçado de perder sua vida, não tente de alguma forma se defender.
Também é um direito humano, porque não há como se exigir de um homem, de um ser humano que, tendo a sua vida em perigo ou tendo a vida de seus familiares em perigo, deixe-se matar e não faça nada.
E, por último, é um direito individual. Cabe ao ser humano perceber, discutir e decidir se ele quer portar uma arma de fogo para sua defesa. Isso é definitivamente um direito individual. Se me sinto preparado, se me sinto seguro, se eu tenho consciência dos prós e dos contras, tenho, como ser humano, o direito de decidir se quero isso para mim.
Não cabe ao Estado essa interferência em nível tão pessoal, dizendo, muitas vezes: “não, eu vou te impedir de ter uma arma, eu vou te impedir de andar armado, porque isso é perigoso para você.” Não cabe ao Estado esse papel. Essa é uma decisão particular, de cada um, de cada pessoa.
O Estatuto do Desarmamento, já aprovado há oito anos, desde 2003, tem trazido uma série de verdadeiros fracassos. Um dos mais gritantes é o desarmamento daqueles que não cumprem a lei. Óbvio, o Estatuto funciona para mim, para os senhores, que não vão ilegalmente portar armas, porque vocês obedecem à lei. Porém, ele é completamente ineficaz para aqueles que não obedecem à lei, e é por isso que o Brasil continua tendo a triste posição de mais de 50 mil mortos todos os anos. Ou seja, o Estatuto não teve qualquer valor para a diminuição da criminalidade no Brasil. (Palmas.)
Muito obrigado!
E o que é pior e que é mais grave: além disso, ele trouxe a segurança aos próprios criminosos, porque, uma vez que uma sociedade onde os seus cidadãos trabalhadores e honestos, onde os seus oficiais de justiça não têm sequer o direito de possuir uma arma de fogo, muito menos de portá-la, desculpem, a segurança não está no cidadão, a segurança está sendo transmitida diretamente ao criminoso.
Nós temos que olhar, muitas vezes, as leis não com os olhos daqueles que obedecem à lei, mas sim com os olhos daqueles que não obedecem à lei. Olhem essa lei, olhem essas campanhas de desarmamento com os olhos daqueles que pretendem atacar a sociedade. Ora, é um sossego, é uma tranquilidade você saber que um oficial de justiça que está indo entregar uma intimação, que está indo cumprir a justiça, está desarmado, está à mercê daquele que, ou por força motora, por força corporal, ou por força de uma faca, de um pedaço de pau, ou em superioridade numérica, pode fazer o que quiser com ele.
Outro mito que se criou, quando se decidiu proibir o porte de armas no Brasil, é que uma sociedade armada indubitavelmente vai virar um bangue-bangue, é o mito do bangue-bangue. Ah, então os oficiais de justiça vão portar armas, e aí sai uma discussão de trânsito, e aí um começa a dar tiro no outro, e aí ele vai para o bar e briga e dá tiro no outro, e aí ele briga com o vizinho e dá tiro no vizinho. Isso é uma balela. E nós temos exemplos pelo mundo todo.
Vamos pegar os Estados Unidos, que são, hoje, o país mais armado do mundo, sem dúvidas. São 175 milhões de armas de fogo na mão da população, com uma taxa anual de 5,4 homicídios por 100 mil habitantes. O Brasil tem hoje 1,8 milhão de armas registradas na Polícia Federal, com uma taxa de 27 homicídios por 100 mil habitantes, 5 vezes mais.
O Estado da Flórida nos Estados Unidos emitiu, nos últimos 10 anos, 1 milhão 327 mil portes de arma, 1 milhão 327 mil portes de arma. Só a Flórida tem, de portes, praticamente o que o Brasil tem, no Brasil todo, de armas registradas. Em 10 anos, desses 1,3 milhão, apenas 4 mil foram revogados. O que quer dizer isso? O cidadão perdeu o direito de ter aquele porte. E perdeu por quê? Porque ele cometeu um crime? Não necessariamente. Ele pode ter entrado num local que seria proibido de ele entrar; ele pode ter cometido qualquer outro problema com a justiça e perdeu esse direito. Não quer dizer que ele cometeu algum crime com essa arma. Isso equivale a 0,3% de portes revogados. Ou seja, a maioria absoluta das pessoas que tenham porte de armas não vai cometer nenhum tipo de crime com essa arma ou em decorrência dessa arma.
E nós temos também outros exemplos. Vamos pegar São Paulo na década de 90. Nós tínhamos 100 mil portes de arma só em São Paulo, a violência era absurdamente menor do que é hoje. A proibição desses portes não serviu para a queda dessa criminalidade. Em Curitiba, há um dado muito importante, um levantamento feito, durante a década de 90, da delegacia que cuidava da expedição dos portes sobre quantos portes tinham sido cancelados por cometimento de crime, dos 40 mil portes que ela tinha emitido. De 40 mil, três foram cancelados. Dois estavam portando arma em local proibido, um em estádio de futebol e um numa boate. O terceiro, realmente, foi um caso de crime passional. De 40 mil, apenas uma pessoa cometeu um crime com a arma legalizada, ou seja, estatisticamente é irrisório.
Agora, quantas vidas foram salvas por conta disso? É muito difícil saber. Por quê? Porque muitas vezes, ou na maioria das vezes, a simples presença da arma não é um fator de violência, ela é um fator de inibição da violência. Por que ninguém desarmado ataca um policial no meio da rua com um pedaço de pau? Porque o policial está armado. Se a arma não protege, como tantos dizem, por que as polícias têm armas? Por que os seguranças particulares têm armas? Por que os seguranças de bancos têm armas? Por que os seguranças aqui desta Casa têm armas? Porque ela é, sim, um excelente objeto de defesa, não só de ataque, desde que nas mãos corretas.
A própria ONU, no seu último estudo sobre homicídios, chamado Global Study on Homicide, definiu, em 2011, pela primeira vez na vida a ONU, que sempre foi a maior defensora do desarmamento, disse que não há como se estabelecer uma relação direta entre o número existente de armas de fogo na sociedade ou o direito do porte dessas armas e o número de homicídios, que outros fatores é que realmente são principais. Isso é muito claro.
Para encerrar, gostaria de levantar a tese de que hoje no Brasil precisamos restabelecer, trazer a debate nacional, duas coisas: liberdade e responsabilidade. Hoje, muitas vezes o Estado tira a minha liberdade individual, acreditando que eu não tenha responsabilidade para responder pelos meus atos. Isso precisa ser retomado, a discussão precisa ser retomada. A liberdade do indivíduo e garantir que esse indivíduo vá responder por seus crimes, pelos seus erros e pelos seus acertos e não ser apenas tutelado, dizendo o Estado, a todo momento, o que é melhor e o que é pior para ele.
Por último, deixo aqui uma mensagem diretamente aos Senadores, que estão aí para votar esta lei, que poderão dizer sim ou não a esse direito para os oficiais de justiça e a outras categorias: se algum desses oficiais fizer uma bobagem com a arma de fogo, cometer um ilícito, uma agressão, um homicídio, acreditem, a responsabilidade é unicamente dessa pessoa, que teve o livre arbítrio, que teve a escolha de fazer o errado. Agora, Srs. Senadores, se vocês negarem esse direito a essas pessoas e uma delas vier a falecer em decorrência dessa negativa, em decorrência de não ter uma arma para se defender, em decorrência de não ter esse direito, que lhe foi retirado, aí, Senhores, infelizmente, a culpa será de vocês.
Muito obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Agradeço ao Bené Barbosa e convidamos o Sr. Marivaldo Pereira, Secretário de Assuntos Legislativos, para as suas considerações.
O SR. MARIVALDO PEREIRA – Bom dia, Senador Paulo Davim, bom dia aos demais componentes da Mesa. Quero, inicialmente, agradecer o convite e parabenizar a iniciativa da Comissão.
Hoje uma das principais políticas empreendidas pelo Ministério da Justiça é pela ampliação da participação no processo de elaboração normativa, sobretudo uma política que vem sendo muito trabalhada no âmbito da Secretaria que estou dirigindo, da Secretaria de Assuntos Legislativos, que tem como principal objetivo trazer a sociedade para ter exatamente o que está acontecendo aqui, a participação no processo de elaboração normativa, pois acreditamos que isso contribua para o aprimoramento da legislação, contribua para que tenhamos um resultado, uma norma muita mais condizente com os interesses de toda a sociedade, de todos os grupos presentes na sociedade, por isso essa contraposição de ideias, essa troca de ideias, esse debate é extremamente importante e produtivo para o aperfeiçoamento da nossa legislação.
Pois bem, eu queria dividir a minha fala em dois pontos principais. Primeiro, justificando aqui a política de desarmamento, que é uma política que vem sendo empreendida pelo Governo Federal desde 2003, com a aprovação do Estatuto. E desde 2004 o Governo vem destinando aproximadamente 10 milhões do seu orçamento para investimento numa política de desarmamento, partindo do pressuposto de que a política de desarmamento possui, sim, resultados efetivos na redução da criminalidade, na redução dos homicídios, na redução dos acidentes.
Grande parte dos homicídios ocorridos no Brasil – e é impossível ignorar isso – são muitas vezes motivados por acidentes ou por crimes passionais. O sujeito de bem, trabalhador, que se envolve numa discussão, levado ali pela emoção do momento, acaba infelizmente cometendo a besteira, simplesmente pelo fato de ter uma arma, cometendo um crime.
Nós assistimos a isso todos os dias. Todos os dias nós temos visto isso e, como muito bem demonstrado aqui, a sociedade americana é o melhor exemplo disso. Todos os meses, assistimos a barbáries cometidas por estudantes, por adolescentes, simplesmente pelo fato de terem armas.
Então, o pressuposto da campanha do desarmamento eu creio que é impossível negar, é negar a realidade, aquilo a que assistimos diariamente. É impossível questionar a efetividade de uma política como esta; se está sendo bem desenvolvida ou não, se precisa melhorar num ou noutro ponto, temos que discutir, temos que debater a amplitude da restrição ao porte de arma, que eventualmente possa ter deixado de fora uma ou outra categoria que corre risco, temos que debater, e acho que é isso que estamos fazendo aqui hoje. Acho que é esse o debate que vem sendo proposto com a discussão do projeto de lei e com tantos outros projetos de lei que tramitam tanto aqui no Senado Federal, como também na Câmara dos Deputados, e temos participado ativamente dessa discussão.
O que nos preocupa no projeto atual? O que nos preocupa principalmente é a grande amplitude em que se está dando autorização para o porte.
É importante lembrar que, só entre 2004 e 2005, o Ministério da Justiça recolheu quase 500 mil armas; de 2008 a 2009, 21 mil armas; em 2011, 37 mil armas que foram retiradas de circulação e que, de acordo com o Instituto Sangari, de pesquisa, que não é do Ministério da Justiça, coincide com um período de redução substancial na taxa de homicídios em nosso País.
Então, temos todo um esforço acumulado, de 2004 para cá, para retirada de armas de circulação, que tem trazido resultados bastante positivos para a sociedade. Obviamente que há pessoas que não concordam com isso, mas são os dados que o Ministério da Justiça tem, os dados que a sociedade civil vem levantando que têm-nos demonstrado isso.
Qual é a nossa preocupação? A ampliação substancial, a ampliação sem um critério lógico, sem um critério definido do porte de armas pode colocar em risco todo esse esforço, todo o recurso tirado da população, recurso tirado das famílias, recursos dos impostos que foram investidos nessa política. E agora não pode ser simplesmente abortado, simplesmente jogado fora. Essa é a nossa preocupação principal. O primeiro ponto que é importante discutir e acho que tem que ser colocado nesse debate: os casos de violência. É fundamental que tenhamos uma análise concreta, uma análise objetiva desses casos de violência que são mencionados aqui, porque é fundamental primeiro delimitar: esses casos aconteceram no exercício da função?
O segundo ponto que é muito importante a gente debater: esses casos poderiam ou não ser evitados simplesmente pelo fato de o agente público possuir ou não a arma? Poderia ou não poderia? Ora, por exemplo, se você é recebido em qualquer lugar já por um sujeito armado que sai atirando, poderia ser um policial armado, poderia ser um soldado do Exército armado que seria recebido a tiro, poderia ser qualquer cidadão comum. Ora, o trânsito pelas ruas, por que não atacam os policiais? Quando eu digo isso, a impressão que se dá é que qualquer um de nós que saímos às ruas seremos atacados por qualquer pessoa. Não é isso que acontece. Não podemos generalizar a criminalidade. Criminalidade existe e deve ser punida. Agora, partir do pressuposto de que vivemos em uma sociedade em que todos saem atacando todo mundo. Não acredito que seja esse o caminho. E mais ainda: o caminho de que, ao armarmos todo mundo, evitaremos esse tipo de coisa, evitaremos a criminalidade. Sinceramente, não conheço pesquisa, não conheço dados estatísticos que comprovem que o fato de possuir a arma aumenta a segurança. Muito pelo contrário. Muito pelo contrário! Se pegarmos diversas situações em que agentes públicos que possuem porte de arma foram assassinados, a conclusão a que chegaremos é de que o porte de arma, infelizmente, não evitou que a pessoa fosse morta. Ou, muito pelo contrário, a arma foi, inclusive, o que motivou a agressão ou que motivou a que o agente público fosse atacado.
Por isso, eu gostaria de chamar a atenção de todos para o seguinte: temos que debater esse assunto – acho que esta é uma Casa extremamente democrática e que esse assunto deve ser pautado –, porém, é fundamental voltarmos os nossos olhares para o critério. Qual é o critério que nós vamos utilizar para conceder o porte de arma? Vamos utilizar o critério, para conceder porte de arma, para o sujeito que exerce uma atividade administrativa? Vamos autorizar o porte de arma, como propõe o PL, por exemplo, para o defensor público que atua na vara cível? Vamos autorizar o porte... Qual é o critério concreto, qual é o critério que justifique que, neste caso, é essencial que tenha arma? E por que ele tem a arma? Eu tenho que comprovar por que a arma é eficiente para evitar a agressão. De outro modo, não faz sentido. Não posso querer ter a arma simplesmente porque... E aí, sim, eu vejo a mitificação, não do desarmamento, mas a mitificação da arma; o mito de que a posse da arma, o porte da arma é suficiente para inibir qualquer tipo de agressão. Nós não acreditamos nesse mito, e os dados demonstram que isso não é verdade. Infelizmente, os dados que nós temos, sobretudo dos agentes relacionados ao Ministério da Justiça que possuem porte de arma, são que isso não foi suficiente para evitar que, na hora vaga, uma discussão levasse à morte, ou mesmo que, agindo em serviço, isso possa ter ocasionado a morte.
Então, é esta discussão que temos que colocar: nós vamos conceder o porte de arma, simplesmente, para uma categoria como um todo, pelo simples fato de ser uma categoria, e presumir que, pelo fato de exercer determinadas atividades, essa categoria corre risco? Ou nós vamos conceder o porte de arma para aquela pessoa que efetivamente foi ameaçada ou para aquela pessoa que vai exercer uma atividade que, necessariamente, tem risco, não tendo sido possível conceder a ela a proteção da autoridade policial, proteção que já é prevista na legislação e que foi criada exatamente para afastar esse tipo de risco? Então, a discussão, a perspectiva do Ministério da Justiça nesse debate é: não vamos comprometer o esforço que vem sendo feito, às custas do dinheiro público, não vamos comprometer todo esse esforço aprovando um projeto que não analisa, criteriosamente, se a arma é ou não um elemento necessário.
E mais do que isso: nós defendemos a política do desarmamento, sem prejuízo de toparmos essa discussão, sem prejuízo de nos sentarmos e debatermos a efetividade e a necessidade da ampliação do porte de armas, porque entendemos que a política do desarmamento é essencial para a proteção das famílias, é essencial para evitar os acidentes a que temos assistido aí, de crianças que conseguem encontrar as armas dos seus pais e, infelizmente, vão brincar com essas armas e acabam matando um irmão, acabam matando um colega, acabam matando um vizinho. É esse tipo de tragédia que nós queremos evitar.
A política do desarmamento é uma política que protege a família, é uma política que protege o cidadão. O direito individual a ter uma arma... Não existe um direito individual a ter arma; existe o direito do Estado de regulamentar o uso da arma porque ela coloca em risco a segurança do coletivo. Eu não posso submeter o interesse da coletividade ao interesse individual, sendo que não há dados objetivos que comprovem que isso traz efetiva segurança ao cidadão.
Então, é essa a perspectiva do Ministério da Justiça, é essa a perspectiva que tem que ter todo órgão público. É o interesse público, é o interesse da coletividade que temos que buscar tutelar, sem prejuízo de fazermos esse debate. Temos que discutir, sim, a segurança dos agentes públicos, mas chamo atenção – e a nossa participação especial neste debate é para isso: vamos discutir com critérios, vamos debater critérios objetivos. Não podemos generalizar, sob pena de comprometer a política empreendida pelo Ministério há tanto tempo, uma política que já custou tanto aos cofres públicos.
É esse o apelo que faço aqui, em defesa da política do desarmamento e também em defesa desse debate aqui com vocês.
É isso que eu tinha para colocar, Sr. Presidente.
Muito obrigado.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Pela ordem, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Pela ordem, concedo a palavra ao nobre Senador Eduardo Suplicy.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT – SP) – Quero cumprimentar a todos pela contribuição que vêm dando e eu preciso me ausentar para uma obrigação de votar na Comissão de Relações Exteriores, apenas aqui expresso o meu sentimento pessoal.
Eu aprendi com o meu pai, desde criança, que seria muito melhor não ter armas em casa. E assim tenho procedido comigo e é o que ensino aos meus filhos, porque sei de muitos casos na família, em tantos lugares e em escolas, de pessoas que acabaram – às vezes, crianças ou jovens – utilizando armas e causaram ferimentos e mortes, por desatenção à utilização de uma arma encontrada involuntariamente.
Mas, com todo o respeito, ouvi com atenção os pontos de vista de todos, e aqui peço licença, Sr. Presidente.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Pois não, Senador Eduardo Suplicy, agradecendo a sua presença, entendo que hoje estão acontecendo simultaneamente na Casa várias audiências públicas, várias sessões de votação nas comissões, o que impossibilita a presença constante dos colegas Senadores neste debate.
Vou passar a palavra, agradecendo ao Dr. Marivaldo Pereira, da Secretaria de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, ao Dr. Sérgio Torres, Assessor da Secretaria Executiva do Ministério da Justiça, em substituição ao Exmº Sr. Ministro de Estado da Justiça, José Eduardo Cardoso.
O SR. SÉRGIO TORRES – Exmº Sr. Senador Paulo Davim, demais colegas aqui da Mesa, Senhoras e Senhores; como já bem colocado aqui pelo Dr. Marivaldo, o Ministério da Justiça, desde o Estatuto do Desarmamento de 2003, implementa uma política de paz, uma política de desarmamento, uma política de proteção da sociedade por entender que a arma não é um instrumento de defesa, a arma é um instrumento de ataque e, quando mal utilizada, na mão de pessoas erradas tem um potencial danoso, um potencial que, enfim, traz todos os riscos à sociedade, como já sabemos. E é essa população, esse cidadão que não deve possuir armas que a campanha do desarmamento busca alcançar. Evitar acidentes, evitar que a arma caia em mãos erradas. Esse é um caminho.
A questão específica do projeto, no que tange ao porte por parte de agente públicos, entende também o Ministério que vem em uma linha de encontro ao Estatuto. A gente está desarmando, não há por que armar agentes públicos. Os argumentos aqui levantados não conseguem colocar de forma cabal essa necessidade. Assim entende o Ministério.
É preciso detalhar melhor esses objetos, ir mais a fundo nesta questão, no lugar de simplesmente permitir, de uma forma mais abrangente, o porte para os agentes, como aqui foi colocado.
Enfim, estamos abertos para discutir, mas precisamos fazê-lo com mais profundidade, com mais detalhes. Entender melhor e compreender essa necessidade, comprovar essa necessidade. Não há como, de uma forma generalizada, permitir que esses agentes estejam armados. A sociedade precisa se desarmar, não se armar.
A arma como instrumento de defesa é muito pouco eficaz, na maioria das vezes. Sabendo o cidadão que aquele agente está armado, ele vai usar do efeito surpresa, vai surpreender o agente público naquele momento. É por isso que os policiais, quando portam arma ostensivamente, realmente as pessoas respeitam – como já foi aqui colocado –, mas, na situação da surpresa, na maioria das vezes essa arma não é capaz de proteger aquele agente que já se encontra preparado, como é de se esperar das forças policiais, principalmente.
Enfim, para as demais categorias na forma aqui proposta, essa questão de capacitação, de preparo, precisa ser muito mais esclarecida. Não dá para apenas, pelos argumentos aqui apresentados, entender ou concordar com a continuidade desse projeto. Quer dizer, precisamos trabalhar numa linha que venha no sentido de proteção da sociedade, e a arma, como entendemos, não vai trazer essa proteção, não vai trazer essa proteção para o agente público, na maioria das vezes. Na maioria das vezes, ele vai ser surpreendido. Quer dizer, a tocaia é o instrumento mais utilizado por aqueles que se sentem atacados ou prejudicados pelo Estado. Não vai ser um confronto aberto, em que se espera que o agente armado vá inibir uma ação a posteriori, de forma surpresa, que não vá acabar, de fato, protegendo aquele agente.
Estamos aqui abertos para continuar a discussão, mas já colocando que, de antemão, o Ministério entende que o projeto, da forma colocada, não se encontra adequado. Muito obrigado.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) ) – Agradeço ao Dr. Sérgio Torres pela sua participação e passaremos a palavra ao Dr. Pedro Delarue Tolentino Filho.
O SR. PEDRO DELARUE TOLENTINO FILHO – Bom dia, Senador Paulo Davim, a todos os presentes, meus companheiros de Mesa. É um prazer ter sido convidado para participar desta audiência pública. Sou Presidente do Sindicato dos Auditores Fiscais da Receita Federal, mas também vou falar um pouco, aqui, sobre os meus colegas auditores fiscais do trabalho.
Os auditores fiscais da Receita Federal, desde 1964, há quase 40 anos, com o advento da Lei nº 4.502, têm o direito ao porte de arma para defesa pessoal. Está nas nossas carteiras funcionais. Ao longo desses 40 anos, Senador, nunca houve um incidente sequer envolvendo crime passional ou agressão, ou mau uso de arma de fogo por parte dos auditores fiscais. Então, o discurso pode ser facilmente rebatido com o exemplo. Ao longo de 40 anos não houve nada disso.
A verdade é que nós fomos surpreendidos ao sermos incluídos, porque nós estamos lá no Estatuto do Desarmamento, mas, como eu disse, já havia uma lei de 1964, e fomos surpreendidos por entrarmos no art. 6º do Estatuto do Desarmamento, já que, como nós temos uma lei, assim como o Ministério Público, assim como a Magistratura, que tem uma legislação específica, nós também não deveríamos sequer estar no Estatuto do Desarmamento, e sim ficarmos com a nossa lei de 1964. Por quê? Por que o Ministério Público, a Magistratura, usa oficiais de justiça, os auditores fiscais, que precisam ter essa proteção? Por quê? Por que tem que ter esse direito? Porque nós mexemos com interesses poderosos, interesses de quadrilhas organizadas. Assim como há atentados a juízes e a membros do Ministério Público, é comum haver atentado à vida de auditores fiscais. Nós mexemos com uma coisa que, muitas vezes, as pessoas prezam mais, alguns tipos de pessoas prezam mais do que a própria liberdade, que é o bolso. Nós atacamos o bolso das pessoas. Muitas vezes, a pessoa vai para a cadeia, mas não diz onde está o dinheiro, porque ela prefere se ver privada na sua liberdade, mas preservar o que para ela é o bem maior, que é o produto do roubo que ela fez. Então, você vê inúmeros.
Estou com uma transparência, será que você poderia passar?
Apenas rapidamente, atentados à vida de auditores fiscais. Aí um em 1981.
Pode passar.
José Agripino Guedes, morto em Macapá em 1991.
Pode passar.
Nestor Leal, Delegado da Receita Federal que, em 1997, foi alvejado com cinco tiros – e aí é importante dizer: não foi na atividade. Essas coisas realmente não acontecem durante a atividade, elas acontecem, no caso aí, na entrada de sua casa. Então, não se pode tirar... Não é só a arma institucional durante o serviço, tem que ser o porte de arma para que a pessoa possa se proteger naquele momento em que ele está mais fragilizado, não é no meio da operação, quando ele está protegido, com a proteção da polícia, com proteção dos próprios colegas, enfim, com todo o apoio, apoio de helicóptero e tal. É naquele momento em que ele está sozinho chegando a casa. Imagina um auditor fiscal lá em Foz do Iguaçu, alguns de vocês podem ter visto na televisão operações com perseguição de carros da Receita Federal a contrabandistas, com apoio de helicóptero e tal... Ali eles pegam contrabandistas, mas não pegam toda a quadrilha, e, à noite, ele vai com sua esposa e com seus filhos jantar em um restaurante, desarmado – porque a arma é institucional, ele tem que entregar a arma de volta –, e o bandido sabe que ele está desprotegido. E é nessa hora que o atentado acontece. É muito raro, embora já tenha acontecido, que seja no horário do expediente, onde ele está praticando a operação.
Vamos em frente.
Jerônimo Freire, morto a tiros em 1998, em Campo Grande.
Em frente.
Jackson Corbari, chefe da Fiscalização de Foz do Iguaçu, recebia constantemente ameaças, foi alvejado com oito tiros e colocado sob vigilância da polícia.
Mais em frente.
Hélio Pimentel Junior, em 2002, trabalhava com empresas importadoras ligadas a máfia chinesa – então são quadrilhas –, foi sequestrado na porta do prédio onde morava e seu corpo foi encontrado horas depois carbonizado e sem as mãos.
Oswaldo Campos Argolo, sofreu tentativa de homicídio em Feira de Santana. Ao abordar um caminhão para fiscalização, foi recebido à bala por seus ocupantes.
Mais em frente.
Esse outro colega sofreu tentativa de homicídio em Paulo Afonso, na Bahia, a viatura em que se deslocava foi atingida a tiros.
Edmundo Trench recebeu sete tiros quando trabalhava em Mundo Novo, e, no dia seguinte, recebeu telefonemas ameaçadores dizendo para ele parar com aquilo que ele estava fazendo, porque senão ele iria morrer.
Janair, morto a tiros em 2004, na garagem de sua casa.
Chacina de Unaí. Aí são os Auditores Fiscais do Trabalho. Foram chacinados em Unaí, Minas Gerais, e eu posso lhes garantir que, se eles estivessem armados, essa chacina talvez não tivesse ocorrido. Nessa época, os Auditores Fiscais do Trabalho não tinham direito a porte de armas, ganharam depois.
Esse é um exemplo muito claro de que não basta, como foi falado aqui pelos representantes do Ministério da Justiça... Eu queria ver esses colegas, que são pessoas bem intencionadas, mas, em uma operação lá na fronteira, perseguindo contrabandistas de armas, perseguindo traficantes de drogas, se eles não queriam estar com uma arma na mão ou se eles iriam lá de peito aberto. (Palmas)
Eu queria ver se eles fossem subir o morro para entregar uma intimação para uma pessoa de alta periculosidade, se eles não queriam estar com uma arma na mão. E já é a segunda vez que nos encontramos com o pessoal dos oficiais de justiça, que lá no PLC nº 330, que trata das atividades de risco, regulamenta a Constituição. Os oficiais de justiça foram incluídos como atividade de risco – que são –, assim como os auditores fiscais são seguramente atividade de risco. E o que é que adianta você, para obedecer ao Estatuto do Desarmamento, dentro de uma política de desarmamento, você desarmar o Estado? Você não consegue desarmar o bandido e você vai desarmar o Estado! E aí o Estado, que tem que enfrentar a bandidagem, fica desprotegido, fica desarmado! E o que é que acontece? Por exemplo, na fronteira, se nós não atuamos, a arma passa e vai chegar às cidades, estimulando estimular a violência. Nós não podemos desarmar o Estado. O Estado tem que ser protegido. (Palmas)
(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)
Os servidores do Estado têm que ser protegidos!
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Dr. Pedro, eu gostaria de que não houvesse a manifestação da assistência, para a melhor condução dos trabalhos.
Obrigado.
O SR. PEDRO DELARUE TOLENTINO FILHO – Senhores, crimes passionais, acredito que a maioria deles são cometidos por agressão física, facada, outros tipos de conduta e não necessariamente por arma de fogo. Quem quer matar não precisa de uma arma para matar. E nem de porte de arma. Porque os bandidos não estão querendo que o Estado lhes dê porte de arma, não. Os bandidos querem mesmo é ver a população desarmada. É ver os agentes públicos desarmados.
Recentemente, houve um atentado contra um magistrado, que vivia sob ameaça de morte. Ele e seus seguranças estavam armados e reagiram. Se não estivessem armados, certamente, hoje, esse juiz estaria morto.
Há, sim, um elemento de proteção, de percepção de risco por quem está do lado de lá e que vai ser abordado. Ele precisa ter a percepção de risco de que, se ele fizer uma violência, o outro tem meios para se proteger. E isso muitas vezes aborta a vontade de praticar uma violência por parte daquele agente. Agora, se ele souber, se ele tiver certeza de que aquele agente está desarmado, aí, provavelmente, muitas tragédias mais acontecerão e nem sempre a polícia – nós sabemos disso – pode dar cobertura.
Muitas vezes, na nossa atividade, nós perdemos, nós deixamos de fazer muitos flagrantes, porque não temos esse acompanhamento da polícia. E aí, como nós sabemos que vem um caminhão, um ônibus carregado de arma, cheio de traficantes, carregado de droga, e nós não podemos fazer aquela operação porque não temos o armamento necessário para nos proteger, para, nos protegendo, proteger a população do Brasil e evitar que as drogas e as armas cheguem às cidades, para armar os bandidos e dar mais insegurança ainda à população.
Então a mensagem é a seguinte: agentes públicos que precisam ter porte de arma, que estão ameaçados constantemente, diariamente na sua atividade, não podem ter cerceado o seu direito à proteção à sua vida, não podem ter o direito à sua vida cerceado. E, por isso, não precisam apenas ter arma institucional, porque elas são devolvidas ao final do dia, na repartição; eles precisam ter porte de arma, ponto. Para se proteger.
Para terminar, falaram sobre uma pessoa que está na atividade administrativa. Muitas vezes, no caso de auditor fiscal, ele exerceu uma função na fiscalização, exerceu uma função na repressão, e o bandido, depois que ele for, até que se aposente – ou na área administrativa, ou mesmo aposentado –, ele vai buscar a vingança é depois, não é naquele momento. Ele vai se vingar depois.
Então, a mensagem é a seguinte: não é armar a população, é não desarmar os agentes do Estado, não desarmar os servidores públicos, para que eles possam fazer o seu trabalho de proteger a população brasileira.
Obrigado. (Palmas.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Obrigado ao Dr. Pedro Delarue.
Atendendo à solicitação do Dr. Marivaldo Pereira, ele terá cinco minutos para explicações em cima da argumentação levantada pelo Dr. Pedro, citando a Secretaria do Ministério da Justiça.
O Dr. Marivaldo terá cinco minutos.
O SR. MARIVALDO PEREIRA – Obrigado, Senador.
Primeiro, eu acho, deixe-me esclarecer um pouco a posição do Ministério da Justiça.
Primeiro, nós não estamos nos recusando a debater eventuais situações em que precisa ser concedido o porte no Estatuto do Desarmamento. Acho que é fundamental aqui a gente separar um pouco. Se a questão é discutir o PLC nº 30, vamos discutir, então, quais são as situações que estão ali, e aí nós temos discordância sobre o formato como o projeto está sendo colocado, temos discordâncias com os critérios que estão sendo colocados ali. Não posso, simplesmente, conceder um porte de arma pelo fato de o sujeito ser agente público. Pelo amor de Deus! Qual é o critério, qual é a justificativa? É um privilégio? É pelo simples fato de ser agente público? Vamos analisar a atividade, vamos descer à atividade, vamos descer ao dia a dia e, a partir dali, avaliar se o porte de arma é necessário ou não. Esse debate nós concordamos em fazer. Acho que era esse o debate que deveria ser colocado aqui. Então, estamos discutindo uma questão que é central para uma política pública que vem sendo custeada pelo cidadão brasileiro. Uma política pública como essa não pode ser debatida simplesmente com argumentos que são para agradar a platéia. Não é isso. Temos de discutir com critérios técnicos, com a análise de dados. Ora, simplesmente o número de pessoas que foram mortas no exercício da função não é um critério suficiente. É necessário avaliar...
Se me permitirem, por favor, como coloquei...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Pessoal, por favor. Eu gostaria... Por favor...
O SR. MARIVALDO PEREIRA – A idéia é a de que o debate seja democrático.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Por favor.
O SR. MARIVALDO PEREIRA – Pois bem...
(Manifestação fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – É proibida a manifestação da assistência, por favor, senhora. Por favor, senhora!
(Manifestação fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Por favor, senhora!
O SR. MARIVALDO PEREIRA – Vou reiterar...
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Dr. Marivaldo...
Senhora, por favor, não é permitida a manifestação da assistência.
(Manifestação fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – É democracia, mas democracia com ordem. Democracia não significa fazer balbúrdia, desrespeito.
(Manifestação fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – A democracia parte do pressuposto do respeito à ordem. A audiência pública tem suas normas e a gente precisa obedecê-las. Entendeu, senhora?
(Manifestação fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – A senhora não pode externar uma opinião emocional, não pode ser assim. Nesta Casa...
(Manifestação fora do microfone.)
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Nesta Casa todos nós estamos imbuídos. Não é à toa que estamos fazendo a discussão desse tema, que é um tema relevante. Se nós convidamos os entes, os atores interessados no tema é porque estamos demonstrando a nossa responsabilidade em discutir a matéria com profundidade. Portanto, não cabem aqui as manifestações acaloradas, as manifestações extemporâneas. Estamos aqui para ouvir a posição oficial do Ministério da Justiça, que é o Ministério que tem de ser ouvido. Estamos aqui para ouvi-lo. Não podemos ouvir todos. Ouvimos todos por meio de seus representantes. Estamos fazendo aqui esse papel. Se nós abrirmos a fala para todos os presentes, sinceramente, não vamos chegar a lugar nenhum. Portanto, peço encarecidamente aos presentes, em particular a senhora, que evite as manifestações, porque não contribuem efetivamente para o que nós queremos.
Passarei, novamente, a palavra ao Dr. Marivaldo.
O SR. MARIVALDO PEREIRA – Gostaria de concluir do ponto em que fui interrompido. Quero dizer o seguinte, veja bem, os casos que foram relatados ali a gente tem de analisar. Por isso, o meu apelo a um debate técnico. Quais foram as condições em que eles ocorreram? Foi nessa linha que coloquei a vocês. Precisamos analisar quais foram as situações. Se aqueles profissionais tinham ou não um porte, se foi no exercício da atividade ou não. Qual foi o motivo que levou ao caso. Entenderam? É essa a análise, é esse o apelo que faço a vocês. É para isso que serve o debate. Gente, estou colocando aqui que o Ministério da Justiça não é contra debater a ampliação das categorias que têm direito ao porte. O meu apelo a vocês é no sentido de que a gente faça um debate técnico. Simplesmente colocar a concessão do porte para qualquer agente público é colocar em risco os avanços alcançados pela campanha do desarmamento. É esse o debate que estou mencionando e propondo a vocês. Então, não vejo, sinceramente, na perspectiva do que vocês estão pleiteando para a categoria dos oficiais de justiça, problema em fazer esse debate. Espanta-me, até, um pouco, uma reação contrária em relação a isso. Por exemplo, no caso dos auditores, é necessário colocar que auditor do trabalho, a partir do momento em que teve o porte de arma, qual foi o impacto do porte na redução do número de mortes.
São esses dados técnicos que temos que colocar na mesa. São dados objetivos, para, a partir daí, conduzir a discussão.
Eu não posso colocar em risco uma política pública a partir de critérios genéricos. É este o apelo. Nós temos a obrigação, sim, de defender a política do desarmamento. É uma política do Ministério, uma política que está sendo custeada pelos brasileiros. Nós temos que defendê-la. Não podemos concordar com medidas que coloquem em risco todo esse esforço. E é esse apelo que faço para vocês. Não dá para a gente chegar aqui e criar uma proposta de um dia para a noite revogando tudo aquilo que foi feito ao longo deste ano.
Concordo em discutir a questão dos oficiais de justiça. Ótimo, vamos nos sentar, discutir e avaliar critérios técnicos. O risco do exercício da atividade, quais são as situações, quais são os obstáculos que a gente tem hoje para ter o porte, como está colocada a legislação, o que a gente poderia avançar. Mas não é isso que está no projeto. O projeto é muito mais amplo que isso. É este o meu apelo. O projeto compromete os esforços que vimos empreendendo desde 2004. É este o apelo.
E, antes de concluir, gostaria de deixar muito claro: isso aqui tem que virar um debate para aprimoramento de um projeto, de uma proposta colocada pelo Poder Executivo. Isso aqui não pode virar um Fla x Flu. Se virar um Fla x Flu, tenho certeza de que não avançaremos em nada, em nada. Não teremos nenhum avanço. Vou ficar aqui falando palavras que vocês não concordam. Quem defende: “não, vamos discutir tecnicamente. Vamos discutir o projeto”. Se a gente discutir o projeto, a gente pode chegar a um acordo. Se a gente optar por outro caminho, pelo caminho do Fla x Flu, a gente vai sair do mesmo jeito que entrou: cada um, com a sua posição, vai para casa, segue a vida.
Acho que é esse o objetivo. É essa a proposta do debate que foi colocada aqui. Então, quero colocar para vocês mais uma vez: a gente concorda em discutir. Nós queremos discutir com base em critérios técnicos. Não podemos colocar um requisito genérico para o porte de armas porque isso compromete os avanços que vimos empreendendo por meio da campanha do desarmamento. É só isso. É só isso. É só isso.
O SR. PRESIDENTE (Paulo Davim. Bloco/PV – RN) – Agradeço a participação do Dr. Marivaldo.
Foram convidados o Presidente da Federação Nacional do Fisco, que não compareceu; o Delegado da Polícia Federal, Chefe da Divisão Nacional de Armas, que também não compareceu; o juiz auxiliar da Corregedoria Nacional de Justiça, que também não compareceu.
Portanto, quero, antes de concluir esta audiência pública – e haverá outros debates, esta matéria desta Comissão irá para CRE, onde será novamente discutida, e, com certeza, se realizará outra audiência, convocando outros entes para participar dessa discussão –, dizer que o nosso objetivo aqui é acertar.
Seria bom demais legislar se a gente pudesse ter os dois quadros, um exercício de futurologia; se a gente pudesse ter a certeza do que aconteceria se votássemos assim e o que aconteceria se votássemos assado. Seria ótimo, porque a gente escolheria o melhor dos cenários, que é o nosso papel aqui. Mas, infelizmente, não temos a condição de termos a certeza do que acontecerá no futuro com o nosso posicionamento.
Por isso fazemos esses debates, procuramos discutir a matéria, aprofundar, estudar, pesquisar, para que, desta forma, consigamos errar menos. Mas o interesse desta Casa, o interesse desta Comissão é sempre acertar, é sempre levar o melhor para a sociedade brasileira. Nenhum de nós está interessado em dificultar o trabalho dos agentes públicos, muito menos colocar em risco a vida de cidadãos e cidadãs no sacrossanto exercício de seu dever. Nenhum de nós, longe de nós. Mas precisamos discutir, conhecer a argumentação plausível, argumentação que dê real sustentação a essa matéria, para que possamos, dessa forma, evitar equívocos, evitar excessos. Se a gente pudesse saber se, com a autorização do porte de arma para os oficiais de justiça – que foi dito aqui, algo em torno de 25 mil, 26 mil –, se a gente pudesse discutir qual seria a consequência de se liberar porte de arma para auditores fiscais – Quantos são no Brasil? –, peritos da Previdência – Quantos são no Brasil? –, auditores dos Estados, do Distrito Federal, avaliadores do Poder Judiciário, defensores públicos – Quantos são? Então, é um contingente razoável, e isso nos obriga a fazer uma discussão com responsabilidade. Nós aqui estamos do lado do cidadão que presta um serviço à sociedade; nós estamos do lado da lei, da legalidade; nós queremos acertar. Portanto, o que foi dito aqui pelo Dr. Marivaldo é verdade: nós não podemos fazer uma discussão emocional; não podemos separar os dois lados como se fossem um do bem e outro do mal. Os dois são do bem, os dois querem acertar, os dois querem o melhor. Então, vamos exorcizar os fantasmas de que existe um lado que representa o bem e um outro que representa o mal. Um lado se opondo ao posicionamento do outro? Não. Esta Casa aqui tem a obrigação de procurar o melhor caminho para a sociedade brasileira.
Portanto, meus amigos, outros debates virão, será apreciado nesta Comissão e daqui vai para outra comissão, e aí teremos ainda muitas oportunidades para discutir, e aprender também, e conhecer a realidade de cada um.
Quero agradecer a todos que estiveram presentes nesta Mesa, enriquecendo com as suas informações todos os presentes, e encerrar a reunião, lamentando a ausência do Senador Paulo Paim, que teve que viajar.
Portanto, muito obrigado.
Está encerrada a reunião.
(Iniciada às 9 horas e 07 minutos, a reunião é encerrada às 10 horas e 33 minutos.)